RE - 3560 - Sessão: 21/01/2016 às 17:00

RELATÓRIO

O PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA – PDT de Machadinho – interpôs o presente recurso (fls. 88-96) contra sentença (fls. 82-84) que desaprovou suas contas referentes ao exercício de 2013 em virtude do recebimento de doações de fonte vedada, determinando o recolhimento do valor de R$ 1.000,00 ao Fundo Partidário, bem como a suspensão da participação neste, com perda das quotas, pelo período de um ano, a contar da data da decisão, consoante o disposto nos arts. 31, II, e 36, II, ambos da Lei n. 9.096/95 (fls. 82-84).

Em sua irresignação, o recorrente defende que as contribuições foram efetuadas em conformidade com a Lei dos Partidos Políticos, a Resolução TSE n. 21.841/04 e suas regras estatutárias e, ainda, de forma espontânea e devidamente identificadas, inviabilizando a sua caracterização como recursos de fonte vedada. Postula a aprovação das contas e, alternativamente, o afastamento da ordem de devolução dos valores ao Fundo Partidário, por já os ter utilizado em sua manutenção (fls. 88-96).

O Ministério Público Eleitoral manifestou-se pelo recebimento do recurso e remessa dos autos a esta Corte (fl. 98 e verso).

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 106-110v.).

É o relatório.

 

 

 

 

VOTO

Eminentes colegas:

1. Admissibilidade

O recurso é tempestivo. O partido foi intimado da sentença em 30.01.2015, sexta-feira (fl. 87), e o recurso interposto em 02.02.2015, segunda-feira (fl. 88), portanto, dentro do tríduo legal.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

2. Mérito

No mérito, trata-se de prestação de contas do PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA – PDT de Machadinho –, desaprovada em virtude do recebimento de doações de fonte vedada, no montante de R$ 1.000,00, em afronta ao art. 31, II, da Lei n. 9.096/95, pois provenientes de contribuições realizadas por filiados ocupantes de cargo em comissão de chefia ou direção.

O art. 31, II, da Lei n. 9.096/95, assim prescreve:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(….)

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38; (Grifei.)

O Tribunal Superior Eleitoral, até a edição da Resolução TSE n. 22.585/07, havia firmado entendimento no sentido de ser possível a contribuição de filiados ocupantes de cargos exoneráveis ad nutum, conforme se depreende da ementa do julgamento da Pet. n. 310 (Resolução TSE n. 20.844 de 14.8.2001), relator Min. Nelson Jobim:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO DOS TRABALHADORES – PT.

EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 1996.

Contribuição de filiados ocupantes de cargos exoneráveis ad nutum.

Inexistência de violação ao art. 31, II, da Lei n° 9.096/95. Contas aprovadas.

(Petição n. 310, Resolução n. 20844 de 14.8.2001, relator Min. NELSON AZEVEDO JOBIM, Publicação: DJ - Diário de Justiça, volume 1, data 09.11.2001, página 154 RJTSE - Revista de Jurisprudência do TSE, volume 13, tomo 1, página 302.)

No entanto, desde o advento da mencionada resolução, o tema não comporta mais os argumentos trazidos pelo recorrente, no sentido de que as contribuições dos filiados foram espontâneas e eventuais, e não estariam vedadas pela Resolução TSE n. 21.841/04.

Por oportuno, reproduzo ementa da consulta que deu origem à resolução:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(Consulta n. 1428, Resolução n. 22585 de 06.9.2007, Relator Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado Min. ANTONIO CESAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172.) (Grifei.)

Os fundamentos exarados para a mudança de interpretação deram-se nos seguintes termos:

(...) Estamos dando interpretação dilatada. Estamos dizendo que autoridade não é somente quem chefia órgão público, quem dirige entidade, o hierarca maior de um órgão ou entidade. Estamos indo além: a autoridade é também o ocupante de cargo em comissão que desempenha função de chefia e direção.

(…)

Está claro. A autoridade não pode contribuir. Que é a autoridade? É evidente que o hierarca maior de um órgão ou entidade já não pode contribuir, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, e, além disso, os ocupantes de cargo em comissão.

(…)

As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenham função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.

(…)

Para mim, autoridade em sentido amplo: todo aquele que possa, por exemplo, em mandado de segurança, comparecer nessa qualidade, para mim é autoridade (…).

O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção. (Grifei.)

Colaciono jurisprudência deste Tribunal no mesmo sentido:

Recurso. Prestação de contas. Exercício 2010. Desaprovação no juízo originário.

Expressiva parte da receita partidária oriunda de doações de pessoas físicas, ocupantes de cargos em comissão, na condição de autoridade. Prática vedada pelo disposto no artigo 31, incisos II e III, da Lei n. 9.096/95.

Provimento negado.

(TRE – RS, RE 1997. Relator EDUARDO KOTHE WERLANG, 30.7.2012.)

 

Recurso. Prestação de contas de partido político. Doação de fonte vedada. Exercício financeiro de 2008.

Doações de autoridades titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta, prática vedada pela Resolução TSE n. 22.585/2007 e pelo inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95.

Desaprovação das contas pelo julgador originário.

Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Razoável e proporcional a aplicação, de ofício, de 6 meses de suspensão das quotas do Fundo Partidário, a fim de colmatar lacuna da sentença do julgador monocrático.

Provimento negado.

(TRE – RS, RE 100000525, Relatora Desa. Federal ELAINE HARZHEIM MACEDO, 25.4.2013.) (Grifei.)

Ressalto que o conceito de autoridade, segundo o atual entendimento, abrange os servidores ocupantes de cargos de direção e chefia (art. 37, V, da Constituição Federal), sendo excluídos os que desempenham exclusivamente a função de assessor.

Como se verifica, transmudou-se de uma compreensão que privilegiava a proteção do partido político contra a ingerência do Poder Público para uma interpretação que ressalta a relevância dos princípios democráticos da moralidade, dignidade do servidor e preservação contra abuso de autoridade e do poder econômico.

O tema voltou a ser enfrentado por esta Casa quando do julgamento do Recurso n. 34-80, de minha relatoria, sessão de 26.8.2014, na qual foram desaprovadas as contas de partido político, em razão do recebimento de doação advinda de cargos de coordenador, diretor de departamento e chefe de setores e unidades administrativas.

Reproduzo a ementa daquele julgado:

Prestação de contas partidária. Diretório municipal. Art. 5º, inc. II, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro 2011.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum e na condição de autoridades. No caso, recebimento de quantia expressiva advinda de cargos de coordenador, diretor de departamento e chefe de setores e unidades administrativas.

Manutenção das sanções de recolhimento de quantia idêntica ao valor doado ao Fundo Partidário e suspensão do recebimento das quotas pelo período de um ano.

Provimento negado. (Grifei.)

Seguindo a mesma orientação, menciono os seguintes processos: RE 94-19, de relatoria da Desa. Maria de Fátima Freitas Labarrère, Sessão de 01.7.2014, e RE 36-50, de relatoria do Des. Luiz Felipe Brasil Santos, Sessão de 23.9.2014.

Nessa linha, transcrevo ementa de recente julgado do TSE:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DECISÕES. INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO. DOAÇÕES. OCUPANTES CARGO DE DIREÇÃO OU CHEFIA. AUTORIDADE. VEDAÇÃO. ART. 31, II, DA LEI Nº 9.096/95.

1. Para fins da vedação prevista no art. 31, II, da Lei nº 9.096/95, o conceito de autoridade pública deve abranger aqueles que, filiados ou não a partidos políticos, exerçam cargo de direção ou chefia na Administração Pública direta ou indireta, não sendo admissível, por outro lado, que a contribuição seja cobrada mediante desconto automático na folha de pagamento. Precedentes.

2. Constatado o recebimento de valores provenientes de fonte vedada, a agremiação deve proceder à devolução da quantia recebida aos cofres públicos, consoante previsto no art. 28 da Res.-TSE nº 21.841/2004.

Recurso especial desprovido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 4930 – Criciúma/SC, de relatoria do Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, sessão de 11.11.2014.) (Grifei.)

A meu sentir, o regramento tem por finalidade evitar que servidores cuja situação jurídica funcional seja de livre nomeação e exoneração, exercendo cargo de chefia, direção ou coordenação, venham a fazer doações aos partidos aos quais se encontrem vinculados. Em outras palavras, busca-se evitar a transferência do dinheiro público – parcela do vencimento auferido pelo titular demissível ad nutum – para a agremiação partidária.

Ainda, de acordo com o consignado pela Procuradoria Regional Eleitoral (fl. 108):

A vedação imposta pela Resolução do Tribunal Superior Eleitoral não tem outra função que não obstar a partidarização da administração pública. Doações eleitorais advindas de servidores detentores de cargo em comissão estimulariam a nomeação de partidários para funções de confiança, facilitando o uso da máquina pública para fins eleitorais.

Pois bem.

Examinando os autos, não paira dúvida sobre o enquadramento dos doadores na condição de autoridade disposto no art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Conforme exposto na sentença (fl. 83), em consonância com a informação do Município de Machadinho de fl. 62 e o parecer técnico de fls. 64-66, Matheus Rodrigues dos Santos e Miriam do Amaral Witmann Pellizzari eram ocupantes, respectivamente, dos cargos de Secretário Municipal de Agricultura, Abastecimento e Meio Ambiente e Secretário de Administração, ambos cargos comissionados demissíveis ad nutum, que envolvem, pela sua própria natureza, o desempenho de funções de direção ou chefia.

As doações por eles realizadas somaram a quantia de R$ 1.000,00 e foram identificadas na prestação de contas do partido e documentos que a instruem, segundo detalhado no parecer ministerial (fl. 107):

Verificou, como já constatado no Relatório Conclusivo (fls. 64-66), que no ano de 2013, o filiado Matheus Rodrigues dos Santos, que exerceu a função de Secretário Municipal de Agricultura, Abastecimento e Meio Ambiente, efetuou três depósitos (abril, agosto e setembro), totalizando R$ 400,00 em contribuições. A filiada Míriam do Amaral Wittman Pellizzari, que ocupou o cargo de Secretária de Administração, fez três depósitos (abril, novembro e dezembro), perfazendo R$ 600,00. Em relação aos depósitos de Míriam, enquanto o Demonstrativo de Contribuições Recebidas de Filiados (fl. 10), apresenta os depósitos de 05/11/2013 e 27/12/13, em nome de Norberto Salvador, os Livros Diário e Razão atestam que estes depósitos foram realizados pela então Secretária de Administração.

Desse modo, o valor doado à agremiação deverá ser recolhido ao Fundo Partidário, nos termos do art. 28, II, da Resolução TSE n. 21.841/04.

Quanto à suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário, determinada na sentença de primeiro grau pelo prazo de um ano, entendo comportar redução de ofício por esta Corte.

Embora o art. 36, II, da Lei n. 9.096/95 fixe a penalidade no referido patamar para a hipótese de recebimento de recursos de fonte vedada, o Tribunal Superior Eleitoral tem admitido o juízo de proporcionalidade nos moldes em que previsto no art. 37, § 3º, da Lei dos Partidos Políticos, autorizando a sua fixação pelo prazo de um a doze meses.

Nesse sentido, o Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 4879, julgado em 29.8.2013, de relatoria do Min. José de Castro Meira, e o Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 963587, julgado em 30.4.2013, de relatoria do Min. Henrique Neves da Silva.

Noto que, no caso dos autos, o único fundamento para a desaprovação das contas do partido foi o recebimento das doações no total de R$ 1.000,00, quantia, por si só, sem maior relevância econômica. Nesse contexto, entendo adequado e suficiente determinar a suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de um mês.

Vale ainda lembrar que, apesar de a Lei n. 13.165/15, recentemente editada, ter trazido norma alterando o disposto no art. 37 da Lei n. 9.096/95 e, consequentemente, suprimindo a sanção de suspensão de novas quotas do Fundo Partidário na hipótese de desaprovação das contas do partido, tal disposição não se aplica à hipótese dos autos, pois trata-se de fatos ocorridos anteriormente à entrada em vigor da nova lei, não havendo falar em retroatividade.

Tal questão foi recentemente debatida neste Tribunal, na sessão de 08.10.2015, em processo de relatoria do Desembargador Paulo Lessa Franz, no qual se decidiu pela irretroatividade da lei.

Por oportuno, trago o inteiro teor da ementa:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Arts. 4º, caput e 14, inc. II, “n”, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014.

A abertura de conta bancária é obrigatória, independentemente de ter havido movimentação financeira no período. Falha de natureza grave que impede a apresentação de extratos bancários correlatos, os quais são imprescindíveis para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos financeiros, bem como para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira. Irregularidade insuperável, a comprometer, modo substancial, a fiscalização exercida pela Justiça Eleitoral.

As alterações introduzidas pela Lei 13.165/2015, que deram nova redação ao art. 37 da Lei n. 9.096/95, suprimindo a sanção de suspensão de novas cotas do Fundo Partidário, não têm aplicação retroativa aos fatos ocorridos antes da sua vigência.

Redimensionamento do quantum de suspensão de cotas, em homenagem aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Provimento parcial.

(RE 27-43.2015.6.21.0008) (Grifei.)

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, determinando sejam recolhidos R$ 1.000,00 (um mil reais) ao Fundo Partidário, nos termos do art. 28, II, da Resolução TSE n. 21.841/04; e readequando, de ofício, o prazo de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para o período de um mês.

É como voto, Senhor Presidente.