REl - 0600245-82.2020.6.21.0093 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/10/2020 às 14:00

VOTO

Admissibilidade

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Das Preliminares

O recorrente alega prefaciais envolvendo eventual cerceamento de defesa decorrente da ausência da juntada de cópia integral do processo administrativo de tomada de contas do TCU, bem como relativamente à nulidade daquela decisão, pois o feito teria ocorrido à sua revelia, sem que lhe fossem oportunizados o efetivo contraditório e a ampla defesa.

Entendo que as alegações não prosperam.

Segundo a jurisprudência, a Justiça Eleitoral é competente para verificar se a falha ou a irregularidade constatada pelo órgão de contas caracteriza vício insanável, e se tal vício pode ser, em tese, enquadrado como ato doloso de improbidade.

Entretanto, a competência da Justiça Eleitoral para proceder ao enquadramento jurídico dos fatos não autoriza o julgador, quando do conhecimento da inelegibilidade insculpida na al. “g” do inc. I do art. 1º da Lei Complementar n. 64/90, a realizar uma revisão do que foi decidido pelo órgão colegiado competente.

Em outras palavras, a possibilidade de reconhecimento das causas de inelegibilidade não representa a abertura de competência para uma nova análise do processo já julgado pelo órgão natural.

Cumpre, sim, por ocasião da análise do registro de candidaturas, a partir dos fundamentos empregados na decisão que apreciou as contas, verificar se, objetivamente, estão ou não presentes os elementos exigidos pelas disposições legais que preveem as causas de inelegibilidade.

É o entendimento consolidado na jurisprudência do TSE:

ELEIÇÕES 2014. REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADO ESTADUAL. RECURSO ORDINÁRIO. REJEIÇÃO DE CONTAS. TRIBUNAL DE CONTAS. CONSÓRCIO INTERMUNICIPAL. PREFEITO. ORDENADOR DE DESPESAS. INELEGIBILIDADE. ALÍNEA G. CARACTERIZAÇÃO. AGRAVO DESPROVIDO.

1. Os consórcios públicos intermunicipais são instrumentos de cooperação entre governos municipais de uma determinada região que, com conjugação de esforços, buscam a realização de objetivos de interesse público comum das municipalidades participantes, mediante a distribuição de atribuições e responsabilidades entre os níveis governamentais.

2. A atuação do prefeito no consórcio intermunicipal nada mais é do que o desdobramento do exercício de atos de gestão próprios do Chefe do Poder Executivo Municipal.

3. Cabe à Justiça Eleitoral, rejeitadas as contas, proceder ao enquadramento das irregularidades como insanáveis ou não e verificar se constituem ou não ato doloso de improbidade administrativa, não lhe competindo, todavia, a análise do acerto ou desacerto da decisão da corte de contas. Precedentes.

4. O responsável pelo consórcio, sendo o administrador público dos valores sob sua gestão, é o responsável pela lisura das contas prestadas. Descabida a pretensão de transferir a responsabilidade exclusivamente ao gerente administrativo.

5. Recurso ordinário desprovido.

(Recurso Ordinário n. 72569, Acórdão de 17.3.2015, Relatora Min. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 60, Data: 27.3.2015, p. 38.) (Grifei.)

No mesmo sentido, a Súmula n. 41 daquela Corte Superior dispõe que:

Não cabe à Justiça Eleitoral decidir sobre o acerto ou desacerto das decisões proferidas por outros Órgãos do Judiciário ou dos Tribunais de Contas que configurem causa de inelegibilidade.

Assim, estando a análise em tela adstrita aos fundamentos e conclusões da decisão desfavorável às contas, já acostada aos autos por ocasião do ajuizamento da impugnação (ID 7460783), torna-se inútil e inadequada a juntada integral do processo de tomada de contas, posto que incabível qualquer consideração por parte da Justiça Eleitoral sobre a regularidade ou irregularidade daquela tramitação.

Com essas considerações, afasto a matéria preliminar.

Do Mérito

No mérito, CLÓVIS ANTÔNIO SCHWERTNER, quando Delegado da Delegacia Federal da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul, teve suas contas rejeitadas por decisão do TCU, nos processos de tomadas de contas n. 625.089/1998-7 e n. 004.176/1999-5, transitadas em julgado, respectivamente, em 26.4.2014 e em 11.6.2014.

Diante disso, o magistrado a quo entendeu pela inelegibilidade do recorrente até 11.6.2022, em razão da incidência da causa prevista no art. 1º, inc. I, al. “g”, da LC n. 64/90, lavrando sentença nos seguintes termos (ID 7462133):

Após a vigência da lei complementar nº 135, de 04.06.2010, que introduziu alterações no texto do art. 1º, I, alínea "g", da lei complementar nº 64, de 18.05.1990, a Corte Superior Eleitoral passou a exigir, para a caracterização da inelegibilidade estipulada pelo dispositivo, a aferição do dolo do agente público que teve contas rejeitadas, independentemente de ter sido a questão objeto de deliberação do TCU e ainda que a irregularidade seja considerada insanável (TSE: AGR-RO nº 99.574, TSE, rel. Min. Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira, DJE de 11.04.2011, p. 32. 2).

No caso dos autos, entre outras irregularidades, conforme se percebe da documentação acostada, verifica-se que Clóvis Schwertner, no exercício da função pública de Delegado Regional, licitou e contratou empresa situada no seu endereço residencial, que estava sob a responsabilidade técnica de sua esposa, sendo detentora de 99% das cotas da empresa, a irmã da esposa do responsável e o cunhado do responsável, gerente da empresa, infringindo o inciso III do art. 9º da Lei nº 8.666/93. Dita empresa deveria proceder a uma reforma no pátio e a construção de um salão de eventos, mas foram verificadas diversas irregularidades, como a ausência de orçamento detalhado, falta de afixação do instrumento convocatório ao certame, restringindo a publicidade, falta de aprovação de minutas do edital e do contrato, ausência de assinatura no contrato e interferência em procedimentos normais de licitação para favorecer empresa de familiar. Além disso, também consta que houve superfaturamento na contratação de serviços de limpeza da Empresa Scala - Serviços de Limpeza e Conservação Ambiental, contratada com dispensa de licitação.

O então DRA/RS Clóvis Schwertner foi apenado com multa, teve contas rejeitadas pelo TCU, inclusive o plenário do TCU considerou irregulares as contas de Clóvis Antônio Schwertner no acórdão nº 955/2013-TCU. No bojo deste acórdão percebe-se que se tratou de um recurso de revisão do MP/TCU contra acórdão nº 386/1998-2ª Câmara. Da leitura do citado acórdão verifica-se (item 10) que houve determinação de auditoria para apurar "diversas irregularidades" TC 004.176/1999-5, praticadas no ano de 1997 referentes aos Convites 55/97 e 68/97 e à dispensa de licitação nº 59/96. No relatório de auditoria foi proposta a audiência do Sr. Clóvis Antônio Schwertmer, ex-Delegado da DRA/RS, cujas razões de justificativa foram rejeitadas.

Todos estes dados são extraídos dos documentos acostados aos autos por diligência do Cartório Eleitoral, após determinação deste juízo, em atenção a requerimento da próprio Clóvis Antônio Schwertner.

Pode-se inferir que o impugnado não conseguiu comprovar qualquer mácula no procedimento administrativo que o inquinasse de nulidade. Não se defendeu porque não quis, devido ser considerado revel, mas depois atuou no processo e inclusive recorreu. apresentando justificativas que foram rejeitadas pelo plenário do TCU.

Consta nos documentos acostados (1.4) em relação a Clóvis Antônio Schwertner: "Ofício de citação nº 536/2008-TCU/SERUR, de 26/11/2008 (fls. 100/105, vol.1), reiterado pelo Ofício nº 231/2009-TCU/SERUR, de 29/5/2009 (fls.175, vol.1) com respectivo AR à fl. 176, vol. 1. Ofício de audiência nº 539/2008-TCU/SERUR, de 26/11/2008 (fls.112/113, vol.1), reiterado pelo Ofício nº 232/2009-TCU/SERUR, de 29/5/2009 (fls. 174, vol.1) com respectivo AR à fl. 177, vol.1 Embora devidamente notificado, o responsável não apresentou alegações de defesa".

Portanto, contrariamente ao que foi alegado, não houve ofensa aos princípios da ampla defesa, contraditório e ao devido processo legal administrativo. Também não vinga a tese de que o MPE persegue objetivo juridicamente impossível, incompatíveis entre si e que dos fatos não decorrem logicamente a conclusão.

Os fatos aqui versados a meu ver são extremamente graves, objetivos, que não permitem emenda ou correção, praticados com dolo e que caracterizam atos de improbidade administrativa, impedindo que o Sr. Clóvis Antônio Schwerner concorra ao cargo de vereador por este município de Venâncio Aires/RS.

Não há nulidade na inicial do Ministério Público. Não se tratava aqui de abrir contraditório a respeito dos fatos pelos quais as contas foram rejeitadas na seara administrativa própria. O certo é que as contas foram rejeitadas pelo TCU com definitividade e isso é motivo legal para a inelegibilidade. A inicial do Ministério Público não descreveu os fatos porque não precisava descrever. Contudo, como o próprio interessado na vaga de vereador solicitou viessem aos autos cópia do procedimento administrativo, os fatos foram conhecidos pelas partes e por esta Justiça Eleitoral.

Pacífica a jurisprudência no TSE que o órgão competente para o julgamento das contas referentes à aplicação de recursos federais é o Tribunal de Contas da União - TCU, a teor do art. 75, II, da Constituição Federal.

A inobservância a preceito de lei na realização dos gastos dos recursos públicos é motivo suficiente para a caracterização da insanabilidade da falha na prestação de contas a que alude o art. 1º, I, "g", da LC 64/90, ante o princípio da legalidade a que está adstrito o administrador público (CF, art. 37, caput).

E mais, a análise da data do trânsito em julgado do Processo Administrativo no âmbito do Tribunal de Contas da União é de competência da Corte de Contas. Cabe à Justiça Eleitoral tão somente verificar se as contas foram rejeitadas por irregularidade insanável (Recurso em Registro de Candidato nº 81, TRE/PI, Rel. Antônio Peres Parente. j. 04.09.2008).

Não fosse isso, restou demonstrado que em dois processos de tomada de contas, quais sejam, nºs 004.176/1999-5, com trânsito em julgado em 11/06/2014, e 625.089/1998-7, com trânsito em julgado em 26/04/2014, a rejeição de contas foi decretada. Com isso, considerando-se somente o último processo definitivamente julgado pelo TCU, encontra-se o impugnado inelegível até 11/06/2022, conforme atesta a certidão anexa (doc. 01), extraída do site da Corte de Contas Federal.

Na esteira do parecer emitido pela Procuradoria Regional Eleitoral, entendo que a decisão deve ser confirmada.

Em seu recurso, Clóvis Antônio Schwertner sustenta que a mera desaprovação das contas não é razão suficiente para impor a causa de inelegibilidade em questão, devendo a hipótese basear-se em irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, circunstância que não estaria concretamente caracterizada.

Pois bem.

A causa de inelegibilidade em tela encontra a seguinte positivação na LC n. 64/90:

Art. 1º. São inelegíveis:

I - para qualquer cargo:

(…).

g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição.

Segundo o dispositivo transcrito, exige-se o preenchimento de três pressupostos para a caracterização da inelegibilidade em questão: a) contas rejeitadas por decisão irrecorrível do órgão competente; b) rejeição por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa; c) inexistência de decisão judicial que suspenda ou anule os efeitos da rejeição.

Conforme bem apontou a sentença, nos termos do art. 75, inc. II, da CF/88, o órgão competente para o julgamento das contas referentes à aplicação de recursos federais é o TCU. Ademais, não há notícias de decisão judicial que tenha suspendido ou anulado os efeitos da decisão que rejeitou as contas.

Portanto, a controvérsia reside na caracterização de rejeição das contas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa.

Quanto ao ponto, extraem-se os seguintes elementos da decisão vertida do Processo n. 004.176/1999-5, os quais grifei para melhor exposição (ID 7460783):

SUMÁRIO: TOMADA DE CONTAS. EXERCÍCIO DE 1998. IRREGULARIDADES NA EXECUÇÃO DE CONVÊNIOS. FRAUDE À LICITAÇÃO NA CONTRATAÇÃO DA EMPRESA PARA REALIZAÇÃO DE OBRA E FORNECIMENTO DE MATERIAIS. BURLA AO PROCESSO LICITATÓRIO. PREÇOS SUPERFATURADOS. CITAÇÕES. AUDIÊNCIAS. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO. MULTA. DETERMINAÇÃO PARA EXTRAÇÃO DE CÓPIAS PARA JUNTADAS ÀS CONTAS DE 1997 E 1999. INABILITAÇÃO PARA EXERCER CARGO EM COMISSÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ENVIO DE CÓPIA DA DELIBERAÇÃO AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.

(...).

14. Dentre as irregularidades tratadas pela unidade técnica, conforme instruções transcritas no relatório precedente, dois contratos merecem considerações, por haver sido caracterizado dano ao erário: um que contratou a empresa Garra Construções, Planejamento Indústria e Comércio Ltda. para a reforma parcial do pátio, construção de guarita, cercas, muros, garagem e salão de eventos na sede do Ministério da Agricultura no Rio Grande do Sul e o outro que contratou a empresa Scala-Serviços de Limpeza e Conservação Ambiental Ltda., para prestação de serviços de limpeza das dependências da DFA/RS e correlatos.

15.Na contratação da empresa Garra Construções, Planejamento Indústria e Comércio Ltda. foram detectadas as seguintes irregularidades: (a) o projeto básico não contém orçamento detalhado; (b) não foi dada adequada publicidade à licitação; (c) não foram aprovadas as minutas do edital e do contrato pela assessoria jurídica; (d) não constou no edital local onde poderia ser examinado o projeto básico; (e) não foi exigida garantia para assinatura do contrato; (f) não houve designação formal de servidor para acompanhamento da obra; (g) não foi aplicada a multa por mora na execução; (h) inexecução parcial do contrato; (i) o contrato continuou sendo executado após a sua vigência; e (j) pagamentos antecipados.

16. O endereço residencial do ex-delegado da DFA-RS, senhor Clóvis Antônio Schwertner, fornecido para registro nos seus assentamentos funcionais, coincide com o da empresa Garra (Vol. I, fl.408-C). Além disso, 99% das cotas da empresa pertencem à senhora Maria Francisca Simões Pires (Vol. I, fl.336), irmã da senhora Amélia Simões Schwertner, esposa do ex-delegado e responsável técnica da empresa. O gerente da empresa, senhor Afonso Délcio Simões Pires, é irmão da esposa do ex-delegado.

17. Além disso, nos autos está demonstrado que houve intervenção no processo licitatório do então delegado, senhor Clóvis Antônio Schwertner. É o que se vê no depoimento de um dos membros da comissão de licitação, a senhora Vera Martinez Gonçalves Mignon, que, na sindicância instaurada para apurar o fato, quando perguntada a respeito da escolha das empresas convidadas, assim se manifestou:

“... normalmente procura-se no cadastro da Comissão (um fichário com cartões de visita), normalmente empresas que já prestaram serviços à DFA/RS, além de buscar-se empresas que estão cadastradas no SICAF para serem convidadas em número aproximado de 10 (dez). Neste processo, excepcionalmente esse procedimento não foi desta forma, e sim por determinação do Sr. Delegado Federal Sr. Clóvis Schwertner, via telefone, a declarante entregou pessoalmente 06 (seis) recibos em branco com os respectivos convites.” (Vol. I, fl. 346)

Portanto, do trecho em destaque, extrai-se bem caracterizada a prática de atos dolosos de improbidade administrativa, que causaram danos ao erário, enquadráveis, assim, no que dispõem os arts. 10 e 11 da Lei n. 8.429/92, por descumprimento da Lei n. 8.666/93 e normas correlatas, bem como pela inobservância de princípios da administração pública no tratamento conferido aos procedimentos licitatórios.

Nesse aspecto, em relação a irregularidades de licitação, é pacífica a jurisprudência no sentido de que a ação ou omissão que não observa os ditames legais pertinentes é apta a caracterizar a inelegibilidade que se analisa. A ilustrar, colaciono os seguintes julgados:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADO FEDERAL. INDEFERIMENTO. INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, G, DA LC Nº 64/90. REJEIÇÃO DE CONTAS. TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO. PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. LEILÃO. AUSÊNCIA DE AMPLA PUBLICIDADE DO EDITAL. AFRONTA À LEI Nº 8.666/93. VÍCIO INSANÁVEL. ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CARACTERIZAÇÃO. PROVIMENTO DO AGRAVO. DESPROVIMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO. (...). 2. Cabe à Justiça Eleitoral, no âmbito do processo de registro de candidatura, verificar se os elementos colhidos do decisum da Corte de Contas se amoldam à hipótese de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC nº 64/90, sem, contudo, alterar as premissas e conclusões do órgão competente, o que esbarraria no óbice previsto na Súmula nº 41/TSE: "não cabe à Justiça Eleitoral decidir sobre o acerto ou desacerto das decisões proferidas por outros Órgãos do Judiciário ou dos Tribunais de Contas que configurem causa de inelegibilidade". 3. Na linha da remansosa jurisprudência desta Corte Superior relativa à multicitada alínea g, a "ausência indevida, dispensa ou descumprimento da Lei 8.666/93 (Lei de Licitações) enquadra–se em referida causa de inelegibilidade" (AgR–REspe nº 127–58/CE, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 24.11.2017). 4. No caso dos autos, é inafastável e legítima a restrição ao jus honorum do ora agravado ante a inobservância dos ditames constitucionais, legais e regulamentares que denotam frontal incompatibilidade das condutas glosadas pela Corte de Contas com os valores tutelados pelo art. 14, § 9º, da CF, além de consubstanciarem vícios insanáveis enquadrados como atos dolosos de improbidade administrativa. 5. Ficou patente, in casu, o dolo in concreto, na medida em que, na condição de presidente da Ferroeste, o ora agravado: a) autorizou o pagamento de R$ 165.000,00 pela divulgação não comprovada do Edital de um leilão que envolvia objeto vultoso de mais de cinco milhões de reais; b) aceitou proposta em desacordo com o edital, implicando benefícios indevidos à arrematante; c) procedeu à homologação do certame e à adjudicação do objeto à SUCAFER apesar de esta empresa não ter atendido às regras editalícias; d) descumpriu sua obrigação legal de acompanhar o contrato firmado com o Leiloeiro oficial, o qual reafirmava, com clareza, a necessidade de controle da publicidade devida ao certame; e) foi sancionado com multa por duas vezes, em conjunto com os demais gestores da Ferroeste, tendo o TCE/PR encaminhado cópias das principais peças dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para as medidas cabíveis. 6. Agravo regimental provido.

(Recurso Ordinário n. 060136730, Acórdão, Relator Min. Admar Gonzaga, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data: 19.12.2018.) (Grifei.)

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. VEREADOR. INDEFERIMENTO. INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, G, DA LEI COMPLEMENTAR nº 64/90. REJEIÇÃO DE CONTAS. TCU. TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. CONVÊNIO ENTRE MUNICÍPIO E UNIÃO. AQUISIÇÃO. UNIDADES MÓVEIS DE SAÚDE. "OPERAÇÃO SANGUESSUGA". LICITAÇÃO. VÍCIOS INSANÁVEIS. FALTA DE COMPETITIVIDADE. SUPERFATURAMENTO. RECURSOS FEDERAIS. DESPROVIMENTO.

1. In casu, o registro de candidatura foi indeferido com base no art. 1º, I, g, da LC nº 64/90, em virtude da rejeição de contas do gestor público, prefeito à época, em sede de tomada de contas especial, na qual o TCU apurou sérias irregularidades tanto na licitação quanto na execução de convênio celebrado com o Fundo Nacional de Saúde visando à aquisição de ambulâncias para o município convenente.

2. Conforme delineado no acórdão regional, foram detectadas falhas graves, diretamente ligadas à atuação do então prefeito, tais quais: realização dos procedimentos sem a necessária presença de no mínimo 3 (três) participantes; não apresentação dos documentos necessários para a comprovação da regularidade fiscal das empresas vencedoras das licitações; existência de vínculo entre empresas participantes - fato ensejador de falta de competitividade no processo licitatório, com indício de conluio para fraudá-lo - e ausência de parecer jurídico que respaldasse a legitimidade do certame.

3. Diante da moldura fática constante do aresto recorrido, não há como acolher a tese de ausência de dolo, pois, na qualidade de prefeito, o ora recorrente foi diretamente responsável por irregularidades na condução do processo licitatório e na execução do convênio, no qual se constatou a malversação de recursos públicos decorrente do superfaturamento de preços com efetivo prejuízo ao Erário.

4. Na linha da jurisprudência deste Tribunal, ressalvados os vícios de natureza formal, o descumprimento da Lei de Licitações (Lei nº 8.666/93) constitui irregularidade insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa. Precedentes. 5. Recurso especial eleitoral desprovido.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 61803, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 226, Data: 22.11.2017, pp. 41-42.) (Grifei.)

Outrossim, é igualmente consolidada a jurisprudência no sentido de que se exige apenas o dolo genérico, consistente do agir consciente de forma contrária aos ditames legais e constitucionais ou contratuais a que está submetido o agente, para atrair a incidência da inelegibilidade.

Transcrevo o seguinte julgado nesse trilhar:

RECURSOS ESPECIAIS ELEITORAIS. ELEIÇÕES 2016. VEREADOR. REGISTRO DE CANDIDATURA. IMPUGNAÇÃO. INELEGIBILIDADE. CONTAS DESAPROVADAS. ART. 1º, I, G, DA LC 64/1990. DESPESAS COM COMBUSTÍVEL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE FINALIDADE PÚBLICA. VÍCIOS INSANÁVEIS. ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PROVIMENTO. […] 6. Desnecessário o dolo específico para incidência de referida inelegibilidade, bastando o genérico ou eventual, presentes quando o administrador assume os riscos de não atender aos comandos constitucionais e legais que vinculam e pautam os gastos públicos. Precedentes: RO 192-33/PB, Rel. Min. Luciana Lóssio, sessão de 30.9.2016; REspe 332-24/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJE de 26.9.2014; AgR-REspe 127-26/CE, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 19.6.2013. […].

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 8493, Acórdão, Relator Min. HERMAN BENJAMIN, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 37, Data: 22.02.2018, pp. 123-124.) (Grifei.)

Por derradeiro, acrescento recente decisão desta Corte de minha lavra, que, no contexto das Eleições de 2018, decidiu caso análogo:

REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADO ESTADUAL. ELEIÇÕES 2018. IMPUGNAÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL. HIPÓTESE DE INELEGIBILIDADE PREVISTA NO ART. 1º, INC. I, AL. "G", DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/90. REJEIÇÃO DAS CONTAS DE GESTÃO PRESTADAS NA QUALIDADE DE ADMINISTRADOR DE AUTARQUIA MUNICIPAL. IRREGULARIDADES INSANÁVEIS QUE CONFIGURAM ATOS DOLOSOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AFASTADA A PRELIMINAR DE INÉPCIA DA IMPUGNAÇÃO. MÉRITO. DESCUMPRIMENTO DO PERCENTUAL MÍNIMO DOS CARGOS EM COMISSÃO A SEREM PREENCHIDOS POR SERVIDORES DETENTORES DE CARGO DE PROVIMENTO EFETIVO. INOBSERVÂNCIA À LEI DE LICITAÇÕES. PAGAMENTO INDEVIDO RELATIVO À CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE RECOMPOSIÇÃO ASFÁLTICA. PRÁTICAS IRREGULARES QUE ATRAEM A INCIDÊNCIA DA INELEGIBILIDADE. PROCEDÊNCIA DA IMPUGNAÇÃO. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE REGISTRO DE CANDIDATURA.

1. Matéria preliminar rejeitada. 1.1 Inépcia da Impugnação apresentada pelo Ministério Público Eleitoral. A impugnação interposta está clara e devidamente fundamentada, propiciando o pleno exercício da defesa pelo interessado e sua coligação partidária. Inexistência de ofensa ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa, tendo sido plenamente atendido o art. 3º da Lei Complementar n. 64/90 e o art. 38 da Resolução TSE n. 23.548/17. 1.2. A possibilidade de proposição de pedido de revisão do julgado se assemelha a uma ação rescisória, e não a um recurso administrativo, razão pela qual não afasta a irrecorribilidade da rejeição de contas, conforme pacífico entendimento do TSE.

2. Impugnação ao pedido de registro de candidatura, ao entendimento da presença da hipótese de inelegibilidade prevista no art. 1º, inc. I, al. “g”, da Lei Complementar n. 64/90. Acórdão exarado pelo Tribunal de Contas do Estado, transitado em julgado, o qual rejeitou as contas de gestão relativas ao impugnado, prestadas na qualidade de administrador de autarquia municipal, por irregularidades insanáveis que configurariam atos dolosos de improbidade administrativa.

3. Cabe à Justiça Eleitoral verificar se a falha ou a irregularidade constatada pelo Órgão de Contas caracteriza vício insanável e se pode, em tese, ser enquadrado como ato doloso de improbidade administrativa. O escopo da inelegibilidade em questão é proteger a probidade administrativa e a moralidade para o exercício de cargo eletivo, considerada a vida pregressa do candidato, nos exatos termos estabelecidos no art. 14, § 9º, da Constituição Federal.

4. Descumprimento do percentual mínimo dos cargos em comissão a serem preenchidos por servidores efetivos. Inobservância aos preceitos da Lei de Licitações. Pagamento indevido relativo à contratação de recomposição asfáltica, caracterizando notório dano ao erário em virtude de valores pagos a maior. Desconsiderada a tese defensiva de ressarcimento dos valores ao erário por falta de provas da efetiva devolução. Ademais, entendimento consolidado do TSE no sentido de que a devolução integral ou parcial do valor recebido indevidamente não tem o condão de afastar a incidência da inelegibilidade.

5. Fatos que evidenciam o descumprimento aos princípios e normas que vinculam a atuação do administrador público e caracterizam o ato doloso de improbidade administrativa apto a atrair a inelegibilidade prevista no art. 1º, inc. I, al. “g” da Lei Complementar n. 64/90.

6. Procedência da impugnação e indeferimento do registro de candidatura.

(TRE-RS; RCAND n. 0601304-64.2018.6.21.0000, sessão de 17.9.2018.)

Dessa forma, na esteira do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, constata-se que, na decisão da Corte de Contas, estão presentes os elementos caracterizadores da inelegibilidade prevista na al. “g”, inc. I, art. 1º da LC n. 64/90, restando, portanto, inelegível o candidato por 8 anos a contar da data do trânsito em julgado da aludida decisão.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo integralmente a sentença que indeferiu o registro de candidatura de CLÓVIS ANTÔNIO SCHWERTNER ao cargo de vereador.