RC - 1551 - Sessão: 17/06/2015 às 17:00

RELATÓRIO

HERCULANO JACÓ HENRICH interpõe recurso criminal contra a sentença que julgou procedente a denúncia oferecida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, para condená-lo à pena de 02 (dois) anos, 09 (nove) meses e 13 (treze) dias de detenção e 35 (trinta e cinco) dias-multa, por incursão nas sanções do art. 324 da Lei n. 4.737/65 (Código Eleitoral), que prevê o crime de calúnia na propaganda eleitoral, e do art. 325 da Lei n. 4.737/65, que estabelece o delito de difamação na propaganda eleitoral, cumulados, nas duas hipóteses, com o art. 327, II e III, da Lei n. 4.737/65 e com o art. 61, I, do Código Penal, na forma do art. 70 do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos descritos na exordial acusatória (fls. 02-07):

1º FATO:

Nos dias 05 e 06 de outubro de 2012, por volta das 08 horas, na Av. Boa Esperança, em Colorado, RS, o denunciado HERCULANO JACO HENRICH caluniou Lirio Riva, visando fins de propaganda eleitoral, imputando-lhe falsamente fato definido como crime, qual seja, de que nas eleições que Lirio Riva concorreu ao cargo de Prefeito Municipal ele efetuou a compra de votos de eleitores.

Ao agir, o denunciado gravou CD contendo um depoimento seu, no qual ele afirma ter tido uma conversa com a vítima Lirio Riva e permitiu que pessoas, não identificadas no expediente policial, mas ligadas à coligação do candidato Lauro, reproduzissem várias cópias do CD e o distribuíssem no Município de Colorado, nas vésperas da eleição Municipal, ocorrida no dia 07 de outubro de 2012, na qual Lirio Riva era candidato ao cargo de Prefeito do Município de Colorado, contendo, entre outras, as seguintes expressões caluniosas que o denunciado refere no CD como tendo sido ditas pela vítima:

Jacó, eu vou gastar, to me incomodando, vou ter que comprar meus próprios companheiros pra consegui disputar esta eleição. Mas te digo uma coisa, se eu vier a ganhar esta eleição, estas pessoas que eu tive que negociar, favorecer, quatro anos eles vão comer na minha mãozinha, porque não vou dar colher de chá. Sempre, em todas as minhas eleições eu tive que comprar os meus próprios companheiros. (...) Olha Lírio, este negócio de ganhar uma eleição goela abaixo, nem que eu venda uma fazenda, nem que eu venda não-sei-o-que, o senhor não(...) Eu vou ganhá a eleição e estes companheiros que eu tive que comprar, negociá, prá ganhá a eleição, vão comer na minha mãozinha, aqui ó. Vou só ajudar aquelas pessoas que é dez ou doze do grupinho e o resto que se dane.

Revela destacar que várias cópias do referido CD foram distribuídas pelo Município de Colorado, com o intuito de fazer propaganda eleitoral negativa em desfavor da vítima Lirio Riva.

O denunciado praticou o crime de calúnia por meio que facilitou a divulgação, porquanto distribui diversos CDs pelas ruas do Município de Colorado, o que possibilitou que, além da vítima Lirio Riva, várias outras pessoas tomassem conhecimento das calunias.

2º FATO:

Nas mesmas circunstâncias de tempo e local antes descritas, o denunciado HERCULANO JACO HENRICH injuriou Lirio Riva, visando fins de propaganda eleitoral, ofendendo-lhe a dignidade e o decoro, fazendo-o em razão da função pública exercida pela vítima, qual seja, a de Prefeito do Município de Colorado e por meio que facilitou a divulgação da injúria.

Ao agir, o denunciado gravou CD contendo um depoimento seu, no qual ele afirma ter tido uma conversa com a vítima Lirio Riva e permitiu que pessoas, não identificadas no expediente policial, mas ligadas à coligação do candidato Lauro, reproduzissem várias cópias do CD e o distribuíssem no Município de Colorado, nas vésperas da eleição Municipal, ocorrida no dia 07 de outubro de 2012, na qual Lirio Riva era candidato ao cargo de Prefeito do Município de Colorado, contendo, entre outras, as seguintes expressões injuriosas:

Então, veja bem, esta desculpa que não pode trazer uma empresa, ou uma pequena empresa, ou uma microempresa prá Colorado, é mentira seu Lirio (...) não vamo se humilhar por causa de um capricho de um home que ainda ficam gozando da cara dos coloradense. O meu pai, segundo a filha do Lírio, cada quatro ano, tem que tratar aquela tropa de porco.

Revela destacar que várias cópias do referido CD foram distribuídas pelo Município de Colorado, com o intuito de fazer propaganda eleitoral negativa em desfavor da vítima Lirio Riva.

O denunciado praticou o crime de injúria por meio que facilitou a divulgação, porquanto distribui diversos CDs pelas ruas do Município de Colorado, o que possibilitou que, além da vítima Lirio Riva, várias outras pessoas tomassem conhecimento das injúrias. (Grifei.)

Na sentença (fls. 186-191v.), o Magistrado da 109ª Zona Eleitoral – Tapera consignou entender comprovadas a autoria e a materialidade delitivas, e que houve certa confusão na narrativa da denúncia ao mencionar o crime de injúria na propaganda eleitoral. Concluiu que o Ministério Público pretendeu imputar ao réu o crime de difamação, tanto que o dispositivo legal indicado ao final da denúncia é o art. 325 do Código Eleitoral, e que a conduta analisada amolda-se ao crime de difamação e não ao de injúria. Calculada a pena, a sanção privativa de liberdade não foi substituída por restritiva de direitos, em virtude de o réu ser duplamente reincidente em delito doloso e em face das circunstâncias dos crimes. O valor unitário do dia-multa foi estipulado no montante mínimo de 01 (um) salário-mínimo vigente ao tempo do fato, em face de o réu ter afirmado, quando do seu interrogatório, que recebe renda mensal entre 10 e 12 mil reais.

Em suas razões recursais (fls. 223-227), Herculano Jacó Henrich pugna pela sua absolvição, sustentando a negativa de autoria e a ausência de tipicidade. Alega que a prova coligida demonstra não ter sido cometido nenhum fato que possa ser qualificado como crime nem ofensa à reputação da vítima, à sua dignidade ou decoro. Afirma que teve o único objetivo de narrar e esclarecer fatos, ausente o elemento subjetivo do tipo relativo ao dolo de caluniar e difamar, e que não foi identificada a pessoa que realizou a reprodução e distribuição da mídia contendo a mensagem atacada. Assevera que o valor do dia-multa é abusivo, uma vez que percebe renda mensal entre 02 e 03 salários-mínimos e foi condenado ao pagamento de 35 salários-mínimos. Invoca o princípio in dubio pro reo. Junta comprovantes de renda (fls. 229-237).

O Ministério Público Eleitoral, em contrarrazões, postulou a manutenção da sentença (fls. 243-248).

O Procurador Regional Eleitoral opinou pela manutenção da condenação e pela readequação, de ofício, da pena definitiva, devendo ser fixada em 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 03 (três) dias de detenção e 25 (vinte e cinco) dias-multa, sem possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade, com o consequente provimento parcial do recurso em função da redução da pena de multa (fls. 251-258).

É o relatório.

 

 

 

 

VOTO

O recurso criminal é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

Conforme referido no relatório, Herculano Jacó Henrich foi condenado como incurso nas sanções previstas para os crimes de difamação e de calúnia na propaganda eleitoral, em virtude da distribuição, em residências da Cidade de Colorado, na véspera da eleição municipal de 2012, de CDs contendo uma gravação de áudio na qual Herculano faz um discurso contra o candidato à reeleição ao cargo de prefeito, Lírio Riva.

Passo ao exame das razões recursais iniciando pelo crime de difamação na propaganda eleitoral previsto no art. 325 do Código Eleitoral.

Crime de difamação

A mídia contendo a gravação de áudio objeto da acusação está acostada à fl. 04 dos autos, no CD com os dizeres Se gostou passe adiante, e foi transcrita às fls. 12-13. A vítima é o candidato à reeleição ao cargo de prefeito do Município de Colorado, Lírio Riva.

O áudio começa com a identificação do locutor: Aqui quem vos fala é Jacó Heinrich, cidadão coloradense e segue com o motivo da gravação: me acho no direito e obrigação de esclarecer as pessoas o porquê que hoje eu estou votando para o Lauro. Lauro era o candidato opositor de Lírio Riva à eleição ao cargo de prefeito municipal.

No longo discurso, diversas falas desabonatórias são dirigidas à vítima Lírio e sua candidatura à reeleição. De acordo com o juízo a quo, a seguinte passagem foi considerada difamatória:

Então, veja bem, esta desculpa que não pode trazer uma empresa, ou uma pequena empresa, ou uma microempresa pra Colorado, é mentira seu Lirio (...) não vamo se humilhar por causa de um capricho de um home que ainda ficam gozando da cara dos coloradense. O meu pai, segundo a filha do Lírio, cada quatro ano, tem que tratar aquela tropa de porco.

O crime de difamação está previsto no art. 325 do Código Eleitoral:

Art. 325. Difamar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:

Pena – detenção de três meses a um ano, e pagamento de 5 a 30 dias-multa. (Grifei.)

Marino Pazzaglino Filho leciona que, na difamação eleitoral o bem jurídico tutelado é a honra no aspecto objetivo, isto é, a reputação, o conceito, a boa fama, a imagem do indivíduo no grupo social em que convive, não sendo necessário à configuração do crime, que a imputação seja falsa, ao contrário do que ocorre na calúnia (Crimes Eleitorais, Editora Atlas S.A., 2012, p.89-90).

Para configuração do tipo penal, é necessária a ação (imputação do fato ofensivo à reputação do sujeito) e o dolo (vontade consciente), que deve ser específico (difamação com fins de propaganda irregular). Também, como se trata de crime de dano, seu momento consumativo dá-se quando terceiros ficam sabendo da difamação proferida.

Entendo que a gravação constante dos autos tem nítido conteúdo difamatório, e que sua distribuição pela cidade nos dias 05 e 06 de outubro, sexta e sábado anteriores à eleição municipal que ocorreu no dia 07 de outubro, demonstra a finalidade eleitoral com que foi publicada a mensagem.

Além da passagem apontada na sentença, em que o locutor afirma que a filha do candidato à reeleição Lírio teria dito que a vítima, a cada quatro anos, tem que tratar aquela tropa de porco, destaco que também considero caracterizadora de difamação a fala apontada como caluniosa:

Jacó, eu vou gastar, to me incomodando, vou ter que comprar meus próprios companheiros pra consegui disputar esta eleição. Mas te digo uma coisa, se eu vier a ganhar esta eleição, estas pessoas que eu tive que negociar, favorecer, quatro anos eles vão comer na minha mãozinha, porque não vou dar colher de chá. Sempre, em todas as minhas eleições eu tive que comprar os meus próprios companheiros. (...) Olha Lírio, este negócio de ganhar uma eleição goela abaixo, nem que eu venda uma fazenda, nem que eu venda não-sei-o-que, o senhor não (...) Eu vou ganhá a eleição e estes companheiros que eu tive que comprar, negociá, prá ganhá a eleição, vão comer na minha mãozinha, aqui ó. Vou só ajudar aquelas pessoas que é dez ou doze do grupinho e o resto que se dane. (Grifei.)

A materialidade do crime de difamação está comprovada nos documentos das fls. 09 a 13 dos autos, nos quais constam o boletim de ocorrência policial registrado pela vítima, Lírio Riva, a mídia contendo a gravação e a respectiva degravação. A prova oral colhida em juízo também demonstra, de forma suficiente, que a mídia foi distribuída aos moradores da cidade de Colorado, notadamente pelos depoimentos prestados por Gentil Paulino Putrich, Noimar Carlos de Oliveira, Ivan Cesar de Bortoli e Eumar Luiz Rizzardi, consoante refere a decisão recorrida (fl. 188-188v.):

A testemunha Gentil Paulino Putrich referiu que, às 04h do sábado que antecedeu às eleições, viu um carro parado em frente à sua residência, tendo alguém jogado um CD para dentro de seu pátio. No CD estava escrito “se gostou, mande para frente”. Ouviu o CD, que continha uma gravação de voz, que identificou como sendo do réu Jacó, no qual eram tecidas críticas em relação ao então candidato a Prefeito Lirio Riva. Referiu que, no dia seguinte, entregou o CD para o Lirio. Falou não ter conseguido identificar quem jogou o CD no seu pátio. Negou que tivesse conversado com Jacó depois desse fato. Afirmou não ter participado de nenhuma campanha na referida eleição, que não tem nada contra o réu e que não sabe se mais pessoas receberam o CD. Destacou que a gravação continha muitas críticas ao candidato Lirio, mas que não o ouviu integralmente.

O informante Noimar Carlos de Oliveira referiu que, ao acordar na sexta feira pela manhã, na semana que antecedeu às eleições, havia um CD, num envelope, debaixo de sua porta, em que inscrito algo no sentido “se gostar, passe adiante”. Tratava-se de uma gravação desabonatória do candidato a Prefeito, na qual o interlocutor identificava-se como sendo Herculano Jacó. O autor da gravação dizia que não concordava com a candidatura de Lirio e Eumar porque Lirio não “gostava daquele povo”, “que comprava votos”, que “inclusive as filhas de Lirio falavam isso abertamente nas campanhas” e que a cada quatro anos Lirio “comprava” a eleição. Disse ter levado a gravação ao conhecimento de Lirio. Falou não saber quem deixou o CD da gravação em sua residência, mas que identificou a voz de Jacó como sendo quem proferiu o discurso gravado. Referiu que o réu foi Vereador e Presidente da Câmara Municipal pelo PMDB. Disse que não tinha conhecimento de atritos entre réu e vítima.

O informante Ivan Cesar de Bortoli narrou ter recebido, em sua casa, um CD no qual constava uma gravação de voz, cujo narrador – que se identificou como sendo Herculano Jacó – falava, entre outras informações, sobre a vida pessoal de Lirio Riva. Disse não saber se foi, de fato, o réu quem efetuou a gravação, nem quem deixou o CD em sua casa. Relatou que, assim que ouviu o conteúdo do CD, entregou-o, em mãos, para Lírio Riva. Destacou que, no dia anterior, ao passar em frente ao diretório do partido político rival ao de Lirio Riva, ouviu o mesmo conteúdo do citado CD, não sabendo indicar se o som vinha de carro de som. Disse não ter conhecimento de desavenças entre réu e vítima. Referiu que Herculano Jacó não residia mais em Colorado quando do fato, mas participava ativamente da campanha eleitoral.

O informante Eumar Luiz Rizzardi narrou ter recebido um CD, que fora deixado debaixo de sua porta, em que contido arquivo de áudio em que Herculano Jacó proferia ofensas à vítima Lirio, e que também viu e ouviu carro de som circular na cidade divulgando o mesmo conteúdo do CD. Falou que não sabe se foi Herculano quem distribuiu a gravação, mas afirma ser de tal indivíduo a voz registrada, inclusive, na gravação, o narrador se identifica como sendo o réu. É mencionado que o réu também falou, na gravação, sobre o informante Eumar. Disse que o demandado não acusou Lirio de ter praticado algum crime. Afirmou que Herculano estava participando da campanha, em favor da coligação de Lauro e Tarcísio, em oposição a Lirio e Eumar.

Além disso, conforme consignado na sentença, a gravação foi inclusive reproduzida em um carro de som que circulou pela cidade, conforme afirmado pela vítima Lírio e por Eumar (fls. 187v. e 188v.):

A vítima Lirio Riva, em juízo, referiu que, na sexta feira que antecedeu a eleição municipal de 2012, o diretório do adversário de campanha reproduziu em alto volume, num carro de som, uma gravação de voz, tendo identificado a voz de Herculano Jacó Henrich. Na manhã seguinte, na véspera da eleição, tomou conhecimento de que algumas pessoas receberam cópias de um CD em suas casas, deixadas debaixo das portas, contendo a escrita: “se gostou, passe para frente.

[...]

O informante Eumar Luiz Rizzardi narrou ter recebido um CD, que fora deixado debaixo de sua porta, em que contido arquivo de áudio em que Herculano Jacó proferia ofensas à vítima Lirio, e que também viu e ouviu carro de som circular na cidade divulgando o mesmo conteúdo do CD.

A difamação tem proporções majoradas quando se refere a pessoas públicas, mormente um político em época de eleições, uma vez que a honra é fator determinante para sua respeitabilidade social e consequentemente confiabilidade por parte dos eleitores.

A natureza difamatória da gravação, é importante referir, não é negada pela defesa. Porém, sustenta a tese que o réu não contribuiu espontaneamente para o delito. Herculano Jacó confirma que a voz na gravação é a sua e que, de fato, proferiu o discurso, mas que teria dito o texto em uma conversa no porão da lancheria da Lori, onde havia cerca de seis ou sete pessoas, e que não imaginava que estavam gravando sua fala.

No entanto, nos termos em que concluiu o nobre julgador na sentença, entendo suficientemente comprovada a autoria, cumprindo transcrever o seguinte excerto da decisão (fl. 189):

Pela análise da prova oral, notadamente pela parcial confissão do réu, denoto comprovado que a voz constante na gravação do CD de fl. 04 é do réu, tendo sido ele quem proferiu as expressões caluniosas e difamatórias descritas na denúncia.

Ainda, não passa de mera retórica, sem o menor amparo no acervo probatório dos autos, a alegação do réu de que a gravação teria sido feita sem seu conhecimento, tratando-se de conversa casual, na presença de várias pessoas. Isso porque é fácil constatar, ao ouvir a gravação discutida, que não estava o réu em conversa com diversas pessoas, pois não se escuta qualquer outra voz durante a gravação que não a do demandado, e também porque a gravação é iniciada como típico depoimento preparado, no qual o depoente, inclusive, identifica-se no início: “Aqui quem vos fala é Jacó Henrich. Cidadão coloradense, eu tenho trinta e sete anos convivendo com esta comunidade. Inclusive em 2001 a 2004 tive privilégio de ser vereador com duzentos e dois votos destas pessoas queridas deste Município. [...]”. (Grifei.)

Não há dúvida quanto ao conteúdo difamatório do material divulgado pelo réu. As razões recursais limitam-se a negar o dolo de difamar e de distribuir a gravação. No entanto, do contexto dos autos, extrai-se que o áudio não trata de uma conversa informal. A gravação demonstra ser discurso preparado e dirigido a atacar a reputação da vítima, mediante o uso de propaganda eleitoral negativa, com nítida intenção de prejudicá-lo nas eleições. Neste sentido, como exemplo, transcrevo as seguintes passagens:

Ora, minha gente, vamo pensa, vamo se valoriza, vamo dar valor a nossa pessoa e o que será dos nossos filhos, dos nossos netos, venha Lírio ganhá.

[…]

E o que será depois dessas pessoas que vão entrar nesse barco furado do Lírio.

[...]

Veja bem, o Lírio ganha a eleição, de novo, quatro anos, o pessoal sem emprego, os que já tão empregado ficam, os concursados ficam, e promessas e promessas e emprego, pelo contrário, vai tirar até pessoas de dentro da prefeitura, não vai contratar. Então, povo de Colorado, vamo acordar, não vamo se humilhar por causa de um capricho de um homem que ainda fica gozando da cara dos coloradenses.

Em resumo, não há elementos nos autos que ponham em dúvida que a mensagem de áudio tenha partido do réu, assim como inexiste razão para que se conclua que não houve a atuação espontânea dele em repassar o material. É fato que o áudio foi gravado por Herculano, ou por terceiro com o seu conhecimento, e que foi realizada para divulgação a demais pessoas. Não fosse assim, o título inscrito no CD não seria Se gostou passe adiante.

No caso, indiferente que se tenha certeza absoluta de que as cópias do CD tenham sido realizadas por Herculano, ou que foram por ele distribuídas, quando está caracterizada a intenção do réu de difamar o candidato à reeleição.

Portanto, em relação ao crime de difamação, a materialidade e a autoria restam comprovadas, sendo possível concluir que o repasse da gravação atentatória à honra da vítima ocorreu com a intenção clara de difamação eleitoral, como tipificado no art. 325 da Lei n. 4.737/65, durante o período de propaganda eleitoral, com intenção de influenciar o eleitorado.

Crime de calúnia

A fala considerada como caluniosa pelo juízo a quo é a seguinte:

Jacó, eu vou gastar, to me incomodando, vou ter que comprar meus próprios companheiros pra consegui disputar esta eleição. Mas te digo uma coisa, se eu vier a ganhar esta eleição, estas pessoas que eu tive que negociar, favorecer, quatro anos eles vão comer na minha mãozinha, porque não vou dar colher de chá. Sempre, em todas as minhas eleições eu tive que comprar os meus próprios companheiros. (...) Olha Lírio, este negócio de ganhar uma eleição goela abaixo, nem que eu venda uma fazenda, nem que eu venda não-sei-o-que, o senhor não(...) Eu vou ganhá a eleição e estes companheiros que eu tive que comprar, negociá, prá ganhá a eleição, vão comer na minha mãozinha, aqui ó. Vou só ajudar aquelas pessoas que é dez ou doze do grupinho e o resto que se dane.

O magistrado entendeu que o discurso afirmaria que a vítima, Lírio Riva, teria comprado votos para ganhar eleições, imputando-lhe a prática do delito descrito no art. 299 da Lei n. 4.737/65 (Código Eleitoral), que prevê o crime de corrupção eleitoral ou compra de votos:

Art. 299 – Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:

Pena – reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa. (Grifei)

O crime de calúnia na propaganda eleitoral está previsto no art. 324 do Código Eleitoral

Art. 324 – Caluniar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando fins de propaganda, imputando-lhe falsamente fato definido como crime.

Pena – detenção de seis meses a dois anos, e pagamento de 10 a 40 dias-multa.

§ 1° Nas mesmas penas incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.

§ 2º A prova da verdade do fato imputado exclui o crime, mas não é admitida:

I – se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido, não foi condenado por sentença irrecorrível;

II – se o fato é imputado ao Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro;

III – se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.

No entanto, duas questões merecem ser sopesadas na análise do delito, uma vez que dizem respeito à ausência de tipicidade formal.

A gravação afirma que Lírio teria dito a Jacó que vai ter que comprar meus próprios companheiros pra consegui disputar esta eleição, que sempre, em todas as eleições que disputou, ele teve que comprar os seus próprios companheiros, e que Lírio disse que estes companheiros que tiverem de ser comprados, vão comer na minha mãozinha.

Ocorre que o art. 299 do Código Eleitoral dispõe sobre a entrega de vantagem em troca do voto do eleitor. A negociação de vantagens em troca de apoio político, situação descrita na fala da gravação quando se refere à compra dos próprios companheiros para Lírio conseguir disputar esta eleição, não constitui o tipo penal previsto no Código Eleitoral.

A compra de apoio para disputar uma eleição, aí compreendidas as negociatas intrapartidárias para que um candidato participe da disputa, na maior parte das vezes mediante promessas de favorecimentos políticos, não está abrangida pelo art. 299 do Código Eleitoral. E esta é, claramente, a situação descrita pela fala vou ter que comprar meus próprios companheiros pra consegui disputar esta eleição. A todo efeito, o texto fala em acordos entre políticos e não em compra de voto de eleitores.

Vale dizer que a compra de apoio político foi analisada por este Tribunal nos autos do RE 198-47, em acórdão de relatoria do Dr. Jorge Alberto Zugno, que, por unanimidade, considerou como caracterizadora de abuso de poder econômico a conduta consistente em oferecer dinheiro e prometer cargos públicos em troca de apoio à candidatura. No julgamento, destacou a Corte que, embora as negociações político-partidárias sejam comuns e ínsitas ao regime democrático quando precedem às convenções, os fatos que ocorrem em pleno período eleitoral, no ápice da campanha política, relativos à tentativa de desistência de candidaturas por compra ou promessa de benesses, possuem maior poder lesivo do que a compra de alguns votos. Além disso, consignou-se que a ilicitude estaria estampada nas verbas oferecidas a cada candidato, que sequer poderiam ser registradas na prestação de contas, sob pena de desaprovação. Transcrevo a ementa:

RECURSOS. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. ELEIÇÕES 2012. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO NO JUÍZO ORIGINÁRIO.

Afastada a matéria preliminar. Não há perda de objeto em face de diplomação já realizada, pois a procedência da ação de investigação judicial eleitoral, ainda que após a proclamação dos eleitos, poderá levar à inelegibilidade do candidato, bem como a cassação do seu registro ou de seu diploma. Rejeição da prefacial de ilicitude de prova. É lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro.

A conduta perpetrada pelos recorrentes, consistente em oferecer dinheiro e prometer cargos públicos a dois candidatos à vereança da coligação adversária para que estes desistissem da disputa eleitoral em apoio à candidatura dos recorridos, configura, modo inequívoco, abuso de poder econômico.

Negociações político-partidárias são comuns e ínsitas ao regime democrático quando precedem às convenções. Fatos que ocorreram em pleno período eleitoral, no ápice da campanha política. A tentativa de desistência de uma candidatura por compra ou promessa de benesses possui maior poder lesivo do que a compra de alguns votos. A ilicitude está estampada nas verbas oferecidas a cada candidato, que sequer poderiam ser registradas na prestação de contas, sob pena de desaprovação.

[...]

Diploma cassado do prefeito e seu vice. Realização de novas eleições majoritárias no município, nos termos do art. 224 do Código Eleitoral, visto tratar-se de nulidade que atinge mais de metade dos votos do município.

Provimento parcial.

(TRE-RS, RE 19847, Rel. Dr. JORGE ALBERTO  ZUGNO, DEJERS 08.4.2013, p. 4.)

A decisão foi mantida pelo Tribunal Superior Eleitoral em recente acórdão, julgado à unanimidade, no qual foi destacada a caracterização da hipótese de abuso de poder de autoridade mediante compra de apoio político na pré-organização eleitoral: negociação como se o apoio político fosse uma mercadoria comprável em dinheiro (TSE, Respe 19847). Na decisão, o TSE assentou que o julgamento adotou posição mais rigorosa no que diz respeito aos acordos políticos envolvendo trocas não só de cargos, mas de favores e valores monetários.

Tem-se, portanto, que a conduta de Herculano, ao afirmar, no áudio contido no CD, que Lírio dissera que teria que negociar e favorecer os seus próprios companheiros, nem que, para isso, tivesse que vender uma fazenda, não imputa, falsamente, um fato definido em lei como crime, pois a compra de apoio político não é infração penal eleitoral, mas, sim, ilícito cível eleitoral relativo ao abuso de poder.

Além disso, ainda que a fala de Herculano tivesse dito que Lírio compra votos de eleitores, que negociou favores em troca do voto, é preciso considerar que o crime de calúnia apenas se consuma quando há imputação específica sobre fato concreto e singular, que possibilite identificação de fato determinado que constitui o crime atribuído ao sujeito passivo. (Pazzaglino Filho, Marino. Crimes Eleitorais, Editora Atlas, 2012, p. 87).

Ou seja, para a configuração da calúnia deve haver imputação de fato certo e determinado, tipificado como crime. A mera afirmação de que o sujeito passivo teria dito vou ter que comprar meus próprios companheiros pra consegui disputar esta eleição é genérica e não caracteriza o crime de calúnia. Nesse sentido, os seguintes precedentes:

Ação penal. Crimes contra a honra. Decisão regional. Procedência parcial. Recurso especial. Alegação. Violação. Art. 324 do Código Eleitoral. Calúnia. Não-configuração. Imputação. Ausência. Fato determinado.

1. A ofensa de caráter genérico, sem indicação de circunstâncias a mostrar fato específico e determinado, não caracteriza o crime de calúnia previsto no art. 324 do Código Eleitoral.

2. O agravo regimental, para que obtenha êxito, deve afastar, especificamente, todos os fundamentos da decisão agravada.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 25583, Acórdão de 31.10.2006, Relator: Min. CARLOS EDUARDO CAPUTO BASTOS, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 30.11.2006, Página 96.)

 

Ação penal. Condenação. Calúnia. Art. 324 do Código Eleitoral. Nota. Jornal. Fato. Afirmação genérica. Não-caracterização. Divulgação de fato inverídico ou difamação. Enquadramento. Impossibilidade. Prescrição da pena em abstrato.

1. A afirmação genérica não é apta a configurar o crime de calúnia, previsto no art. 324 do Código Eleitoral, sendo exigida, para a caracterização desse tipo penal, a imputação de um fato determinado que possa ser definido como crime.

2. Impossibilidade de se enquadrar o fato nos tipos previstos nos arts. 323 do Código Eleitoral, que se refere à divulgação de fato inverídico, ou art. 325 do mesmo diploma, que diz respeito ao crime de difamação, em face da ocorrência da prescrição pela pena em abstrato para esses delitos.

Recurso especial provido a fim de declarar extinta a punibilidade.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 21396, Acórdão n. 21396 de 19.02.2004, Relator: Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, Relator designado: Min. FERNANDO NEVES DA SILVA, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Volume 1, Data 02.4.2004, Página 106 RJTSE – Revista de Jurisprudência do TSE, Volume 15, Tomo 1, Página 28221403.)

 

[...]

1 - A descrição típica do crime de calúnia exige um elemento normativo, contido na expressão "falsamente", imputando a alguém fato definido como crime. A imputação falsa deve consistir em fato determinado. Referências genéricas não caracterizam o crime de calúnia.

2 – Atipicidade da conduta, com o consequente arquivamento dos autos.

(TRE-CE, Expediente sem Classificação n. 11183, Acórdão n. 11183 de 13.4.2005, Relator: CELSO ALBUQUERQUE MACEDO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Volume 078, Data 27.4.2005, Página 123-124.)

 

Conforme se verifica, ocorre calúnia somente quando há imputação falsa de crime com apontamento de fato certo e específico.

Portanto, na fala apontada como caluniosa não se verifica a ocorrência de calúnia, tendo em vista que o discurso menciona a compra de meus próprios companheiros pra conseguir disputar esta eleição, e não a compra de votos de eleitores, conforme prevê o art. 299 do Código Eleitoral, e que não há referências a fato específico praticado pelo candidato no trecho citado. Embora tal fala possa conter conteúdo indecoroso e ofensivo à honra, que inclusive considero caracterizador de difamação, há ausência da subsunção do fato à norma no que diz com a calúnia.

Por conseguinte, concluo que deve ser mantida a condenação quanto ao crime de difamação e provido o recurso, em parte, para o fim de ser o recorrente absolvido da condenação pelo crime de calúnia, por ausência de tipicidade, nos termos do art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal.

No entanto, conforme opina a Procuradoria Regional Eleitoral, impõe-se a readequação do quantum da pena, de ofício.

Para o crime de difamação tipificado no art. 325 CE, que prevê pena de detenção de três meses a um ano, e pagamento de 5 a 30 dias-multa, o nobre julgador considerou a cumulação com as causas de aumento de pena previstas nos incisos II e III do art. 327 do Código Eleitoral, por ter sido o delito praticado contra prefeito municipal e por meio que facilitou a divulgação da ofensa, e com a circunstância agravante prevista no art. 61, I, do Código Penal, diante da existência de reincidência em prática de crime doloso:

Art. 327 – As penas cominadas nos artigos 324, 325 e 326, aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido:

I - [...]

II – contra funcionário público, em razão de suas funções;

III – na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da ofensa.

Art. 61 – São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:

I – a reincidência;

A pena-base foi fixada nos seguintes termos (fl. 190v.):

Examinando as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, verifico que a culpabilidade do agente, tida como grau de reprovação de seu agir, não desborda do ordinário. O acusado ostenta maus antecedentes, nos termos da Súmula n.º 444 do Egrégio STJ (certidão de fls. 165/168), dadas a condenação definitiva a que se refere o processo n.º 021/2.05.0005588-4 (reservando-se as condenações atinentes aos feitos n.º 009/2.06.0005214-3 e 021/2.06.0004797-2 para a segunda fase da aplicação da pena).

Não há elementos nos autos a desabonar a conduta social da agente e a sua personalidade. Os motivos do delito são inerentes à espécie, prejudicar a campanha do candidato vítima. As circunstâncias do crime merecem especial reprovação, pois praticado às vésperas da eleição. O comportamento da vítima nada influenciou a prática do fato.

Nesse contexto, havendo duas circunstâncias judiciais negativas (antecedentes do réu e circunstâncias do crime), fixo a pena-base em 07 (sete) meses de detenção, sendo 02 meses vinculados a cada vetorial reputada negativa.

Calculada a pena para o crime de difamação, esta foi fixada de forma definitiva em um ano, dois meses e vinte dias de detenção e quinze dias-multa (fl. 191).

Entretanto, consoante apontado no parecer ministerial à fl. 257, mostra-se exagerado o aumento de 02 meses para cada vetorial considerada negativa, devendo ser readequado o quantum da condenação de ofício, nos termos definidos pelo Parquet eleitoral:

No ponto, levando-se em consideração que o tipo penal do art. 325, do Código Eleitoral, comina uma pena de detenção de três meses a um ano, tenho que foi exagerado o aumento de 02 meses para cada vetorial.

Dessa forma, entendo que a pena-base deve ser reduzida de ofício para 04 (quatro) meses e 04 (quatro) dias, considerando o aumento de 17 (dezessete) dias para cada vetorial.

A reincidência deve ser aplicada nos mesmos moldes do fato 1, ou seja, acréscimo de 1/3 à pena-base. Logo, a pena provisória deve ser estabelecida em 05 (cinco) meses e 15 (quinze) dias.

Na terceira fase deve ser considerada a causa de aumento do art. 327, II e III, do Código Eleitoral, majorando-se a pena provisória em 1/3, ou seja, a pena definitiva deve ser fixada em 07 (sete) meses e 10 (dez) dias de detenção.

Por fim, em relação ao 2º Fato, deve ser reduzida a pena de multa para 10 dias-multa.

Avaliando as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, em conjunto com os fatos constantes e comprovados nos autos e com as circunstâncias e consequências do crime, mormente considerado o cometimento de um único delito, o de difamação na propaganda eleitoral, e que são duas as vetoriais negativas, dado que o réu ostenta maus antecedentes (certidão das fls. 165-168), por força da condenação referente ao processo n. 021/2.05.0005588-4 (delito de trânsito) e que, conforme bem apontado na sentença, as circunstâncias do crime merecem especial reprovação, pois praticado às vésperas do pleito eleitoral municipal (fl. 190), tenho por correto e adequado o cálculo efetuado pela Procuradoria Regional Eleitoral, com o que a pena-base deve se distanciar do mínimo (detenção de três meses) e ser fixada em 04 (quatro) meses e 04 (quatro) dias de detenção, considerando-se o aumento de 17 (dezessete) dias para cada vetorial reputada negativa, conforme sugerido pelo Parquet.

A pena provisória, diante do acréscimo de 1/3 à pena-base em função da existência da agravante reincidência, que foi verificada em duplicidade pelas certidões de antecedentes das fls. 167-168, em relação às quais o julgador apontou as condenações havidas nos processos n. 009/2.06.0005214-3 (delitos de trânsito e desobediência) e n. 021/2.06.0004797-2 (delitos de trânsito e desacato), deve ser redimensionada para 05 (cinco) meses e 15 (quinze) dias.

A pena definitiva, em vista da incidência das causas de aumento de um terço previstas nos incisos II e III do art. 327 do Código Eleitoral, resta fixada em 07 (sete) meses e 10 (dez) dias de detenção.

O quantum da pena de multa prevista no art. 325 do Código Eleitoral, que prevê condenação ao pagamento de 5 a 30 dias-multa, também deve ser redimensionado, com o que fixo o montante da condenação em 10 dias-multa.

Assim, redimensiono a pena definitiva para 07 (sete) meses e 10 (dez) dias de detenção e 10 dias-multa, reprimenda que se mostra adequada e suficiente à punição e prevenção do delito.

Quanto ao pedido recursal de redução do valor do dia-multa, considerando a juntada de documentação relativa aos comprovantes de rendimentos e à última declaração de imposto de renda do recorrente, e em vista da ausência de impugnação dos documentos pela acusação, tenho que deve ser readequado o montante, em favor das possibilidades econômicas do réu, para quantia que se mostre razoável. Neste cenário, em face dos elementos constantes nos autos, o valor do dia-multa deve ser fixado no mínimo legal, em 1/30 do salário-mínimo diário da região, vigente na data do crime.

Dada a absolvição do crime de calúnia e do consequente afastamento do concurso de crimes, modifico o regime inicial de cumprimento da pena para o aberto, na forma do disposto no art. 33, caput, e seu § 2º, alínea “c” c/c § 3º, do Código Penal.

Com relação à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, dispõe o artigo 44 do Código Penal que, no caso de ser o réu reincidente em crime doloso, o juiz poderá aplicar a medida de conversão se essa se mostrar socialmente recomendável e se a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime. O § 2º do art. 44, por sua vez, prevê que na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos.

Levando-se em conta que os maus antecedentes do réu e as circunstâncias do crime relativas ao cometimento de difamação às vésperas do pleito eleitoral municipal já foram considerados na primeira fase de aplicação da pena, que a agravante da reincidência já foi registrada na segunda fase, e que o juízo a quo, na análise das circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal, ressaltou que a culpabilidade do agente, tida como grau de reprovação de seu agir, não desborda do ordinário e que não há elementos nos autos a desabonar a conduta social da agente e a sua personalidade, revela-se possível a substituição da pena corporal por restritiva de direitos.

Assim sendo, substituo a pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direito (art. 44, § 2º, CP) consistente em prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas (art. 46, CP).

A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas consistirá na atribuição de tarefas gratuitas ao réu, pelo mesmo tempo da pena privativa de liberdade, devendo ser cumprida à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho, atendidas suas aptidões pessoais, nos termos do disposto no art. 46, § 3º, do CP.

Fica o réu advertido de que no caso de descumprimento injustificado da restrição imposta, a pena restritiva de direitos será convertida em privativa de liberdade, conforme disposto no § 4º, do artigo 44 do Código Penal, com seu recolhimento à prisão.

Fica o réu, assim, condenado à pena de em 07 (sete) meses e 10 (dez) dias de detenção e 10 dias-multa, substituída a pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direitos, consistente na prestação de serviços à comunidade ou à entidade pública a ser indicada pelo juízo da execução.

Considerando a substituição da pena privativa de liberdade, não há falar em sursis. Autorizo o parcelamento dos valores devidos.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento parcial do recurso, para o fim de:

a) manter a condenação quanto ao crime de difamação, previsto no art. 325 do Código Eleitoral, e readequar, de ofício, o quantum da reprimenda, condenando o recorrente à pena de 07 (sete) meses e 10 (dez) dias de detenção e 10 dias-multa, substituída a pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direitos consistente na prestação de serviços à comunidade ou à entidade pública a ser indicada pelo juízo da execução, nos termos da fundamentação;

b) acolher o pedido recursal de redução do valor do dia-multa, para o fim de fixá-lo no mínimo legal, à razão de 1/30 do salário-mínimo diário da região, vigente na data do crime;

c) reformar a sentença quanto à condenação do recorrente pelo delito de calúnia previsto no art. 324 do Código Eleitoral, absolvendo-o por atipicidade formal, com fundamento no art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal.

É o voto.