RP - 264956 - Sessão: 24/02/2015 às 14:00

Senhor Presidente, ouvi atentamente os votos do ilustre relator e da digna Desa. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère, e inclino-me a acompanhar a divergência.

A prova é farta e coerente, não havendo dúvida a respeito dos fatos. Os representados Gilmar Sossella e Artur Alexandre Souto coagiram servidores ocupantes de funções comissionadas a adquirirem ingressos para um churrasco com a finalidade de financiar a campanha do primeiro acusado. O valor dos ingressos foi definido em razão da remuneração das Funções Gratificadas, com a anuência do deputado estadual, e a distribuição dos convites era feita através da organização hierárquica da Assembleia, em que as chefias recebiam os ingressos e deviam vendê-los aos seus subordinados.

A coação para o financiamento da campanha de Sossella fica evidente pela dispensa do servidor Nelson Delavald de sua função remunerada apenas porque não adquiriu o ingresso. Tratava-se de um servidor competente, conforme a coerente prova testemunhal colhida nos autos. Ademais, diante do uso da estrutura hierárquica da Assembleia para distribuir os ingressos, os servidores davam por certa a ameaça de perderem seus cargos, mas os acusados em nenhum momento preocuparam-se em esclarecer eventual mal entendido. Ao contrário, valendo-se novamente da estrutura hierárquica do Parlamento estadual convocaram reunião com as chefias para reforçar a ameaça, informando que auditorias seriam realizadas no setor em que os servidores haviam se negado a comprar os ingressos.

Comprovado, portanto, o abuso de poder político pelos representados.

Está evidente também a gravidade das circunstâncias, exigida pelo artigo 22, XVI, da Lei Complementar n. 64/90, para a configuração do ato abusivo. Relevante observar que a atuação dos representados, embora tenha se dado apenas no âmbito da Assembleia Legislativa, não pretendia buscar o voto dos seus servidores, mas garantir que todos os detentores de função gratificada contribuíssem com R$ 2.500,00 para a campanha de Gilmar Sossella. O valor obtido mediante essa conduta foi então distribuído por todo o Estado, impulsionando a sua candidatura. Nesse aspecto, as circunstâncias são graves o suficiente para macular a legitimidade do pleito, lembrando-se, ainda, que o esquema organizado pelos representados buscava arrecadar mais recursos do que efetivamente obteve o candidato, sendo impedido por causa da ação policial, do afastamento de Artur Souto das suas atividades e das notícias divulgadas na imprensa.

Entendo que a interpretação da gravidade das circunstâncias não se confunde com a potencialidade de o fato modificar o resultado do pleito, pois este critério é expressamente afastado pela lei, quando afirma que “para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição [...]”. O mesmo doutrinador, Rodrigo López Zilio, em artigo publicado na Revista do TRE, n. 33, afirma:

Não é necessária a prova irretorquível e unânime do malferimento da lisura da eleição; basta sejam carreados elementos, ainda que indiciários, mas majoritariamente convergentes, de que a eleição teve sua regularidade quebrada pelo ato abusivo praticado, com o benefício a determinado candidato. (Revista TRE/RS, Porto Alegre, v.16, n.33, jul/dez 2011, pp. 24-25.)

Esta gravidade, como bem pontuou o voto divergente, está presente no caso em apreço.

Assim, resta configurado o abuso de poder político e econômico, mediante o esquema organizado para usar a estrutura hierárquica da Assembleia do Estado com a finalidade de obter recursos que foram empregados na campanha do candidato Sossella, com gravidade suficiente para macular a legitimidade das eleições.

Da mesma forma, como bem apontou a divergência, resta configurada a conduta prevista no artigo 30-A da Lei n. 9.504/97, pois os recursos com a venda dos ingressos foram obtidos mediante coação dos representados, caracterizando inequívoca arrecadação ilícita de recursos.

Com essas considerações, senhor Presidente, acompanho integralmente o voto proferido pela Desa. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère.