REl - 0600413-66.2024.6.21.0086 - Voto Relator(a) - Sessão: 30/04/2025 às 09:30

VOTO

O recurso é tempestivo e tem presente os demais pressupostos de admissibilidade, de forma que merece conhecimento.

VALDIR DE ALMEIDA BUENO interpõe recurso contra a sentença do Juízo da 86ª Zona Eleitoral de Três Passos/RS, em razão de aplicação irregular dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC e da utilização de recurso de origem não identificada - RONI.

Passo à análise do mérito da demanda.

1. Quanto à aplicação irregular dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, a sentença registrou como segue:
 

1. Da irregularidade na comprovação de gastos quitados com recursos oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha:

Para evitar desnecessária tautologia, transcrevo abaixo o apontamento constante na página 4 do Parecer Conclusivo:

4.1. As despesas com aluguel de veículos automotores, num total de R$ 1.500,00, extrapolaram o limite de 20% do total dos gastos de campanha contratados, num total de R$ 2.000,00, em R$ 1.100,00, infringindo o que dispõe o art. 42, II, da Resolução TSE nº 23.607/2019.

Assim, por aplicação irregular dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, considera-se irregular o montante de R$ 1.100,00, passível de recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/2019.


Efetivamente verifica-se a extrapolação do limite permitido para realização de despesas com aluguel de veículo, contrariando o que determina a legislação vigente, evidenciando-se a irregularidade. O candidato justificou-se dizendo:

"Já em relação as despesas de aluguel de veículos automotores extrapolar o limite de 20% do total de gastos de campanha, vem aduzir que devido ao crédito deste recurso somente ser creditado no dia 19/09/2024, não havia mais tempo hábil para gastar este recurso em impulsionamento de conteúdos ou atividades de militância ou mobilização de rua, pois seu eleitorado é estritamente interiorano, motivo pelo qual, apenas visitas domiciliares do candidato ou seus colaboradores e familiares, conseguiriam atingir um número expressivo de votos" (ID 125181585).

A manifestação não altera juridicamente a irregularidade cometida, cabendo a devolução do valor de R$ 1.100,00 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79 da Resolução n. 23.607/2019.

(Grifou-se.)
 

Pois bem.

Sublinho que as despesas com aluguel de veículos automotores não podem extrapolar o limite de 20% do total de gastos da campanha contratados, conforme disciplina a Lei n. 9.504/97, art. 26, § 1º, inc. II, e a Resolução TSE n. 23.607/19, art. 42, inc. II:

Lei n. 9.504/97

Art. 26. São considerados gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados nesta Lei: § 1º São estabelecidos os seguintes limites com relação ao total do gasto da campanha:

...)

II - aluguel de veículos automotores: 20% (vinte por cento).

Resolução TSE n. 23.607/19

Art. 42. São estabelecidos os seguintes limites em relação ao total dos gastos de campanha

contratados (Lei nº 9.504/1997, art. 26, § 1º):

(...)

II - aluguel de veículos automotores: 20% (vinte por cento).


 

No presente feito, contudo, em que pese o total de gastos contratados de campanha do candidato ter alcançado o montante de R$ 2.000,00, a despesa realizada com aluguel de veículo automotor foi de R$ 1.500,00, conforme revela o extrato de prestação de contas de ID 45807165, representando 75% da receita financeira utilizada na campanha – e ultrapassando em R$ 1.100,00, portanto, o limite estabelecido na legislação de regência.

Dessa forma, resulta evidente que os recursos do FEFC empregados para pagamento das despesas com aluguel de automóveis extrapolaram o limite imite de 20% do total de gastos da campanha contratados, em ofensa aos termos dos dispositivos legais supramencionados, restando configurada a aplicação irregular de verba pública, impondo o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional. Nesse sentido, cito o seguinte precedente deste Tribunal:
 

“PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSO DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. EXTRAPOLAÇÃO DO LIMITE DE GASTOS COM ALUGUEL DE VEÍCULO AUTOMOTOR. ALTO PERCENTUAL DA FALHA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. Prestação de contas apresentada por candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

2. No intuito de garantir o equilíbrio na disputa eleitoral, a legislação estabelece regras objetivas acerca de determinados limites de gastos de campanha, nos quais se inclui a despesa com aluguel de veículos automotores. Desse modo, os dispêndios com locação de veículos ficam limitados a 20% do total dos gastos eleitorais, sob pena de ser caracterizada irregularidade atinente à aplicação dos recursos de campanha.

3. Na espécie, foram empregados recursos do FEFC para pagamento das despesas com aluguel de automóveis, sendo extrapolado o correspondente limite, restando configurada a aplicação irregular de verba pública, impondo o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.

4. A irregularidade representa 19,32% do montante arrecadado pelo candidato, de maneira a inviabilizar a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade como meio de atenuar a gravidade das máculas sobre o conjunto das contas. 5. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PCE 0602293-31.2022.6.21.0000, Relator: CAETANO CUERVO LO PUMO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data: 17/10/2023) ”

Portanto, ante a aplicação irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, e em razão do exposto, deve ser mantida a sentença que determinou o recolhimento da quantia de R$ 1.100,00 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, §1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

2. Em relação ao apontamento de Recursos de Origem não Identificada – RONI, assim consignou o Juízo de origem:

2. Dos recursos de Origem não Identificada - RONI:

Houve apontamento no parecer conclusivo referente nota fiscal emitida em 03/10/2024 para o CNPJ de campanha do candidato, no valor de R$ 27,24, a qual não integrou a prestação de contas das Eleições, configurando-se como recurso de origem não identificada.

O candidato manifestou-se no ID 125181585 afirmando:

"Que no exame de contas foram identificadas despesas que não constaram nos dados declarados da prestação de contas, a exemplo da Nota Fiscal 116973, no valor de R$ 27,24, tendo como fornecedor SB POSTO LTDA., o que provavelmente tenha ocorrido, na medida que o candidato deva ter abastecido sua moto neste reduzido valor, e no momento da emissão do documento fiscal o atendente em vez de lançar no seu cadastro particular do CPF, erroneamente tenha lançado o gasto no cadastro de seu CNPJ de campanha"

Da análise das justificativas apresentadas aos autos identifica-se a ausência de má fé do candidato, diante do ínfimo valor da nota (R$ 27,24), contudo, a realização do gasto em CNPJ de campanha sem o lançamento na prestação de contas e o pagamento por meio de recursos arrecadados para a eleição não pode ser considerada regular, e, tampouco, pode-se dizer que atende às determinações legais vigentes para aplicação e comprovação de recursos financeiros.

Assim, por não comprovação da origem dos recursos utilizados na campanha, considera-se irregular o montante de R$ 27,24, passível de recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme o art. 14 e o art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/2019.

Assim, não comprovadas na forma legal as despesas realizadas (1 e 2), deve o valor correspondente ser devolvido ao Tesouro Nacional, com incidência de juros moratórios e atualização monetária, na forma do artigo 79, §§ 1º e 2º da Res. TSE n. 23.607/2019:

Art. 79. A aprovação com ressalvas da prestação de contas não obsta que seja determinada a devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou a sua transferência para a conta única do Tesouro Nacional, assim como dos recursos de origem não identificada, na forma prevista nos arts. 31 e 32 desta Resolução.

§ 1º Ausente a comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário (FP) e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou comprovada a utilização indevida, a execução da decisão que julgar as contas, após o seu trânsito em julgado, determinará a devolução do valor correspondente na forma estabelecida pela Res.-TSE nº 23.709/2022. (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024)

§ 2º Na hipótese do § 1º, incidirão juros moratórios e atualização monetária, calculados com base na taxa aplicável aos créditos da Fazenda Pública, sobre os valores a serem recolhidos ao Tesouro Nacional, desde a data da ocorrência do fato gerador até a do efetivo recolhimento, salvo se tiver sido determinado de forma diversa na decisão judicial.

Dessa forma, analisadas as irregularidades, passo a realizar o juízo de proporcionalidade e razoabilidade para fins de desaprovação ou aprovação com ressalvas das contas. No caso dos presentes autos as irregularidades totalizam R$ 1.127,24 e perfazem 40,25% dos recursos advindos, ou seja, está além tanto do montante de R$ 1.064,10 quanto do percentual de 10% costumeiramente adotados como balizas para a aprovação com ressalvas das contas.

(Grifou-se.)
 

 

O presente tópico tem a matéria regulada no art. 14 e art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 14. O uso de recursos financeiros para o pagamento de gastos eleitorais que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º implicará a desaprovação da prestação de contas do partido político ou do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º).

§ 1º Se comprovado o abuso do poder econômico por candidato, será cancelado o registro da sua candidatura ou cassado o seu diploma, se já houver sido outorgado (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º).

§ 2º O disposto no caput também se aplica à arrecadação de recursos para campanha eleitoral os quais não transitem pelas contas específicas previstas nesta resolução.

(...)

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

(…)

IV - as doações recebidas em desacordo com o disposto no art. 21, § 1º, desta Resolução quando impossibilitada a devolução ao doador;
 

E a tese recursal lançada alega, em suma, a ocorrência de equívoco no lançamento de despesa efetuada em posto de combustível, porquanto tal lançamento fora feito no CNPJ da campanha, quando deveria ter sido registrado no CPF do candidato, em razão de que não teria relação com o pleito eleitoral.

Destaco, contudo, que o recorrente não trouxe aos autos elemento probatório a corroborar o alegado, de modo que não é possível afastar a incidência da legislação, no sentido de que incumbe ao candidato providenciar, junto ao prestador do serviço, o efetivo cancelamento da nota.

Nesse norte, a presença de recursos de origem não identificada entre as verbas usadas na campanha eleitoral exige o recolhimento do valor ao Tesouro Nacional

Portanto, subsiste a irregularidade e, consequentemente, a determinação de recolhimento.

Por fim, destaco que a soma das irregularidades é percentualmente expressiva, representando 40,25%, do total arrecadado (R$ 2.000,00), e seu valor absoluto é superior ao parâmetro de R$ 1.064,10 estabelecido no art. 43, caput, e referido no art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, utilizado por este Tribunal como autorizador da aplicação do postulado da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas, de modo a afastar a possibilidade de aplicação dos princípios constitucionais.

Diante do exposto, VOTO para negar provimento ao recurso e manter a sentença pelos seus próprios fundamentos.