PC - 223036 - Sessão: 17/02/2016 às 17:00

RELATÓRIO

CELSO KRAMER, candidato ao cargo de Deputado Estadual, apresentou prestação de contas relativa à arrecadação e ao dispêndio de recursos utilizados nas eleições gerais de 2014.

Após análise técnica das peças, a Secretaria de Controle Interno e Auditoria (SCI) emitiu Relatório Preliminar manifestando-se pela necessidade de diligências (fls. 53-55).

Intimado por meio de seu procurador constituído (procuração à fl. 33), o candidato prestou esclarecimentos e juntou documentos (fls. 62-145).

Sobreveio parecer técnico conclusivo pela desaprovação das contas e a transferência de R$ 31.500,00 ao Tesouro Nacional, pois verificada a permanência de falhas, inclusive a inconsistência na identificação dos doadores originários (fls. 147-149).

Novamente intimado, o candidato requereu, em preliminar, a aplicação do princípio da anterioridade da lei eleitoral e a consequente extinção do feito. No mérito, requereu o cruzamento dos dados de sua contabilidade com os contidos na prestação de contas de 2013 da agremiação. Ao final, postulou a aprovação das contas (fls. 155-158).

Após nova análise, a SCI manteve o entendimento pela desaprovação das contas com a consequente transferência de valores ao Tesouro Nacional (fls. 161-168).

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pela desaprovação das contas e repasse de recursos de origem não identificada ao Tesouro Nacional (fls. 171-175v.).

Incluído em pauta para julgamento, sobreveio petição do interessado, que constituiu novo procurador, requerendo tempo para apresentação de defesa compatível com a gravidade da sanção sugerida (fl. 179).

Deferido o pedido (fl. 183), o prestador invocou o caráter administrativo da prestação de contas, postulou a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade ao argumento de que o valor das irregularidades apontadas atinge o percentual de 7,32%. Consignou que a Lei n. 13.165/15 trouxe alterações normativas que dispensam a individualização dos doadores originários, e juntou documentos (fls. 200-213).

Em análise da segunda manifestação, o órgão técnico opinou por manter desaprovadas as contas (fls. 217-219). A Procuradoria Regional Eleitoral, por sua vez, ratificou o parecer anterior, igualmente pela desaprovação (fls. 226-229v.).

É o relatório.

 

VOTO

 

1. Preliminar – Princípio da anterioridade da lei eleitoral

O candidato suscita, em preliminar, a extinção do feito sem julgamento do mérito, com o argumento de que a resolução TSE n 23.406/14 foi publicada em fevereiro de 2014, ou seja, menos de 01 (um) ano antes das eleições, e a sua aplicação no pleito de 2014 vai na contramão do princípio da anterioridade da lei eleitoral e do preceito de segurança jurídica inserido na Constituição Federal.

A tese defensiva não encontra respaldo legal. Isso porque a obrigatoriedade de declaração do doador originário nas contas de campanha não é exigência inédita e já foi analisada por este Regional quando do julgamento das prestações de contas relativas ao pleito de 2010, diante das regras contidas na Resolução TSE n. 23.217/10, que estabeleciam o dever de identificar a fonte doadora, à luz do art. 14, §§ 1º, I, e 3º, da Resolução TSE n. 23.217/10, in verbis:

Art. 14. Os recursos destinados às campanhas eleitorais, respeitados os limites previstos nesta resolução, são os seguintes:

[…]

§ 1º Em ano eleitoral, os partidos políticos poderão aplicar ou distribuir pelas diversas eleições os recursos financeiros recebidos de pessoas físicas e jurídicas, devendo, obrigatoriamente:

I – discriminar a origem e a destinação dos recursos repassados a candidatos e a comitês financeiros;

[…]

§ 3º Os partidos deverão manter conta bancária e contábil específicas, de forma a permitir o controle da origem e destinação dos recursos pela Justiça Eleitoral (Lei n. 9.096, arts. 33, 34 e 39, § 5º).

Logo, não se trata de regra inovadora que possa gerar insegurança jurídica ou causar lesão ao princípio da anterioridade, tratando-se de mera reprodução de regulamento anterior.

A propósito, referida questão já foi objeto de apreciação por esta Casa, em vários julgados, restando afastada aludida preliminar.

 

Prefacial rejeitada.

 

2. Mérito

O órgão técnico deste Regional apontou inconsistência na identificação dos doadores originários de recursos repassados pelo partido ao candidato.

Eis o relatório da análise final (fls. 217-219):

1) Quanto aos itens “a”, “b” e “d” do Relatório de Análise da Manifestação que apontaram divergências entre as informações prestadas nesta prestação de contas, as informações constantes na prestação de contas de doadores e os documentos entregues, não houve o saneamento permanecendo os erros de preenchimento já referidos que impedem o atesto da confiabilidade e fidedignidade das mesmas.

2) Quanto ao item “c” que trata da inconsistência na identificação das doações originárias dos recursos arrecadados pelo candidato que permaneceu apontada no Relatório de Análise da Manifestação (fls. 161/168) verifica-se que o prestador anexou relatórios do Partido Trabalhista Brasileiro – PTB, o qual relaciona os doadores originários para esses valores (fls. 212/213).

Observa-se que a prestação de contas não foi retificada para constar a informação dos doadores originários informados pela agremiação, tampouco foram apresentados novos recibos eleitorais com as informações abaixo:

Nome: Edir Pedro Domeneghini

CPF: 206.269.380-72

Valor: 901,00

Nome: Eduardo Martins Medeiros

CPF: 345.068.969-04

Valor: 6.099,00

Nome: Randon S/A Imp. e Participações

CPF: 89.086.144/0001-16

Valor: 24.500,00

Total: 31.500,00

[...]

Das falhas apontadas, a falta de identificação dos doadores originários é a mais grave e que, por si só, tem o condão de macular a contabilidade em análise e acarretar a reprovação das contas.

Na espécie, o Diretório Estadual do PTB repassou ao Comitê Financeiro Único de campanha a quantia de R$ 31.500,00, recebida pela agremiação mediante doações de pessoas físicas e/ou jurídicas ao partido. O comitê repassou esses valores ao candidato e, nos recibos eleitorais, tanto do comitê de campanha quanto do candidato, não aparecem os nomes dos doadores originários. Essa informação foi omitida pelo comitê e pelo candidato, situação verificada em diversas prestações de contas daqueles que concorreram pelo PTB. No lugar dos reais doadores, aponta-se incorretamente, como doador originário, a direção estadual do PTB.

Intimado da existência da irregularidade, o interessado alega que tal questão já foi amplamente debatida pelo Partido, que resultou no pleno atendimento da exigência pertinente, ocorrido no processo n. 1395-48, do Comitê Financeiro Único do PTB, em que as devidas informações a respeito dos doadores originários de todos os candidatos do PTB foram prestadas, através de Tabelas, identificando, candidato por candidato, os doadores originários das verbas que lhes foram repassadas pelo partido.

A tese delineada não encontra amparo legal. Isso porque não basta a apresentação de simples “Tabelas”. É necessário que se façam os lançamentos devidos no SPCE, bem como a emissão individualizada dos recibos eleitorais, contendo a anuência dos doadores originários, o que ainda não foi providenciado.

Portanto, permanece a ausência do doador originário na prestação de contas em exame e na do citado Comitê referentes às seguintes doações:

Prestador de Contas: 20.558.162/0001-57-14-RS Comitê Financeiro Único

Data: 30/07/14

Valor (R$): 7.000,00

CPF/CNPJ Doador originário: 89.455091/0001-63

Nome do Doador Originário: Direção Estadual/Distrital

Recibo Eleitoral: 142340700000RS000001

 

Prestador de Contas: 20.558.162/0001-57-14-RS Comitê Financeiro Único

Data: 08/09/14

Valor (R$): 24.500,00

CPF/CNPJ Doador originário: 89.455091/0001-63

Nome do Doador Originário: Direção Estadual/Distrital

Recibo Eleitoral: 142340700000RS000015

Quando o prestador não identifica a real origem do recurso, acaba por inviabilizar a fiscalização quanto à legitimidade da fonte doadora, não sendo possível reconhecer as fontes vedadas de arrecadação, tampouco se foi, ou não, ultrapassado o limite legal de doação.

Ademais, a ausência de informações fidedignas prejudica a transparência das informações repassadas à própria sociedade, conforme arts. 43 e 74 da Resolução TSE n. 23.406/14.

A irregularidade em tela alcança o montante de R$ 31.500,00 e representa 7,34% do total de recursos arrecadados pelo prestador (R$ 429.081,00), devendo tal quantia ser transferida ao Tesouro Nacional, consoante art. 29 da Resolução TSE n. 23.406/14.

A ilustrar, a jurisprudência desta Casa e de outros Regionais, com grifos meus:

Prestação de contas. Candidato. Resolução TSE n. 23.406/14. Eleições 2014.

Não apresentação dos recibos eleitorais e omissão no registro de despesas com prestação de serviços contábeis e advocatícios. Realização de despesas antes da solicitação de registro de candidatura e/ou concessão do CNPJ de campanha e realização de despesas após as eleições.

Arrecadação de recursos de origem não identificada. Recurso recebido mediante doação realizada pelo partido e por outro candidato. Previsão normativa determinando que o prestador identifique o CPF ou CNPJ do doador originário dos repasses realizados por partidos, comitês, ou por outros candidatos (Arts. 26, § 3º e 29, ambos da Resolução TSE n. 23.406/14). A ausência de discriminação do doador originário impossibilita a fiscalização das reais fontes de financiamento da campanha eleitoral, devendo o recurso de origem não identificada ser transferido ao Tesouro Nacional.

Falhas que, analisadas em conjunto, comprometem a regularidade das contas, ensejando sua rejeição.

Desaprovação.

(Prestação de Contas n. 158341 - Porto Alegre/RS. Acórdão de 20.5.2015. Relatora DRA. GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA.)

 

Prestação de contas. Candidato. Arts. 19, parágrafo único, e 29, ambos da Resolução TSE n. 23.406/14. Eleições 2014.

Utilização de recursos próprios do candidato acima do limite imposto pela norma de regência. Arrecadação de recursos de origem não identificada.

Entendimento deste Tribunal no sentido da obrigatoriedade da identificação dos doadores originários nas prestações de contas, mesmo que o recurso seja proveniente de contribuição de filiado, já que a verba, quando repassada pelo partido político às campanhas eleitorais, assume a condição de doação. Ausente a discriminação dos doadores originários, deve o recurso de origem não identificada ser transferido ao Tesouro Nacional.

Desaprovam-se as contas pois identificadas falhas insanáveis que comprometem a auditoria contábil pela Justiça Eleitoral.

Desaprovação.

(Prestação de Contas n. 183289 - Porto Alegre/RS, Acórdão de 5.12.2014, Relatora DESA. FEDERAL MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2014. AUSÊNCIA DE IDENTIFICAÇÃO DO DOADOR ORIGINÁRIO. IRREGULARIDADE. DESAPROVAÇÃO DE CONTAS.

1. Caso em que a irregularidade detectada se afigura com gravidade suficiente para atrair a desaprovação das contas apresentadas pelo candidato, como demonstra a jurisprudência pacífica.

2. Prestação de contas desaprovada.

(Prestação de Contas n. 170804 – Belém/PA, Acórdão n. 27201 de 24.3.2015, Relator ALTEMAR DA SILVA PAES.)

Não obstante a Lei n. 13.165/15 ter introduzido norma que dispensa a identificação do doador originário, este Tribunal, na sessão do dia 20.10.2015, em processo da relatoria do Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, firmou entendimento no sentido de sua irretroatividade para alcançar situações pretéritas.

Por oportuno, trago o inteiro teor da ementa:

Prestação de contas de candidato. Arrecadação e dispêndio de recursos de campanha. Resolução TSE n. 23.406/14. Eleições 2014. Arrecadação de recursos sem a emissão de recibo eleitoral; despesas com combustível sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos ou publicidade com carro de som; divergências e inconsistências entre os dados dos fornecedores lançados na prestação de contas e as informações constantes na base de dados da Receita Federal; pagamentos em espécie sem a constituição do Fundo de Caixa; pagamento de despesa sem que o valor tivesse transitado na conta de campanha; inconsistência na identificação de doador originário. Conjunto de falhas que comprometem a transparência e a regularidade da contabilidade apresentada.

Entendimento deste Tribunal, no sentido da não retroatividade das novas regras estabelecidas pela Lei n. 13.165/15, permanecendo hígida a eficácia dos dispositivos da Resolução TSE n. 23.406/14.

A ausência de discriminação do doador originário impossibilita a fiscalização das reais fontes de financiamento da campanha eleitoral, devendo o recurso de origem não identificada ser transferido ao Tesouro Nacional. Desaprovação.

(PC n. 2066-71.2014.6.21.0000.)

As demais irregularidades, quando analisadas em conjunto, igualmente comprometem a transparência dos demonstrativos contábeis, haja vista que erros de preenchimento acarretam divergências de valores que impedem o atesto da confiabilidade das contas.

Registro, por fim, que o objetivo da prestação de contas é identificar todos os recursos arrecadados e mapear a integralidade das movimentações financeiras realizadas, oferecendo maior transparência à campanha eleitoral, o que restou prejudicado na espécie em razão do conjunto de falhas que não restaram sanadas.

DIANTE DO EXPOSTO, e na linha do parecer ministerial, VOTO por afastar a prefacial e julgar desaprovadas as contas de CELSO KRAMER, relativas às eleições gerais de 2014, determinando ao candidato o recolhimento de R$ 31.500,00 (trinta e um mil e quinhentos reais) ao Tesouro Nacional, no prazo de até 5 dias após o trânsito em julgado das suas contas, na forma do art. 54, inc. III, combinado com o art. 29, ambos da Resolução TSE n. 23.406/14.

Anote-se esta determinação de modo que o valor seja transferido ao Tesouro Nacional uma única vez, evitando-se a repetição da ordem de recolhimento da mesma quantia, por fato idêntico, em outros autos.