PC - 220790 - Sessão: 04/11/2015 às 17:00

    RELATÓRIO

Trata-se da prestação de contas apresentada por ANA INES AFFONSO, em razão da sua candidatura ao cargo de deputado estadual pelo Partido dos Trabalhadores -  PT, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2014.

Após análise, a Secretaria de Controle Interno e Auditoria - SCI deste Tribunal emitiu relatório preliminar, opinando pela concessão  do prazo de 72h para a prestadora sanar as irregularidades verificadas, nos termos do art. 49 da Resolução TSE n. 23.406/14 (fls. 65-69).

Em resposta às diligências, a candidata apresentou petição e novos documentos (fls. 76-173), os quais foram submetidos ao exame do órgão técnico, que emitiu parecer conclusivo pela desaprovação das contas (fls. 175-182.)

Notificada, em conformidade com o art. 51 da Resolução TSE n. 23.406/14 (fl. 185), a prestadora manifestou-se nas fls. 187-188 e juntou outros documentos (fls. 189-206), apresentando justificativas e requerendo a aprovação das contas.

A equipe técnica desta Corte reiterou o seu entendimento pela desaprovação da contabilidade (fls. 207-214).

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral exarou parecer pela desaprovação das contas (fls. 217-223).

É o relatório.

 

VOTO

A candidata Ana Ines Affonso apresentou prestação de contas relativa à arrecadação e ao dispêndio de valores durante a campanha ao pleito de 2014.

A Secretaria de Controle Interno e Auditoria emitiu relatório final pela desaprovação da contabilidade (fls. 207-214), devido às seguintes falhas:

1) ausência de registro de despesa, ou doação, relativa à prestação de serviços advocatícios e contábeis para a candidata (art. 31, VII, da Resolução TSE n. 23.406/14);

2) dívida de campanha na prestação de contas, no total de R$ 76.795,73, não assumida pelo respectivo partido;

3) existência de despesas que, além de não terem sido lançadas individualmente no Sistema de Prestação de Contas Eleitorais, foram pagas em espécie, sem constituição de Fundo de Caixa, num montante de R$ 18.250,00, tendo a candidata ultrapassado em R$ 11.792,13 o limite de 2% dos gastos estabelecidos no art. 31, § 6º, da Resolução TSE n. 23.406/14;

4) ausência de esclarecimentos sobre apontamento referente ao valor total recebido de doador originário que se mostra incompatível com o valor total transferido para outro prestador de contas;

5) ausência de esclarecimentos/documentação (cheques resgatados ou declarações de quitação pelos fornecedores) relativos à devolução de cheques, os quais não foram pagos nem aparecem registrados em conciliação bancária, portanto sem comprovação da quitação com recursos da campanha eleitoral, num total de R$ 32.360,00. O mencionado valor configura dívida de campanha que não está consignada na prestação. Ainda, a prestadora não apresentou o termo de assunção de dívida, cronograma de pagamento e quitação, bem como a anuência expressa dos credores previstos na Resolução TSE n. 23.406/14 (arts. 30 e 40, II, “f”).

Passo a analisar as contas.

Em relação ao item 1, o entendimento desta Corte é no sentido de que a falta de declaração de despesas com serviços advocatícios, pagas em espécie ou recebidas como estimáveis em dinheiro, não se reveste de gravidade suficiente para fundamentar a desaprovação das contas, tratando-se de irregularidade de natureza formal, que não causa efetivo prejuízo à análise contábil da campanha pela Justiça Eleitoral. Vejamos:

Prestação de contas. Candidato. Arrecadação e dispêndio de recursos de campanha. Art. 31, VII, da Resolução TSE n. 23.406/14. Eleições 2014.
A falta de registro de despesas com honorários advocatícios ou com profissional contador, ainda que exigida pelo § 4.º do art. 33 da Resolução TSE n. 23.406/14, não é suficientemente grave para levar à desaprovação das contas. Natureza do serviço estranha à obtenção de votos, não afetando a regularidade das arrecadações e gastos de campanha.
Aprovação com ressalvas.
(TRE, PC n. 170639, Relator: Dr. LEONARDO TRICOT SALDANHA, julgado em 23.6.2015.)

Todavia, as demais irregularidades comprometem a confiabilidade e a transparência da demonstração contábil apresentada à Justiça Eleitoral, como se verá adiante.

Conforme relatado no item 2, a interessada encerrou a sua campanha com uma expressiva dívida de R$ 76.795,73 (setenta e seis mil setecentos e noventa e cinco reais e setenta e três centavos). Muito embora tal dívida tenha sido declarada quitada pela prestadora, que inclusive apresentou os documentos de fls. 187-188 e 190-206, verifica-se nos extratos de fls. 189-195 que os pagamentos foram realizados por meio da sua conta bancária pessoal.

Ocorre que esse tratamento dado à dívida em questão fere os artigos 18 e 30 da Resolução TSE n. 23.406/14, in verbis:

Art. 18. A movimentação de recursos financeiros fora das contas específicas de que trata os arts. 12 e 13 implicará a desaprovação das contas.

Art. 30. Os candidatos, partidos políticos e comitês financeiros poderão arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

§ 1º Após o prazo fixado no caput, é permitida a arrecadação de recursos exclusivamente para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até o dia da eleição, as quais deverão estar integralmente quitadas até o prazo para entrega da prestação de contas à Justiça Eleitoral.

§ 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas poderão ser assumidos pelo partido político (Lei nº 9.504/97, art. 29, § 3º e Código Civil, art. 299):

a) por decisão do seu órgão nacional de direção partidária, com apresentação de cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo; e

b) com anuência expressa dos credores.

§ 3º No caso do disposto no parágrafo anterior, o órgão partidário da respectiva circunscrição eleitoral passará a responder por todas as dívidas solidariamente com o candidato, hipótese em que a existência do débito não poderá ser considerada como causa para a rejeição das contas (Lei nº 9.504/97, art. 29, § 4º).

§ 4º Os valores arrecadados para a quitação dos débitos de campanha a que se refere o § 2º devem:

I – observar os requisitos da Lei nº 9.504/97 quanto aos limites legais de aplicação e às fontes lícitas de arrecadação;

II – transitar necessariamente pela conta “Doações para Campanha” do partido político, a qual somente poderá ser encerrada após a quitação de todos os débitos;

III – constar da prestação de contas anual do partido político até a integral quitação dos débitos, conforme o cronograma do pagamento e quitação apresentado por ocasião da assunção da dívida.

§ 5º As despesas já contraídas e não pagas até a data a que se refere o caput deverão ser comprovadas por documento fiscal hábil, idôneo ou por outro meio de prova permitido, emitido na data da realização da despesa.

Conforme bem pontuado pelo setor técnico, o procedimento determinado pela Resolução TSE n. 23.406/2014 para quitação das dívidas tem como objetivo a identificação das reais fontes de financiamento de campanha. No caso concreto, verificam-se nos extratos juntados pela candidata (fls. 189-195) os créditos e débitos abaixo relacionados, nos quais não se identifica a origem dos recursos utilizados para quitação das dívidas, restando prejudicada a transparência que deve nortear a movimentação financeira da campanha eleitoral.

Créditos:

Depósito cheque cash - R$ 3.400,00; Depósito em dinheiro - R$ 5.750,00; Crédito folha de pagamento - R$ 51.469,63; Crédito transferência - R$ 37.520,00; Depósito dinheiro cash - R$ 8.200,00; Depósito dinheiro - R$ 25.926,00; Crédito transferência - R$ 33.426,23. Total de créditos no período R$ 166.691,86.

Débitos:

Débitos diversos - R$ 49.346,32; TED para pagamento de dívida - R$ 21.340,00; cheques compensados para pagamento de dívida - R$ 62.430,32. Total de débitos no período - R$ 133.116,64.

Além disso, a prestadora realizou pagamentos em espécie sem a devida constituição de Fundo de Caixa, num total de R$ 18.250,00 (dezoito mil duzentos e cinquenta reais), ultrapassando em R$ 11.792,13 (onze mil setecentos e noventa e dois reais e treze centavos) o limite estabelecido no art. 31, § 6º, da Resolução TSE n. 23.406/14 (fls. 177 e 210). Ainda, tais pagamentos não foram lançados de modo individualizado no Sistema de Prestação de Contas.

Em sua manifestação inicial, a candidata alega não se tratar de pagamentos em espécie, mas realizados por meio de cheques, os quais teriam sido sacados pelos fornecedores (fl. 78). Ocorre que foram apenas dois os cheques, totalizando a quantia já referida de R$ 18.250,00, ao passo que os pagamentos, que totalizam o mesmo valor, foram efetuados a 17 pessoas diferentes, mediante RPA, restando insustentável, portanto, a justificativa apresentada.

Some-se a essas irregularidades, que por si já levariam à desaprovação das contas, a ausência de esclarecimentos sobre incongruência no valor recebido de doador originário, incompatível com o valor total transferido pela candidata a outro prestador (Tarso Genro).

Com efeito, a candidata recebeu a quantia de R$ 9.100,00 de Carlos Alberto Finger e transferiu R$ 11.500,00 ao candidato Tarso Genro, gerando impossibilidade de atestar a consistência e confiabilidade dessa informação.

Ainda, a prestadora não esclareceu ou apresentou documentação relativa a vários cheques devolvidos, no total de R$ 32.360,00 (trinta e dois mil, trezentos e sessenta reais), fl. 211.

Importa mencionar que, apesar de a Lei n. 13.165/15 ter trazido norma que dispensa a identificação do doador originário, este Tribunal, na sessão do dia 20.10.2015, em processo de minha relatoria, firmou entendimento no sentido da sua irretroatividade.

Por oportuno, trago o inteiro teor da ementa:

Prestação de contas de candidato. Arrecadação e dispêndio de recursos de campanha. Resolução TSE n. 23.406/14. Eleições 2014. Arrecadação de recursos sem a emissão de recibo eleitoral; despesas com combustível sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos ou publicidade com carro de som; divergências e inconsistências entre os dados dos fornecedores lançados na prestação de contas e as informações constantes na base de dados da Receita Federal; pagamentos em espécie sem a constituição do Fundo de Caixa; pagamento de despesa sem que o valor tivesse transitado na conta de campanha; inconsistência na identificação de doador originário. Conjunto de falhas que comprometem a transparência e a regularidade da contabilidade apresentada.

Entendimento deste Tribunal, no sentido da não retroatividade das novas regras estabelecidas pela Lei n. 13.165/2015, permanecendo hígida a eficácia dos dispositivos da Resolução TSE n. 23.406/2014.

A ausência de discriminação do doador originário impossibilita a fiscalização das reais fontes de financiamento da campanha eleitoral, devendo o recurso de origem não identificada ser transferido ao Tesouro Nacional.
Desaprovação.

(PC 2066-71.2014.6.21.0000)  (Grifei.)

Destaco que a última irregularidade ganha relevo pelo fato de a candidata não ter comprovado o resgate dos cheques, situação que caracteriza dívida de campanha não consignada na presente prestação, sem termo de assunção pelo órgão partidário, cronograma de pagamento e quitação, bem como a anuência expressa dos credores, consoante determinam os arts. 30 e 40, II, “f”, da Resolução TSE n. 23.406/14.

Como visto, a presente prestação de contas demonstra a existência de irregularidades graves e insanáveis na movimentação financeira realizada pela candidata, restando inviável a sua aprovação.

Diante do exposto, VOTO pela desaprovação da prestação de contas de ANA INES AFFONSO com fundamento no art. 54, inc. III, da Resolução TSE n. 23.406/14.