REl - 0600354-36.2024.6.21.0100 - Voto Relator(a) - Sessão: 30/04/2025 às 09:30

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Quanto ao mérito, trata-se de recurso interposto por CARLOS EDUARDO DE OLIVEIRA, candidato ao cargo de vereador no Município de Tapejara/RS, contra a sentença que desaprovou suas contas de campanha, referentes às Eleições Municipais de 2024, em razão da extrapolação do limite de autofinanciamento em R$ 783,66, aplicando-lhe multa correspondente a 100% da quantia excedida, com base no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

O limite de gastos para o cargo de vereador no Município de Tapejara, nas Eleições 2024, foi de R$ 22.163,42, teto informado pelo Tribunal Superior Eleitoral no Sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, o que impunha ao candidato a obediência ao limite equivalente a 10% deste valor ao utilizar recursos próprios, ou seja, R$ 2.216,34, na forma do art. 23, § 2º-A, da Lei das Eleições.

Na hipótese, o candidato utilizou, em sua campanha eleitoral, recursos próprios no valor total de R$ 3.000,00, consoante apurou o órgão técnico (ID 45827756), excedendo em R$ 596,49 o limite prescrito.

Em suas razões, o recorrente alega que o suposto excesso de autofinanciamento deu-se em razão de uma doação de terceiro, não registrada oportunamente, na monta de R$ 785,00, a qual, ao cabo, restou contabilizada como recursos próprios.

Nada obstante, a apresentação de declaração firmada pelo suposto doador, acompanhada de comprovante simples de doação (IDs 45827770 e 45827771), não cumpre os requisitos estabelecidos no art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19, que exige depósitos identificados ou transferências bancárias para garantir a rastreabilidade e a transparência dos recursos eleitorais.

A inobservância das formalidades exigidas pela legislação eleitoral para o recebimento de doação financeira de terceiro compromete a confiabilidade das informações relativas à origem e ao tempo da alegada operação.

Assim, os documentos apresentados pelo recorrente não possuem idoneidade probatória suficiente para afastar a irregularidade apontada na sentença.

Por outro lado, verifica-se que o recorrente, após a sentença, recolheu de modo voluntário e espontâneo a multa imposta (ID 45827769), a fim de evidenciar a sua boa-fé no intento de sanear a falha.

O pagamento realizado configura ato incompatível com a sua vontade de recorrer e faz nascer a preclusão lógica em relação à discussão da sanção aplicada na sentença, em conformidade com o art. 1.000 do CPC:

Art. 1.000. A parte que aceitar expressa ou tacitamente a decisão não poderá recorrer.

Parágrafo único. Considera-se aceitação tácita a prática, sem nenhuma reserva, de ato incompatível com a vontade de recorrer.

 

Na mesma direção, colho precedente do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. MULTA ADMINISTRATIVA. PAGAMENTO ESPONTÂNEO. ACEITAÇÃO TÁCITA. ATO INCOMPATÍVEL COM A VONTADE DE RECORRER. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. 1. A conduta da impetrante de realizar o pagamento espontâneo da multa que lhe foi imputada configura ato incompatível com a vontade de recorrer, mormente porque não houve qualquer ressalva a esse respeito. Precedentes: AgInt no REsp 1.823.177/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe 19/11/2020; AgInt no REsp 1.565.569/RS, Rel. Mini. Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 24/04/2020; AgInt no AREsp 588.832/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Seção, DJe 08/09/2016; AgRg nos EDcl no REsp 1.220.327/MA, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 23/08/2011. 2. Agravo interno não provido.

(STJ - AgInt no RMS: 62744 PE 2020/0010183-5, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 24.05.2021, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 26.05.2021.) Grifei.

 

Na seara eleitoral, colho julgado do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro:

RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. CANDIDATO AO CARGO DE VEREADOR. ELEIÇÕES 2020. MUNICÍPIO DE SÃO GONÇALO. IRREGULARIDADE NA APLICAÇÃO DOS RECURSOS DO FEFC DURANTE A CAMPANHA. VALOR ABSOLUTO E PERCENTUAL EXPRESSIVOS. GRAVIDADE. ADMISSIBILIDADE DO EXAME DOS DOCUMENTOS JUNTADOS EXTEMPORANEAMENTE APENAS PARA FINS DE REDUÇÃO DO VALOR A SER RECOLHIDO AO ERÁRIO. PAGAMENTO ESPONTÂNEO DO VALOR DETERMINADO PARA O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. ACEITAÇÃO TÁCITA. CONHECIMENTO EM PARTE DO RECURSO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIMENTO. MANUTENÇÃO DA DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. […]. 6. O recorrente efetuou o pagamento do valor determinado na sentença para recolhimento ao Tesouro Nacional, após a interposição do recurso eleitoral, mas antes do seu julgamento, como confirmado pela Secretaria de Orçamento e Finanças. Prática de ato incompatível com a vontade de recorrer quanto ao capítulo da sentença referente à devolução de valores ao erário. O recorrente acabou por anuir, de forma espontânea, ainda que tacitamente, com a condenação que lhe foi imposta. Configuração da denominada aceitação tácita da sentença ou aquiescência, aplicando-se o disposto no art. 1.000 do Código de Processo Civil. Não conhecimento do recurso quanto a esse capítulo da sentença, diante do pagamento espontâneo do valor estabelecido na condenação. Precedente deste TRE-RJ. 7. Recurso conhecido em parte e, nesta extensão, desprovido, mantendo-se a desaprovação das contas de campanha do recorrente.

(TRE-RJ; RECURSO ELEITORAL n. 060034739, Acórdão, Des. Rafael Estrela Nobrega, Publicação: DJE - DJE, 27.11.2024.) Grifei.

 

Logo, sem prejuízo da conferência do pagamento no momento processual adequado (fase de cumprimento de sentença), está, desde já, operada a preclusão lógica e prejudicada a impugnação relativa à condenação pecuniária aplicada na sentença.

Nada obstante, subsiste o interesse recursal referente ao julgamento pela aprovação com ou sem ressalvas da contabilidade.

Nesse ponto, tem-se que a irregularidade reconhecida na sentença ostenta diminuta expressão, pois representa apenas 4,6% do total arrecadado pelo recorrente (R$ 17.000,00) e está aquém do limite de R$ 1.064,10 considerado pela jurisprudência como irrisório no universo das campanhas eleitorais, o que não justifica a desaprovação das contas.

Esse entendimento encontra amparo na jurisprudência consolidada do Tribunal Superior Eleitoral, no sentido de que os princípios da proporcionalidade e razoabilidade incidem na prestação de contas, para fins de aprovação com ressalvas, quando o valor total das irregularidades for de até 10% do montante de recursos arrecadados ou quando o valor total das irregularidades for de até 1.000 (mil) Ufirs, ou seja, R$ 1.064,10:

ELEIÇÕES 2018. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEPUTADO ESTADUAL. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DESPESAS COM COMBUSTÍVEL SEM A DECLARAÇÃO DE LOCAÇÃO OU CESSÃO DE USO DE VEÍCULO. INEXISTÊNCIA DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL DOS RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC) NÃO UTILIZADOS. VALOR MÓDICO EM TERMOS ABSOLUTOS. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE MÁ–FÉ. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. INCIDÊNCIA. MANUTENÇÃO DA DETERMINAÇÃO DE DEVOLUÇÃO AO ERÁRIO. DESPROVIMENTO.

[...].

3. Este Tribunal Superior tem orientação no sentido de que, "nas hipóteses em que não há má–fé, a insignificância do valor da irregularidade pode ensejar a aprovação da prestação de contas, devendo ser observado tanto o valor absoluto da irregularidade, como o percentual que ela representa diante do total dos valores movimentados pelo candidato" (AgR–Al nº 1856–20/RS, Rel. Min. Maria Thereza Rocha de Assis Moura, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 9.2.2017). Na mesma linha: AgR–Al nº 211–33/PI, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 9.8.2014.

4. Não há, portanto, falar em quebra da isonomia relativa a outros candidatos, tampouco em violação à segurança jurídica, porquanto este Tribunal Superior tem aplicado os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade em situações semelhantes à dos autos. Precedentes.

5. Assim, é de serem aprovadas as contas, com ressalvas, mantendo–se a determinação de ressarcimento ao Erário do montante tido por irregular, nos termos apontados na decisão agravada.

6. Agravo regimental desprovido.

(TSE; Agravo Regimental Em Recurso Especial Eleitoral 060175306/PI, Relator Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Acórdão de 03.09.2020, Publicado no Diário de Justiça Eletrônico 190, data 23.09.2020.) Grifei.

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CAMPANHA. CANDIDATO. DEPUTADA ESTADUAL. DESAPROVAÇÃO NA INSTÂNCIA REGIONAL. DESPESAS IRREGULARES COM RECURSOS DO FEFC. GASTO NÃO ELEITORAL. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. VALOR PERCENTUAL DIMINUTO DAS IRREGULARIDADES. PRECEDENTES. APROVAÇÃO DAS CONTAS COM RESSALVAS. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. O art. 36, §§ 6º e 7º, do RITSE autoriza o relator a decidir, monocraticamente, os recursos que lhe são distribuídos, com fundamento na compreensão jurisprudencial dominante no Tribunal Superior Eleitoral.

2. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade podem ser aplicados para aprovar, com ressalvas, as contas cujas falhas identificadas constituam valor percentual ou valor absoluto módico.

3. O montante equivalente a 1.000 (mil) Ufirs – R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) – é considerado diminuto e, isoladamente, inapto a ensejar a desaprovação de contas.

4. Ao lado desse critério, examina–se o percentual correspondente ao vício impugnado que, segundo precedentes desta Corte, alcança o limite máximo de 10% do total da arrecadação ou despesa.

5. A irregularidade relacionada à utilização de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) não impede, per se, a aprovação das contas com ressalvas. Precedentes.

6. Na espécie, extrai–se do quadro fático delineado no acórdão regional que a irregularidade constatada, relativa a gastos com serviços contábeis mediante utilização de recursos do FEFC, totalizou o montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), correspondente a 5,2% do total das despesas contratadas. Esse valor percentual afigura–se diminuto e autoriza a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas, à luz da jurisprudência deste Tribunal Superior, considerando que não se depreendem do acórdão regional elementos qualitativos capazes de inviabilizar a aplicação dos referidos preceitos.

7. Agravo interno a que se nega provimento.

(TSE; Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral n. 060542160/SP, Relator: Min. Edson Fachin, Acórdão de 25.2.2021, Publicado no Diário de Justiça Eletrônico 48, data 17.3.2021.) Grifei.

 

Dessa forma, as circunstâncias apontadas afastam a necessidade de desaprovação das contas, sendo razoável e suficiente a sua aprovação com ressalvas, medida adequada para refletir o pequeno vulto da irregularidade constatada, mantendo-se a multa aplicada e os demais termos da sentença em razão da preclusão.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de campanha de CARLOS EDUARDO DE OLIVEIRA, nos termos do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.