RE - 23144 - Sessão: 08/10/2015 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recursos interpostos por CELSO DE MORAES PINTO e pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL contra decisão do Juízo da 24ª Zona Eleitoral, que julgou parcialmente procedente a representação ajuizada pelo Ministério Público contra Celso de Moraes e Gil Marques, aplicando-lhes multa no valor de 20.000 UFIR por ofensa ao artigo 73, VI, 'b', da Lei n. 9.504/97.

Na sentença (fls. 1.379-1.387), o juízo de primeiro grau, preliminarmente, extinguiu o feito sem julgamento do  mérito em relação à coligação ré, sob o fundamento de que a entidade deixou de existir com o encerramento do período eleitoral. No mérito, concluiu ter sido respeitada a média de gastos dos últimos três exercícios financeiros, mas entendeu comprovada a realização de publicidade institucional nos três meses que antecederam o pleito, sem a demonstração, pela defesa, de justificativas para tais gastos. Consignou ser irrelevante a ausência de autorização expressa do prefeito para a realização desses gastos. Registrou que a difusão da propaganda não alcançou um expressivo número de eleitores, considerando o contingente de cidadãos residentes na área rural do município, evidenciado, inclusive, pela derrota dos representados nas urnas. Ao fim, julgou parcialmente procedente a representação, para condenar os representados Celso de Moraes e Gil Marques ao pagamento de multa de 20.000 UFIR.

CELSO DE MORAES PINTO recorreu (fls. 1.390-1.404) suscitando nulidade da sentença, pois os agentes públicos responsáveis pelos atos impugnados nesta representação não foram chamados para integrar a lide, deixando-se de se formar o litisconsórcio passivo necessário, o que leva, no atual estágio, à extinção do feito sem julgamento do mérito. Quanto à matéria de fundo, argumenta ter passado a integrar a chapa majoritária faltando 17 dias para as eleições, sendo que não fazia parte da administração municipal antes dessa data. Alega não ser agente público nem a pessoa responsável pelas autorizações de publicidades institucionais. Aduz que a publicidade realizada no período vedado era lícita, pois restrita à publicação de editais e informações de interesse público e social. Requer, preliminarmente, a extinção do feito sem julgamento do mérito ou, sucessivamente, a improcedência da representação.

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, em seu recurso (fls. 1.406-1.421), argumenta não ser possível separar as despesas com publicações oficiais daquelas com publicidade institucional em sentido estrito, devendo ser considerada a despesa com publicidade de maneira global. Sustenta que, seguindo-se tal entendimento, houve ofensa ao art. 73, VII, da Lei das Eleições, pois os gastos com publicidade institucional no ano da eleição superaram a média dos últimos três exercícios. Requer a aplicação das sanções pecuniária e de cassação do registro dos recorridos.

Com as contrarrazões (fls. 1.441-1.453, 1.456-1.465v. e 1.484), nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do recurso de Celso de Moraes e pelo provimento do recurso ministerial (fls. 1.521-1.535v.).

É o relatório.

 

VOTOS

Dr. Hamilton Langaro Dipp:

1. Tempestividade

Os recursos são tempestivos, pois observaram o prazo de três dias previsto no artigo 73, § 13, da Lei n. 9.504/97. Celso de Moraes foi intimado da sentença no dia 28.10.2014 e interpôs o recurso no dia 30 do mesmo mês. Por sua vez, o Ministério Público Eleitoral foi intimado da decisão no dia 27.10.2014 e também interpôs o recurso no dia 30 do mesmo mês.

2. Agravo retido

Preliminarmente, deixo de conhecer o agravo retido interposto pelo recorrente. O agravo é espécie recursal prevista no Código de Processo Civil destinada a evitar a preclusão das decisões interlocutórias, situação que não ocorre no processo eleitoral, cujas decisões proferidas no curso do procedimento não precluem, e devem ser rebatidas, acompanhadas das suas razões pertinentes, no recurso interposto contra a sentença.

Nesse sentido é a jurisprudência:

Recurso especial. Representação. Programa de rádio.
Art. 45, incisos I, II e IV, da Lei nº 9.504/97. Preliminar de nulidade rejeitada. Matéria não prequestionada. Agravo retido. Cabimento no âmbito da Justiça Eleitoral. Impossibilidade. Ausência de previsão.
1. A liberdade de manifestação do pensamento garantida pela Constituição Federal e a liberdade de imprensa são princípios equivalentes, na ordem constitucional, aos da lisura e legitimidade dos pleitos e igualdade dos candidatos. Precedentes da Corte.
Recurso conhecido e improvido.
(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 21298, Acórdão n. 21298 de 04.11.2003, Relator Min. FERNANDO NEVES DA SILVA, Publicação: DJ - Diário de Justiça, Volume 1, Data 21.11.2003, Página 163.)
 
Prestação de Contas. Eleições 2012. Partido político.
Comitê Financeiro do Partido da Social Democracia - PSD de Barra do Ribeiro.
Para fins de cumprimento de diligências, a intimação de procurador regularmente constituído não ofende os princípios do contraditório e da ampla defesa.
Agravo retido interposto contra decisão interlocutória. Incabível na seara eleitoral. Reiterada interposição de agravos retidos reconhecida como manifestamente protelatória. Incidência da litigância de má-fé, nos termos do art. 17, VII, do CPC.
[...]
Deram parcial provimento ao recurso, para aprovar as contas com ressalvas.
(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 49908, Acórdão de 18.11.2014, Relator DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 211, Data 20.11.2014, Páginas 10-11.)
 
Recursos. Abuso de poder político. Condutas vedadas. Captação ilícita de sufrágio. Prefeito, vice e vereador. Eleições 2012.
Parcial procedência da ação no juízo originário. Aplicação das sanções de cassação dos diplomas e pagamento de multa aos três candidatos demandados.
Não conhecimento de agravo retido interposto contra decisão interlocutória. Ausência de previsão no processo eleitoral. Matéria combatida sem a incidência da preclusão, devendo ser objeto da irresignação contra a sentença.
[...]
Provimento parcial aos apelos ministerial e da coligação representante.
Provimento negado aos recursos remanescentes.
(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 27008, Acórdão de 26.11.2013, Relator DES. MARCO AURÉLIO HEINZ, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 220, Data 28.11.2013, Página 3.)

Assim, não conheço do agravo retido interposto por Celso de Moraes Pinto.

3. Decadência por falta de litisconsórcio necessário

No mérito, Celso de Moraes Pinto sustenta a decadência da ação por falta de formação do litisconsórcio passivo necessário entre os representados e os agentes públicos responsáveis pela prática dos atos administrativos que teriam beneficiado o candidato ao Executivo municipal.

Argumenta o recorrente, eleito vice-prefeito no pleito de 2012, que não fazia parte da administração municipal na época dos fatos, integrando a lide apenas na condição de beneficiário. Por outro lado, sustenta que as notas de empenho emitidas para efetivar a publicidade institucional foram assinadas pela assessora de planejamento, Sandra Lindemayer, e pelo Secretário da Fazenda, Hamilton Berro, os quais não integram a representação.

Não merece prosperar a alegação do recorrente. O egrégio Tribunal Superior Eleitoral firmou entendimento no sentido de que as representações por condutas vedadas devem observar a formação de litisconsórcio passivo necessário entre os candidatos beneficiários e os agentes públicos responsáveis pelas condutas irregulares, pois apenas estes podem justificar as condutas impugnadas ou suspender a sua execução (TSE, Recurso Ordinário n. 1696-77, Relator Min. Arnaldo Versiani, DJE: 06.02.2012).

Em nenhum momento, a jurisprudência exige a integração do polo passivo das representações de todos os agentes que eventualmente tenham participado da prática do ato. Ao contrário, o litisconsórcio é formado entre os candidatos e o agente público responsável pelo ato ilegal, tenha ele praticado o ato de forma individual ou com a participação de outros agentes. Esse raciocínio é extraído do seguinte julgado, cuja ementa reproduzo:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2012. PREFEITO E VICE. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ART. 73, § 10, DA LEI 9.504/97. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA.

1. Para os fins do art. 73, § 10, da Lei 9.504/97, há que se distinguir as situações em que o agente público que executa a conduta vedada atua com independência em relação ao candidato beneficiário, fazendo-se obrigatória a formação do litisconsórcio, e aquelas em que ele atua como simples mandatário, nas quais o litisconsórcio não é indispensável à validade do processo.

2. Na espécie, não existe litisconsórcio passivo necessário entre os agravantes chefes do Poder Executivo de Três Barras do Paraná/PR, candidatos à reeleição no pleito de 2012 e a secretária municipal de ação social que distribuiu o material de construção a eleitores no ano eleitoral, pois ela praticou a conduta na condição de mandatária daqueles.

3. Agravo regimental não provido.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 31108, Acórdão de 03.9.2014, Relator Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 173, Data 16.9.2014, Página 121.) (Grifei.)

Na hipótese dos autos, a inicial da representação imputa expressamente a responsabilidade pelo ilícito ao prefeito à época dos fatos, Gil Marques Filho, que integra a lide na condição de agente responsável e candidato beneficiado. Os servidores referidos pelo recorrente somente assinaram os empenhos, agindo sob o comando de Gil Marques, e sem poderes para decidir e executar todos os aspectos que perfectibilizaram a conduta impugnada.

Extraio do voto proferido pelo Ministro João Otávio de Noronha as seguintes considerações, que bem esclarecem a desnecessidade da formação do litisconsórcio em hipóteses como a dos autos:

De fato, aquela situação reclamava a obrigatoriedade de formação do litisconsórcio passivo, pois a conduta do agente público fora praticada de maneira autônoma e independente em relação ao chefe do Poder Executivo, candidato supostamente beneficiado.

Entretanto, no caso dos autos não se autoriza idêntica disciplina, pois, ainda que a secretária de ação social tenha executado a doação de material de construção, praticou o ato no cumprimento de ordens do chefe do Poder Executivo local, ou seja, como longa manus dos agravantes. Na condição de secretária de governo, essa agente pública não possuía autonomia administrativa para determinar a distribuição gratuita de bens à população. Se o fez, foi em nome da Administração Pública Municipal, chefiada pelos candidatos beneficiários, ora agravantes.

Há que se distinguir as situações em que o agente público atua com independência em relação ao chefe do Poder Executivo, fazendo-se obrigatória a formação do litisconsórcio, e aquelas em que ele atua como simples mandatário, nas quais o litisconsórcio não é obrigatório, porquanto, em última análise, o autor da conduta vedada é o próprio chefe do Poder Executivo. (Grifei.)

Assim, deve ser afastada a alegação de decadência, por ausência da formação de litisconsórcio passivo necessário, pois desnecessária a citação dos servidores Sandra e Hamilton, tendo em vista que o responsável pelos atos, prefeito à época dos fatos, já integra a lide.

4. Condutas vedadas

Quanto à questão de fundo da representação, a sentença julgou-a parcialmente procedente, entendendo não caracterizada a realização de publicidade institucional em montante superior à média dos últimos três anos anteriores ao da eleição, afastando a conduta vedada do art. 73, VII, da Lei n. 9.504/97. Nada obstante, considerou comprovada a realização de propaganda institucional nos três meses que antecedem o pleito, em afronta ao art. 73, VI, 'b', da lei supracitada, para condenar os representados à sanção de R$ 21.282,00.

Celso de Moraes Pinto recorreu, buscando afastar sua condenação pessoal, bem como a condenação pelo art. 73, VI, 'b', enquanto o Ministério Público interpôs recurso para obter também o reconhecimento da conduta vedada prevista no art. 73, VII, da Lei n. 9.504/97. Passo a analisar as irresignações de forma individualizada.

4.1. Condenação de Celso de Moraes Pinto

Celso de Moraes sustenta ter integrado a chapa majoritária somente nos últimos 17 dias de campanha, motivo pelo qual não poderia ser responsabilizado pelas condutas vedadas, de responsabilidade dos agentes públicos.

De fato, o recorrente somente apresentou pedido de registro de candidatura na data de 13 de setembro de 2012 (fl. 459), em substituição a Claudete Machado. Quando passou a integrar a chapa majoritária, os gastos com publicidade no primeiro semestre e a propaganda institucional realizada no período crítico já haviam cessado, considerando que os autos noticiam a publicação desses atos até a data de 18 de agosto (fl. 06).

Não se ignora que a legislação viabiliza a condenação de candidatos beneficiários de condutas vedadas, nos termos do § 8º do art. 73:

Art. 73 [...]

§ 4º O descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor de cinco a cem mil UFIR.

[...]

§ 8º Aplicam-se as sanções do § 4º aos agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem. (Grifei.)

Por certo, também, que a punição dos beneficiários não exige a prova de sua responsabilidade direta pela prática do ato ilegal, pois, do contrário, não seria necessária a previsão específica de sancionamento ao beneficiário, pois sua figura já estaria contemplada na condenação dos “responsáveis” do § 4º.

Nada obstante, o egrégio Tribunal Superior Eleitoral tem exigido, ao menos, o prévio conhecimento da irregularidade pelo candidato beneficiário, como se extrai das seguintes ementas (com grifos meus):

ELEIÇÕES 2014. REPRESENTAÇÃO. CONDUTA VEDADA. ART. 73, VI, b, DA LEI Nº 9.504/97. PRELIMINARES. ILEGITIMIDADE PASSIVA. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. REJEIÇÃO. VEICULAÇÃO DE PROPAGANDA INSTITUCIONAL. PERÍODO VEDADO. RESPONSABILIDADE. PRESIDENTE DA PETROBRAS. PROCEDÊNCIA DA REPRESENTAÇÃO. DEMAIS REPRESENTADOS. IMPROCEDÊNCIA. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO E PRÉVIO CONHECIMENTO. INCOMPETÊNCIA PARA INTERVIR OU EXERCER CONTROLE NA PUBLICIDADE.

[...]

5. É indispensável a comprovação de autorização ou prévio conhecimento dos beneficiários quanto à veiculação de propaganda institucional em período vedado, não podendo ser presumida a responsabilidade do agente público. O uso abusivo de propaganda travestida de institucional não afasta a ressalva. Decisão unânime.

[...]

(TSE, Representação n. 77873, Acórdão de 03.9.2014, Relator Min. ADMAR GONZAGA NETO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 187, Data 06.10.2014, Páginas 34-35.)

 

ELEIÇÕES 2014. REPRESENTAÇÃO POR CONDUTA VEDADA. TIPO DO ART. 73, VI, b, DA LEI Nº 9.504/97. PRELIMINARES. ILEGITIMIDADE PASSIVA. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. REJEIÇÃO. VEICULAÇÃO DE PROPAGANDA INSTITUCIONAL EM PERÍODO VEDADO. RESPONSABILIDADE OMISSIVA DA PRESIDENTE DA PETROBRAS. PROCEDÊNCIA DA REPRESENTAÇÃO. DEMAIS REPRESENTADOS. IMPROCEDÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVAS DE AUTORIZAÇÃO E/OU DE PRÉVIO CONHECIMENTO. INCOMPETÊNCIA PARA INTERVIR OU EXERCER CONTROLE NA PUBLICIDADE. PRECEDENTE ESPECÍFICO DO TSE: RP nº 778-73, REL. MIN. ADMAR GONZAGA. SOLUÇÃO EQUIVALENTE. FIXAÇÃO DA MULTA, IN CASU, EM PATAMAR INTERMEDIÁRIO. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE.

[...]

4. A indispensabilidade da comprovação de autorização ou prévio conhecimento dos beneficiários, quanto à veiculação de propaganda institucional em período vedado, afasta a procedência da representação em relação aos representados candidatos a cargos políticos.

[...]

(TSE, Representação n. 82802, Acórdão de 11.9.2014, Relator Min. TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 184, Data 01.10.2014, Páginas 24-25.)

 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ART. 73, INCISO VI, ALÍNEA b, DA LEI Nº 9.504/97. CONDUTA VEDADA. PROPAGANDA INSTITUCIONAL. PRÉVIO CONHECIMENTO. BENEFICIÁRIO. RECURSO PROVIDO.

1. Para a conduta vedada prevista na alínea b do inciso VI do art. 73 da Lei nº 9.504/97, há que ser comprovado o prévio conhecimento do beneficiário. Precedentes.

2. Não é dado ao julgador aplicar a penalidade por presunção, já que do beneficiário não se exige, obviamente, a prova do fato negativo.

3. Recurso especial provido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 49805, Acórdão de 01.10.2014, Relatora Min. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 195, Data 16.10.2014, Páginas 45-46.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PROPAGANDA INSTITUCIONAL. CHEFE DO PODER EXECUTIVO. CONDUTA VEDADA. CARACTERIZAÇÃO.

1. Deve ser comprovada a autorização ou prévio conhecimento da veiculação de propaganda institucional, não podendo ser presumida a responsabilidade do agente público (AI n° 10.280/SP, Rel. Mm. Marcelo Ribeiro, DJE de 14.9.2009, e REspe n° 25.6141 SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ de 12.9.2006). Contudo, não há se falar em presunção no caso em debate.

2. Cabe analisar, em cada caso concreto, se o beneficiário da propaganda institucional teve ou não conhecimento da propaganda (Precedentes: REspe nO 35.903/SP, Mm. Rel. Arnaldo Versiani, DJE de 2.9.2009; AgRg no AI no 10.969, de minha relatoria, DJE de 4.8.2009; e AAg 7.501/SC, Rel. Min. Gerardo Grossi, DJ de 16.3.2007). No caso, o e. TRE/SP entendeu como peculiaridade do caso o fato de o agravante, beneficiado pela propaganda institucional, ser o chefe do Poder Executivo, e, portanto, responsável por esta.

[...]

4. Agravo regimental não provido.

(TSE, AgR-REspe n. 36.251/SP, Relator Min. FELIX FISCHER, DJe 10.3.2010.)

Dessa forma, embora o beneficiário da conduta vedada possa ser sancionado pelo ilícito mesmo que não tenha sido responsável por ela, a jurisprudência exige a evidência de um envolvimento mínimo com o fato. Caso não o tenha autorizado, as circunstâncias devem indicar que anuiu com sua prática ou, ao menos, que podia impedi-lo ou opor-se à sua realização, impondo aos candidatos o dever geral de zelar pela licitude e normalidade do pleito.

As peculiaridades dos autos os diferenciam daqueles que esta Corte tem habitualmente enfrentado, e indicam a inviabilidade da condenação de Celso de Moraes Pinto, mesmo na condição de beneficiário, pois nenhum conhecimento tinha a respeito das irregularidades. O candidato a vice-prefeito não integrava a administração municipal na gestão 2008-2012 nem compunha originariamente a chapa majoritária. Ao contrário, apenas ingressou na campanha em meados de setembro, faltando menos de um mês para a realização do pleito. Alie-se a isso o fato de que as condutas vedadas objeto da presente representação foram realizadas, em sua integralidade, antes da formalização do registro de candidatura do recorrente.

Dessa forma, as circunstâncias do caso indicam que Celso de Moraes Pinto não tomou conhecimento dos fatos ora apurados e sequer tinha condições de saber a seu respeito, impedi-los ou opor-se à sua prática.

Assim, deve ser afastada a condenação de Celso de Moraes Pinto.

4.2. Publicidade nos três meses anteriores ao pleito

A sentença reconheceu a prática de publicidade institucional nos três meses que antecedem o pleito, mediante publicações de matérias no semanário Folha de Itaqui e nos periódicos Nossa Época e A Verdade (fl. 1.385), em ofensa ao art. 73, VI, 'b', da Lei n. 9.504/97:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

VI - nos três meses que antecedem o pleito:

[...]

b) com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral;

Argumenta, o recorrente, que somente pode ser considerada ilegal a propaganda institucional na qual constem nomes, fotos ou identificação dos candidatos, sendo permitida a publicidade com caráter informativo e as publicações legais, aduzindo que apenas foram realizadas, no período vedado, publicações de interesse público.

Sem razão o recorrente. É pacífico o entendimento segundo o qual a conduta vedada é objetiva, caracterizando-se com a simples divulgação de publicidade institucional no período vedado, excetuando-se, apenas, os casos de grave e urgente necessidade, reconhecidos pela Justiça Eleitoral.

Nessa linha de raciocínio, não cabe indagar a respeito de eventual finalidade eleitoreira das divulgações, pois a finalidade da proibição é reduzir os naturais benefícios que os candidatos à reeleição possuem em relação aos demais competidores, buscando preservar a igualdade de oportunidades em benefício dos eleitores. Para reduzir o impacto dessa desigualdade, nos três meses anteriores ao pleito a norma estabeleceu como regra a vedação de qualquer publicidade institucional, com pontuais exceções.

São esclarecedoras as seguintes ementas (com grifos meus):

ELEIÇÕES 2014. CONDUTA VEDADA. ART. 73, VI, "B". LEI DAS ELEIÇÕES. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. DIVULGAÇÃO DE VÍDEOS DE PROPAGANDA NA INTERNET. PERÍODO CRÍTICO ELEITORAL. USO DE LOGOMARCA DO GOVERNO FEDERAL. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL.

[...]

12. "Esta Corte já afirmou que não se faz necessário, para a configuração da conduta vedada prevista no art. 73, VI, b, da Lei n° 9.504/97, que a mensagem divulgada possua caráter eleitoreiro, bastando que tenha sido veiculada nos três meses anteriores ao pleito, excetuando-se tão somente a propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado e a grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral. Nesse sentido: AgR-Al 719-90, rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJE de 22.8.2011".

[...]

(TSE, Representação n. 81770, Acórdão de 01.10.2014, Relator Min. ANTONIO HERMAN DE VASCONCELLOS E BENJAMIN, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 200, Data 23.10.2014, Páginas 16-17.)

 

ELEIÇÕES 2012. RECURSO ESPECIAL. AIJE. PREFEITO E VICE-PREFEITO. CONDUTA VEDADA. ART. 73, VI, B, DA LEI N. 9.504/97. CARACTERIZAÇÃO. ABUSO DO PODER POLÍTICO. ART. 74 DA LEI Nº 9.504/97. OFENSA AO PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE. ART. 37, § 1º, DA CF. NÃO CONFIGURAÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL PARA AFASTAR A SANÇÃO DE CASSAÇÃO. MULTA MANTIDA.

1. A veiculação de publicidade institucional, consubstanciada na distribuição de material impresso aos munícipes em geral, nos três meses que antecedem o pleito e sem que haja demonstração de situação grave ou urgente, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral, configura a conduta vedada do art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/97, sujeitando o infrator à sanção pecuniária, quando ausente gravidade que justifique, segundo um juízo de proporcionalidade e razoabilidade, a imposição cumulativa da pena de cassação do registro/diploma outorgado.

2. A caracterização do abuso de autoridade previsto no art. 74 da Lei nº 9.504/97 requer seja demonstrada, de forma objetiva, afronta ao disposto no art. 37, § 1º, da CF, ou seja, que haja ruptura do princípio da impessoalidade com a menção na publicidade institucional a nomes, símbolos ou imagens, que caracterizem promoção pessoal ou de servidores públicos.

3. Recurso especial parcialmente provido.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 44530, Acórdão de 03.12.2013, Relatora Min. LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 32, Data 14.02.2014, Página 97.)

Foram juntadas aos autos provas documentais suficientes para concluir de forma segura a respeito da efetiva realização de publicidade institucional nos três meses que antecederam o pleito de 2012. Apenas para ilustrar, cita-se algumas das divulgações, todas com a identificação da prefeitura mediante o seu brasão oficial: 15ª Castilha da Canção Farropilha (fl. 91); Seminário Itaquiense sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (fl. 92); 16ª Dança Comigo Itaqui lota Theatro Prezewodowski nas duas noites (fl. 94); Nova Coleta do Lixo (fl. 104); Projeto Multimídia da Educação forma primeira turma (fl. 105); Cavalgada Integração da Região Sul (fl. 106); e Baile Municipal Tradicionalista (fl. 109).

Inequívoca, portanto, a realização de publicidade institucional sobre eventos que não evidenciavam grave ou urgente necessidade, como a divulgação da formação de turmas de informática, cavalgadas ou bailes regionais. Além da evidente ausência de grave urgência, não houve prévia autorização da Justiça Eleitoral, conforme determina a norma de regência.

Caracterizada, portanto, a conduta vedada do artigo 73, VI, 'b', da Lei n. 9.504/97.

4.3. Publicidade acima da média dos últimos três anos

A legislação eleitoral veda, no ano da eleição, gastos com publicidade institucional superiores à média dos últimos três anos ou do ano imediatamente anterior ao do pleito. Transcrevo a regra em questão:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

VII - realizar, em ano de eleição, antes do prazo fixado no inciso anterior, despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que excedam a média dos gastos nos três últimos anos que antecedem o pleito ou do último ano imediatamente anterior à eleição.

A sentença recorrida afastou a pretendida infringência ao artigo 73, VII, justificando que os gastos com publicidade do município no ano de 2012 foram de R$ 180.018,40, inferiores à média anual do triênio 2009-2011, da ordem de R$ 181.537,28.

Em suas razões recursais, o Ministério Público Eleitoral sustenta que há excesso de gastos com publicidade tanto na informação prestada pelo município quanto no parecer técnico elaborado por perito oficial.

Inicialmente, cumpre esclarecer que, para fins do art. 73, VII, da Lei n. 9.504/97, deve-se diferenciar os gastos com publicidade institucional, destinada a divulgar os feitos de determinada administração, da publicidade legal, aquela necessária e imprescindível para atuação regular da administração pública, impostas por lei, tais como a publicação de atos oficiais e convocações.

Como a finalidade das condutas vedadas é compatibilizar a necessária continuidade do serviço público com a igualdade entre candidatos, o artigo 73, VII, acima referido, limita apenas a publicidade institucional, tendente a afetar a igualdade, sem restringir a publicidade de atos legais, pois haveria o risco da paralisação indevida da atividade pública.

Nesse sentido, firmou-se a jurisprudência (com grifos meus):

Recurso especial. Agravo regimental. Ação de investigação judicial eleitoral. Publicidade institucional. Período vedado. Art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/97. Violação.

Não caracterização. Dissídio. Não configuração. Fatos e provas. Reexame. Súmula nº 279 do Supremo Tribunal Federal. Decisão agravada. Fundamentos não afastados.

1. A publicação de atos oficiais, tais como leis e decretos, não caracteriza publicidade institucional.

2. A configuração do dissídio jurisprudencial requer, entre outros requisitos, a realização do confronto analítico.

3. O recurso especial não se apresenta como meio idôneo para se reexaminar fatos e provas (Súmula nº 279 do Supremo Tribunal Federal).

4. O agravo regimental, para que obtenha êxito, deve atacar, especificamente, todos os fundamentos da decisão agravada.

Agravo regimental desprovido.

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 25748, Acórdão de 07.11.2006, Relator Min. CARLOS EDUARDO CAPUTO BASTOS, Publicação: DJ - Diário de Justiça, Data 30.11.2006, Página 96.)

 

Embargos de declaração com pedido de atribuição de efeitos infringentes. Alegada ocorrência de omissão no aresto que deu provimento a recurso e condenou o embargante à multa por infringência ao inciso VII do artigo 73 da Lei n. 9.504/97.

A publicação de atos legais/oficiais não se confunde com a publicidade institucional destinada à divulgação dos atos da administração pública, não sendo computados para fins de aferição do limite previsto no artigo 73, inciso VII, da Lei n. 9.504/97. Valores decorrentes de atos administrativos vinculados.

Efeitos infringentes para negar provimento ao recurso ministerial e manter a improcedência da representação.

Acolhimento.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 72666, Acórdão de 23.9.2014, Relator DR. LEONARDO TRICOT SALDANHA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 172, Data 25.9.2014, Página 2.)

 

Recurso. Suposta conduta vedada. Art. 73, inc. VI, letra "b", e inc. VII, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2012.

Improcedência da representação pelo juízo originário. Alegada realização de despesas, em valor superior à média dos anos anteriores ao pleito, autorizadas ou determinadas por Prefeito Municipal, beneficiando candidatos eleitos. Suposto excesso de gastos com publicidade institucional. Não configurada a prática de conduta vedada prevista no inc. VII do art. 73 da Lei das Eleições. Publicidade realizada em cumprimento às exigências legais. Publicações obrigatórias não podem ser consideradas para dar efetividade à proibição legal, sob pena de violação dos princípios da publicidade e de transparência que devem reger a administração pública.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 69459, Acórdão de 25.6.2013, Relator DR. INGO WOLFGANG SARLET, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 116, Data 27.6.2013, Página 6.)

Estabelecido que apenas as publicidades institucionais são objeto da norma em comento, excluídas as publicações legais, é necessário fixar quais despesas devem ser consideradas para o cálculo dos gastos com publicidade, se as despesas empenhadas ou as despesas liquidadas.

Esta Corte possui julgados entendendo que basta o empenho das despesas públicas para a caracterização da publicidade institucional (RE 451-55, de minha relatoria, julg. em 20.5.2014; RE, n. 88-13, Rel. Dr. Leonardo Tricot Saldanha, julg. em 18.6.2013). No entanto, o egrégio Tribunal Superior Eleitoral definiu que devem ser levadas em consideração apenas as despesas liquidadas, momento no qual o serviço contratado já foi prestado ao ente público, que confirma a realização da atividade por meio da liquidação, para posterior pagamento. Cite-se a ementa do julgado:

Recurso especial. Representação. Conduta vedada. Art. 73, VII, da Lei nº 9.504/97.

1. O Tribunal Regional Eleitoral entendeu não configurada a conduta vedada do art. 73, VII, da Lei nº 9.504/97, reconhecendo que as despesas com publicidade em Município, efetivamente realizadas em 2012, não ultrapassaram o limite legal. Diante das premissas contidas no voto condutor da decisão recorrida, seria necessário reexaminar os fatos e as provas contidas nos autos para concluir, ao contrário, que foram realizados gastos acima da média legal no ano da eleição. Incidem, no particular, as Súmulas 7 do STJ e 279 do STF.

2. O art. 73, VII, da Lei nº 9.504/97 previne que os administradores públicos realizem no primeiro semestre do ano da eleição a divulgação de publicidade que extrapole o valor despendido no último ano ou a média dos três últimos, considerando-se o que for menor. Tal proibição visa essencialmente evitar que no ano da eleição seja realizada publicidade institucional, como meio de divulgar os atos e ações dos governantes, em escala anual maior do que a habitual.

3. A melhor interpretação da regra do art. 73, VII, da Lei das Eleições, no que tange à definição - para fins eleitorais do que sejam despesas com publicidade -, é no sentido de considerar o momento da liquidação, ou seja, do reconhecimento oficial de que o serviço foi prestado - independentemente de se verificar a data do respectivo empenho ou do pagamento, para fins de aferição dos limites indicados na referida disposição legal.

4. A adoção de tese contrária à esposada pelo acórdão regional geraria possibilidade inversa, essa, sim, perniciosa ao processo eleitoral, de se permitir que a publicidade realizada no ano da eleição não fosse considerada, caso a sua efetiva quitação fosse postergada para o ano seguinte ao da eleição, sob o título de restos a pagar, observados os limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 67994, Acórdão de 24.10.2013, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 242, Data 19.12.2013.) (Grifei.)

Transcrevo a seguinte passagem do voto proferido pelo Ministro Henrique Neves:

A Lei n° 4.320.164, que estatui normas de direito financeiro para a elaboração e o controle dos orçamentos da União, Estados, Municípios e do Distrito Federal, prevê em seu art. 63: A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.

Destaco o teor deste dispositivo legal:

Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.

§ 1° Essa verificação tem por fim apurar:

I- a origem e o objeto do que se deve pagar;

II- a importância exata a pagar;

III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação.

§ 2° A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:

I- o contrato, ajuste ou acordo respectivo;

II- a nota de empenho;

III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço. (Grifei.)

O art. 62 da mesma lei prevê que o pagamento da despesa só será efetuado quando ordenado após sua regular liquidação.

Diante dessas disposições, vê-se que a realização das despesas implica, primordialmente, a liquidação delas no momento em que há a comprovação efetiva do serviço.

O regime de liquidação, inclusive, terá fundamental importância para que o administrador tenha prudência na efetiva realização de despesas no próprio ano eleitoral, momento em que a observância à limitação de tais gastos com publicidade se demonstra essencial, considerando o período eleitoral em curso.

Por outro lado, a regra do art. 73, inciso VII, da Lei n° 9.504/97 deve ser interpretada de acordo com o caput do referido dispositivo que faz menção às condutas dos agentes públicos que são tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos.

A partir dessa presunção legal é que o inciso VII estabelece a proibição de, no ano da eleição, antes dos 3 meses que antecedem o pleito, serem realizadas despesas com publicidade dos órgãos públicos federais estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que excedam a média dos gastos nos três últimos anos que antecedem o pleito ou do último ano imediatamente anterior à eleição.

A regra proibitiva previne, em outras palavras, que os administradores públicos realizem no primeiro semestre do ano da eleição a divulgação de publicidade que extrapole o valor despendido no último ano ou a média dos três últimos, considerando-se o que for menor.

Tal proibição visa essencialmente evitar que no ano da eleição seja realizada publicidade institucional, como meio de divulgar os atos e ações dos governantes, em escala anual maior do que a habitual.

No caso dos autos, o que se discute não é propriamente a realização de publicidade no ano eleitoral ou a sua quantidade, mas o pagamento de publicidade anteriormente realizada, que - segundo o acórdão regional - foi liquidada em 2011, ou seja, a efetiva prestação dos serviços foi atestada em 2011, mas o pagamento somente veio a ser realizado no exercício seguinte.

A adoção de tese contrária à esposada pelo acórdão regional geraria a possibilidade inversa, essa, sim, perniciosa ao processo eleitoral, de se permitir que a publicidade realizada no ano da eleição não fosse considerada, caso a sua efetiva quitação, fosse postergada para o ano seguinte ao da eleição, ao título de restos a pagar, observados os limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

No caso, tenho que a melhor interpretação da regra do art. 73, VII, da Lei n° 9.504/97, no que tange à definição - para fins eleitorais - do que sejam despesas com publicidade, seja considerar o momento da liquidação, ou seja, do reconhecimento oficial de que o serviço foi prestado - independentemente de se verificar a data do respectivo empenho ou do pagamento.

Cumpre mencionar, entretanto, que aquela egrégia Corte, em decisão monocrática, posterior ao precedente citado, adota o empenho como critério válido para aferir eventual ofensa ao artigo 73, VII (Agravo de Instrumento n. 29725, Decisão monocrática de 27.3.2015, Relator: Min.Gilmar Ferreira Mendes, DJE: 06.4.2015), mas naqueles autos, assim como ocorreu nos precedentes desta Corte, acima referidos, tratou-se de qual seria o melhor critério entre as despesas empenhadas e as efetivamente pagas. Fica claro, portanto, que o empenho das despesas não deve ser desprezado, sendo preferível quando confrontado com o montante pago, tanto que foi posteriormente adotado naquela Corte Superior.

Diante desse quadro, conclui-se que o empenho é evidência suficiente da realização da publicidade institucional, especialmente quando os representados não contestam a efetiva realização das propagandas empenhadas. Nada obstante, instaurando-se nos autos divergências a respeito da efetiva prestação do serviço empenhado, a liquidação das despesas é critério mais seguro do que o mero empenho.

No caso, está devidamente demonstrado que nem todas as despesas empenhadas haviam sido liquidadas, devendo-se levar em consideração para a análise dos autos apenas as despesas liquidadas, para fins de apuração de ofensa ao art. 73, VII, da Lei n. 9.504/97.

Fixadas essas premissas, passo à análise dos gastos realizados pela Prefeitura de Itaqui, conforme apurado por laudo do perito judicial (fls. 801-804).

No ano de 2009 foram gastos R$ 166.551,43; em 2010 gastou-se o montante de R$ 183.737,70; e em 2011 a despesa foi de R$ 194.322,70, chegando-se ao gasto médio de R$ 181.537,28 com publicidade institucional nos três anos anteriores ao pleito.

Já no ano das eleições, 2012, as despesas liquidadas chegaram ao valor absoluto de R$ 126.175,40.

Vê-se, portanto, que as despesas com publicidade institucional no ano da eleição não superaram o valor bruto da média dos últimos três anos nem os gastos realizados no ano imediatamente anterior ao da eleição.

Entretanto, o órgão ministerial, amparado em recente decisão proferida pelo egrégio Tribunal Superior Eleitoral, apresenta raciocínio diverso, concluindo pela irregularidade da conduta dos representados.

O artigo 73 da Lei n. 9.504/97, de regra, veda a realização de publicidade institucional nos três meses anteriores ao pleito (inciso VI, 'b'), permitindo, portanto, a realização de propagandas apenas no primeiro semestre do ano eleitoral. Por outro lado, o inciso VII limita os gastos com publicidade institucional à média dos três anos anteriores. Assim, pela letra fria da lei, o dispositivo usaria medidas distintas para estabelecer um critério de igualdade: adotaria os gastos com publicidades realizadas no decorrer de doze meses para estabelecer um limite de despesas nos seis primeiros meses do ano eleitoral. Dessa forma, o candidato poderia concentrar no primeiro semestre do ano eleitoral toda a publicidade institucional realizada ao longo de um ano inteiro nos exercícios anteriores.

Tal interpretação ofende a própria finalidade da norma, que busca evitar o aumento da divulgação dos atos do governo no ano do pleito, impondo ao candidato a manutenção dos gastos médios realizados nos demais exercícios financeiros de sua gestão, para assegurar a igualdade entre os contendores.

Diante dessa realidade, o egrégio Tribunal Superior Eleitoral firmou entendimento no sentido de que a norma do art. 73, VII, da Lei n. 9.504/97, para além de limitar os gastos do ano eleitoral à média dos anos anteriores, impõe a observância de uma relação de proporcionalidade entre os gastos realizados.

Cito a ementa do referido julgado:

ELEIÇÕES 2012. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CONDUTA VEDADA. GASTOS EXCESSIVOS COM PUBLICIDADE INSTITUCIONAL NO PRIMEIRO SEMESTRE DO ANO DA ELEIÇÃO. ABUSO DE PODER POLÍTICO/AUTORIDADE. DESVIRTUAMENTO DA PUBLICIDADE INSTITUCIONAL NO PRIMEIRO SEMESTRE DO ANO DA ELEIÇÃO. DESPROVIMENTO DO RECURSO.

[...]

4. Conduta vedada e gastos com publicidade institucional: os gastos com publicidade institucional não podem ultrapassar a média dos três anos anteriores ou a do ano imediatamente anterior à eleição - art. 73, inciso VII, da Lei nº 9.504/1997. A compreensão sistemática das condutas vedadas, que busca justamente tutelar a igualdade de chances na perspectiva da disputa entre candidatos, leva à conclusão de que, no primeiro semestre do ano da eleição, é autorizada a veiculação de publicidade institucional, respeitados os limites de gastos dos últimos três anos ou do último ano, enquanto, nos três meses antes da eleição, é proibida a publicidade institucional, salvo exceções (art. 73, inciso VI, alínea b, da Lei nº 9.504/1997). Consequentemente, os gastos com publicidade institucional, no ano de eleição, serão concentrados no primeiro semestre, pois no segundo semestre, além das limitações, algumas publicidades dependem de autorização da Justiça Eleitoral. O critério a ser utilizado não pode ser apenas as médias anuais, semestrais ou mensais, nem mesmo a legislação assim fixou, mas o critério de proporcionalidade. O acórdão regional demonstra que os gastos no primeiro semestre de 2012 (R$ 1.340.891,95 - um milhão, trezentos e quarenta mil, oitocentos e noventa e um reais e noventa e cinco centavos) representaram aproximadamente: 68% dos gastos realizados em 2011 (R$ 1.958.977,91 - um milhão, novecentos e cinquenta e oito mil, novecentos e setenta e sete reais e noventa e um centavos), 24% a mais do que os realizados em 2010 (R$ 1.079.546,97 - um milhão, setenta e nove mil, quinhentos e quarenta e seis reais e noventa e sete centavos) e 94% dos gastos do ano de 2009 (R$ 1.415.633,93 - um milhão, quatrocentos e quinze mil, seiscentos e trinta e três reais e noventa e três centavos), o que dispensa maiores cálculos matemáticos acerca da evidente desproporcionalidade das despesas com publicidade institucional no primeiro semestre de 2012, a revelar quebra da igualdade de chances. Some-se a isso o fundamento ressaltado pelo acórdão regional de que "os números demonstram que os gastos em excesso foram bastante expressivos, superiores a 80% (oitenta por cento) do valor autorizado por lei, o que torna a conduta ainda mais grave" (fl. 356).

[...]

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 33645, Acórdão de 24.3.2015, Relator Min. GILMAR FERREIRA MENDES, Publicação: REPDJE - Republicado DJE, Tomo 73, Data 17.4.2015, Páginas 45-46 DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 72, Data 16.4.2015, Páginas 92-93.) (Grifei.)

Transcrevo, ainda, a seguinte passagem do voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes:

Dispõe o art. 73, inciso VII, da Lei das Eleições ser proibido ao agente público realizar no ano da eleição “despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que excedam a média dos gastos nos três últimos anos que antecedem o pleito ou do último ano imediatamente anterior à eleição”.

A referida norma protege o princípio da igualdade de chances ou paridade de armas entre os contendores - candidatos, partidos políticos e coligações - entendido assim como a necessária concorrência livre e equilibrada entre os partícipes da vida política, sem o qual fica comprometida a própria essência do processo democrático.

O princípio da igualdade de chances entre os competidores, portanto, abrange todo o processo de concorrência, não estando, por isso, adstrito a uma fase específica. É fundamental, por isso, que a legislação que disciplina o sistema eleitoral, a atividade dos partidos políticos e dos candidatos, o seu financiamento, o acesso aos meios de comunicação, o uso de propaganda governamental, etc. não negligencie a ideia de igualdade de chances, sob pena de a concorrência entre agremiações e candidatos tornar-se algo ficcional, com grave comprometimento do próprio processo democrático.

A compreensão sistemática das condutas vedadas, que busca justamente tutelar aquela igualdade de chances na perspectiva da disputa entre candidatos, leva à conclusão de que, no primeiro semestre do ano da eleição, é autorizada a veiculação de publicidade institucional, respeitados os limites de gastos dos últimos três anos ou do último ano, enquanto, nos três meses antes da eleição, é proibida a publicidade institucional, salvo exceções (art. 73, inciso VI, alínea b, da Lei n° 9.504I1997).

Consequentemente, portanto, os gastos com publicidade institucional, no ano de eleição, serão concentrados no primeiro semestre, pois no segundo semestre, além das limitações, algumas publicidades dependem de autorização da Justiça Eleitoral. Por isso, o critério a ser utilizado não poder ser apenas as médias anuais, semestrais ou mensais, nem mesmo a legislação assim fixou, mas o critério de proporcionalidade, evitando, à guisa de exemplificação, que o gestor público gaste, no primeiro semestre do ano da eleição, muito além das despesas do ano anterior, em desrespeito ao princípio da igualdade de chances.

Não se trata de interpretar extensivamente norma restritiva de direito (condutas vedadas), pois não se está restringindo situação fática não prevista em lei, mas apenas buscando a finalidade da norma. Para Carlos Maximiliano, “deve o Direito ser interpretado inteligentemente: não de modo que a ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões inconsistentes ou impossíveis”.

De fato, constituiria verdadeiro absurdo flagrante violação da ideia de igualdade de chances, pensar que a finalidade da legislação eleitoral é vedar gastos que excedam apenas a média anual, sabendo-se, de antemão, que a Lei das Eleições impõe diversas restrições à publicidade institucional no segundo semestre em que haverá disputa eleitoral.

Por fim, cabe uma breve alusão ao registro feito pelo egrégio TSE no sentido de que este entendimento não pode ser considerado mudança de jurisprudência. Lê-se do voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes:

Não se argumente, ademais, que há mudança radical de jurisprudência sobre o critério para a verificação dos gastos com publicidade institucional.

De fato, além de não existir jurisprudência consolidada sobre o tema no TSE, o precedente referido no acórdão regional, Ag n° 2.5061SP, rel. Mm. Fernando Neves, julgado em 12.12.2000, realmente utilizou o critério anual, mas ressalvou que “o acórdão regional não registra que a concentração da propaganda institucional foi feita com o intuito de indevidamente influir na campanha eleitoral”. No caso concreto, isso é evidente, pois houve nítido desvirtuamento da publicidade institucional, conforme se observará adiante.

Da mesma forma, no julgamento do AgR-REspe no 476-861SC, rel. Mm. Dias Toffoli, em 27.3.2014, este Tribunal utilizou o critério anual, mas ressalvou no tocante à media semestral: “ainda que se considerasse tal critério de proporcionalidade, o valor gasto a mais foi de 11,61% do limite semestral”.

Retomando a análise dos fatos, tendo como norte esse critério de proporcionalidade, os gastos no ano de 2012 (R$ 126.175,40) equivalem a 69% da média de gastos com publicidade nos três anos anteriores ao pleito (R$ 181.537,28) e 64% das despesas equivalentes no ano de 2011. Evidente, portanto, a não observância da proporcionalidade imposta pelo artigo 73, VII, da Lei n. 9.504/97, a justificar a imposição de sanção também por descumprimento desse inciso.

Por conta dessa irregularidade específica, o recorrido Gil Marques Filho deve ser condenado também à pena de multa de R$ 5.320,50, tendo em vista que, apesar da desproporcionalidade dos gastos, a publicidade não se mostrou ofensiva ao equilíbrio do pleito, especialmente porque não continha referências explícitas à pessoa dos representados, apresentando conteúdo de menor impacto à igualdade de oportunidades entre os candidatos.

Relativamente ao representado Celso de Moraes Pinto, por conta das peculiaridades do caso, já explicitadas, não havendo sequer indícios de um mínimo envolvimento anterior com os fatos ou com a campanha eleitoral, não cabe a imposição de pena pecuniária a ele.

Diante de todo o exposto, deixa-se de conhecer do agravo retido e, no mérito, afasta-se a pretendida decadência da ação, pois desnecessária a citação de todos os agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas.

Quanto à matéria de fundo, afasta-se a condenação do recorrente Celso de Moraes Pinto, pois, embora integre a ação na condição de beneficiário, as peculiaridades do caso evidenciam que ele não possuía qualquer conhecimento a respeito dos fatos apurados na presente ação.

Os autos demonstram, ainda, a prática da conduta vedada prevista no artigo 73, VI, 'b', da Lei n. 9.504/97, pois comprovada a realização de publicidade institucional nos três meses anteriores ao pleito, e da conduta vedada pelo art. 73, VII, em razão de as despesas liquidadas ofenderem o critério de proporcionalidade estabelecido pelo aludido dispositivo, visto que os gastos do primeiro semestre de 2012 foram desproporcionais à média das despesas equivalentes nos três anos anteriores ao do pleito, condenando-se o representado Gil Marques Filho à multa de R$ 5.320,40, a qual se agrega à sanção pecuniária a ele imposta na sentença.

 

Diante do exposto:

a) não conheço do agravo retido;

b) dou parcial provimento ao recurso de Celso de Moraes Pinto, para julgar improcedente a representação quanto a ele, afastando a multa imposta ao recorrente na sentença;

c) dou parcial provimento ao recurso do Ministério Público Eleitoral, para reconhecer a ofensa ao artigo 73, VII, da Lei n. 9.504/97, e condenar apenas Gil Marques Filho à multa de R$ 5.320,40.

Dr. Leonardo Tricot Saldanha:

Peço vênia para divergir do posicionamento do MM. Relator apenas no ponto em que concluiu pelo parcial provimento do recurso ministerial para condenar Gil Marques Filho à pena de multa por ofensa ao artigo 73, VII, da Lei n. 9.504/97.

Adianto que acompanho o voto do Relator em relação ao restante da matéria apreciada.

Ouvi com atenção os argumentos trazidos pelo Procurador Regional Eleitoral, Dr. Marcelo Veiga Beckhausen, e também os trazidos pela advogada em sua sustentação oral, e não há dúvidas de que a melhor interpretação para o dispositivo legal em questão, hoje revogado, é aquela que considera os gastos dos primeiros seis meses do ano da eleição.

Em verdade, é absolutamente desproporcional que se faça uma média entre três anos inteiros e, após, no último ano, exatamente o ano da eleição, se utilize esse dado como base nos gastos do primeiro semestre, ou seja, a média do que se gastou em doze meses anteriores. Então a interpretação da norma, proposta pelo Relator, no sentido de que “no primeiro semestre do ano da eleição é autorizada a veiculação de publicidade institucional, respeitados os limites de gastos dos últimos três anos ou do último ano”, e que, “nos três meses antes da eleição, é proibida a publicidade institucional, salvo exceções”, de fato é uma interpretação mais correta, é a interpretação mais adequada, inclusive pautada nos bons argumentos trazidos pelo Ministro Gilmar Mendes no acórdão paradigma citado pelo eminente Relator.

Ocorre que essa nova interpretação, invocada pelo órgão ministerial com base na recente decisão do Tribunal Superior Eleitoral, conduz à alteração significativa na jurisprudência desta Corte, que até então adotava os gastos com publicidades realizadas no decorrer de doze meses para aferir a extrapolação do limite de despesas nos seis primeiros meses do ano eleitoral.

A questão apresenta-se como um conflito entre a mais inteligente hermenêutica da norma e a aplicação da norma ao caso concreto, ou seja, o impacto que a norma tem sobre as pessoas. 

Em outros julgamentos em que este Tribunal decidiu pela inovação de interpretação muito significativa, como a que ora se apresenta, concluiu pela modulação da consequência concreta do novo posicionamento, não punindo diretamente a parte, solução que parece ser razoável adotar na hipótese dos autos.

Cito, como referência, o acórdão no REC 136258, de relatoria do Des. Federal Otávio Roberto Pamplona, julgado na sessão de 24.9.2014, em que o Tribunal decidiu pela ausência de sancionamento devido à alteração do entendimento até então adotado em casos análogos, em preservação da segurança jurídica e da boa-fé processual:

Recurso. Representação. Horário eleitoral gratuito. Utilização indevida de tempo destinado à propaganda proporcional como publicidade da majoritária. Art. 53-A da Lei n. 9.504/97. Eleições 2014.

É vedada pela legislação eleitoral a utilização da propaganda de candidatura majoritária em horário reservado à propaganda proporcional. No caso, configurada a invasão, pelo candidato à reeleição ao Governo do Estado, do espaço destinado ao horário eleitoral gratuito dos candidatos ao pleito proporcional, causando a ruptura da igualdade entre os concorrentes ao pleito.

Existência de divergência jurisprudencial quanto à matéria. Modulação dos efeitos do decisum para, em preservação da segurança jurídica e da boa-fé processual, deixar de estabelecer o sancionamento previsto no § 3º do art. 53-A da Lei n. 9.504/97, reservando sua aplicabilidade para eventual reiteração da conduta e futuras veiculações similares.

Provimento negado.

No referido julgado, esta Corte entendeu que a parte não deveria ser punida porque haveria uma surpresa decorrente da alteração de entendimento, mostrando-se adequado aplicar ao caso concreto a mesma conclusão.

Verdadeiramente, este Tribunal, como o Tribunal Superior Eleitoral, até a interpretação trazida pelo Ministro Gilmar Mendes, aplicava exatamente a média anual para os primeiros seis meses, isto é, adotava a interpretação gramatical do inciso VII do art. 73, que diz:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

VII - realizar, em ano de eleição, antes do prazo fixado no inciso anterior, despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que excedam a média dos gastos nos três últimos anos que antecedem o pleito ou do último ano imediatamente anterior à eleição.

Apesar de acompanhar os fundamentos do voto do Relator, com o qual, essencialmente, eu concordo, encaminho a divergência para não reconhecer o cometimento da conduta vedada porque, quando praticada, esse Tribunal, assim como outros tribunais eleitorais do país, utilizavam como base de cálculo os gastos do ano inteiro, não sendo razoável exigir, depois da realização da despesa, a observância do período de apenas seis meses.

Considero que essa inovação interpretativa deve guiar as nossas interpretações futuras pra outros casos, mas não quando esses gastos foram feitos ao tempo em que esse entendimento não era adotado pela jurisprudência, pois a regra não era clara para os administradores públicos naquele determinado momento em que a conduta vedada ocorreu.

Com essas considerações, acompanho parcialmente o Relator e VOTO pelo desprovimento do recurso do Ministério Público Eleitoral.

Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja:

Acompanho o relator.

Dra. Maria de Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez:

Acompanho o relator.

Des. Fed. Paulo Afonso Brum Vaz:

Sra. Presidente. Eu também fiquei com séria dúvida com relação à nova tese jurisprudencial. E na verdade não é nem em relação ao princípio da não surpresa e da boa fé, é mesmo uma questão do meu ponto de vista, mais semiótico, ou semiológico mesmo; é que eu não consigo enxergar no texto do artigo 73, inciso VII, as expressões semestralidade e proporcionalidade, elas não estão no texto, o texto é claro, fala em três últimos anos e não faz a mínima referência a essa possibilidade de cindirmos esse período. Ocorre que o texto é fundamental para a interpretação, embora não se confundam texto e norma, o texto não pode ser ignorado pelo intérprete. Tem um trabalho fantástico do Humberto Eco - Eco é um semiólogo; na verdade, ele travou um debate com o Derrida, Jacques Derrida, e ele defendia que toda interpretação tem limites. Cada um com seus argumentos, mas havia um consenso de que a interpretação tem limites no texto, o texto, ele precisa ser ouvido - Eco dizia -, o intérprete precisa deixar o texto falar, precisa ouvir o texto para depois se manifestar. O intérprete nunca é livre na sua interpretação, toda interpretação então tem limites, um dos limites é justamente o limite semântico do texto, não tem essas expressões. Há um problema legislativo aqui, não de interpretação. A interpretação é de certa forma arbitrária, ela vai além do texto; ainda que o texto possa receber várias interpretações - Eco mesmo disse que o texto se submete a todo tipo de interpretação - ele precisa falar, ele precisa se manifestar. A interpretação do Ministro Gilmar, Humberto Eco chamaria de intencionalista. Por que intencionalista? Porque ele enfoca no autor, na intentio autoris, ou na soberania do leitor, na intentio lectoris, buscando a real intenção do texto, a intentio operis; eu acho que foi longe demais a interpretação do ministro Gilmar, que pese respeitável, o ministro Gilmar é uma referência mesmo. Mas nós precisamos ser humildes, enquanto leitores, para ouvir o texto. Humberto Eco condena a superinterpretação. O que ele chama de superinterpretação? É justamente desrespeitar o limite do texto; se o texto fala, e de fato permite uma infinitude de interpretações no seu contexto, o autor empírico deve silenciar. O que não significa que não possa agir como leitor modelo, diz Eco, ou mesmo admirar leituras diversas do seu próprio texto. Assim, resumidamente, eu também vou pedir vênia ao eminente relator para negar provimento ao recurso ministerial, acho que o texto não acomoda essa respeitável compreensão.

Des. Paulo Roberto Lessa Franz: Acompanho a divergência me alinhando aos argumentos do Des. Paulo Afonso.

Desa. Liselena Schifino Robles Ribeiro:

Profiro voto de desempate, já tenho condições de votar, e, com a vênia do relator, vou negar provimento ao recurso do Ministério Público, ratificando os votos do Dr. Leonardo e do Des. Paulo Afonso.