REl - 0600324-57.2024.6.21.0049 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/05/2025 às 16:00

VOTO

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

No mérito, GIOVANE DE ANDRADE NEVES recorre contra a sentença que desaprovou a prestação de contas referente ao cargo de vereador no Município de Santa Margarida do Sul. A decisão hostilizada determinou recolhimento no valor de R$ 1.465,00 (mil quatrocentos e sessenta e cinco reais).

A questão, em resumo, diz respeito à ausência de documentação que atenda aos requisitos legais na comprovação de prestação de serviço de parte de CARLA BRAATZ DRESCH, informada pelo prestador entre os gastos com pessoal, em afronta ao art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…)

VII - remuneração ou gratificação de qualquer espécie paga a quem preste serviço a candidatas ou candidatos e a partidos políticos;

(…)

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

O recorrente admite a ausência do contrato, e argumenta que a exigência de detalhes sobre local de trabalho, horas trabalhadas e justificativa do preço não deve ser interpretada de forma rígida, especialmente em campanhas de pequeno porte. Acosta ao recurso cópia do cheque utilizado para pagamento de Carla Dresch.

Sem razão.

O título não é suficiente para comprovação do gasto, apenas firmando a ocorrência do seu pagamento. Quanto à despesa, além de ausente o contrato, o recibo eleitoral não atende aos requisitos impostos na legislação de regência, quais sejam: locais de trabalho, horas trabalhadas,  especificação das atividades executadas e justificativa do preço contratado.

Irregular a despesa, portanto. Nesta linha de raciocínio, cito precedentes deste Tribunal:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA. DEPUTADA FEDERAL. IRREGULARIDADE NA COMPROVAÇÃO DE GASTOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. AUSÊNCIA DE CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E OUTROS DOCUMENTOS. ALTO PERCENTUAL. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.
1. Prestação de contas apresentada por candidata não eleita ao cargo de deputada federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.
2. Ausência de comprovação dos gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. Verificado, no Relatório de Despesas Efetuadas, a contratação de fornecedor para o serviço de coordenação e organização de campanha. Omissão da candidata na apresentação dos documentos pertinentes ao contrato.
3. A irregularidade corresponde a 11.5% da receita total declarada pela candidata, tornando imperativo a desaprovação das contas e o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional, conforme o art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.
4. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional.
PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº060261029, Acórdão, Des. RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 06/09/2023.

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA. DEPUTADA ESTADUAL. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. IRREGULARIDADE NA COMPROVAÇÃO DE GASTOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. EXISTÊNCIA DE DESPESAS NÃO LASTREADAS EM CONTRATO, NOTA FISCAL, OU OUTRO DOCUMENTO IDÔNEO. CRÉDITOS NÃO UTILIZADOS. DEVER DE TRANSFERÊNCIA. EXTRATOS ELETRÔNICOS SEM A IDENTIFICAÇÃO DO CPF OU CNPJ DO BENEFICIÁRIO. IRREGULARIDADES CARACTERIZADAS. FALHA DE ALTO PERCENTUAL. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.
1. Prestação de contas apresentada por candidata não eleita ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às Eleições Gerais de 2022.
2. Irregularidades na comprovação dos gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. A comprovação dos gastos eleitorais “deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das (os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço”, nos termos do art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19. O art. 35, § 12, do mesmo diploma normativo impõe que, no tocante às despesas de campanha com pessoal, os documentos comprobatórios contenham diversos detalhamentos, para permitir à Justiça Eleitoral aferir a regularidade do gasto, inclusive; identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado”.
3. Existência de despesas não lastreadas em contrato, nota fiscal, ou outro documento idôneo que preencha os requisitos legais, de modo a impedir que se ateste as características essenciais e a regularidade dos gastos. Os documentos acostados, consistentes em comprovantes bancários e recibo particular de pagamento, não se mostram suficientes para atestar a despesa, pois não esclarecem os detalhes do objeto, das condições e demais características da avença. 3.1. Os valores que envolveram eventuais créditos não utilizados junto ao fornecedor Facebook Ltda. deveriam ter sido transferidos ao Tesouro Nacional até o final da campanha, consoante prevê o art. 35, § 2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, o que não se comprovou. 3.2. Os extratos eletrônicos da conta de campanha registram a realização de débitos por meio de saque eletrônico, sem a identificação do CPF ou CNPJ do beneficiário na própria operação bancária. Assim, está caracterizada a irregularidade em relação à forma utilizada para a quitação dos gastos eleitorais, ou seja, saque de recursos da conta do FEFC e pagamento em espécie. Impedida a rastreabilidade dos valores e a confirmação acerca de efetivo destinatário dos recursos.
4. As falhas apuradas representam 14,05 % dos recursos arrecadados, sendo adequado, razoável e proporcional, no presente caso, o julgamento pela desaprovação das contas. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional, diante da insuficiente comprovação de regularidade no manejo de recursos do FEFC, com fulcro no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.
5. Desaprovação. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.
PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº060247432, Acórdão, Des. Mario Crespo Brum, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 23/07/2024.

 

O prestador de contas, ademais, alega "violação ao princípio da dignidade da pessoa humana".

Inconsistente.

Ora, o princípio em questão é um vetor e, por isso, inaplicável quando vulnera norma expressa que fixa as regras de aplicação das verbas públicas nas campanhas eleitorais. Ele foi considerado, por exemplo, em momento antecedente, quando o legislador elaborou a regra sancionatória.

Ademais, o recorrente não demonstrou situação pessoal excepcional que justificaria afastar a multa sob o manto do princípio da dignidade da pessoa humana - tão somente, modo genérico, apontou que depende de sua remuneração como vereador para sustentar sua família. Adentrando aspectos pessoais, GIOVANE é integrante da classe política eleita, deve ter atenção especial aos regramentos aplicáveis a quem coloca o nome sob o escrutínio popular e, em visita ao site da Câmara de Vereadores de Santa Margarida do Sul, vislumbra-se que aquela casa legislativa se reúne uma vez por semana, em ofício que certamente permite outras atividades.

Não é possível, assim, cogitar a aplicação do referido princípio para eventual mitigação da ordem de recolhimento determinada na sentença, diga-se, consectário legal do reconhecimento da ilicitude.

Por fim, destaco que a irregularidade importa em 50,52% do total de recursos recebidos (R$ 2.899,50), e nominalmente constitui quantia superior a R$ 1.064,10, valor admitido pela jurisprudência como “balizador, para as prestações de contas de candidatos”, e “como espécie de tarifação do princípio da insignificância” (AgR–REspe n. 0601473–67, de relatoria do Ministro Edson Fachin, de 05.11.2019).

Inadmissível, assim, a aprovação com ressalvas.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso de GIOVANE DE ANDRADE NEVES, nos termos da fundamentação.