RE - 3350 - Sessão: 25/01/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso interposto pelo DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB) de Santa Tereza (fls. 33-35) contra sentença do Juízo da 8ª Zona Eleitoral de Bento Gonçalves, que desaprovou suas contas referentes ao exercício financeiro de 2014, em virtude da falta de abertura de conta bancária e, consequentemente, dos extratos bancários, determinando a suspensão, com perda, do repasse de recursos do Fundo Partidário pelo período de 12 meses, com fundamento no art. 45, IV, “b” c/c o art. 48, § 2º, ambos da Resolução TSE n. 23.432/14 (fl. 31v.).

Em suas razões recursais, a agremiação requereu a aprovação das contas, alegando a inexistência de movimentação de receitas financeiras ou patrimoniais, assim como não ter recebido repasses do Fundo Partidário ou do diretório estadual do partido e gastos eleitorais (fls. 33-35).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pela manutenção da sentença (fls. 39-42v.).

É o relatório.

 

VOTO

O DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB) de Santa Tereza interpôs recurso contra a sentença do Juízo da 8ª Zona Eleitoral de Bento Gonçalves, que desaprovou suas contas referentes ao exercício financeiro de 2014, aplicando-lhe a penalidade de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 12 meses, com fundamento no art. 45, inc. IV, “b” c/c o art. 48, § 2º, ambos da Resolução TSE n. 23.432/14.

1. Admissibilidade

O recurso é tempestivo. A sentença foi publicada no DEJERS n. 122, de 09.7.2015 (fl. 32), quinta-feira, e o recurso protocolado em 13.7.2015 (fl. 33), segunda-feira seguinte, dentro, portanto, do tríduo legal, previsto no art. 258 do Código Eleitoral.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

2. Mérito

Dispensa de apresentação de contas, Suspensão do Repasse de Novas Quotas do Fundo Partidário e Lei n. 13.165/15.

A Lei n. 13.165, de 29 de setembro de 2015 (Reforma Política), que alterou dispositivos das Leis n. 9.504/97 (Lei das Eleições), n. 9.096/95 (Lei dos Partidos Políticos) e n. 4.737/65 (Código Eleitoral), trouxe o § 4º ao art. 32 da Lei n. 9.096/95, com o seguinte teor:

§ 4o  Os órgãos partidários municipais que não hajam movimentado recursos financeiros ou arrecadado bens estimáveis em dinheiro ficam desobrigados de prestar contas à Justiça Eleitoral, exigindo-se do responsável partidário, no prazo estipulado no caput, a apresentação de declaração da ausência de movimentação de recursos nesse período.

Igualmente trouxe nova redação ao art. 37 da mesma Lei n. 9.096/95:

Art. 37. A desaprovação das contas do partido implicará exclusivamente a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento).

Como se verifica, os órgãos partidários municipais que não tenham movimentado recursos financeiros ou arrecadado bens estimáveis em dinheiro ficaram desobrigados de apresentar contas, assim como foi excluída a sanção de suspensão de quotas do Fundo Partidário.

Surge a questão de direito intertemporal relativo à aplicação retroativa desse dispositivo aos processos em tramitação.

Consabido que o sistema de direito positivo brasileiro adotou o princípio da irretroatividade da lei, consagrando efeito prospectivo, imediato e geral, não alcançando os efeitos já consolidados sob a vigência de lei pretérita.

A irretroatividade, entretanto, não é absoluta, pois há casos em que a própria lei nova expressamente disciplina sua retroatividade.

Na hipótese em apreço, a Lei n. 13.165/15 não ressalvou quanto a eventual efeito retro-operante, sendo, portanto, aplicável apenas às prestações partidárias apresentadas após a sua vigência.

Ademais, esta Corte já examinou a matéria e sedimentou esse entendimento, em acórdão de relatoria do Des. Paulo Roberto Lessa Franz, julgado em 08.10.2015, com a seguinte ementa:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Arts. 4º, caput e 14, inc. II, “n”, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014.

A abertura de conta bancária é obrigatória, independentemente de ter havido movimentação financeira no período. Falha de natureza grave que impede a apresentação de extratos bancários correlatos, os quais são imprescindíveis para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos financeiros, bem como para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira. Irregularidade insuperável, a comprometer, modo substancial, a fiscalização exercida pela Justiça Eleitoral.

As alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15, que deram nova redação ao art. 37 da Lei n. 9.096/95, suprimindo a sanção de suspensão de novas contas do Fundo Partidário, não têm aplicação retroativa aos fatos ocorridos antes da sua vigência.

Redimensionamento, de ofício, do quantum de suspensão das cotas, em homenagem aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Provimento negado.

(RE n. 31-80.2015.6.21.0008.) (Grifei.)

Superado esse ponto, faço breve referência ao art. 67, caput, da Resolução TSE n. 23.432/14, que determinou serem inaplicáveis as disposições desse diploma legal ao mérito das prestações de contas relativas aos exercícios anteriores ao de 2015, em consonância com os princípios da segurança jurídica e da estabilidade das relações processuais. Como as contas objeto dos autos se referem ao exercício financeiro de 2014, aplicável, portanto, a Resolução TSE n. 21.841/04.

Passo à análise de mérito.

A prestação de contas do Diretório Municipal do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) de Santa Tereza, relativa ao exercício de 2014, foi desaprovada devido à falta de abertura e de apresentação dos extratos consolidados e definitivos da conta bancária destinada ao registro da sua movimentação financeira, tendo sido sancionado com a suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 12 meses.

Em suas razões recursais, a agremiação alegou que a ausência de conta bancária não causou prejuízo à contabilidade, porque não houve movimentação financeira ou patrimonial no período, bem como que, em se tratando de município pequeno, com menos de dois mil habitantes, a campanha eleitoral é realizada pessoalmente, não havendo gastos com publicidade.

Todavia, as razões do partido não merecem acolhida.

O art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04 determina a abertura de contas bancárias distintas para o movimento dos recursos financeiros provenientes do Fundo Partidário e os de outra natureza. Além disso, segundo o art. 13, parágrafo único, da mesma resolução, a falta de recebimento de recursos em espécie não justifica a entrega de prestação de contas sem movimento, devendo ser registrados os bens e direitos estimáveis em dinheiro recebidos em doação, empregados na manutenção e funcionamento do partido. Eis a redação dos dispositivos citados:

Art. 4º O partido político pode receber cotas do Fundo Partidário, doações e contribuições de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro de pessoas físicas e jurídicas, devendo manter contas bancárias distintas para movimentar os recursos financeiros do Fundo Partidário e os de outra natureza (Lei n. 9.096/95, art. 39, caput).

 

Art. 13. […]

Parágrafo único. O não-recebimento de recursos financeiros em espécie por si só não justifica a apresentação de prestação de contas sem movimento, devendo o partido registrar todos os bens e serviços estimáveis em dinheiro recebidos em doação, utilizados em sua manutenção e funcionamento.

Ressalto não ser desconhecida desta Corte a realidade de diretórios municipais e comissões provisórias em municípios do interior, cujo funcionamento se dá, não raras vezes, na residência dos seus dirigentes, com pouca ou nenhuma movimentação financeira.

Contudo, a abertura de conta bancária e a apresentação dos extratos correspondentes, determinada no art. 14, inc. II, al. "n", da Resolução TSE n. 21.841/04, são imprescindíveis tanto para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos financeiros quanto para comprovar a alegada ausência de movimentação desses recursos à Justiça Eleitoral.

As peculiaridades locais não desobrigam os órgãos partidários do atendimento aos deveres legais. O cumprimento da lei e respectivos ônus são inerentes às suas atividades, não cabendo ao julgador fazer análise subjetiva quanto à realidade de cada órgão partidário para afastar as exigências legais.

Assim, as irregularidades são graves e comprometeram, de forma substancial, a confiabilidade e transparência das contas, ensejando a sua desaprovação com base no art. 24, III, “a”, “b” e “c”, da Resolução TSE n. 21.841/04, entendimento que está consolidado na jurisprudência deste Tribunal, como demonstra a ementa do seguinte julgado:

Prestação de contas anual de partido político. Art. 14 da Resolução 21.841/04. Exercício de 2011. Parecer da unidade técnica pela desaprovação.

Ausência de documentos essenciais à análise da regularidade da movimentação contábil e a falta de abertura de conta bancária inviabilizam a aferição da real movimentação financeira da agremiação. Caracterizadas falhas insuperáveis.

Suspensão das cotas do Fundo Partidário.

Desaprovação.

(TRE-RS, PC n. 8490, Relator Dr. Leonardo Tricot Saldanha, Data de Julgamento: 22.5.2014, Publicação em 26.5.2014 Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS n. 91 Pág. 5. Acórdão de 22.5.2014.) (Grifei.)

Em consequência da rejeição das contas, o juiz eleitoral de primeira instância determinou a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário pelo período de 12 meses, com base no disposto no art. 48, da Res. TSE n. 23.432/14.

Embora não constitua objeto de inconformidade expressa no recurso, a sanção merece ser apreciada de ofício para melhor se adequar às particularidades do caso concreto e, com isso, atender aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade que devem balizar a sua dosimetria.

Nesse sentido, entendo que a natureza e a gravidade das falhas, o nível de organização e estrutura do órgão partidário e a dimensão do município em que instalado autorizam, na hipótese dos autos, o redimensionamento da penalidade para 1 mês de suspensão.

Desse modo, a sentença merece reforma apenas no ponto em que cominou ao partido a pena de suspensão das quotas do Fundo Partidário pelo período de 12 meses, reduzindo-se esse prazo para 1 mês de suspensão.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a desaprovação das contas do PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB) de Santa Tereza, e, de ofício, pela redução do período de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para 1 mês, com fundamento no art. 24, III, “a”, “b” e “c”, da Resolução TSE n. 21.841/04 e art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95 (redação da Lei n. 12.034/09).

 

Dr. Leonardo Tricot Saldanha:

Senhor Presidente, eu gostaria de louvar o voto do Dr. Aurvalle, que vai em muito bom caminho. Gostaria apenas de fazer uma declaração de voto, o motivo principal é a situação específica do Município de Santa Teresa. Trata-se de um município pequeno, de um partido pequeno, além de todos os demais argumentos levantados pelo relator para chegar à conclusão proferida.

Ressalto, no entanto, que a não abertura de conta-corrente é muito grave. Se fosse em um município ou partido maior, entendo que nós poderíamos estabelecer os 12 meses de suspensão, exatamente pela gravidade, como foi referido pelo Ministério Público. Neste caso concreto, estou absolutamente de acordo com a conclusão a que o eminente relator chegou.