PC - 179125 - Sessão: 22/01/2016 às 11:00

RELATÓRIO

NICELLI BROCARDO PEDROSO, candidata ao cargo de Deputado Estadual pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), prestou contas referentes à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2014.

Após análise preliminar das peças entregues, a Secretaria de Controle Interno e Auditoria deste Tribunal (SCI) emitiu parecer pela intimação da prestadora para realizar diligências quanto às falhas constatadas (fls. 18-19).

Intimada (fl. 25), a candidata peticionou nos autos, defendendo a regularidade das contas. Juntou recibos eleitorais, comprovantes de transferência bancária e notas fiscais (fls. 26-45).

Sobreveio parecer técnico conclusivo pela desaprovação das contas, em virtude da ausência de identificação dos doadores originários de valor equivalente a R$ 12.000,00, apontando-se a necessidade de sua transferência ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 29 da Resolução TSE n. 23.406/14 (fls. 47-49).

Notificada para manifestação, em conformidade com o art. 51 da Resolução TSE n. 23.406/14, a prestadora deixou transcorrer in albis o prazo concedido (fls. 53-54).

Todavia, após o decurso do referido prazo, a candidata apresentou petição, arguindo, em preliminar, a inconstitucionalidade da Resolução TSE n. 23.406/14, por violação aos princípios da anterioridade da lei eleitoral (art. 16 da CF) e segurança jurídica, requerendo a extinção do feito sem julgamento de mérito. Sustentou serem as contas regulares, postulando a sua aprovação (fls. 56-59).

Apesar da sua intempestividade, a petição foi juntada aos autos e encaminhada para exame contábil, tendo em vista a ausência de prejuízo à tramitação do feito (fl. 55).

No relatório de análise da manifestação da candidata, a equipe técnica manteve o seu posicionamento pela desaprovação das contas e recolhimento do montante de R$ 12.000,00 ao Tesouro Nacional, na linha do parecer conclusivo (fls. 61-68).

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral também opinou pela desaprovação das contas e repasse dos recursos sem origem identificada, no valor de R$ 12.000,00, ao Tesouro Nacional, na forma do art. 29 da Resolução TSE n. 23.406/14 (fls. 71-76v.).

A candidata trouxe aos autos documentação emitida pelo Diretório Regional do PTB/RS, com o intuito de comprovar a origem dos recursos provenientes de fontes não identificadas, postulando a aprovação das suas contas ou a sua aprovação com ressalvas, na hipótese de ser considerada intempestiva a juntada dos documentos. Requereu, ainda, fossem prequestionados os princípios da anualidade/anterioridade da lei eleitoral, da razoabilidade e proporcionalidade e o art. 39, § 5º, da Lei n. 9.096/95 (fls. 80-90).

Em seu relatório final de exame, o órgão técnico entendeu persistir sem identificação os doadores originários da quantia de R$ 12.000,00, uma vez que não foram retificadas as prestações de contas da candidata e do Comitê Financeiro Único do PTB no Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE) e apresentados novos recibos eleitorais (fls. 92-93).

Nesse mesmo sentido, opinou a Procuradoria Regional Eleitoral no parecer de fls. 96-98.

É o relatório.

 

VOTO

Eminentes colegas:

NICELLI BROCARDO PEDROSO apresentou sua prestação de contas relativa à arrecadação e ao dispêndio de valores durante a campanha ao pleito de 2014.

Em suas manifestações, a candidata requereu, em sede preliminar, a extinção do feito sem julgamento de mérito, ao argumento de que a Resolução TSE n. 23.406, publicada em fevereiro de 2014, ou seja, menos de 01 (um) ano antes das eleições, não poderia ser aplicada ao pleito de 2014 por força dos princípios da anterioridade da lei eleitoral (art. 16 da CF), segurança jurídica, razoabilidade e proporcionalidade. Consequentemente, seria inconstitucional a exigência de identificação dos doadores originários de valores recebidos durante a campanha, prevista no art. 26, § 3º, da mencionada resolução, inconsistência que embasou o parecer técnico pela desaprovação da contabilidade.

A tese, contudo, não merece acolhida.

A obrigatoriedade de declarar o doador originário nas contas de campanha não constitui inovação legislativa, tendo sido analisada por este Tribunal quando do julgamento das prestações de contas relativas ao pleito de 2010, diante das regras contidas no art. 14, §§ 1º, inc. I, e 3º, da Resolução TSE n. 23.217/10, que estabeleciam o dever de identificação da fonte doadora, in verbis:

Art. 14. Os recursos destinados às campanhas eleitorais, respeitados os limites previstos nesta resolução, são os seguintes:

[…]

§ 1º Em ano eleitoral, os partidos políticos poderão aplicar ou distribuir pelas diversas eleições os recursos financeiros recebidos de pessoas físicas e jurídicas, devendo, obrigatoriamente:

I – discriminar a origem e a destinação dos recursos repassados a candidatos e a comitês financeiros;

[…]

§ 3º Os partidos deverão manter conta bancária e contábil específicas, de forma a permitir o controle da origem e destinação dos recursos pela Justiça Eleitoral (Lei n. 9.096, arts. 33, 34 e 39, § 5º). (Grifei.)

Percebe-se, portanto, que a norma atinente à identificação dos doadores originários constante na Resolução TSE n. 23.406/14 apenas reproduziu regramento já existente, de modo que, não tendo havido inovação na ordem jurídica, inviável reconhecer a alegada ofensa aos princípios da anterioridade da lei eleitoral (art. 16 da CF), segurança jurídica, proporcionalidade ou razoabilidade.

A propósito, a incidência da Resolução TSE n. 23.406/14 nos processos de prestação de contas referentes à eleições de 2014 foi objeto de apreciação por esta Corte, quando do julgamento das Prestações de Contas n. 2453-86 e n. 1976-63, na sessão de 26.5.2014, ambas de relatoria do Des. Luiz Felipe Brasil Santos, restando superada a aludida inconstitucionalidade.

Com essas razões, rejeito a prefacial arguida pela candidata e passo a examinar o mérito das contas.

A unidade técnica deste Tribunal emitiu parecer conclusivo pela desaprovação das contas, com base na falta de identificação dos doadores originários de receita equivalente a R$ 12.000,00, a qual foi declarada como doação recebida do Comitê Financeiro Único do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), constando, como doador originário, o Diretório Estadual do mesmo partido, de acordo com os recibos eleitorais de fls. 29, 33-34 e 40-41.

A falha é grave, na medida em que contraria frontalmente o disposto no § 3º do art. 26 da Resolução TSE n. 23.406/14:

Art. 26

As doações entre partidos políticos, comitês financeiros e candidatos deverão ser realizadas mediante recibo eleitoral e não estarão sujeitas aos limites impostos nos incisos I e II do art. 25.

[...]

§ 3º As doações referidas no caput devem identificar o CPF ou CNPJ do doador originário, devendo ser emitido o respectivo recibo eleitoral para cada doação. (Grifei.)

Consequentemente, o montante recebido pela candidata, sem a identificação dos doadores originários – pessoas físicas ou jurídicas e seus respectivos números de CPF ou CNPJ – no Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE) e nos recibos eleitorais, caracteriza a receita como proveniente de origem não identificada, que deve ser transferida ao Tesouro Nacional, conforme dispõe o art. 29, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.406/14:

Art. 29 – Os recursos de origem não identificada não poderão ser utilizados pelos candidatos, partidos políticos e comitês financeiros e deverão ser transferidos ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), tão logo seja constatada a impossibilidade de identificação, observando-se o prazo de até 5 dias após o trânsito em julgado da decisão que julgar as contas de campanha.

§ 1º A falta de identificação do doador e/ou a informação de números de inscrição inválidos no CPF ou no CNPJ caracterizam o recurso como de origem não identificada.

[…].

Este Tribunal, ao julgar a PC n. 1698-62, de minha relatoria, na sessão de 3.12.2014, firmou entendimento nesse sentido, segundo a ementa abaixo transcrita:

Prestação de contas. Candidato. Arts. 20, I, 26, § 3º e 29, todos da Resolução TSE n. 23.406/14. Eleições 2014.

Preliminar afastada. É intempestiva a juntada de documentos no dia do julgamento da prestação. Indeferimento do pedido. Oportunizado ao candidato os prazos para manifestação dispostos na Resolução TSE n. 23.406/14, em observância ao devido processo legal. Inviável o tratamento diferenciado, violando o princípio da isonomia entre os demais prestadores.

Persistência de irregularidade insanável, ainda que concedida mais de uma oportunidade para retificação dos dados informados. Arrecadação de recursos de origem não identificada. Valores recebidos mediante doações realizadas pelo comitê financeiro onde consta como doador originário o diretório estadual partidário.

Necessidade da identificação da pessoa física da qual realmente procede o valor, ainda que o recurso seja proveniente de contribuição de filiado, já que a verba, quando repassada pelo partido político às campanhas eleitorais, assume a condição de doação. Previsão normativa determinando que o prestador indique o CPF ou CNPJ do doador originário dos repasses realizados por partidos, comitês e campanhas de outros candidatos.

Inviável condicionar o exame das contas de candidato à análise da prestação de contas partidária. É imprescindível a consignação da real fonte de financiamento de campanha e seu devido registro no Sistema de Prestação de Contas – SPCE, devendo o candidato declarar o nome do responsável pelo recurso repassado pelo partido ou comitê e empregado na campanha.

Ausente a discriminação do doador originário, não há como se aferir a legitimidade do repasse, devendo o recurso de origem não identificada ser transferido ao Tesouro Nacional.

Desaprova-se a prestação quando apresentada de forma a impossibilitar a fiscalização das fontes de recursos de campanha, comprometendo a sua transparência.

Desaprovação. (Grifei.)

Ao contrário do que sugeriu a candidata nas petições de fls. 56-59 e 80-83, o exame da prestação de contas do Diretório Estadual do PTB, relativa ao exercício financeiro de 2013, ou da documentação por ele emitida, contendo listagem de filiados que realizaram contribuições ao partido, não supre o procedimento exigido para a identificação dos doadores originários dos valores recebidos, o qual deve ser uniforme e transparente ao longo de toda a cadeia de doações para que se possa identificar as reais fontes de financiamento de campanha.

A exigência de identificação dos doadores originários não restringe ou contraria o disposto no art. 39, § 5º, da Lei n. 9.096/95, o qual apenas autoriza que, em ano eleitoral, os partidos políticos apliquem ou distribuam, nas diversas eleições, recursos financeiros recebidos de pessoas físicas e jurídicas, desde que observados os limites e as vedações previstas nos arts. 23, 24 e 81, § 1º, da mencionada lei.

Vale ainda lembrar que, apesar de a Lei n. 13.165/15 ter trazido norma que dispensa a identificação do doador originário, este Tribunal, na sessão do dia 20.10.2015, em processo da relatoria do Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, firmou entendimento no sentido de sua irretroatividade para alcançar situações pretéritas.

Por oportuno, trago o inteiro teor da ementa:

Prestação de contas de candidato. Arrecadação e dispêndio de recursos de campanha. Resolução TSE n. 23.406/14. Eleições 2014. Arrecadação de recursos sem a emissão de recibo eleitoral; despesas com combustível sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos ou publicidade com carro de som; divergências e inconsistências entre os dados dos fornecedores lançados na prestação de contas e as informações constantes na base de dados da Receita Federal; pagamentos em espécie sem a constituição do Fundo de Caixa; pagamento de despesa sem que o valor tivesse transitado na conta de campanha; inconsistência na identificação de doador originário. Conjunto de falhas que comprometem a transparência e a regularidade da contabilidade apresentada.

Entendimento deste Tribunal, no sentido da não retroatividade das novas regras estabelecidas pela Lei n. 13.165/15, permanecendo hígida a eficácia dos dispositivos da Resolução TSE n. 23.406/14.

A ausência de discriminação do doador originário impossibilita a fiscalização das reais fontes de financiamento da campanha eleitoral, devendo o recurso de origem não identificada ser transferido ao Tesouro Nacional. Desaprovação.

(PC n. 2066-71.2014.6.21.0000). (Grifei.)

Para finalizar, noto que a importância de R$ 12.000,00 é economicamente expressiva e foi efetivamente utilizada pela candidata, que, muito embora tenha sido notificada em duas oportunidades, deixou de retificar os dados consignados em sua prestação de contas e apresentar recibos eleitorais com os dados dos doadores originários da referida quantia.

Diante do exposto, afastada a preliminar suscitada, VOTO pela desaprovação da prestação de contas de NICELLI BROCARDO PEDROSO e determino que a candidata efetue o recolhimento do valor de R$ 12.000,00 (doze mil reais) ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), no prazo de até cinco dias após o trânsito em julgado da presente decisão, com fundamento no art. 54, inc. III c/c o art. 29, caput, ambos da Resolução TSE n. 23.406/14, anotando-se esta determinação para que o valor seja transferido ao Tesouro Nacional uma única vez, evitando-se que seja repetida a ordem de recolhimento da mesma quantia, por fato idêntico, em outros autos, nos termos da fundamentação.

É como voto, Senhor Presidente.