PET - 6919 - Sessão: 26/08/2015 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de ação declaratória de justa causa para desfiliação partidária ajuizada por SÉRGIO ZENBRUSKI, vereador de Nova Prata, contra o PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO – PSB DE NOVA PRATA, por alegada mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário e grave discriminação pessoal, situações que, nos termos do artigo 1º da Resolução TSE n. 22.610/07, autorizam o mandatário a desfiliar-se sem a perda do cargo eletivo para o partido ao qual é filiado.

Na inicial, o requerente afirma que foi eleito em 2012 para o cargo de vereador pelo PSB junto à Câmara de Vereadores de Nova Prata e que, desde o ano de 2009, participava da direção partidária exercendo o cargo de primeiro-secretário de finanças do PSB. Alega que, no ano de 2014, descobriu, através de consulta à internet, que havia sido destituído do cargo que ocupava na direção executiva, pois o partido havia realizado uma nova eleição da diretoria sem seguir as regras definidas no estatuto do PSB e no seu regimento interno. Assevera que, após as eleições municipais de 2012, o PSB de Nova Prata entrou em uma crise de identidade ideológica, mesmo com a vitória do candidato a prefeito pelo PSB, e que a ruptura de ideologia culminou com o seu isolamento dentro do partido, pois não tem nenhuma possibilidade de participar dos atos decisórios e deliberativos, o que constitui justa causa para a desfiliação sem a perda do cargo eletivo. Além disso, sustenta que a atual presidente do PSB recusou-se a receber uma notificação extrajudicial para exibição de documentos que comprovariam os fatos alegados na presente ação. Sustenta que tais circunstâncias demonstram a má-fé do partido, a grave discriminação pessoal e a prática de reiterados atos de desvio do programa, do estatuto e do regimento interno da agremiação (fls. 02-13).

A ação foi ajuizada com pedido de antecipação de tutela, a fim de que, no início da lide, fosse deferida a desfiliação partidária do requerente sem a perda do cargo de vereador, pleito que restou indeferido, com a determinação de citação do partido para oferecer resposta (fl. 60 e verso).

Intimado, o Partido Socialista Brasileiro de Nova Prata, por meio de sua comissão executiva, ofereceu resposta sustentando que o autor da ação está querendo criar artificialmente uma situação que não existe para migrar para outra agremiação partidária. Alega que o mero inconformismo com os mecanismos internos de funcionamento partidário e dissabores de relacionamento não configuram justa causa para a desfiliação. Afirma que, para configurar justa causa, necessária prova robusta da segregação injustificável e individualizada que torne insustentável a permanência do mandatário na agremiação, sendo insuficientes os desentendimentos decorrentes do choque de opiniões ou de perda de representatividade no âmbito interno do partido. Assevera que convocou todos os seus filiados para participarem do congresso renovatório de seus diretórios e respectivas executivas municipais, e que o requerente não foi destituído do cargo que ocupava na direção partidária. O que ocorreu foi o término de seu mandato e seu nome não compôs a nova executiva. Aponta que o autor se autoexcluiu de participar das atividades partidárias por discordar da gestão atual da Secretária de Obras, talvez porque almejasse a recondução ao cargo, fazendo inclusive manifestações pela imprensa escrita. Requereu a improcedência da ação e juntou documentos (fls. 69-106 e 118-155 - originais).

Os autos foram remetidos ao Ministério Público Eleitoral, que se manifestou pelo prosseguimento do feito, com a instrução probatória (fls. 108-109).

Por despacho, foi determinada a oitiva de testemunhas mediante delegação ao Juízo da 75ª Zona Eleitoral de Nova Prata (fl. 157).

A audiência foi realizada, oportunidade em que foram ouvidas seis testemunhas e juntados aos autos cópias de atas de sessões da Câmara de Vereadores de Nova Prata e outros documentos, providência contra a qual o requerente ofereceu impugnação que foi registrada em ata (fls. 162-163).

Retornados os autos do juízo delegado, foi acolhida a impugnação contra a juntada dos novos documentos e determinado o seu desentranhamento, em virtude da preclusão para a juntada e da ausência de demonstração da necessidade da prova (fl. 218 e verso).

Encerrada a instrução, as partes ofereceram alegações finais (fls. 222-223 e 225-235).

O Ministério Público Eleitoral manifestou-se pela improcedência do pedido (fls. 237-241).

É o relatório.

 

VOTOS

Dr. Leonardo Tricot Saldanha:

O § 1º do art. 1º da Resolução TSE n. 22.610/2007 prevê quatro hipóteses que autorizam o titular de cargo eletivo a se desfiliar do partido político sem a perda do mandato:

Art. 1º - O partido político interessado pode pedir, perante a Justiça Eleitoral, a decretação da perda de cargo eletivo em decorrência de desfiliação partidária sem justa causa.

§ 1º - Considera-se justa causa:

I) incorporação ou fusão do partido;

II) criação de novo partido;

III) mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário;

IV) grave discriminação pessoal.

No caso dos autos, SÉRGIO ZENBRUSKI, eleito vereador de Nova Prata pelo PSB nas eleições municipais de 2012, pretende a sua desfiliação pelas justificantes previstas nos incisos III e IV, relativas à mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário e à grave discriminação pessoal, respectivamente.

A mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário estaria demonstrada em virtude de uma crise ideológica do PSB de Nova Prata, que teria culminado com a exoneração de filiados de cargos em comissão em concomitância com a nomeação de opositores do partido para assumir cargos junto à administração municipal, por determinação do prefeito de Nova Prata, e na alteração do destino de recursos públicos obtidos por meio de uma emenda parlamentar, autoria de Sérgio Zenbruski, mesmo após ter sido divulgado o local onde os recursos seriam investidos.

Entretanto, não obstante a insurgência do requerente, as circunstâncias relatadas não caracterizam mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário, pois, na esteira da jurisprudência do TSE, para a caracterização da hipótese, é necessário que se demonstre o desvio reiterado de diretriz nacional ou de postura que a legenda historicamente tenha adotado sobre tema de natureza político-social relevante (TSE, Ação Cautelar n. 18578, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE 31.3.2014, pgs. 94-95).

A própria natureza dos cargos em comissão existentes junto ao Executivo, que por excelência são de livre nomeação e exoneração, dá ao chefe do Poder discricionariedade suficiente para que nomeie até mesmo antigos opositores do partido.

Ademais, a formação de alianças políticas é tema complexo que, muitas vezes, desagrada à sociedade tanto nos aspectos locais, quanto em âmbito nacional e, normalmente, é justificada pelo argumento da necessidade de governabilidade.

A nomeação de um antagonista para assumir cargo em comissão, ou a exoneração de um correligionário, não pode ser considerada mudança substancial, visto que em nada modifica os preceitos norteadores do partido.

Tampouco os autos dão conta de que o chamamento de opositores para assunção de cargos junto ao Executivo tenha acontecido em massa, mas sim em casos isolados, não se evidenciando a mudança substancial a que se refere a Resolução TSE n. 22.610/07, que é aquela capaz de fazer com que os filiados deixem de se identificar com a sigla partidária.

De igual forma, a insatisfação do requerente quanto à mudança de destinação de recursos, originariamente destacados para contemplar determinada localidade do município, não dá azo à alegação de desvio do programa ou de grave discriminação. A matéria, em princípio, é afeta à iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo em tema de diretrizes orçamentárias, e de sua atuação enquanto gestor público, sendo certo que eventuais irregularidades na aplicação de recursos podem e devem ser examinadas pelos órgãos de controle quando do julgamento da prestação de contas do governo.

A grave discriminação pessoal, por sua vez, estaria consubstanciada numa série de fatos que demonstrariam, além de um clima de animosidade, a existência de alijamento partidário contra o requerente Sérgio Zenbruski.

Ao prever a grave discriminação pessoal como justa causa para a desfiliação partidária, o Tribunal Superior Eleitoral estabeleceu uma hipótese de conceito aberto, relegando para o julgador a apreciação, diante do caso concreto, da existência, ou não, de discriminação grave e sujeita à desfiliação com manutenção do cargo eletivo.

A análise é casuística e merece aplicação do art. 335 do atual CPC (reproduzido no art. 375 do Novo CPC, Lei n. 13.105/15): Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial.

Etimologicamente, a discriminação pode ser associada à ideia de diferenciar, discernir, distinguir. Não obstante, também apresenta a acepção que aponta para o tratamento desigual ou injusto, com base em preconceitos de alguma ordem.

Segundo o TSE, a discriminação pessoal que caracteriza justa causa para desfiliação partidária exige a demonstração de fatos certos e determinados que tenham o condão de afastar o mandatário do convívio da agremiação ou revelem situações claras de desprestígio ou perseguição (TSE, AC n. 18578, antes referido).

Para fins de justa causa, a grave discriminação pessoal não deve ser confundida com o afeto ou simpatia natural que determinado filiado possa deixar de ter perante os correligionários e a direção partidária. A previsão normativa dispõe sobre a discriminação grave. Deve ela ser gratuita, injustificada, movida por sentimentos vis e menores que não aproveitariam ao próprio partido, mas a outros interesses, muitas vezes de difícil demonstração.

Sob esse prisma e considerados esses aspectos, importa aferir, do contexto dos autos, a demonstração de grave discriminação pessoal contra o vereador Sérgio Zenbruski.

De acordo com o peticionante, em junho do ano passado, a direção partidária do PSB de Nova Prata marcou um congresso municipal para escolha de novas composições do diretório municipal e da comissão executiva municipal. A convenção foi organizada pela presidente do partido, Clarice Chimento Minozzo, que assinou um documento, denominado de Edital de Convocação, a fim de dar ciência aos filiados de que o ato aconteceria (fls. 102, 150 e 151). O edital foi publicado nos murais da prefeitura municipal e do cartório eleitoral.

Na data marcada, um domingo, às 9 horas, a convenção, que foi realizada no subsolo da Casa de Cultura de Nova Prata, ocorreu normalmente, com a eleição da nova direção partidária. Na oportunidade, o outro vereador eleito pelo PSB, Sebastião Costa Mamede, se fez presente e foi escolhido  líder de bancada do partido na Câmara de Vereadores.

O requerente Sérgio Zenbruski alega que, mesmo sendo um dos dois vereadores eleitos pelo PSB nas eleições de 2012, e ocupar, até então, o cargo de secretário de finanças do partido, não foi avisado de que a convenção aconteceria. Além disso, disse que ficou sabendo do fato apenas depois de ocorrido, por meio da internet, quando verificou que já não ocupava mais cargo algum na composição partidária. Afirmou que o líder de bancada deve ser escolhido dentre os mandatários que representam o partido junto ao Poder Legislativo, mas que, aproveitando-se de sua ausência, o partido elegeu o outro vereador do PSB para liderar a legenda. Por fim, referiu que o estatuto e o regulamento do partido não foram observados, pois o edital de convocação deveria ter sido publicado na imprensa escrita de Nova Prata.

Quando tomou ciência da situação, Sérgio solicitou que a presidente do partido, Clarice Chimento Minozzo, fornecesse a ata da convenção partidária, a lista de presentes e outros documentos, o que foi negado. Interpelada extrajudicialmente, Clarice recusou-se a receber a notificação ou fornecer a documentação solicitada, conforme certificado à fl. 22 pelo oficial escrevente do tabelionato de notas e protestos.

A partir disso, Sérgio viu-se excluído de participar das tomadas de decisões junto ao partido, tendo inclusive tentado conversar com o prefeito municipal, que é filiado ao PSB, mas que se recusa a recebê-lo na prefeitura.

Todos esses fatos demonstrariam o afastamento do requerente da vida partidária, com a exclusão de reuniões e decisões da agremiação, bem como a animosidade pessoal que caracterizariam a justa causa para a desfiliação.

Na resposta das fls. 69-74, o Partido Socialista Brasileiro alega que: a) a convocação para a convenção partidária ocorreu normalmente, mediante publicação nos órgãos públicos e, também, de forma verbal; b) foi o requerente quem não quis receber a documentação solicitada na notificação extrajudicial; c) o líder de bancada foi eleito pelos próprios vereadores do partido; e d) o autor se afastou da participação nas atividades partidárias por discordar da atual gestão da Secretaria de Obras municipal, uma vez que não foi reconduzido ao cargo de secretário.

Por certo, a questão relativa a não observância das regras previstas pelo PSB para a convocação dos filiados no estatuto ou regulamento do partido, no que pertine à pretensão de anulação da convenção, é matéria atinente à competência da Justiça comum Estadual, a quem compete resolver judicialmente as desavenças partidárias, as deliberações de diretórios de partidos políticos, em especial casos de eleição de dirigentes de diretórios.

Nesta ação, compete apenas verificar se a questão caracteriza grave discriminação e, com efeito, o Estatuto do PSB foi juntado aos autos, depreendendo-se de sua leitura a necessidade de publicação da convocação dos filiados por meio da imprensa escrita local.

O art. 27, letra f, do estatuto, prevê que a convocação para as deliberações partidárias deve ser publicada na imprensa escrita, nos municípios em que existente (fl. 41). De igual modo, o art. 10 do Regimento Interno do PSB dispõe sobre a publicação de convocações de filiados no jornal de maior circulação da respectiva jurisdição (fl. 54). Some-se a esses fatos o documento da fl. 58, ao qual foi acostado um exemplar do “Jornal Popular” que, segundo informação do expediente, tem publicação semanal que abrange o Município de Nova Prata.

Em momento algum o partido contestou a existência do jornal local apontado pelo requerente, insurgiu-se contra o alegado dever de publicar os atos partidários, nem tampouco justificou a falta de publicação da convocação dos filiados na imprensa, apenas limitando-se a afirmar que a publicidade do ato foi realizada mediante publicação nos murais da Prefeitura Municipal e do cartório eleitoral.

Considerado sob o aspecto da grave discriminação pessoal, elemento que busca identificar reflexos de segregação do mandatário eleito no âmbito intrapartidário, com ações que prejudiquem a militância e tornem inviável a convivência dentro do partido, tenho que a ausência de divulgação sobre a realização de importante ato partidário relativo ao congresso para escolha da nova composição executiva, aliada à falta de participação na escolha do líder de bancada e à exclusão da nova composição partidária, não são meros dissabores cotidianos.

Não parece razoável considerar, como entende o órgão partidário, que seja suficiente, para a comunicação do congresso a um dos dois representantes do partido junto à Câmara, a mera afixação de edital de convocação na prefeitura e no cartório eleitoral.

Mesmo não havendo disposição expressa nas normas que regulamentam a legenda, era, no mínimo, dever de lealdade da agremiação fazer uma comunicação direta de que o congresso aconteceria.

Ademais, diante da ausência de provas da ampla divulgação na internet e nas redes sociais afirmada pelo partido e suas testemunhas, pois nenhuma prova de publicação diferente dos editais afixados nos murais foi juntada aos autos, não parece ser desarrazoada a ideia de que o requerente foi excluído do ato partidário, pois o partido não demonstrou sequer minimamente que ao requerente foi dado conhecimento de que uma nova direção executiva do partido seria eleita, ou que pretendia eleger o novo líder de bancada no dia do congresso partidário, deliberação que sequer consta do edital de convocação assinado pela presidente do partido.

Apesar da afirmativa do PSB, no sentido de que o ato foi divulgado mediante publicação no mural do cartório eleitoral, no átrio da Prefeitura Municipal de Nova Prata e, também, verbalmente, pois trata-se de município de pequeno porte, sobressai dos autos que a realização da convenção, para o requerente, foi sim sigilosa, tendo sido colhido de surpresa após a consumação dos fatos.

Mais surpreendente ainda é o fato de o vereador ter de recorrer a uma interpelação extrajudicial para ter acesso às atas de deliberação dos atos partidários do seu próprio partido, e a notificação ser recusada pela presidente da agremiação.

De ressaltar que, apesar de o autor não ter pedido que fosse determinada, durante a instrução, a intimação do partido para que trouxesse a documentação ao feito, a providência tomada espontaneamente viria ao encontro da boa-fé com que o partido entende agir ao afirmar que é o requerente que se auto exclui dos autos partidários. Por conta disso, não é crível a versão referida na resposta, no sentido de que foi Sérgio quem se recusou a receber a documentação relativa às atas partidárias.

De notar-se que todos os integrantes do PSB ouvidos em juízo, os quais foram inclusive eleitos para assumir cargos na nova composição partidária quando da realização do congresso, embora uníssonos no sentido de que não segregaram o autor dentro do partido, em momento algum disseram ter comentado sobre a realização da convenção partidária com Sérgio, tendo se limitado a dizer que o meio de ele descobrir que o ato aconteceria era averiguar nos murais da prefeitura e do cartório eleitoral.

É inegavelmente contraditória a versão de João Guerino Rui, eleito na convenção para o cargo de secretário do PSB, no sentido de que, por diversas vezes, convidou Sérgio para permanecer mais junto do partido, participar das atividades, considerando estranha a colocação de que ele estaria sendo discriminado (fl. 192), aliada a sua afirmativa de que a convocação do congresso se deu por edital (fl. 193). Aliás, em seu depoimento, João Guerino refere que sequer tomou conhecimento da convocação pelo edital, pois soube do fato, como haveria de se esperar, a partir de uma conversa junto com colegas que fazem parte do PSB (fl. 193). Indagado, João inclusive assumiu não ter certeza de que Sérgio soubesse da data do congresso, mas que, no evento, o outro vereador eleito pelo PSB, Sebastião da Costa Mamede, estava presente (fls. 192-199).

Luciane Maria Bristot, eleita no congresso para o cargo de tesoureira, de igual modo, apesar de sustentar não haver discriminação partidária contra Sérgio, também afirmou que a forma de divulgação da reunião se deu pela afixação de editais na prefeitura e no cartório eleitoral.

Dirceu Borsatto, integrante da diretoria do PSB, por sua vez, disse que a forma para tomar conhecimento da reunião se deu pela publicação do edital na prefeitura municipal.

Lidos os depoimentos, causa estranheza que, a par da negativa de exclusão do requerente do ato partidário, os integrantes da agremiação assumam como suficiente, para a tomada de conhecimento do ato ao vereador que representa o partido junto ao Poder Legislativo local, a mera afixação de edital nos órgãos públicos, a mesma forma de comunicação a quaisquer dos filiados do partido que não detêm mandato eletivo e que não ocupam cargo na composição partidária. Ressalte-se, conforme antes referido, que Sérgio era o secretário de finanças do PSB e que, a despeito disso, não sabia que o congresso aconteceria.

Mais forçosa ainda a situação diante da eleição de Sebastião Costa Mamede, o outro vereador eleito pelo PSB, para a posição de líder de bancada, pois a votação foi realizada, na ausência de Sérgio, pelos filiados presentes no congresso, conforme afirmado pela testemunha João Guerino Rui.

A versão apresentada por Sérgio, de que a eleição para a nova direção executiva municipal foi realizada de forma a afastar a sua participação das deliberações, mostra-se coerente se consideradas as alegações do próprio partido, no sentido de que a realização do congresso teria sido comentada verbalmente, "pois Nova Prata é um município de pequeno porte". De acordo com os depoimentos dos integrantes da agremiação, Sérgio tomaria conhecimento da realização do congresso se conferisse os murais do cartório eleitoral ou da prefeitura.

Parece, de fato, que o congresso foi restrito, ao menos para Sérgio, que, após as deliberações, viu-se não apenas fora da composição partidária, mas com dificuldade de acesso às decisões do partido, que sequer com notificação extrajudicial lhe foram apresentadas.

Some-se a isso o fato de os poucos filiados presentes - cerca de 30 pessoas, conforme referiu o depoente Dirceu José Borsatto - terem escolhido o líder de bancada, quando é cediço que a prática parlamentar é de que a escolha dos líderes de bancada seja feita pelos parlamentares da legenda, fato que inclusive foi informado pelo partido na resposta juntada aos autos.

Convergindo para a alegada discriminação, os testemunhos de Vitorino Anselmo Dall Agnol (fls. 173-182) e de Vitor Antonio Pletsch (fls. 183-191) confirmaram a postura do partido em excluir o vereador dos atos partidários.

Vitorino Anselmo Dall Agnol, o qual disse ter sido vice-presidente do PSB, relatou que o costume partidário era a comunicação das convenções por telefonema aos integrantes da executiva, e que os membros do partido não se atêm a editais para tomar ciência dos atos partidários.

Vitor Antonio Pletsch, testemunha que afirmou ter exercido o cargo de prefeito municipal pelo PSB por diversas vezes (fls. 183-191), também disse que a prática do partido era avisar os correligionários das reuniões partidárias por meio de telefone. Além disso, referiu que poucas pessoas foram avisadas, e que Sérgio Zenbruski, de fato, não foi comunicado.

Com efeito, a prova testemunhal não convence de que a realização da reunião à revelia de Sérgio foi despropositada e ao acaso, pois as regras da experiência demonstram que, sendo um dos dois mandatários eleitos pelo PSB para o cargo de vereador, sua presença nos atos da legenda normalmente não seria tomada como circunstância de menor importância, salvo em função de discriminação.

De forma intencional ou não, a oportunidade foi aproveitada para impedir ou dificultar a pretensão de ser designado como líder de bancada, deliberação que sequer consta do edital de convocação publicado na prefeitura e no cartório eleitoral.

Para além disso, o requerente sequer foi comunicado do fato de não ocupar mais um cargo na direção partidária.

A prova evidencia que o partido, efetivamente, excluiu Sérgio dos atos partidários, aí incluídos os projetos e ideais políticos da legenda, tomando uma série de atitudes concretas que, somadas e analisadas em conjunto, culminaram não somente na perda de espaço político e isolamento junto à bancada, mas na impossibilidade de convivência com os membros da agremiação em função do alijamento operado pelo partido.

A jurisprudência desta Corte Eleitoral é iterativa no sentido de que divergências subjetivas intrapartidárias, normais no âmbito de associações e agremiações de qualquer espécie, não configuram grave discriminação pessoal, porquanto para a caracterização da grave discriminação descrita na legislação, exige-se a prova robusta da segregação pessoal capaz de tolher a atividade no cargo, sendo insuficientes os naturais desentendimentos decorrentes do choque de opiniões ou de perda de distinção no âmbito partidário (Petição n. 34674, Rel. Dr. Artur dos Santos e Almeida, DEJERS 24.5.2012).

Aliás, os precedentes sobre a matéria são recorrentes ao afirmar que o embate político e o choque de opiniões são inerentes ao funcionamento interno das agremiações partidárias, circunstâncias que possibilitam o crescimento e o fortalecimento da democracia.

Mas os autos não evidenciam a existência de debates internos, nos quais correntes ideológicas, capitaneadas por diferentes filiados, buscam fazer com que o partido se oriente para essa ou aquela direção, tome essa ou aquela decisão.

A prova revela que o partido, manifestamente, pôs o peticionante à margem dos atos partidários, sendo que a falta de comunicação sobre a realização do congresso, a recusa em alcançar os documentos solicitados na notificação extrajudicial e a forma de eleição do líder da bancada, decidida pelos filiados e não pelos vereadores eleitos, denotam o grau de exclusão do peticionante da vida partidária, pois manifesto o desinteresse na sua manutenção nos quadros do PSB e evidente a falta de apoio de seus correligionários, sendo cabível, no caso, a declaração da justa causa para a desfiliação.

A permanência do requerente no Partido Socialista Brasileiro mostra-se, por fim, inviável em razão da animosidade e acentuada desconsideração promovidas pela presidente municipal da grei, conforme sobressai da recusa em ao menos apresentar ao vereador as atas e deliberações do partido, bem como em função da realização de eleição para líder de bancada entre os filiados, sem a presença do vereador Sérgio Zenbruski, contrariando a afirmativa do próprio PSB (fls. 69-74), no sentido de que o líder de bancada na Câmara de Vereadores deve ser escolhido dentre os vereadores eleitos.

Mostra-se presente o requisito jurisprudencial da discriminação gratuita, injustificada, que não aproveita ao próprio partido, pois a inteligência da Res. TSE n. 22.610/07 demonstra que se tem por grave discriminação a atitude específica de segregar o mandatário, de negar oportunidades, de impedir acesso. O termo discriminação designa a materialização, no plano das relações partidárias, de atitudes arbitrárias, comissivas ou omissivas, contra o filiado que detém o cargo eletivo.

É o caso dos autos, pois os fatos resultaram em tratamento desigual e injusto contra Sérgio, demonstrando que a sua permanência no partido não se sustenta e nem deve ser exigível, uma vez que foi, do contexto, posto de lado pela sua legenda partidária.

Por tudo o que dos autos consta, resta demonstrada a discriminação, a partir de fatos certos e determinados que têm o condão de afastar o mandatário do convívio da agremiação e revelam situação clara de desprestígio e alijamento partidário, com gravidade suficiente a ponto de constituir motivo hábil a embasar a desfiliação partidária. Nesse sentido, a jurisprudência:

Ação de perda de cargo eletivo. Deputado estadual. Desfiliação partidária.

(...)

5. A hipótese de discriminação pessoal que caracteriza justa causa para desfiliação exige a demonstração de fatos certos e determinados que tenham o condão de afastar o mandatário do convívio da agremiação ou revelem situações claras de desprestígio ou perseguição.

6. Fatos posteriores à desfiliação não podem ser invocados como motivo justificador do desligamento, pois óbvio que o motivo não pode ser posterior à consequência.

7. Eventual dificuldade ou resistência da agremiação em lançar o ocupante do cargo como candidato em eleições futuras não é fato suficiente para a aferição de grave discriminação pessoal.

(...)

9. Eventuais discordâncias locais sobre o posicionamento da agremiação diante da administração de um único município não caracteriza desvirtuamento do programa ou da diretriz partidária, os quais, dada a natureza e circunscrição do cargo em questão, deveriam ter, no mínimo, caráter estadual. Recursos ordinários desprovidos.

Ação cautelar improcedente, com revogação da liminar concedida, e respectivo agravo regimental julgado prejudicado.

(TSE, Ação Cautelar n. 18578, Acórdão de 13.3.2014, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 31.3.2014, Páginas 94-95.) (Grifei.)

 

Pedido de decretação de perda de cargos eletivos. Pretensão de reaver os cargos de três vereadores que se desligaram da agremiação de origem para filiarem-se, logo após, a partidos diversos.

Superveniente reintegração de edil aos quadros da agremiação autora. Circunstância que torna incompatível a ação com fundamento na Resolução TSE n. 22.610/07. Extinção do feito, sem resolução do mérito, diante da manifesta ausência do interesse de agir e da homologação da desistência da ação com relação ao parlamentar.

Preliminares rejeitadas. Parte inaudível de degravação insignificante diante da extensão dos depoimentos, restando preservado o sentido das declarações. Também a alegação genérica de nulidade na juntada de documentação no curso da instrução processual, sem a demonstração de eventual repercussão negativa à defesa, não enseja a decretação de invalidade do ato praticado. Inocorrência de prejuízo aos direitos das partes.

Não caracterizadas as excludentes arguidas pelos requeridos remanescentes, contidas nos incisos III e IV do § 1º do artigo 1º da precitada resolução.

Imprescindível, para a configuração da mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário, a ocorrência de significativas alterações programáticas e ideológicas no estatuto da agremiação.

Para a caracterização da grave discriminação descrita na legislação, exige-se a prova robusta da segregação pessoal por motivos injustos, não razoáveis ou preconceituosos que tornem insustentável a permanência do mandatário na legenda, sendo insuficientes os naturais desentendimentos decorrentes do choque de opiniões entre correntes divergentes dentro da própria agremiação ou de perda de distinção no âmbito partidário.

Procedência do pedido com relação a estes.

(TRE-RS, Petição n. 29648, Acórdão de 14.6.2012, Relator  DES. FEDERAL CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 104, Data 18.6.2012, Página 03.) ( Grifei.)

 

AÇÃO DE JUSTIFICAÇÃO DE DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA - OCORRÊNCIA DE ALIJAMENTO PARTIDÁRIO E ANIMOSIDADE - HIPÓTESE PREVISTA NO ART. 1º, §1º, IV, DA RESOLUÇÃO TSE N. 22.610/2007 - CITAÇÃO REGULAR - AUSÊNCIA DE DEFESA - CONFISSÃO FICTA - ATOS DISCRIMINATÓRIOS TIDOS COMO VERDADEIROS - JUSTA CAUSA PARA A DESFILIAÇÃO - CONFIGURAÇÃO - PRECEDENTES - PROCEDÊNCIA.

(...) O afastamento do requerente da vida partidária, com a exclusão de reuniões e decisões partidárias, bem como a animosidade pessoal, caracterizam a justa causa para a desfiliação. Pedido julgado procedente. Declaração da existência de justa causa para a desfiliação do requerente (TREMG. Ac. prolatado na Pet 83451, de 23.1.2012, Rel. Juíza Luciana Diniz Nepomuceno - grifou-se)

(TRE_SC, PROCESSO n. 1909, Acórdão n. 30697 de 13.5.2015, Relator RODRIGO BRISIGHELLI SALLES, Publicação: DJE - Diário de JE, Tomo 76, Data 19.5.2015, Páginas 5-6.) ( Grifei.)

Ante o exposto, VOTO pela procedência do pedido e reconheço a existência de justa causa para a desfiliação do vereador Sérgio Zenbruski do Partido Socialista Brasileiro – PSB de Nova Prata.

 

Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja: 

Queria referir que a função e a ideia do legislador, no caso, foi evitar a utilização de um partido visando se eleger e depois passar para outro. Porém, descabe a imposição de que o candidato fique em um partido onde ele não é bem quisto; e, neste caso, ficou bastante clara essa discriminação e o alijamento partidário desse vereador, pois não teve acesso às atas e acabou afastado de todas as decisões do partido. Entendo que não apenas a mudança substancial do desvio do programa partidário, mas a grave discriminação pessoal, inserida no art. 1º da Res. TSE 22.610/07, ficaram muito claras. Fazendo estes adendos, acompanho integralmente e parabenizo o voto do colega.

Dra. Maria de Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez:

Acompanho o relator pelo excelente voto.

Des. Fed. Paulo Afonso Brum Vaz:

O voto do colega, Dr. Leonardo, foi brilhante, excelente voto, ele não foi positivista. Um voto que faz o círculo hermenêutico, trabalha a faticidade muito bem, a fenomenologia, e trabalhou com a tradição, também. Voltou para lembrar que os partidos agiam assim. Fiquei tentado a pensar que Vossa Excelência exercitou a hermenêutica filosófica. Meus cumprimentos.

Quando eu li esse voto, eu estava com o livro do professor da UniRitter Roger Raupp Rios, que escreveu sobre a vedação da discriminação. A vedação da discriminação é uma variante, um viés, do princípio da vedação da isonomia. Cogita-se de uma releitura – que o professor Leonardo fez – do princípio da igualdade a partir da não discriminação. Quer dizer, a proibição de discriminação que veda qualquer tipo de distinção, preferência, exclusão, limitação ou restrição entre pessoas que se encontrem em situações similares, sem motivo razoável ou objetivamente proporcional. Na hipótese, a conduta do partido insulou e distinguiu o candidato, excluindo-o, praticamente, da vida partidária. Essa conduta se revela, pra mim, inconstitucional, por afronta ao princípio isonômico.

O professor Roger dizia que a discriminação pode implicar violação ao princípio isonômico de variadas formas, e segundo ele, o direito antidiferenciação considera ilegítimos tratamentos diferenciados prejudiciais, ou também benéficos, em favor de quem quer que seja, mesmo quando pela via indireta, como no caso de decisões e práticas que, aparentemente neutras, acarretam um impacto desigual a uma determinada pessoa ou grupo de pessoas.

Com estas breves considerações quero dizer que estou de pleno acordo, senhor presidente, com o brilhante voto.

Desa. Liselena Schifino Robles Ribeiro:

Queria ratificar os elogios ao voto do Dr. Leonardo, e acho que será um precedente muito importante este voto. Estou de acordo, também. Pela procedência.

Dr. Hamilton Langaro Dipp:

Cumprimento o Dr. Leonardo pelo brilhante voto. Me parece evidente que houve aqui discriminação, porque a mera escolha da comunicação desse encontro partidário por outros meios, que não aqueles previstos pelo estatuto, já caracteriza, por si, a discriminação. Acompanho.