REl - 0600474-60.2024.6.21.0074 - Voto Relator(a) - Sessão: 08/05/2025 00:00 a 09/05/2025 23:59

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, MARCOS PAULO BARBOSA DA SILVA, candidato eleito ao cargo de vereador no Município de Alvorada/RS, teve desaprovadas suas contas de campanha, com base na identificação de irregularidades relacionadas à comprovação de despesas custeadas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), com esteio no parecer conclusivo do órgão técnico da origem (ID 45812320):


 

O recorrente apresentou novos documentos com a finalidade de afastar as irregularidades apontadas, tais como recibos, comprovantes bancários de pagamentos e notas fiscais (ID 45812326, fls. 6 a 22).

Sobre a juntada de novos documentos com o recurso, no âmbito dos processos de prestação de contas de campanha, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos acostados com a peça recursal, ainda que o interessado tenha sido intimado para se manifestar no curso da instrução, quando, da sua simples leitura, restar sanada a irregularidade, não havendo necessidade de nova análise técnica.

Potencializa-se, assim, o direito de defesa, especialmente quando a juntada da nova documentação mostra capacidade de influenciar positivamente no exame da contabilidade, de forma a prestigiar o julgamento pela retidão no gerenciamento dos recursos empregados no financiamento da campanha, como denota-se da ementa abaixo colacionada:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. CONHECIDOS OS DOCUMENTOS JUNTADOS AO RECURSO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. COMPROVADA ORIGEM DAS VERBAS INJETADAS NA CAMPANHA. AFASTADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas de candidato ao cargo de vereador, nas eleições de 2020, e determinou o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional.

2. Conhecidos os documentos juntados com o recurso. No âmbito dos processos de prestação de contas de campanha, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, ainda que o interessado tenha sido intimado para se manifestar, quando sua simples leitura, primo ictu oculi, pode sanar irregularidades e não há necessidade de nova análise técnica.

[…].

5. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Afastada a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS, REl n. 0600288-60.2020.6.21.004750460, Relator: Des. Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, Data de Julgamento: 01.02.2023) (Grifei.)

 

O entendimento foi recentemente reafirmado por esta Corte Regional no contexto das contas eleitorais de 2024, consoante o seguinte julgado:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÃO 2024. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. NOTA FISCAL RETIFICADA EM SEDE RECURSAL. SANADA A IRREGULARIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS MANTIDA. RECOLHIMENTO AO ERÁRIO AFASTADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1.1. Recurso interposto por candidata contra sentença que aprovou com ressalvas suas contas de campanha, relativas ao pleito eleitoral de 2024, e determinou o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, visto que apresentada nota fiscal, quitada com valores do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, não indicando as dimensões de impressos adquiridos.

1.2. A recorrente alegou impossibilidade técnica de retificar a nota fiscal no sistema da municipalidade, tendo, no entanto, juntado o documento corrigido em sede recursal.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

2.1. A controvérsia consiste em: (i) verificar a admissibilidade de juntada de nota fiscal retificada em sede recursal; (ii) avaliar os efeitos da regularização documental na prestação de contas; (iii) decidir sobre a manutenção da ressalva e da ordem de recolhimento ao Tesouro Nacional.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. Preliminar. Conhecida a nota fiscal juntada com o recurso. Jurisprudência deste Tribunal no sentido de recepcionar, ainda que em sede recursal, documento em que a simples análise possa resultar no saneamento de irregularidade remanescente.

3.2. Nota fiscal apresentada apta a sanar a irregularidade. Possibilidade de aferir que a verba pública foi efetivamente destinada ao fornecedor indicado no registro fiscal. Afastado o comando de recolhimento.

3.3. Embora o documento juntado conduza a um juízo de adequação quanto à finalidade do dinheiro público, ele aportou ao feito extemporaneamente. Assim, ainda que sanado o apontamento, adequada a manutenção da ressalva.

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Preliminar. Conhecido o documento apresentado na fase recursal.

4.2. Mérito. Recurso parcialmente provido. Afastada a determinação de recolhimento ao erário, mantida a aprovação das contas com ressalvas.

Tese de julgamento: “A apresentação de documento em sede recursal pode sanear irregularidade remanescente em prestação de contas de campanha, afastando ordem de recolhimento ao erário, sem prejuízo da manutenção da ressalva pelo atraso na correção.”

Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19, art. 60, § 8º.

Jurisprudência relevante citada: TRE-RS, RE n. 0600539-72.2020.6.21.0049, rel. Des. Caetano Cuervo Lo Pumo; TRE-RS, RE n. 0601134-53.2020.6.21.0055, rel. Des. Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle.

(TRE-RS; REl n. 0600356-21.2024.6.21.0095, Relator: Des. Eleitoral Nilton Tavares da Silva, Data de Julgamento: 28.1.2025) (Grifei.)


 

Assim, conheço os documentos juntados com as razões recursais.

Todavia, adianto que, no caso concreto, os documentos apresentados pelo recorrente sanam apenas parcialmente as irregularidades constatadas.

No que diz respeito ao fornecedor DEIVID VINICIOS MOURA PIRES, o recorrente apresentou tão somente um recibo particular e unilateral de pagamento no valor de R$ 3.000,00, no qual o serviço prestado é descrito como “referente à Prestação de serviços da divulgação da campanha do candidato a Vereador nas redes sociais como: Criação e edição de vídeos para publicação nas redes sócias no período da propaganda eleitoral de 30.8.2024 á 03.10.2024” (ID 45812326, fl. 6).

O recibo apresentado, isoladamente, revela-se insuficiente para comprovar a regularidade dos gastos realizados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). A descrição genérica dos serviços prestados, sem o detalhamento necessário, compromete a transparência e não atende às exigências legais para a comprovação das despesas.

A inexistência de documentos essenciais, como nota fiscal e contrato de prestação de serviços, torna inviável aferir a efetiva prestação do serviço e o vínculo jurídico entre as partes, configurando grave lacuna na documentação e gerando dúvidas quanto à autenticidade e à regularidade do gasto.

Assim, a falha em questão não pode ser desconsiderada.

No caso da despesa no valor de R$ 770,00 junto ao fornecedor RRECC PRODUTORA, a nota fiscal apresentada (NFS-e n. 289) contém uma descrição genérica do serviço, indicando “propaganda e publicidade, inclusive promoção de vendas, planejamento de campanhas ou sistemas de publicidade, elaboração de desenhos, textos e demais materiais publicitários” (ID 45812326, fl. 8).

Embora a emissão da nota fiscal seja um elemento essencial para a comprovação da regularidade da despesa, a falta de detalhamento específico do serviço efetivamente prestado compromete a análise da Justiça Eleitoral quanto à vinculação do gasto à campanha eleitoral e à efetiva execução da atividade contratada.

A descrição abrangente e imprecisa não permite identificar, com clareza, quais foram os materiais publicitários ou serviços efetivamente entregues, tampouco sua relação direta com a campanha do candidato. Para sanar tal fragilidade, seria imprescindível a apresentação de documentos que detalhassem a prestação dos serviços, como contratos, relatórios de entrega, exemplares dos materiais produzidos, ou qualquer outra prova que evidenciasse a execução do serviço contratado, o que não ocorre nos autos.

A ausência desses elementos reforça a insuficiência do documento apresentado para atestar, de forma inequívoca, a regularidade do gasto e sua adequação às finalidades da campanha eleitoral, especialmente quando se trata de recursos públicos oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

Portanto, a inconsistência persiste, não sendo possível sua superação.

No caso das despesas realizadas junto aos fornecedores YAN PIERRE DOS SANTOS LOPES, no montante de R$ 3.000,00, e DEIVISON WILLIAN MOURA PIRES, no montante de R$ 1.420,00, verificou-se que o prestador de contas apresentou somente recibos para justificar os gastos (ID 45812326, fls. 19 e 21).

A avaliação da documentação aponta que a descrição dos serviços indicados nos recibos, ambos relacionados a atividades de marketing e mídias sociais, não demonstra, com a clareza exigida pela legislação eleitoral, a efetiva prestação do serviço, nem especifica a quantidade, qualidade ou o impacto das atividades contratadas, elementos indispensáveis para comprovar a regularidade da despesa.

Ademais, chama a atenção o fato de que o período de contratação de ambos os fornecedores é coincidente, assim como as atividades descritas nos recibos, enquanto os valores pagos apresentam uma discrepância significativa (R$ 3.000,00 para YAN e R$ 1.420,00 para DEIVISON), sem que tenha sido apresentada qualquer justificativa razoável para tal diferença.

Esse fato, aliado à ausência de notas fiscais e contratos detalhados, compromete ainda mais a idoneidade da documentação apresentada, dificultando a aferição da efetiva utilização dos recursos em conformidade com os princípios da transparência e da moralidade na aplicação do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

Diante dessas inconsistências, a documentação apresentada não atende aos requisitos legais para a comprovação dos gastos, conforme disposto no art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, sendo insuficiente para afastar a irregularidade apontada.

Por outro lado, a despesa realizada junto à SOCIEDADE RECREATIVA UNIÃO ESPERANÇA ESPORTE CLUBE UNIÃO está devidamente comprovada.

O prestador de contas apresentou, além do recibo, o contrato de locação do salão da sede social, no qual estão devidamente especificados a finalidade da locação (instalação do comitê de campanha), o período de uso e os respectivos valores (ID 45812326, fls. 10 a 15).

A apresentação desse contrato, acompanhado de elementos que evidenciam sua efetiva execução, demonstra a adequação da despesa às finalidades eleitorais, bem como a regularidade do gasto.

Da mesma forma, encontra-se devidamente comprovada a despesa realizada junto ao fornecedor NATANAEL LOUREIRO RAUPP, referente a serviços de contabilidade, no valor de R$ 600,00. Sobre tal operação, o recorrente apresentou nota fiscal (NFS-e n. 1574), declaração firmada pelo contador e comprovante de pagamento via PIX (ID 45812326, fls. 16 a 18), satisfazendo plenamente as exigências normativas quanto à comprovação da regularidade do gasto.

Portanto, julgo sanadas as falhas envolvendo as despesas realizadas junto à SOCIEDADE RECREATIVA UNIÃO ESPERANÇA ESPORTE CLUBE UNIÃO (R$ 5.000,00) e NATANAEL LOUREIRO RAUPP (R$ 600,00), pois devidamente comprovadas por documentos idôneos.

Por outro lado, o somatório das irregularidades remanescentes atinge R$ 8.190,00 (R$ 3.000,00 + R$ 770,00 + R$ 3.000,00 + R$ 1.420,00), que representa 31,89% do total das receitas declaradas (R$ 25.682,00), inviabilizando a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para mitigar a gravidade das falhas, impondo-se a manutenção do juízo de desaprovação das contas e o dever de recolhimento do equivalente ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Este Tribunal entende que, para que haja possibilidade de mitigação de irregularidade apurada na prestação de contas, mediante aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, o conjunto das máculas deve ser inferior, nominalmente, a R$ 1.064,10 ou, proporcionalmente, situar-se abaixo de 10% do total da receita auferida, não importando o valor isolado de cada inconsistência.

Em idêntico sentido se posiciona o Tribunal Superior Eleitoral:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONVERSÃO EM AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2018. PARTIDO POLÍTICO. CONTAS DESAPROVADAS. DÍVIDA DE CAMPANHA. CRONOGRAMA DE PAGAMENTO E QUITAÇÃO. AUSÊNCIA. IRREGULARIDADE GRAVE. SÚMULA 24/TSE. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INAPLICABILIDADE. NEGATIVA DE PROVIMENTO. 

(...)

3. No caso, são inaplicáveis os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas, ao argumento de que o gasto de R$ 22.000,00 com recursos do FEFC seria de pouca monta, pois a análise da insignificância dos percentuais envolvidos deve ter em consideração o total das falhas identificadas, e não apenas uma isoladamente. 

4. Esta Corte Superior assentou que "a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade deve considerar o conjunto das irregularidades verificadas na prestação de contas, não sendo realizada a partir da análise isolada da falha" (AgR–REspe 0601342–06/RN, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJE de 22/4/2020). 

(...)

(RECURSO ESPECIAL ELEITORAL n. 060109046, Acórdão, Relator Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 216, Data 27.10.2020) (Grifei.)

 

Assim, em razão do montante e do percentual expressivo de recursos cuja aplicação não restou comprovada, é inviável a aprovação das contas, ainda que com ressalvas.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para, mantendo a desaprovação das contas de campanha de MARCOS PAULO BARBOSA DA SILVA, relativas às Eleições de 2024, reduzir para R$ 8.190,00 o montante a ser recolhido ao Tesouro Nacional.