PET - 6749 - Sessão: 26/01/2016 às 17:00

RELATÓRIO

HELIO CLAUDIO DE CAMILLIS requer anulação da anotação de suspensão de direitos políticos decorrente de condenação pelo crime de desobediência (art. 330 do Código Penal) pela Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (fls. 02-06).

O requerente comprova, por meio de certidão narratória juntada à fl. 09, que cumpriu a totalidade da pena, tendo a extinção da punibilidade transitado em julgado em 12.05.2014, sendo anotada a baixa da pena em 01.08.2014.

Aduz que, mesmo após ter readquirido a plenitude de seus direitos políticos, teria sido impedido de exercer seu direito de voto nas eleições de 2014.

Sustenta que não teve ciência da decisão que promoveu sua inelegibilidade e a cassação de seus direitos políticos, motivo pelo qual sofreu constrangimento no momento em que foi votar nas eleições de 2014, pois, ao apresentar-se à mesa eleitoral, teria sido impedido de exercer o sufrágio por estar com seus direitos políticos suspensos.

Traz jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral dando conta de que o crime de desobediência comum, por si só, não atrai a inelegibilidade prevista no art. 1º, inciso I, alínea “e”, da Lei Complementar n. 64/90.

Junta certidão do Cartório Eleitoral de Tramandaí (110ª Zona Eleitoral), datada de 23.3.2015, por meio da qual é possível constatar o restabelecimento da plenitude de seus direitos políticos (fl. 15).

Por fim, em que pese tenha readquirido a quitação eleitoral, requer a anulação do processo desta Especializada que determinou a suspensão de seus direitos políticos (fl. 06).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou preliminarmente pela extinção do feito sem resolução de mérito por ausência de interesse processual do autor. Quanto ao mérito, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 17-20).

É o relatório.

 

VOTO

Eminentes colegas:

Inicialmente, cabe decidirmos sobre a preliminar de ausência de interesse processual levantada pelo Ministério Público.

1. Preliminar de ausência de interesse processual

O douto Procurador Regional Eleitoral sustenta a ausência de interesse processual, haja vista a falta de documentação nos autos que demonstre que o requerente foi impedido de votar nas eleições de 2014.

Sustenta, ainda, que o postulante juntou ao processo certidão de quitação eleitoral, demonstrando estar na plenitude de seus direitos políticos, motivo pelo qual o ente ministerial entende deva o processo ser extinto sem resolução de mérito, nos termos do art. 267, inciso VI, do Código de Processo Civil (fl. 17-v.).

Com a vênia do douto Procurador, tenho por reconhecer o interesse processual do requerente.

Isso porque, em consulta aos registros do eleitor disponíveis neste Tribunal, foi possível verificar que este, de fato, não pôde votar nas eleições de 2014.

Consta, nos assentos do requerente nesta Especializada, que seus direitos políticos (capacidade ativa e passiva) foram suspensos em 29.7.2013 (data de anotação do ASE 337) em virtude de condenação criminal transitada em julgado, tendo sido restabelecidos em 20.8.2014 – data em que este Regional recebeu a comunicação do Tribunal de Justiça do Estado informando a extinção da punibilidade do postulante.

Todavia, referido eleitor não pôde votar, pois não houve tempo hábil para as devidas anotações em seu cadastro, situação que será explicada de forma aprofundada no exame do mérito.

Portanto, vislumbro o interesse processual do autor, motivo pelo qual voto por não acolher a preliminar ministerial.

Passo ao exame do mérito.

2. Mérito

No mérito, a questão cinge-se a verificar se há base legal para a anulação da decisão que determinou a suspensão dos direitos políticos do requerente em consequência de condenação criminal pela Justiça Comum em virtude do crime de desobediência (art. 330 do Código Penal).

Conforme já mencionado no exame da preliminar, restou incontroverso que o requerente teve seus direitos políticos suspensos em razão de condenação criminal transitada em julgado.

Restou incontroverso, também, que, embora na data do pleito de 2014 já estivesse com seus direitos políticos readquiridos, não pôde votar, em virtude do fechamento do cadastro ter ocorrido na data de 08.05.2014, sendo tecnicamente inviável o lançamento do restabelecimento da capacidade eleitoral ativa do requerente no sistema informatizado da Justiça Eleitoral.

Portanto, tenho que não merece guarida a pretensão do autor.

A suspensão dos direitos políticos do requerente resultou de condenação criminal, e encontra amparo no art. 15, inciso III, da Constituição Federal:

Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:

I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado;

II - incapacidade civil absoluta;

III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;

IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação

alternativa, nos termos do art. 5º, VIII;

V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.

(Grifei.)

Assim, os direitos políticos do eleitor (capacidade eleitoral ativa e passiva) permaneceram suspensos durante o período de cumprimento da pena, sendo restabelecidos em 12.05.2014, com o trânsito em julgado da extinção da punibilidade (fl. 09).

Desse modo, em tese, o eleitor estava com a plenitude de seus direitos políticos na data do pleito de 2014.

Todavia, não pôde votar por outro motivo.

Explico.

Ocorre que, nos termos da Resolução TSE n. 23.390/2013, que fixou o Calendário Eleitoral para as Eleições Gerais de 2014, a data limite para que houvesse alterações no cadastro dos eleitores, em consonância com o art. 91 da Lei 9.504/97, era o dia 07.05.2014. Portanto, em 08.05.2014 o cadastro eleitoral foi fechado.

No entanto, conforme consta na certidão da fl. 09, apenas em 01.08.2014 se deu a baixa da pena do eleitor pela Justiça Estadual, sendo que somente em 20.08.2014 o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul informou a esta Justiça Eleitoral a respectiva extinção da punibilidade.

Desse modo, conclui-se que o cadastro eleitoral encontrava-se fechado no momento em que esta Especializada recebeu a comunicação de extinção da punibilidade do eleitor, não sendo possível reativar sua habilitação para o exercício do voto no pleito de outubro de 2014.

Assim, não há como acolher o postulado pelo requerente.

Ainda, quanto à jurisprudência trazida pelo peticionário, necessário esclarecer que não se aplica ao caso. E, por elucidativo, reproduzo excerto do parecer ministerial que com extrema propriedade examinou o tema (fl. 19 e verso):

Com referência à jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (AgRREspe nº 30551) selecionada pelo interessado, na qual se afirma que a condenação pelo art. 330 do Código Penal, por si só, não atrai a inelegibilidade prevista no art. 1º, I, “e”, da Lei Complementar nº 64/90, tem-se que seus fundamentos não se aplicam ao caso concreto.

Aqui, estamos diante de suspensão dos direitos políticos em razão de condenação criminal, sendo irrelevante a espécie ou a natureza do delito, enquanto que o precedente colacionado trata de hipóteses de inelegibilidade, previstas na Lei Complementar nº 64/90, institutos diversos, portanto. (Grifei.)

Já, a suspensão dos direitos políticos em razão de condenação criminal tem como precedente o seguinte entendimento, conforme julgado deste Tribunal Regional Eleitoral:

Mandado de segurança. Impetração contra decisão judicial que determinou a suspensão de seus direitos políticos. Incidência do disposto no art. 15, inc. III, da Constituição Federal. Vereador eleito.

Eleições 2012. Competência do Tribunal Regional Eleitoral para julgar mandado de segurança manejado contra ato de juiz investido de jurisdição eleitoral. Trânsito em julgado de sentença penal condenatória em data anterior à diplomação. Crime previsto no art. 14 da Lei n. 10.826/2003. A suspensão dos direitos políticos é consequência irretorquível do trânsito em julgado de condenação criminal. A espécie do delito ou a natureza da pena são irrelevantes para a incidência da restrição, ainda que substituída a pena privativa de liberdade por restritiva de direito. (grifamos) Inviabilidade do exercício de mandato a quem esteja circunstancialmente sem a fruição dos direitos políticos. Não vislumbrada qualquer violação a preceito de ordem constitucional ou infraconstitucional, impositivo o afastamento do vereador eleito em decorrência da condenação criminal. Denegação da segurança.

(Mandado de Segurança n. 10362, Acórdão de 12.09.2013, Relator DES. MARCO AURÉLIO HEINZ, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 171, Data 16.09.2013, Página 10.)

Portanto, tendo em vista que a suspensão dos direitos políticos do requerente se deu em consequência de condenação criminal a ele imposta, inexiste “processo” desta Justiça Eleitoral a ser anulado.

Somado a isso, cumpre ressaltar que nenhuma restrição subsiste no cadastro do eleitor, o qual se encontra na plenitude de seus direitos políticos, tal como demonstra certidão por ele acostada à fl. 15.

Diante do exposto, afastada a preliminar suscitada pelo agente ministerial, VOTO pelo indeferimento do pedido.

É como voto, senhor Presidente.