AP - 268246 - Sessão: 06/08/2015 às 17:00

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL ofereceu denúncia (fls. 02-05) contra IVANOR RENATO RAUBER (Prefeito de Jaquirana/RS), ORESTE ÂNGELO ANDELIERI e IVAN LAURO RAUBER, pela suposta prática de delito tipificado no art. 299 do Código Eleitoral.

A ação foi proposta perante esta Corte em razão da prerrogativa de foro do denunciado IVANOR (Prefeito de Jaquirana/RS).

Os fatos foram assim narrados na peça acusatória:

1º fato – CORRUPÇÃO ELEITORAL – ARTIGO 299 DO CÓDIGO PENAL – TROCA DE VOTOS POR VANTAGEM ECONÔMICA

Interceptação telefônica (fl. 449) identificou diálogo entre o denunciado IVAN LAURO RAUBER e o alvo HELIOVAN, onde o primeiro questiona o segundo sobre o problema da construção de um banheiro e o pagamento de mil reais em troca de seis votos. Investigação policial subsequente logrou obter o depoimento de ADELINO SILVEIRA RODRIGUES que confirmou que IVAN RAUBER mandou fazer um banheiro em sua casa, sendo que a mão de obra foi paga por IVAN e o material quem lhe deu foi o Prefeito IVANOR RAUBER. Em relação aos seis votos em troca de mil reais, afirmou que ele, sua mulher e seus seis filhos votaram no Prefeito IVANOR. Pontuou, ainda, que o material foi entregue em sua residência uma semana antes das eleições.

Assim, em data próxima à eleição de 06 de outubro de 2012, o denunciado IVANOR RENATO RAUBER, na condição de candidato à reeleição ao cargo de Prefeito do Município de Jaquirana/RS, e IVAN LAURO RAUBER, na condição de coordenador da campanha eleitoral de IVANOR, ofereceram e deram a ADELINO SILVEIRA RODRIGUES material para a construção de um banheiro, que foi construído em 06/10/2012 (fl. 451), em troca de seu voto e de seus seis filhos.

Deste modo, os denunciados IVANOR RAUBER e IVAN RAUBER ofereceram e deram a ADELINO vantagem econômica para obter o seu voto, incorrendo nas sanções do artigo 299 do Código Eleitoral.

2º FATO - CORRUPÇÃO ELEITORAL – ARTIGO 299 DO CÓDIGO PENAL – TROCA DE VOTOS POR DINHEIRO

No dia 04 de outubro de 2012, os denunciados IVANOR RENATO RAUBER, na condição de candidato à reeleição ao cargo de Prefeito do Município de Jaquirana/RS, e ORESTE ÂNGELO ANDELIERI, na condição de candidato a vereador no mesmo local, ofereceram a ELIZETE DA SILVA PEREIRA, no Gabinete do Prefeito IVANOR, a quantia de R$ 180,00 (cento e oitenta reais), para que pagasse uma consulta médica para sua filha, em troca de seu voto. Em 05 de outubro de 2012, por volta das 14 horas e 30 minutos, o denunciado ORESTES foi até a casa de ELIZETE e entregou-lhe a quantia de R$ 100,00 (cem reais), que seria parte do negócio da compra de votos, sendo que os outros R$ 80,00 (oitenta reais) foram entregues no mesmo dia, cerca de uma hora depois, também por ORESTES, mas, nesta oportunidade, a mando do também denunciado IVANOR (fls. 481-482).

Conforme interceptação telefônica captada entre ELIZETE e o candidato a vereador ORESTES (fl. 479), a primeira cobrou do segundo o valor tratado para a compra de seu voto ou de mais, sendo que o segundo disse que daria R$ 100,00 (cem reais) e que a outra parte é com o IVANOR. O teor da conversa degravada é confirmado pelo depoimento prestado perante a Polícia Civil (fl. 481).

Deste modo, os denunciados IVANOR RAUBER e ORESTE ÂNGELO ANDELIERI ofereceram e deram a ELIZETE vantagem econômica para obter o seu voto, incorrendo nas sanções do artigo 299 do Código Eleitoral.

3º fato – CORRUPÇÃO ELEITORAL – ARTIGO 299 DO CÓDIGO PENAL – TROCA DE VOTOS POR DINHEIRO

Aos 05 dias do mês de outubro de 2012, os denunciados IVANOR RENATO RAUBER, na condição de candidato à reeleição ao cargo de Prefeito do Município de Jaquirana/RS, e ORESTE ÂNGELO ANDELIERI, na condição de candidato a vereador do mesmo município, ofereceram a ONEIDE AGUIAR FOGAÇA material para a construção de uma casa na barra da chapada em troca de quinze votos.

Conforme interceptação telefônica captada no dia 05/10/2012 (fls. 483-484), ONEIDE telefonou para ORESTES, cobrando a madeira que ele e IVANOR haviam lhe prometido, em data não especificada, em troca de quinze (fl. 485). O teor da conversa degravada é confirmado pelo depoimento prestado perante a Polícia Civil (fl. 485).

Deste modo, os denunciados IVANOR RAUBER e ORESTE ANDELIERI ofereceram a ONEIDE vantagem econômica para obter o seu voto, incorrendo nas sanções do artigo 299 do Código Eleitoral.

DA CAPITULAÇÃO LEGAL DAS CONDUTAS

Assim agindo, o denunciado IVANOR RENATO RAUBER fez-se incurso no artigo 299 do Código Eleitoral por três vezes, em concurso material, IVAN LAURO RAUBER por uma vez e ORESTE ÂNGELO ANDELIERI por duas vezes, também em concurso material.

O órgão ministerial requer o arquivamento do inquérito em relação a ADELINO SILVEIRA RODRIGUES, ELIZETE DA SILVA PEREIRA e ONEIDE AGUIAR FOGAÇA, nos seguintes termos:

Embora moralmente reprovável a venda de votos, ADELINO SILVEIRA RODRIGUES, ELIZETE DA SILVA PEREIRA e ONEIDE AGUIAR FOGAÇA são pessoas extremamente simples que obtiveram itens absolutamente essenciais à sua sobrevivência, o que permite que se exclua a ilicitude da conduta, ante a presença do estado de necessidade, nos termos do artigo 23, I, do Código Penal.

A denúncia está instruída com cópia do Inquérito Policial n. 048/2012/152725 da Delegacia de Polícia de Jaquirana, autuado neste Tribunal sob a Classe INQ n. 359-44.2012.6.21.0063, e do INQ 22432.2012.6.21.0063 (fls. 06-522).

Notificados, nos termos do art. 4° da Lei n. 8.038/90 (fls. 538-540), os denunciados IVANOR RENATO RAUBER (Prefeito de Jaquirana/RS), ORESTE ÂNGELO ANDELIERI e IVAN LAURO RAUBER apresentaram resposta conjunta (fls. 543-553).

Preliminarmente, a defesa pugna pela nulidade de toda a prova colhida nos inquéritos policiais de números 359-44, 224-32, 047 e 048, conduzidos pela Polícia Civil e complementados pela Polícia Federal, pois, segundo afirma, tais instrumentos contrariam as disposições da Resolução TSE n. 23.363/11 (vigente à época dos fatos), visto que foram instaurados sem que houvesse requisição do Ministério Público Eleitoral ou determinação da Justiça Eleitoral, não havendo, tampouco, nenhuma prisão em flagrante – requisitos postos pelo art. 8º da referida norma.

Ainda em sede preliminar, a defesa requer a manifestação do Ministério Público Eleitoral sobre a possibilidade de proposta da suspensão condicional do processo a todos os denunciados e, especialmente, em relação a IVAN LAURO RAUBER.

Em relação a IVANOR RENATO RAUBER (Prefeito de Jaquirana/RS), a defesa nega a autoria dos fatos que lhe foram imputados (1º, 2º e 3º fatos), assim como a coautoria e, até mesmo, a simples participação. Alega que nas investigações policiais que embasaram a presente denúncia foram ouvidas 60 (sessenta) pessoas, sendo uma delas o próprio Ivanor. Entende que, mesmo com esse grande número de depoimentos, nada, em matéria de informação ou prova, atesta a autoria, a coautoria ou a simples participação do prefeito municipal nos fatos denunciados. Aduz que a autoridade policial não encontrou uma informação sequer que indicasse a necessidade de interrogar o prefeito municipal. Argumenta que foi indiciado sem confirmação alguma de sua participação e, inclusive, sem sequer ser ouvido. Afirma que, interrogado mais tarde, com o complemento do inquérito policial feito pela Polícia Federal, de sua versão não se tira o menor informe de participação delitiva, tal como, em seu entender, é possível verificar às fls. 439-440. Quanto aos fatos, diz que apenas tomou conhecimento da construção de um banheiro na casa de Adelino Silveira Rodrigues, mas que tal obra não teve finalidade de compra de voto (1º fato). Em relação ao 2º fato, alega que não deu R$ 80,00 (oitenta reais) em troca do voto de Elizete da Silva Pereira, nem diretamente, nem por meio de terceiros. Quanto ao 3º fato, informa que não conhece a eleitora Oneide Aguiar Fogaça, motivo pelo qual não poderia ter entregue madeiras em troca do voto desta. Argumenta, ainda, inexistir qualquer prova nos autos que relacione o prefeito aos fatos, sendo a relação de parentesco entre os denunciados Ivan (seu filho) e Oreste (seu cunhado) a única evidência apontada pelo Ministério Público Eleitoral de piso que o ligue aos fatos.

No que concerne ao denunciado IVAN LAURO RAUBER, a defesa nega o caráter criminoso do fato que lhe foi imputado (1º fato). Alega que não houve promessa ou oferta de material de construção em troca do voto de Adelino Silveira Rodrigues. Aduz que Ivan realmente entregou a Avelino materiais para a construção de um banheiro, mas sem nenhuma conotação eleitoral.

Quanto ao denunciado ORESTE ÂNGELO ANDELIERI, a defesa igualmente nega o caráter criminoso das imputações a ele relacionadas (1º e 2º fatos). No que diz respeito ao 2º fato, alega que Elizete da Silva Pereira pediu ao denunciado Oreste certa importância em dinheiro, usando, como justificativa, a necessidade de pagamento de uma consulta médica, mas este, desconfiado – pois, segundo informa, há assistência médica gratuita no município – não atendeu ao pedido. Em relação ao 3º fato, informa que Oneide Aguiar Fogaça pediu material de construção (madeira) a Oreste, mas o pedido foi de pronto negado.

Por fim, a defesa requer o que segue:

a) a decretação da nulidade das investigações levadas a efeito pela autoridade policial;

b) a manifestação do Ministério Público Eleitoral sobre a proposta da suspensão condicional do processo a todos os acusados, e, especialmente, ao denunciado Ivan Lauro Rauber;

c) a suspensão do prosseguimento desta ação penal, apesar da teórica independência das jurisdições, até o julgamento do Agravo de Instrumento e do Recurso Especial interpostos nos autos do RE n. 360-29/RS, ora em trâmite perante o TSE, a que se refere a Ação Cautelar supracitada, eis que a nulidade, ou não, de toda a prova, é tese comum a todos esses processos; e

d) a rejeição da denúncia ou a improcedência da acusação em relação a todos os denunciados; ou, muito especialmente, em eventual caso de recebimento da denúncia, seja este parcial, excluindo-se da ação penal o denunciado Ivanor Renato Rauber, Prefeito Municipal de Jaquirana, RS.

Em relação ao oferecimento do benefício de suspensão do processo (item 3 da defesa preliminar), a Procuradoria Regional Eleitoral informou que deixará para se manifestar após o eventual recebimento da denúncia (fls. 558-561).

É o relatório.

 

VOTO

Eminentes colegas:

A questão submetida ao presente julgamento diz respeito à existência de substrato mínimo probatório que autorize a deflagração da ação penal contra os denunciados, levando em consideração o preenchimento dos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, e não incidindo qualquer uma das hipóteses do art. 395 do mesmo diploma legal.

Segundo o Direito Processual Penal brasileiro, a denúncia deve conter a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado (ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo), a classificação do crime e, quando for o caso, o rol de testemunhas (CPP, art. 41).

Tais exigências têm como fundamento a necessidade de precisar, com acuidade, os limites da imputação, não apenas autorizando o exercício da ampla defesa, como também viabilizando a aplicação da lei penal pelo órgão julgador.

Portanto, a verificação acerca da narração de fato típico, antijurídico e culpável, da inexistência de causa de extinção da punibilidade e da presença das condições exigidas pela lei para o exercício da ação penal (aí incluída a justa causa), revela-se fundamental para o juízo de admissibilidade de deflagração da ação penal.

Como já mencionado no relatório, IVANOR RENATO RAUBER (Prefeito de Jaquirana/RS), ORESTE ÂNGELO ANDELIERI e IVAN LAURO RAUBER estão sendo denunciados pela suposta prática de delito tipificado no art. 299 do Código Eleitoral, in verbis:

Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:

Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.

Passo à análise da denúncia.

1. Da competência

A competência deste Tribunal Regional Eleitoral está firmada em razão de o denunciado IVANOR RENATO RAUBER ser o atual Prefeito de Jaquirana/RS, detentor de foro privilegiado perante esta Corte em razão da prerrogativa da função, nos termos do art. 29, inc. X, da Constituição Federal, combinado com art. 84 do Código de Processo Penal, de acordo com a Súmula n. 702 do STF:

Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

[…]

X - julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça;

 

Súmula 702 do STF

A competência do Tribunal de Justiça para julgar prefeitos restringe-se aos crimes de competência da justiça comum estadual; nos demais casos, a competência originária caberá ao respectivo tribunal de segundo grau.

2. Do pedido de decretação de nulidade das investigações policiais (INQ 359-44.2012.6.21.0063)

Quanto ao pedido de nulidade das investigações policiais no Inquérito 359-44.2012.6.21.0063, tenho que não merece acolhida.

Este Tribunal já se manifestou nos autos do referido inquérito (fl. 922 daquele expediente) entendendo pela sua validade (fl. 428).

Portanto, não há nulidade a ser declarada, ao menos neste estágio processual, até porque o procedimento inquisitorial foi regularmente acompanhado pelo Juízo Eleitoral e pelo Ministério Público.

3. Do pedido de suspensão condicional do processo

Quanto ao requerimento de que o Ministério Público Eleitoral se manifestasse sobre a proposta de suspensão condicional do processo em relação a todos os acusados e, em especial, ao denunciado IVAN LAURO RAUBER, o Parquet assim se manifestou, com grifos do original (fls. 559v. e 560):

Quanto à Suspensão Condicional do Processo, o Ministério Público Eleitoral não desconsidera que o crime imputado aos acusados (Código Eleitoral, artigo 299), em abstrato, pode ensejar o oferecimento do referido benefício. Contudo, porque o procedimento das ações originárias prevê uma fase de resposta preliminar ao juízo de admissibilidade da denúncia (atual momento da ação), este órgão do Ministério Público entende que seria prematuro o oferecimento do benefício de suspensão do processo, pois, de rigor, sequer existe processo.

Disso, o Ministério Público Eleitoral, deixará para se manifestar no feito, sobre o benefício da suspensão condicional do processo, no momento oportuno, vale dizer, após eventual recebimento da denúncia.

Registra-se que o denunciante imputa aos acusados a prática do delito tipificado no art. 299 do Código Eleitoral, cuja pena mínima, conforme interpretação conjunta com o art. 284 do mesmo diploma, é de um ano, in verbis:

Art. 284. Sempre que este Código não indicar o grau mínimo, entende-se que será ele de quinze dias para a pena de detenção e de um ano para a de reclusão.

Todavia, nos termos da denúncia, IVANOR RENATO RAUBER fez-se incurso no artigo 299 do Código Eleitoral por três vezes, em concurso material, e ORESTE ÂNGELO ANDELIERI por duas vezes, também em concurso material.

Com efeito, a respeito desse ponto, cumpre apontar a Súmula n. 243 do Superior Tribunal de Justiça:

O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano.

Dessa forma, incabível a proposta de suspensão condicional do processo aos denunciados IVANOR RENATO RAUBER e ORESTE ÂNGELO ANDELIERI, ao menos no atual estágio processual.

Já em relação à IVAN LAURO RAUBER, vislumbra-se a possibilidade da concessão do referido benefício, devendo, no entanto, ser aguardada a proposta ministerial após o eventual recebimento da denúncia.

Desse modo, caso este Tribunal entenda pelo recebimento da denúncia, caberá ao órgão ministerial manifestar-se sobre o pedido de suspensão condicional do processo, o qual posteriormente será submetido a esta Corte para fins de eventual homologação.

4. Do requerimento de suspensão do prosseguimento da ação

Os indiciados postulam a suspensão do prosseguimento desta ação penal até o julgamento do Agravo de Instrumento e do Recurso Especial interpostos nos autos do RE n. 360-29/RS, ora em trâmite perante o TSE, pois entendem que a nulidade, ou não, de toda a prova, é tese comum a ambos os processos.

Sem razão os investigados.

Não desconheço que parte da instrução probatória é comum a este processo e ao RE 360-29 (atualmente reautuado no TSE como RESPE 36069), todavia, tal fato não é argumento suficiente para, por si só, suspender o exame da presente denúncia proposta pela Procuradoria Regional Eleitoral.

Registro, por fim, haver independência entre as esferas eleitorias cível e penal, motivo pelo qual não subsiste a alegação posta pelos indiciados.

5. Das condições da ação e dos elementos mínimos de autoria e materialidade

Analisando a peça acusatória, verifica-se a narração de como foram praticados os delitos, ou seja, a tipicidade dos fatos, seus autores e a descrição dos crimes, a qualificação dos acusados e, também, as testemunhas arroladas. Assim, todos os pressupostos de recebimento da denúncia estão presentes.

De acordo com a peça inaugural, materialidade e autoria restaram configuradas na descrição dos fatos elencados, como a seguir exposto:

Quanto ao primeiro fato, por meio de interceptação telefônica (fl. 143) foi identificado diálogo entre o denunciado IVAN LAURO RAUBER e o alvo HELIOVAN, onde o primeiro questiona o segundo sobre o problema da construção de um banheiro e o pagamento de mil reais em troca de seis votos.

No decorrer da investigação policial, ADELINO SILVEIRA RODRIGUES confirmou que IVAN RAUBER mandou fazer um banheiro em sua casa, sendo a mão de obra paga por IVAN e o material cedido pelo Prefeito IVANOR RAUBER. Em relação aos seis votos em troca de mil reais, afirmou que ele, sua mulher e seus seis filhos votaram no Prefeito IVANOR. Ao final, informou que o material foi entregue em sua residência uma semana antes das eleições.

Portanto, é possível concluir pela existência de elementos indiciários de autoria e materialidade delitiva suficientes a embasar o recebimento da denúncia em relação aos investigados IVANOR RAUBER e IVAN RAUBER pela suposta prática do delito previsto no art. 299 do Código Eleitoral.

No que diz ao segundo fato, melhor sorte não socorre aos indiciados.

A investigação apurou que, em 04.10.2012, os indiciados IVANOR RENATO RAUBER, na condição de candidato à reeleição ao cargo de Prefeito do Município de Jaquirana/RS, e ORESTE ÂNGELO ANDELIERI, na condição de candidato a vereador no mesmo local, ofereceram a ELIZETE DA SILVA PEREIRA, no Gabinete do Prefeito IVANOR, a quantia de R$ 180,00 (cento e oitenta reais) para que pagasse uma consulta médica para sua filha, em troca de seu voto.

Segundo declarado por Elizete (fls. 172-173), em 05.10.2012, por volta das 14 horas e 30 minutos, o denunciado ORESTES foi até a casa desta e entregou-lhe a quantia de R$ 100,00 (cem reais), que seria parte da compra de votos, sendo que os outros R$ 80,00 (oitenta reais) foram entregues no mesmo dia, cerca de uma hora depois, também por ORESTES, mas, nesta oportunidade, a mando do também denunciado IVANOR.

O teor das declarações converge com a interceptação telefônica captada entre Elizete e o candidato a vereador ORESTES (fl. 171), por meio da qual é possível verificar que a primeira cobrou do segundo o valor tratado para a compra de seu voto, sendo que o ORESTES disse que daria R$ 100,00 (cem reais) e que a outra parte seria com o IVANOR.

Desse modo, entendo presentes elementos indiciários de autoria e materialidade suficientes a possibilitar o recebimento da denúncia quanto a IVANOR RAUBER e ORESTE ÂNGELO ANDELIERI, pela suposta prática do crime disposto no artigo 299 do Código Eleitoral, em virtude do alegado oferecimento e consequente concessão de vantagem econômica a Elizete, objetivando a obtenção do voto desta.

Por fim, tenho que a denúncia deva ser igualmente recebida no que se refere ao terceiro fato, consistente no suposto oferecimento pelos investigados IVANOR RENATO RAUBER, na condição de candidato à reeleição ao cargo de prefeito do Município de Jaquirana/RS, e ORESTE ÂNGELO ANDELIERI, na condição de candidato a vereador do mesmo município, de material de construção para Oneide Ângelo Andelieri, em troca de quinze votos.

Na interceptação telefônica captada no dia 05.10.2012 (fl. 174), é possível verificar que Oneide telefonou para ORESTES, cobrando a madeira que ele e IVANOR haviam lhe prometido, em data não especificada, em troca de quinze votos.

O teor da conversa degravada foi confirmado pelo depoimento prestado por Oneide à Polícia Civil (fl. 175).

Assim, é possível concluir pela existência de conjunto indiciário apto a motivar o recebimento da denúncia em relação a IVANOR RAUBER e ORESTE ANDELIERI, por estes supostamente terem oferecido a Oneide vantagem econômica para obter o seu voto, incorrendo nas sanções do artigo 299 do Código Eleitoral.

Concluo, então, pela comprovação de indícios suficientes acerca da autoria e materialidade dos fatos narrados, fazendo-se necessário o recebimento da denúncia para que, no decorrer da ação penal, seja possível apurar se efetivamente ocorreram.

Registro ainda, que a denúncia é apta, cumprindo todos os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, descrevendo os fatos imputados com todas as circunstâncias necessárias para permitir aos acusados o exercício da ampla defesa.

Consoante doutrina penal autorizada e os arestos dos Tribunais do País, estando preenchidos os requisitos dos arts. 41 e 357, §2º, do Código de Processo Penal e Código Eleitoral, respectivamente, e estando, por sua vez, ausentes quaisquer dos casos contemplados nos arts. 43 do CPP e 358 do CE, que disciplinam as hipóteses de sua rejeição, deve a denúncia ser recebida.

Cabe ressaltar que a denúncia somente pode ser rejeitada quando a imputação se referir a fato atípico certo e delimitado, apreciável desde logo, sem necessidade de produção de qualquer meio de prova, eis que o juízo é de cognição imediata, incidente, acerca da correspondência do fato à norma jurídica, partindo-se do pressuposto de sua veracidade, tal como narrado na peça acusatória.

Não é o caso dos autos, pois concluo haver substrato fático-probatório suficiente para o início e desenvolvimento da ação penal pública, de forma legítima.

Nesse sentido, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal assim se posiciona (com grifos meus):

PENAL E PROCESSUAL PENAL. INQUÉRITO. DENÚNCIA OFERECIDA. ART. 89 DA LEI 8.666/93. ART. 41 DO CPP. INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA. TIPICIDADE DOS FATOS. PRESENÇA DE JUSTA CAUSA. RECEBIMENTO. 1. A questão submetida ao presente julgamento diz respeito à existência de substrato mínimo probatório que autorize a deflagração da ação penal contra o denunciado, levando em consideração o preenchimento dos requisitos do art. 41, do Código de Processo Penal, não incidindo qualquer uma das hipóteses do art. 395, do mesmo diploma legal. 2. De acordo com o direito brasileiro, a denúncia deve conter a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado (ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo), a classificação do crime e, quando for o caso, o rol de testemunhas (CPP, art. 41). Tais exigências se fundamentam na necessidade de precisar, com acuidade, os limites da imputação, não apenas autorizando o exercício da ampla defesa, como também viabilizando a aplicação da lei penal pelo órgão julgador. 3. A verificação acerca da narração de fato típico, antijurídico e culpável, da inexistência de causa de extinção da punibilidade e da presença das condições exigidas pela lei para o exercício da ação penal (aí incluída a justa causa), revela-se fundamental para o juízo de admissibilidade de deflagração da ação penal, em qualquer hipótese, mas guarda tratamento mais rigoroso em se tratando de crimes de competência originária do Supremo Tribunal Federal. 4. Registro que a denúncia somente pode ser rejeitada quando a imputação se referir a fato atípico certo e delimitado, apreciável desde logo, sem necessidade de produção de qualquer meio de prova, eis que o juízo é de cognição imediata, incidente, acerca da correspondência do fato à norma jurídica, partindo-se do pressuposto de sua veracidade, tal como narrado na peça acusatória. 5. A imputação feita na denúncia consiste na prática, em tese, do delito previsto no art. 89, caput e parágrafo único, da Lei 8.666/93, por parte dos requeridos, ao inexigirem uma licitação quando era caso justamente de fazer o contrário. 6. Houve preenchimento dos requisitos do art. 41, do Código de Processo Penal, havendo justa causa para a deflagração da ação penal, inexistindo qualquer uma das hipóteses que autorizariam a rejeição da denúncia (CPP, art. 395). 7. Há substrato fático-probatório suficiente para o início e desenvolvimento da ação penal pública de forma legítima. 8. Denúncia recebida.

(Inq 3016/SP. Relatora Min. ELLEN GRACIE J. 30.9.2010, Tribunal Pleno.)

Portanto, presentes as condições da ação e verificados elementos mínimos de autoria e materialidade, deve ser recebida a denúncia.

5. Conclusão

Portanto, pelos motivos expostos, presentes as condições da ação e verificados elementos mínimos de autoria e materialidade, tenho por receber a denúncia em relação aos acusados IVANOR RENATO RAUBER (Prefeito de Jaquirana/RS), ORESTE ÂNGELO ANDELIERI e IVAN LAURO RAUBER.

Todavia, deixo a citação dos mesmos para momento posterior à resposta da Procuradoria Regional Eleitoral sobre eventual proposta de suspensão condicional do processo.

Por fim, acolho a promoção de arquivamento do inquérito policial em relação a ADELINO SILVEIRA RODRIGUES, ELIZETE DA SILVA PEREIRA e ONEIDE AGUIAR FOGAÇA.

6. Dispositivo

Diante do exposto, VOTO pelo recebimento da denúncia, com o prosseguimento da ação, nos termos do art. 6º e seguintes da Lei n. 8.038/90, em relação aos acusados IVANOR RENATO RAUBER (Prefeito de Jaquirana/RS), ORESTE ÂNGELO ANDELIERI e IVAN LAURO RAUBER, pela suposta prática do crime de corrupção eleitoral, delito tipificado no art. 299 do Código Eleitoral.

Recebida a denúncia, DETERMINO:

a) o arquivamento do procedimento investigatório em relação a ADELINO SILVEIRA RODRIGUES, ELIZETE DA SILVA PEREIRA e ONEIDE AGUIAR FOGAÇA;

b) sejam atualizados os antecedentes dos acusados IVANOR RENATO RAUBER (Prefeito de Jaquirana/RS), ORESTE ÂNGELO ANDELIERI e IVAN LAURO RAUBER; e

c) sejam os autos encaminhados à Procuradoria Regional Eleitoral para que se manifeste sobre eventual proposta de suspensão condicional do processo em relação aos acusados IVANOR RENATO RAUBER (Prefeito de Jaquirana/RS), ORESTE ÂNGELO ANDELIERI e IVAN LAURO RAUBER.

É como voto, senhor Presidente.