REl - 0600896-02.2024.6.21.0085 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/05/2025 às 16:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, trata-se de recurso interposto por OLI SPARREMBERGER, candidato ao cargo de vereador no Município de Três Forquilhas/RS, nas Eleições Municipais de 2024, contra a sentença que desaprovou suas contas de campanha, em razão do recebimento de duas doações em espécie, uma no valor de R$ 1.050,00 (mil e cinquenta reais) e outra no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), na mesma data (25.9.2024), configurando, portanto, o uso de recurso de origem não identificada.

Sobre o tema, a Resolução TSE n. 23.607/19, regulamentadora da matéria, assim dispõe em seu art. 21, inc. I e §§ 1º a 5º:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

(...).

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

§ 5º Além da consequência disposta no parágrafo anterior, o impacto sobre a regularidade das contas decorrente da utilização dos recursos recebidos em desacordo com este artigo será apurado e decidido por ocasião do julgamento.

 

Portanto, as doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 somente poderão ser concretizadas por intermédio de transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do donatário ou cheque cruzado e nominal, e, havendo infringência a tais preceitos normativos, devem os recursos serem recolhidos ao erário, caso utilizados na campanha.

A exigência legal visa prevenir a entrada de valores de origem incerta no processo eleitoral, assegurando a transparência e a confiabilidade do financiamento de campanha por meio da rastreabilidade bancária das receitas.

A regulamentação também é aplicável na ocorrência de sucessivas movimentações de recursos em um mesmo dia, situação em que o limite indicado na norma eleitoral deve ser aferido com base no resultado da soma das operações realizadas pelo mesmo doador, como ocorreu no particular.

Nesses termos, a irregularidade decorrente da inobservância do parágrafo 1º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19, que incide de forma objetiva a todos os concorrentes ao pleito, “sendo irrelevante a boa–fé do prestador como elemento hábil a afastar a incidência da regra” (TRE-RS; Recurso Eleitoral n. 060014804/RS, Relator: Des. Eleitoral José Luiz John dos Santos, Acórdão de 14.9.2023, Diário de Justiça Eletrônico n. 171, data 18.92023).

Além disso, está consolidado na jurisprudência o entendimento de que a mera anotação do CPF do suposto doador no depósito em espécie é incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, haja vista a ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória desse ato bancário.

Nessa linha, colho os seguintes julgados da Corte Superior:

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DOAÇÃO FINANCEIRA. DEPÓSITO EM ESPÉCIE. NÃO IDENTIFICAÇÃO DO DOADOR. ART. 21, § 1º, DA RES.-TSE 23.607/2019. PERCENTUAL ELEVADO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESAPROVAÇÃO. NEGATIVA DE PROVIMENTO.1. No decisum monocrático, negou-se seguimento a recurso especial interposto contra aresto unânime em que o TRE/MA manteve a desaprovação das contas de campanha do agravante, referentes às Eleições 2020, haja vista o recebimento de doações acima de R$ 1.064,10, por meio de depósito em dinheiro, em contrariedade ao art. 21, I, § 1º, da Res.-TSE 23.607/2019, totalizando 98,54% dos recursos movimentados.2. Nos termos do art. 21, § 1º, da Res.-TSE 23.607/2019, "as doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias da doadora ou do doador e da beneficiária ou do beneficiário da doação ou cheque cruzado nominal".3. A realização de depósitos identificados por determinada pessoa é incapaz, por si só, de comprovar sua origem, haja vista a ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário. Precedentes.4. A aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar com ressalvas as contas está condicionada a três requisitos cumulativos: a) falhas que não comprometam a higidez do balanço; b) percentual ou valor inexpressivo do total irregular; c) ausência de má-fé. Precedentes.5. No caso, o depósito bancário não identificado, além de constituir falha grave, totalizou 98,54% (R$ 1.355,00) dos recursos movimentados na campanha, o que impede a aprovação do ajuste contábil.6. Agravo interno a que se nega provimento.

(TSE; Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº 060035966, Acórdão, Min. Benedito Gonçalves, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 17/10/2023) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PREFEITO E VICE-PREFEITO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. DOAÇÕES. DEPÓSITOS EM ESPÉCIE. ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. DECLARAÇÃO UNILATERAL. PROVA INEFICAZ. FUNDAMENTOS SUFICIENTES NÃO ATACADOS. ENUNCIADO SUMULAR Nº 26 DO TSE. ACÓRDÃO REGIONAL EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. ENUNCIADO Nº 30 DA SÚMULA DO TSE. REJEIÇÃO DAS CONTAS. RECOLHIMENTO DOS RECURSOS AO TESOURO NACIONAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.1. Na origem, o TRE/MS manteve a sentença que desaprovou as contas de campanha do agravante em virtude do recebimento de valores de origem não identificada, mediante depósitos em espécie, e determinou o recolhimento do montante ao Tesouro Nacional.2. Não há ofensa aos arts. 275 do CE e 1.022 do CPC se as questões levantadas nos embargos foram devidamente enfrentadas pelo Tribunal de origem, embora de forma contrária ao interesse da parte embargante. Precedente.3. No recurso especial, o agravante deixou de impugnar, específica e articuladamente, todos os fundamentos suficientes do acórdão recorrido para considerar não comprovada a origem dos depósitos e não identificados os respectivos doadores - notadamente o de que sua declaração unilateral não é prova suficiente dessas circunstâncias -, o que atrai a incidência do Enunciado Sumular nº 26 desta Corte.4. Mesmo que fosse possível superar esse óbice, o acórdão recorrido está em harmonia com a jurisprudência do TSE de que a realização de depósito identificado por determinada pessoa é incapaz, por si só, de comprovar a efetiva origem de doações em espécie, haja vista a ausência do prévio trânsito dos recursos pelo sistema bancário. Precedente.5. Agravo em recurso especial não provido.

(TSE; Agravo em Recurso Especial Eleitoral nº 060034745, Acórdão, Min. Mauro Campbell Marques, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 30/08/2022) (Grifei.)

 

Ademais, incabível imputar a terceiros a responsabilidade pela inobservância da legislação em vigor, pois cabe ao candidato ou candidata a administração financeira de sua campanha e a responsabilidade por fiscalizar o cumprimento das obrigações legais em suas contas.

Nessa linha, cumpria ao candidato a conferência sobre a regularidade e a origem de suas receitas, deixando de utilizar aquelas auferidas em desacordo com a legislação eleitoral, restituindo-as ao doador ou recolhendo-as ao Tesouro Nacional, conforme o caso, nos termos do art. 21, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19 antes do fechamento de suas contas, o que não ocorreu na espécie, uma vez que os recurso foram efetivamente aplicados em campanha.

A irregularidade em questão totaliza R$ 1.450,00, cifra que corresponde a 46,22% do total das recursos declarados (R$ 3.136,50), implicando significativo impacto financeiro sobre a regularidade e transparência das contas e impedindo a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas, em conformidade com a jurisprudência pacífica do TSE (AREspEl n. 0600397-37, Relator: Min. Mauro Campbell Marques, Data de Julgamento: 29.8.2022).

Logo, não merece reforma a sentença recorrida.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.