PC - 9517 - Sessão: 11/07/2017 às 17:00

RELATÓRIO

O DIRETÓRIO ESTADUAL DO SOLIDARIEDADE (SD) apresentou sua prestação de contas referente ao exercício financeiro de 2014.

A Secretaria de Controle Interno e Auditoria realizou exame preliminar, notificando-se o partido para a apresentação de documentação complementar.

Foi determinada pelo relator, ainda, a exclusão dos responsáveis, por se tratar de contas referentes ao exercício  de 2014, decisão agravada ao Pleno pelo órgão ministerial, o qual manteve a decisão monocrática.

O órgão técnico realizou exame da prestação de contas (fls. 405-410), e foi determinada a notificação da agremiação para diligências (fl. 416).

Após manifestação do partido, foi emitido parecer conclusivo pela desaprovação das contas (fls. 450-454), citando-se, em seguida, a agremiação (fl. 489), a qual apresentou defesa.

Autos novamente remetidos à Secretaria de Controle Interno para análise dos documentos (fls. 531-532).

Apresentadas alegações finais, os autos foram em vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pela desaprovação das contas (fl. 550).

Por fim, em razão da mudança de entendimento desta Corte a respeito da citação dos dirigentes partidários, presidente e tesoureiro foram citados e apresentaram defesa (fls. 562-565).

É o relatório.

 

VOTO

Adequação do rito

Preliminarmente, quando os autos estavam conclusos para julgamento, esta Corte promoveu a alteração de entendimento a respeito da necessária inclusão dos responsáveis partidários na prestação de contas relativa ao exercício de 2014.

Em razão dessa nova orientação, embora o feito tenha transcorrido com a presença apenas da agremiação partidária, determinei a citação dos dirigentes partidários, reabrindo para eles o prazo de defesa e a possibilidade de realização de instrução.

Citados, os responsáveis apresentaram defesa alegando, basicamente, as mesmas razões tecidas pela agremiação, sem apresentar novos documentos capazes de alterar a situação fática apurada pelo órgão técnico desta Corte, quando da emissão do parecer conclusivo.

Assim, como as defesas não trouxeram novos elementos, é desnecessário novo prazo de alegações finais, de forma que o feito encontra-se apto para julgamento, após garantido o devido exercício de defesa pelos responsáveis partidários.

 

MÉRITO

No mérito, a Secretaria de Controle Interno e Auditoria, ao emitir parecer conclusivo pela desaprovação das contas, constatou as seguintes irregularidades, que passo a examinar.

a) Depósito de outros recursos na conta destinada ao Fundo Partidário

O órgão técnico identificou, na conta específica para movimentação de recursos do Fundo Partidário, depósitos no total de R$ 15.127,00 oriundos de outros recursos (fl. 451).

A agremiação defendeu-se, informando que, efetivamente, houve um equívoco no depósito de R$ 15.000,00, proveniente de doação de pessoa jurídica para o partido. Justificou, ainda, ter realizado um depósito de R$ 71,00 para cobrir tarifas bancárias com TED originárias daquela conta, e explicou que R$ 56,00 decorrem de um equívoco do Diretório Nacional, que, ao transferir recursos do Fundo Partidário, não informou que este montante referia-se à taxa bancária cobrada pela operação.

Embora seja de fundamental importância o respeito à separação dos recursos do Fundo Partidário dos valores oriundos de outras fontes, para viabilizar o efetivo controle da destinação dos gastos públicos, no caso, o depósito equivocado não causou prejuízo substancial ao controle das contas.

O destino dos valores equivalentes ao efetivamente recebido do Fundo Partidário (R$ 29.926,00) pode ser identificado quase em sua integralidade, e a falha foi justificada pela agremiação. Ademais, inexistem notícias a respeito de eventual reiteração da conduta capaz de evidenciar desídia do prestador quanto ao controle das contas do Fundo Partidário.

Cumpre destacar, entretanto, a recomendação tecida pelo órgão técnico, para que a “agremiação adote controle rígido com o intuito de não misturar recursos do Fundo Partidário com Outros Recursos” (fl. 452).

 

b) Recursos de fonte vedada

No parecer conclusivo, a Secretaria de Controle Interno identificou o recebimento de uma doação na importância de R$ 1.500,00, originária de fonte vedada, pois feita por ocupante do cargo de supervisor de gabinete parlamentar da Câmara de Vereadores de Porto Alegre (cargo de chefia em órgão público).

Com efeito, o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 veda o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas, como se verifica por seu expresso teor:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38

No conceito de autoridade pública prevista no artigo referido, inserem-se os detentores de cargos em comissão que desempenham função de chefia e direção, conforme assentou o egrégio Tribunal Superior Eleitoral, com a Resolução n. 22.585/07, editada em razão da resposta à Consulta 1428, cuja ementa segue:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(CONSULTA nº 1428, Resolução n. 22585 de 06.9.2007, Relator Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado Min. ANTONIO CESAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172)

(Grifei.)

Reproduzo trechos extraídos do referido acórdão que bem explicitam a decisão:

[…] podemos concluir que os detentores de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta da União, e por via reflexa os dos Estados e dos Municípios, são considerados autoridade pública, ante a natureza jurídica dos cargos em comissão, bem como das atividades dele decorrentes.

O recebimento de contribuições de servidores exoneráveis ad nutum pelos partidos políticos poderia resultar na partidarização da administração pública. Importaria no incremento considerável de nomeação de filiados a determinada agremiação partidária para ocuparem esses cargos, tornando-os uma força econômica considerável direcionada aos cofres desse partido.

Esse recebimento poderia quebrar o equilíbrio entre as agremiações partidárias. Contraria o princípio da impessoalidade, ao favorecer o indicado de determinado partido, interferindo no modo de atuar da administração pública. Fere o princípio da eficiência, ao não privilegiar a mão-de-obra vocacionada para as atividades públicas, em detrimento dos indicados políticos, desprestigiando o servidor público. Afronta o princípio da igualdade, pela prevalência do critério político sobre os parâmetros da capacitação profissional.

[…]

Estamos dando interpretação dilatada. Estamos dizendo que autoridade não é somente quem chefia órgão público, quem dirige entidade, o hierarca maior de um órgão ou entidade. Estamos indo além: a autoridade é também o ocupante de cargo em comissão que desempenha função de chefia e direção.

[…]

Está claro. A autoridade não pode contribuir. Que é a autoridade? É evidente que o hierarca maior de um órgão ou entidade já não pode contribuir, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, e, além disso, os ocupantes de cargo em comissão.

[…]

As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenham função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.

[…]

O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção.

A vedação, decorrente do entendimento firmado pela Corte Superior na aludida consulta, vem sendo confirmada pelos tribunais, como se verifica pelas seguintes ementas:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Doação de fonte vedada. Art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2013.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridade, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia.

Redução, de ofício, do período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário, conforme os parâmetros da razoabilidade. Manutenção da sanção de recolhimento de quantia idêntica ao valor recebido irregularmente ao Fundo Partidário.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 2346, Acórdão de 12.3.2015, Relator DR. INGO WOLFGANG SARLET, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 45, Data 16.3.2015, Página 02.)

 

Recurso. Prestação de contas de partido político. Doação de fonte vedada. Exercício financeiro de 2008.

Doações de autoridades titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, prática vedada pela Resolução TSE n. 22.585/07 e pelo inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95.

Desaprovação das contas pelo julgador originário.

Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Razoável e proporcional a aplicação, de ofício, de 6 meses de suspensão das quotas do Fundo Partidário, a fim de colmatar lacuna da sentença do julgador monocrático.

Provimento negado.

(TRE-RS, RE 100000525, Relatora Desa. Federal Elaine Harzheim Macedo, 25.4.2013)

Assim, verificando-se doação proveniente de detentor de cargo em comissão que desempenha função de chefia ou direção, tais verbas são consideradas fonte vedada, por força do art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95.

A agremiação, em sua defesa, afirma que a doação foi realizada de forma espontânea pelo doador, sem o conhecimento do partido.

O argumento, entretanto, não afasta a irregularidade da arrecadação. É dever da agremiação gerir seus recursos, atenta à licitude de sua origem, não lhe sendo permitido utilizar todos os recursos que aportarem à sua conta bancária sem indagar sua origem, pois isso desvirtuaria o próprio sentido do controle de sua movimentação financeira.

Caso efetivamente não tivesse prévio conhecimento da doação, deveria ter se informado de sua origem e, imediatamente, recolhido o montante equivalente, em vez de empregá-lo em seus gastos ordinários.

A quantia arrecadada de fonte vedada, no total de R$ 1.500,00, deverá ser recolhida ao Tesouro Nacional, na forma do art. 14, § 1º, da Resolução 23.464/15, tendo presente que a destinação do valor irregular é norma de natureza processual, e tem aplicação imediata, conforme restou definido no julgamento da PC 72-42:

Prestação de contas anual. Partido político. Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2012.

Verificada a existência de recursos de origem não identificada, bem como de arrecadações oriundas de fontes vedadas, realizadas por titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta, na condição de autoridades e desempenhando funções de direção ou chefia. No caso, Chefe de Gabinete, Coordenador-Geral e Diretor.

Nova orientação do TSE no sentido de que tais verbas - de origem não identificada e de fontes vedadas - devem ser recolhidas ao Tesouro Nacional, nos termos do disposto na Resolução TSE n. 23.464/15.

Aplicação dos parâmetros da razoabilidade para fixar a sanção do prazo de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário em um mês.

Desaprovação.

(TRE-RS - PC 72-42, Rel. Dra. MARIA DE LOURDES GALVAO BRACCINI DE GONZALEZ. Sessão de 04.5.2016)

 

c) Ausência de comprovação de despesas com o Fundo Partidário

O órgão técnico identificou que dois gastos realizados com montantes do Fundo Partidário, no total de R$ 328,18, foram justificados com a apresentação de boletos bancários que sequer estavam no nome da agremiação (fl. 453), contrariando assim o art. 9º da Resolução TSE 21.841/04, o qual estabelece que as despesas devem ser comprovadas com documentos fiscais ou recibos, contendo nome, endereço, CPF ou CNPJ do emitente, natureza do serviço prestado, data de emissão e valor.

Em defesa, a agremiação alegou que a despesa destinou-se a pagar débito pessoal do contador com terceira pessoa, como forma de pagamento indireto de seus honorários, juntando recibos de seus serviços para suprir a irregularidade.

Todavia, a argumentação e os documentos não suprem de forma segura a irregularidade verificada, pois, como apontou o órgão técnico, “os recibos acostados às fls. 476 e 477 possuem data de emissão de 17.11.2016, sendo que o apontamento refere-se ao exercício de 2014” (fl. 531v).

Assim, permanece a irregularidade na importância de R$ 328,18, que deverá ser recolhida ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 34 da Resolução TSE 21.841/04, repetido no art. 59, § 2º, da Resolução 23.464/15.

Os valores que configuram irregularidades prejudiciais às contas (R$ 1.500,00 e R$ 328,18) correspondem a 4,66% do total arrecadado. Ainda que este percentual represente um pequeno montante da quantia movimentada, parte da irregularidade refere-se à arrecadação de recursos de fontes vedadas pela legislação eleitoral, justificando a desaprovação das contas, conforme tem se posicionado esta Corte:

Prestação de contas anual. Partido Político. Diretório Estadual. Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro 2013.

Manutenção apenas do partido como parte no processo. A aplicabilidade imediata das disposições processuais da Resolução TSE n. 23.432/14 não alcança a responsabilização dos dirigentes partidários, por se tratar de matéria afeta a direito material.

Recebimento de recursos de fonte vedada. Doações realizadas por titulares de cargos em comissão que desempenham função de direção ou chefia, tais como: chefe de seção, chefe de gabinete, chefe de divisão, diretor de planejamento, coordenador-geral de bancada, chefe de gabinete de líder, diretor-geral, diretor de departamento, diretor de estabelecimento. Transferência dos valores impugnados ao Fundo Partidário.

Irregularidades que ensejam juízo de reprovação, com a consequente penalidade de suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo período de um mês.

Desaprovação. (TRE-RS, PC 61-76, Rel. Dra. Maria de Lourdes Braccini de Gonzales, julgado em 28.4.2016)

No entanto, embora as irregularidades apuradas justifiquem a desaprovação das contas, a penalidade da suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário deve ser aplicada, de forma proporcional à gravidade das falhas apuradas, pelo prazo de 01 a 12 meses.

Por oportuno, ressalta-se que este Colegiado firmou entendimento pela não aplicação da Lei n. 13.165/15, que instituiu a Reforma Eleitoral, aos processos em tramitação antes da sua vigência, admitindo a incidência do referido dispositivo legal com seu texto original às contas relativas a exercícios financeiros anteriores a 2015.

Na hipótese em tela, o período de suspensão deve ser fixado pelo prazo de 01 mês, considerando o reduzido percentual irregular.

 

d) Responsabilidade dos dirigentes partidários

Como bem ilustrou o Desembargador Carlos Cini Marchionatti, no voto proferido no RE 35-87, acima referido, apesar da inclusão dos responsáveis partidários no feito, “a possibilidade de responsabilização dos dirigentes continua sendo regida pelas regras específicas da Lei n. 9.096/95 e da Resolução n. 21.841/04”, as quais estabelecem a sua responsabilidade subsidiária.

Nos termos da Resolução 21.841/04, os dirigentes serão responsabilizados quando houver omissão no dever de prestar contas ou irregularidade na aplicação de verbas do fundo partidário, caso a agremiação não promova a recomposição do erário, conforme se extrai do art. 34 do aludido diploma:

Art. 34. Diante da omissão no dever de prestar contas ou de irregularidade na aplicação dos recursos do Fundo Partidário, o juiz eleitoral ou o presidente do Tribunal Eleitoral, conforme o caso, por meio de notificação, assinará prazo improrrogável de 60 dias, a contar do trânsito em julgado da decisão que considerou as contas desaprovadas ou não prestadas, para que o partido providencie o recolhimento integral ao erário dos valores referentes ao Fundo Partidário dos quais não tenha prestado contas ou do montante cuja aplicação tenha sido julgada irregular.

§ 1º À falta do recolhimento de que trata o caput, os dirigentes partidários responsáveis pelas contas em exame são notificados para, em igual prazo, proceder ao recolhimento.

Na hipótese, o parecer técnico verificou que o montante de R$ 328,18, oriundo do Fundo Partidário, não teve a sua aplicação devidamente atestada.

Dessa forma, eventual responsabilização dos dirigentes partidários à época do exercício financeiro em julgamento fica restrita à irregularidade acima apontada, caso a agremiação se omita em recompor o erário, nos termos da norma acima transcrita.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela desaprovação das contas, determinando a suspensão de repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 01 mês, e o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 1.828,18 (relativos a soma de R$ 1.500,00 e de R$ 328,18).