E.Dcl. - 143882 - Sessão: 12/03/2015 às 17:00

RELATÓRIO

JULIANA BRIZOLA opõe embargos de declaração (fls. 504-506) perante o acórdão das fls. 498-501, aos fundamentos de que houve (1) omissão, ao não constar no aresto a declaração de voto do julgador revisor que fez coro com a tese fundamental de defesa e, (2) contradição, uma vez que a prestadora de contas não teria se valido das regras constantes na Resolução TSE n. 23.406/2014, mas sim unicamente do disposto nos arts. 29, §§ 3° e 4° da Lei n. 9.504/1997.

Sustenta ser necessário o acolhimento, de modo que sejam analisados adequadamente todos os fundamentos de fato e de direito elencados na peça recursal, entregando-se, assim, de maneira completa, a prestação jurisdicional.

É o relatório.

 

VOTOS

Desa. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère:

A irresignação é tempestiva e pode ser conhecida.

Os embargos de declaração servem para afastar omissão, obscuridade, dúvida ou contradição que emergem do acórdão, situando a matéria no âmbito deste Tribunal, nos termos do artigo 275, I e II, do Código Eleitoral.

Dispõe o aludido comando:

Art. 275. São admissíveis embargos de declaração:

I - quando há no acórdão obscuridade, dúvida ou contradição;

II - quando for omitido ponto sobre que devia pronunciar-se o Tribunal.

No caso concreto, alega-se (1) omissão, eis que o voto do revisor, que enfrentou e fez coro com a tese fundamental de defesa, apesar de ter acompanhado o voto do relator pela desaprovação das contas, não fez parte do acórdão; e (2) contradição, pois contraditória não é a atitude da prestadora, mas sim o voto proferido pela relatora pois a prestadora não se valeu apenas de uma parte do comando normativo e se desfez da outra. A prestadora se utilizou, sim, do que diz a Lei n. 9.504/1997, em seu art. 29, §§3º e 4º e, desta forma, a parte em que a relatora aduz que a candidata se valeu afim de lhe beneficiar nada mais é aquilo que a lei prevê. Ocorre que a lei não prevê a anuência expressa dos credores. Assim sendo, a candidata não se valeu de uma parte da resolução, como induz o voto, mas tão somente da lei que a instituiu.

Pois bem.

Na parte em que alegadamente se pretende ocorrida omissão, note-se que os embargos parecem pedir a transcrição, no corpo do acórdão, da fala realizada pelo Dr. Leonardo Tricot Saldanha por ocasião do julgamento – até mesmo porque a manifestação que se pretende registrada não teve o autor indicado, e os processos de prestação de contas não possuem julgador revisor.

Ressalto que a praxe desta Casa, como sói ocorrer nos tribunais, é de que a manifestação de voto, quaisquer razões que o julgador deseje fiquem registradas, é antecedida pelo pedido específico de registro – que não foi solicitado por parte dos integrantes do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul durante a sessão de julgamento, merecendo relevo o fato de que o acórdão, por unanimidade, desaprovou as contas da ora embargante.

Além disso, o TSE tem posição consolidada no sentido de que as notas taquigráficas e a degravação da fita da sessão de julgamento não são necessárias para que a decisão fique completa. Ao assinarem o acórdão, os juízes demonstram sua concordância com o nele contido (ERESPE n. 19370, Rel. Min. FERNANDO NEVES DA SILVA, DJ 03.5.2002, p. 120 e ED-REspe n. 29730, Rel. Min. FELIX FISCHER, Publicado em Sessão em 29.9.2008).

De acordo com a jurisprudência do STJ, a falta de juntada das notas taquigráficas da sessão de julgamento não configura omissão hábil a autorizar o manejo de embargos declaratórios, registro que somente deve ser determinado se as notas forem indispensáveis à compreensão do exato sentido e alcance do acórdão (EDcl no AgRg no REsp 1277644/SP, Rel. Min. Regina Helena Costa, Quinta Turma, DJe 25.4.2014).

O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é de que a transcrição de eventuais manifestações dos integrantes do Colegiado, declaradas durante a sessão de julgamento, somente é devida quando há discordância entre os eventuais pronunciamentos orais e o que restou consignado no acórdão lavrado pelo relator. Neste sentido, colaciono a seguinte ementa:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR, COM VIOLÊNCIA PRESUMIDA. PEDIDO DE JUNTADA DE NOTAS TAQUIGRÁFICAS. RELEVÂNCIA DOS PRONUNCIAMENTOS ORAIS NÃO DEMONSTRADA.

INEXISTÊNCIA DE DISCREPÂNCIA OU OMISSÃO QUANTO AOS FUNDAMENTOS DO JULGADO. EMBARGOS REJEITADOS.

1. Muito embora o Regimento Interno preconize a juntada das notas taquigráficas (arts. 100 e 103 do RISTJ), como parte integrante da decisão, essa regra tem sido flexibilizada, a fim de abreviar o tempo que intermedeia o julgamento e a respectiva publicação do acórdão, em especial atenção ao princípio da celeridade e da efetividade na prestação jurisdicional.

2. Assim, desde que não haja discrepância entre os eventuais pronunciamentos orais e o que restou consignado no acórdão lavrado pelo Relator, tem-se dispensado a juntada das notas taquigráficas, prática que não fere o devido processo legal substancial.

3. O Embargante não logrou demonstrar que o conteúdo dos debates foi relevante ao deslinde da causa, mormente porque o julgado foi proferido por unanimidade, nos termos do voto condutor do julgado, sendo-lhe garantido o acesso aos fundamentos da decisão que, por ventura, pretenda impugnar por meio dos recursos cabíveis. Omissão inexistente. Precedentes.

4. Embargos de declaração rejeitados.

(EDcl no REsp 1357289/PR, Relator:  Min. LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, DJe 24.6.2014.)  (Grifei.)

Portanto, considerando que o processo foi julgado unanimemente, sem qualquer voto vencido, mostra-se despicienda a transcrição de votos orais que se posicionaram pelo acompanhamento do voto condutor, medida que iria de encontro com a celeridade processual e culminaria com o atraso na publicação dos acórdãos deste Tribunal.

De igual sorte, no que pertine à alegação de contradição, não assiste razão à embargante, sendo nítido o intuito de revaloração dos fatos já julgados, finalidade a que não se prestam os embargos de declaração:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDOS COMO REGIMENTAL. PRINCÍPIOS DA FUNGIBILIDADE E DA ECONOMIA PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. INTEMPESTIVIDADE.

1. Esta Corte Superior posicionou-se de forma clara, adequada e suficiente acerca da intempestividade do especial.

2. Por meio dos aclaratórios, é nítida a pretensão da parte embargante em provocar rejulgamento da causa, situação que, na inexistência das hipóteses previstas no art. 535 do CPC, não é compatível com o recurso protocolado.

3. A juntada de certidão que contradiz certidão dos autos não está autorizada em sede de embargos de declaração, pois extemporânea.

4. Embargos de declaração rejeitados.

(Embargos de Declaração nos EDcl no AREsp 76.433/RN, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Segunda Turma, julgado em 19.4.2012, DJe 25.4.2012.)

Ora, exatamente da desobediência à Resolução n. 23.406/2014 é que trata a desaprovação das contas de Juliana Brizola. Reproduzo o trecho do acórdão atacado:

Razões que não procedem, por dois motivos principais.

O primeiro, porque existente o amparo legal que a defesa entende inexistente – o art. 299 do Código Civil. Tratando-se de dívida que deve se moldar pela legislação civil, nada mais indicado que a resolução do TSE, normativo regulamentar, esteja em sintonia com as normas legais de regência.

O segundo, porque ao repassar as dívidas para o partido, a candidata se valeu do art. 30 da Resolução TSE n. 23.406/2014, exatamente o dispositivo que questiona.

Não é razoável, portanto, a quem quer que seja, obter de qualquer norma apenas o que lhe beneficia, sem arcar com os ônus que em contrapartida são trazidos. Utilizar o caput do art. 30 e, quanto ao § 3°, sustentar que a norma é secundária, e por isso não foi cumprida, é, no mínimo, contraditório.

Ou seja, se a prestadora quer obter a vantagem de repasse da dívida, deveria também arcar com a responsabilidade de obter a anuência dos credores – até porque ambas as situações estão regradas no mesmo comando normativo.

Superada a questão, saliento apenas que, além da desobediência da regra em si, que prejudica o correto exame das contas da candidata, os consideráveis valores envolvidos – R$ 318.945,45 (trezentos e dezoito mil novecentos e quarenta e cinco reais com quarenta e cinco centavos), bem como a admissão de que a conduta ocorreu por opção deliberada, tornam ainda mais reprovável a falha.

Como se percebe, a decisão restou adequadamente fundamentada, sendo especificadas as razões do julgamento e inexistente a contradição apontada.

Em termos breves, assim, a obediência à Lei n. 9.504/1997 foi acompanhada de desobediência ao art. 299 do Código Civil - não houve, portanto, obediência à legislação, como querem fazer crer os embargos, ao atribuir contradição ao acordão. Nessa linha, friso que a obediência à Resolução TSE n. 23.406/2014 foi também parcial, redundando logicamente em desobediência na parte em que exige a observância do art. 299 do CC.

As pretensas alegações, portanto, não se amoldam às hipóteses previstas na legislação para manejo de aclaratórios. Veja-se a jurisprudência:

Embargos de declaração. Acórdão que manteve a sentença pela desaprovação de contas prolatada no juízo originário.

Não configuradas quaisquer das hipóteses previstas no artigo 275 do Código Eleitoral para o manejo dos aclaratórios. Decisão adequadamente fundamentada, inexistindo dúvida, omissão, contradição ou obscuridade passíveis de serem sanadas.

Insubsistência desse instrumento como meio para retomada da discussão de matéria já decidida por esta Corte ou para lastrear recurso às instâncias superiores. Desacolhimento. (PROCESSO: RE 1000034-61.2008.6.21.0170, julgado em 29-03- 2012. DR. JORGE ALBERTO ZUGNO)

 

Embargos de declaração com pedido de efeitos infringentes. Acórdão unânime que manteve desaprovação de prestação de contas no juízo originário. Insurgência sob a alegação de não exaurimento da matéria versada no decisum.

Aclaratórios destinam-se a afastar obscuridades, dúvida ou contradição que emergem dos fundamentos do acórdão, nos estritos termos do disposto no art. 275 do Código Eleitoral. Incabível a via recursal eleita para lastrear recurso às instâncias superiores. Insubsistência desse instrumento, igualmente, como meio para retomada da discussão de matéria já decidida por esta Corte. Desacolhimento. (PROCESSO: PC 432 (402397-03.2008.6.21.0160), julgado em 25-08-2011. Dr. Leonardo Tricot Saldanha)

Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração.

 

Dr. Leonardo Tricot Saldanha:

Pedindo desculpas à relatora, encaminho voto divergente.

Entendo que, no momento de um julgamento, sendo este público, fazem parte de sua composição inclusive os outros votos que são dados. E, dentro de um Estado Democrático de Direito, é importante que as várias falas que formaram a convicção sejam dadas ao cidadão que está sendo julgado.

No caso, concordei com a relatora, mas acredito que possa ser de interesse da pessoa conhecer a manifestação.

Foram trazidos julgamentos do STJ no sentido de não ser necessária transcrição de manifestações se for para convergir; mas existem julgamentos desse TRE, que deram provimento a pedidos absolutamente similares. Um órgão judicial fundamenta seus julgamentos para que a parte concorde ou discorde daquela decisão.

Encaminho voto divergente nos embargos, dando procedência apenas para que seja transcrita a manifestação proferida nos seguintes termos, na referida ocasião:

Do ponto de vista racional, lógico e sistemático, o argumento do advogado é absolutamente razoável, ou seja, não existe motivo para que se exija anuência expressa dos credores em face do fato de que mais um devedor se soma: não existe substituição. Se eu fosse legislador, eu votaria com o advogado, Dr. Jonatas, eu acho que ele tem toda a razão e essa alínea b não deveria existir. Mas existe, e em ela existindo, podemos discutir a questão de sua constitucionalidade e razoabilidade.

Não está estabelecido na lei a exigência da anuência expressa dos credores. Por outro lado, a resolução do TSE exige a anuência expressa, de maneira, ao meu ver, desnecessária, mas exige. A pergunta é: essa resolução operou no espaço da legalidade ou chegou a ultrapassá-lo e ser com isso inconstitucional?

Teoricamente, uma resolução só pode desenvolver aquilo que está estabelecido na lei – a resolução lei não é – mas a resolução do TSE tem um caráter normativo mais significativo e isso tem sido aceito pelos tribunais há muito tempo. Eu não concordo com aquela antiga posição que diz que resolução do TSE tem nível de lei ordinária, porque isso é simplesmente absurdo – uma resolução nunca pode ter nível de lei ordinária - mas o STF tem aceitado, inclusive em situações mais graves como a questão da fidelidade partidária, que o Tribunal Superior Eleitoral tem um caráter normativo muito importante em face da especificidade da matéria eleitoral e da necessidade de uma organização sistemática.

A questão em julgamento leva a um sopesamento subjetivo significativo: será que o TSE ultrapassou sua capacidade regulamentar ao exigir anuência expressa dos credores se a lei não exige? A primeira impressão é que sim, ocorre que as resoluções do TSE fazem isso e precisam fazer isso por que as leis eleitorais são infinitamente insuficientes para regular o processo eleitoral.

Parece-me que essa alínea não é suficientemente agressiva ao sistema; o TSE quando diz com anuência expressa dos credores não o faz por acaso, e o faz dentro dessa resolução para essas eleições. Ela é sistêmica porque está de acordo com a jurisprudência antiga e porque tem amparo no artigo 299 do Código Civil, apesar de ser outra situação, porque haveria essa modificação.

Discordo da alínea b, mas está ali e é feita por um poder maior que não chega a ser suficientemente absurdo ao ponto de eu declarar a inconstitucionalidade dessa alínea. Motivo pelo qual, com todos esses reparos, todos esses argumentos, e em homenagem ao argumento racional e lógico que foi apresentado da tribuna, eu acompanho o voto da eminente relatora.

 

Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja:

Acompanho o voto divergente, porque eu acho importante para a parte que fique transcrita a manifestação do juiz no julgamento.

 

Desa. Liselena Schifino Robles Ribeiro:

Acompanho a Desa. Maria de Fátima, porque tendo o Dr. Leonardo concordado, embora a declaração fosse acrescer ao voto, realmente não vejo necessidade de acrescentá-la.

 

Dr. Hamilton Langaro Dipp:

Pelas mesmas razões da Dra. Gisele, estou acompanhando o voto divergente.

 

Dr. Ingo Wolfgang Sarlet:

Com a devida vênia à Desa Maria de Fátima, compreendo as razões que levaram ao indeferimento, também manifestadas pela Desa. Liselena, concordo com o voto divergente.