REl - 0600703-46.2024.6.21.0033 - Voto Relator(a) - Sessão: 08/05/2025 00:00 a 09/05/2025 23:59

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, é incontroverso que o então prefeito de Pontão, VELTON VICENTE HAHN, quando candidato à reeleição, utilizou-se de um grupo de WhatsApp denominado “PT Pontão”, no qual estavam presentes filiados e simpatizantes, dentre os quais servidores públicos municipais. A mensagem questionada convocava os integrantes do grupo para atos de campanha, com o seguinte texto:

Pessoal todos os cc ou contratos estão convocados para sábado estou muito atento quem está participando depois do dia 6 de outubro não adianta chorar as pitangas.

 

A controvérsia envolve a caracterização de eventual prática de abuso de poder político e assédio eleitoral em razão do envio da mensagem no referido grupo de WhatsApp.

Da análise dos autos, verifica-se que a mensagem não foi colocada em um grupo próprio de servidores públicos e utilizado oficialmente para assuntos administrativos da municipalidade. Em realidade, o grupo “PT Pontão” possui evidente intuito político-partidário, congregando pessoas partidárias dos candidatos recorridos, com ou sem vínculo funcional com a Administração Pública.

A prova oferecida nos autos não permite concluir o contexto ou exato direcionamento da mensagem a fim de definir, sem qualquer dúvida razoável, se a mensagem foi realizada em tom de exigência e ameaça ou se envolveu uma mera mobilização da militância, na qual se destacou o grupo de servidores públicos que poderia ser afetado com a troca de gestão.

As circunstâncias e os termos da mensagem não são suficientes para que se conclua inequivocamente pela intenção de coagir, intimidar ou ameaçar, consoante bem pontuou o Magistrado a quo:

Quanto à mensagem enviada, às vésperas das eleições, não se mostra desarrazoada a alegação defensiva, no sentido de que se tratava de um estímulo aos seus apoiadores para que “lutassem pelo voto até o último minuto”, sendo deveras subjetiva a interpretação de que a expressão “depois não adianta chorar as pitangas” teria cunho de retaliação.


 

Do print anexado à petição inicial (ID 45802006), observa-se que as mensagens que se seguiram ao texto lançado pelo investigado são colocações típicas de incentivo à atuação em campanha, a exemplo de emojis de aplausos e colocações como “verdade, bora lá pessoa temos que botar a cara e participar, juntos somos fortes” e “agora hora de assumir nosso compromisso com o 13”, sem conotação de pressão ou imposição.

Além disso, não existe informação mínima sobre a quantidade de membros do grupo de conversa e, tampouco, sobre a identidade das pessoas ou sobre suas condições de servidores públicos ou não, o que impede a aferição da extensão e gravidade do fato.

Conforme registrado pela Procuradoria Regional Eleitoral, é certo que a manifestação atingiu um número reduzido e particular de pessoas não identificadas nos autos, o que não basta para comprovar que a conduta tenha afetado a igualdade de oportunidades no pleito (ID 45881133):

No entanto, convém ressaltar que a mensagem foi enviada em um grupo de Whatsapp intitulado “PT Pontão”, o que sugere que, em geral, os respectivos integrantes seriam apenas filiados ou simpatizantes do partido. Como consequência, deduz-se que o número de servidores efetivamente ameaçados limitou-se a um pequeno número, percepção reforçada quando se considera que apenas 6 (seis) pessoas reagiram ao texto enviado pelo candidato.

 

Assim, julgo que as provas constantes do presente feito, embora indiciárias, não comprovam, com a certeza que se faz necessária, a ocorrência dos ilícitos imputados na inicial.

O Tribunal Superior Eleitoral adota entendimento de que a configuração do abuso de poder político depende de prova robusta sobre a gravidade qualitativa e quantitativa da conduta, não comprovadas no presente caso.

Nesse sentido, colho o seguinte julgado:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DO PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. CONDUTA VEDADA A AGENTE PÚBLICO. CONFIGURAÇÃO. SANÇÕES PECUNIÁRIAS. INEXISTÊNCIA DE GRAVIDADE DAS CONDUTAS. ABUSO DO PODER ECONÔMICO E POLÍTICO NÃO CONFIGURADO. INCIDÊNCIA DOS VERBETES SUMULARES 24 E 30 DO TSE. NÃO PROVIMENTO.SÍNTESE DO CASO […]. 9. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, a configuração do abuso de poder demanda a existência de prova inequívoca de fatos que tenham a dimensão bastante para desigualar a disputa eleitoral, haja vista que não se admite reconhecer o abuso de poder com fundamento em meras presunções acerca do encadeamento dos fatos imputados aos investigados. Precedentes. 10. O Tribunal Superior Eleitoral exige, para a caracterização do abuso de poder, que a gravidade dos fatos seja comprovada de forma robusta e segura a partir da verificação do alto grau de reprovabilidade da conduta (aspecto qualitativo) e de sua significativa repercussão a fim de influenciar o equilíbrio da disputa eleitoral (aspecto quantitativo). Nesse sentido: AIJE 0600814-85, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE de 2.8.2023; REspEl 0600840-72, rel. Min. Floriano de Azevedo Marques, DJE de 2.2.2024; e AIJE 0601779-05, rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJE de 11.3.2021. CONCLUSÃO Agravo em recurso especial eleitoral a que se nega provimento.

Agravo em Recurso Especial Eleitoral nº060098479, Acórdão, Min. Floriano De Azevedo Marques, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 31/05/2024. (Grifei.)


 

Em suma, verifica-se que, no caso concreto, o conjunto probatório é insuficiente para o reconhecimento dos supostos abuso do poder político e assédio eleitoral a servidores, não havendo prova robusta de mácula à integridade do processo eleitoral, a legitimidade do pleito e a sinceridade da vontade popular expressa nas urnas.

Ainda em relação ao suposto assédio eleitoral, os recorrentes pretendem “a condenação dos recorridos na responsabilidade criminal, com a devida comunicação ao Ministério Público Eleitoral, para apuração dos crimes eleitorais cometidos, com base no artigo 300-B do Código Eleitoral” (ID 45802043, fl. 3).

Nos termos do art. 300 do Código Eleitoral, a conduta de “valer-se o servidor público de sua autoridade para coagir alguém a votar ou não votar em determinado candidato ou partido” é considerado crime punível com detenção de quinze dias até seis meses e pagamento de 60 a 100 dias-multa.

Vê-se que se trata de matéria criminal, de modo que a presente ação cível-eleitoral não é a via processual adequada para a apuração da suposta infração penal.

Assim, considerando-se a independência entre as instâncias cível e criminal, a comprovação plena da prática do crime de coação exigiria o aprofundamento das apurações no âmbito penal, havendo indícios suficientes para justificar a remessa dos autos ao titular da ação penal.

Logo, cumpre dar parcial provimento ao recurso, apenas para autorizar a remessa de cópia dos autos à Procuradoria Regional Eleitoral para que avalie eventual cabimento de providências na via criminal pelo Membro do Ministério Público Eleitoral com atribuição legal para o caso.

Ressalte-se que não cabe, na presente sede processual, o pronunciamento acerca da existência ou não de foro por prerrogativa de função, competindo ao Ministério Público Eleitoral e, se o caso, à autoridade judiciária competente para o processamento do caso na instância penal proceder a essa verificação e deliberação no expediente criminal adequado.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO por dar parcial provimento ao recurso interposto, exclusivamente para determinar a remessa de cópia integral dos autos à Procuradoria Regional Eleitoral para as medidas que entender cabíveis na esfera criminal, mantendo-se, no mais, a sentença que julgou improcedente a ação.