RE - 1339 - Sessão: 06/10/2015 às 17:00

RELATÓRIO

O PARTIDO PROGRESSISTA – PP de Jaguari protocolou, em 29.4.2014, perante o Juízo da 26ª Zona Eleitoral, a sua prestação de contas anual referente ao exercício financeiro de 2013 (fls. 02-60).

Determinado o cumprimento de diligências (fl. 66), o partido manifestou-se (fls. 68-106). Sobreveio parecer conclusivo pela desaprovação das contas, tendo em vista o recebimento de doação, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) proveniente da Associação Nacional da Defesa Vegetal - ANDEF, cuja atividade principal a inscreve na categoria de entidade de classe, constituindo, assim, fonte vedada, nos termos do art. 31, IV, da Lei n. 9.096/95 (fls. 108-109).

Após, sem que tivesse sido oportunizada manifestação ao prestador, no prazo de 72 (setenta e duas) horas, consoante determina o art. 24, § 1º, da Resolução TSE n. 21.841/04, os autos foram com vista ao Ministério Público Eleitoral, o qual opinou pela desaprovação das contas (fls. 111-112v.).

Sobreveio sentença, na qual o magistrado acolheu o teor do parecer técnico e do parecer ministerial, desaprovando as contas, nos termos do art. 31, IV, da Lei n. 9.096/95 (fls. 114-116).

Irresignado, o PP de Jaguari interpôs recurso (fls. 118-138), aduzindo, em síntese, que a doadora, entidade de natureza privada, sem contribuições compulsórias, não se enquadra no conceito de entidade de classe, para fins de constituição da fonte vedada elencada no art. 31, IV, da Lei n. 9.096/95, adotado pela jurisprudência do TSE, pelo que requereu a aprovação das contas. Sucessivamente, pugnou pela aplicação do princípio da razoabilidade, tendo em vista que o valor doado, no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), não representa nenhuma diferença a fim de proporcionar vantagem política ao partido recebedor, tratando-se de recurso parco que ampara apenas o trabalho e despesas mensais do partido. Requereu, então, a revisão da dosimetria da determinação da suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário, aplicada no grau máximo previsto, ainda que, na prática, não traga efeitos práticos, pois, conforme assevera, a grei partidária não aufere renda alguma da distribuição das referidas quotas (fl. 122).

Nesta instância, os autos foram com vista ao Ministério Público Eleitoral, o qual opinou pelo provimento do recurso (fls. 145-149).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

O recorrente foi intimado em 15.4.2015, quarta-feira (fl. 117), e o recurso foi interposto em 20.4.2015, segunda-feira (fl. 118), dentro do tríduo legal.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Cerceamento de Defesa

Nos termos do art. 5º, LV, da Carta Magna, o direito de defesa é garantia constitucional - matéria de ordem pública -, podendo ser apreciado de ofício.

No presente caso, verifico que o exame técnico final concluiu pela desaprovação das contas, nestes breves termos (fl. 109):

Diante do exposto e com fundamento no resultado do exame ora relatado, recomenda-se, s.m.j., pela desaprovação das contas.

Após a emissão do relatório final, os autos foram diretamente encaminhados ao Parquet eleitoral, sem abertura de vista ao prestador, o que ignora a garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa cristalizada na Resolução TSE n. 21.841/04, em seu art. 24, III, § 1º, que assim dispõe:

Emitido parecer técnico pela rejeição das contas ou pela aprovação das contas com ressalvas, o juiz relator abrirá vista dos autos para manifestação em setenta e duas horas.

Em tais circunstâncias, entendo configurado o cerceamento de defesa, uma vez que as razões de decidir do magistrado de origem, assim como o parecer ministerial, tiveram por fundamento parecer conclusivo de desaprovação, a respeito do qual não foi oportunizada manifestação ao prestador, em dissonância com a legislação afeta, resultando em claro prejuízo para o ora recorrente.

Contudo, em prestígio ao princípio da economia processual, entendo que a questão deva ser momentaneamente superada para o fim de adentrar-se no mérito da insurgência, pois caso acolhidas as razões do recorrente quanto à aprovação das contas, despiciendo o retorno dos autos à origem para sanar o defeito.

Destaco.

 

Mérito

Trata-se de recurso interposto em virtude de desaprovação das contas anuais do Partido Progressista – PP de Jaguari, referente ao exercício financeiro de 2013.

O juízo de desaprovação teve suporte na análise técnica, a qual constatou que o Partido Progressista recebeu a importância de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de doação, efetuada pela entidade Associação Nacional de Defesa Vegetal (fl. 71). A referida associação, consoante consta no Cadastro de Pessoas Jurídicas da Receita Federal, teria por atividade econômica principal a atividade de organizações associativas patronais e empresariais (fl. 72). Portanto, ela estaria inserida no rol das fontes vedadas, nos termos do art. 31, IV, da Lei n. 9.096/95.

Em sede de recurso, o partido confirmou o recebimento do valor, mas rebateu o ponto aduzindo que a doadora é uma entidade de natureza privada, cujas contribuições financeiras não possuem caráter compulsório, uma vez que a associação aos seus quadros é facultativa. Em vista disso, a associação não se enquadraria no rol das fontes vedadas, pois a jurisprudência do TSE afirma que a expressão “entidade de classe”, para os fins de doação vedada, ficaria restrita ao conceito delineado pelo STF, segundo o qual (fl. 121):

...Associação que reúne empresas, sociedades de companhias abertas, pessoas jurídicas de direito privado, não caracteriza entidade de classe de âmbito nacional legitimada para ajuizar ação direta de inconstitucionalidade. Necessidade de unidade, em caráter permanente, de interesse daqueles que empreendem atividade profissional idêntica.

Alegou também que o Código de Ética, em seu item 08, permite a realização das doações, nos seguintes termos:

A ANDEF poderá apoiar e fazer donativos voluntários a qualquer partido político ou a seus representantes, nos estritos termos da legislação eleitoral.

Incontroversa a ocorrência da doação, primeiramente cumpre afastar a tese da defesa relacionada à permissão de doação constante no seu código de ética.

Em virtude da hierarquia normativa, o código de ética de uma entidade não se pode contrapor, nem sobrepor, ao regrado por lei ordinária, como é o caso das Leis n. 9.096/95 e n. 9.504/97, ambas incidentes na espécie. Portanto, para fins de análise de eventual ofensa à legislação eleitoral, desimporta a permissão contida no referido regramento da entidade, razão pela qual não há maiores considerações a serem tecidas sobre tal alegação da defesa.

O cerne da questão, portanto, no caso em apreço, reside em definir se a doadora enquadra-se como entidade de classe para o fim de ser inserida no rol das fontes vedadas, nos termos da legislação de regência.

Para tanto, vejamos o teor do art. 31, IV, da Lei n. 9.096/95:

É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(...)

IV - entidade de classe ou sindical. (Grifei.)

Conteúdo bastante semelhante é também vertido no art. 24, VI, da Lei n. 9.504/97:

É vedado, a partido e candidato, receber direta ou indiretamente doação em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(...)

VI - Entidade de classe ou sindical;

Como demonstrado acima, as entidades de classe são consideradas, tanto pela Lei dos Partidos Políticos quanto pela Lei das Eleições, como fonte vedada.

Já o Comprovante de Inscrição e de Situação Cadastral expedido pela Receita Federal aponta que a Associação Nacional de Defesa Vegetal - ANDEF tem sua natureza jurídica descrita como “associação privada” e, no campo destinado à atividade econômica principal, faz constar a descrição “atividades de organizações associativas patronais e empresariais” (fl. 72).

Porém, da mera descrição da atividade principal como sendo atividade de organização associativa patronal e empresarial não decorre, necessariamente, o enquadramento como entidade de classe. Para tanto, consoante bem apontou a Procuradoria Regional Eleitoral, é necessário que a pessoa jurídica, além de se inscrever como organização associativa, detenha o caráter de unidade, de homogeneidade, além de ser imperioso que seus associados comunguem dos mesmos interesses, com identidade de valores.

Ademais, nos termos esposados no parecer ministerial (fl. 147v.), que agrego às minhas razões de decidir, as ...entidades de classe possuem algumas similaridades, como, em alguns casos, o caráter compulsório, quanto à contribuição de seus membros, o recebimento de subsídios públicos de maneira direta ou indireta e como condição indispensável e precípua, representar uma categoria de atividade, profissional ou empresarial.

Nesse sentido, é a jurisprudência pacífica desta Corte:

Entende-se como entidade de classe aquela que, mediante financiamento público ou contribuição compulsória previstos em lei, representa, obrigatoriamente, em determinado âmbito da federação, os interesses profissionais, sociais ou econômicos dos seus congregados, a fim de legitimar o exercício das suas atividades – as quais devem guardar caráter único e permanente.

(TRE-RS, PC N. 7099-81.2010.6.21.0000, Relator: Des. MARCO AURÉLIO DOS SANTOS CAMINHA, Acórdão Publicado em Sessão em 01.12.2010.)

No caso em tela, conforme se depreende da Missão e da Visão da entidade doadora, consultadas no seu sítio da internet, no endereço www.andef.com.br, resta cristalino que a atividade precípua da ANDEF não é a defesa ou a representação dos interesses de uma categoria ou ramo profissional. Longe disso, a finalidade seria a de promoção da produção de grãos de modo sustentável, incentivando a criação de condições favoráveis ao desenvolvimento do combate a organismos vivos nocivos e do desenvolvimento do setor fitossanitário (fl. 147).

Ainda, tendo em vista que não há obrigatoriedade para associação à entidade, tem-se, por extensão, que as contribuições são feitas de modo espontâneo, não havendo, portanto, falar em compulsoriedade quanto à arrecadação da verba que restou por ser doada ao Partido Progressista de Jaguari.

Dessa forma, a Associação Nacional de Defesa Vegetal – ANDEF desatende os requisitos necessários para ser enquadrada como entidade de classe, não pertencendo, portanto, ao rol das fontes vedadas de realizar doação a partido político descrito no inc. IV, do art. 31, da Lei n. 9.096/95. Considerando que o apontamento da doação originária de fonte alegadamente vedada foi o único óbice que exsurgiu da análise das contas, tenho que a aprovação é medida que se impõe.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso para o fim de aprovar as contas prestadas pelo PARTIDO PROGRESSISTA – PP DE JAGUARI, referente ao exercício financeiro de 2013, superando a preliminar de cerceamento de defesa em prestígio ao princípio da economia processual.