PC - 206671 - Sessão: 20/10/2015 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se da prestação de contas apresentada por REJANE MATTOS TEIXEIRA, candidata ao cargo de deputada estadual pelo Partido Social Democrata Cristão - PSDC, referente à arrecadação às eleições gerais de 2014.

Do exame da documentação apresentada, a unidade técnica deste Regional opinou pela desaprovação das contas, pois pendentes várias impropriedades, inclusive a falta de identificação de doadores originários (fls. 31-35).

Intimada novamente, a candidata apresentou esclarecimentos (fls. 41-43), o que ensejou nova análise do órgão técnico, mantendo o entendimento externado no parecer conclusivo (fls. 45-49).

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pela desaprovação das contas e a transferência de recursos de origem não identificada ao Tesouro Nacional, no valor de R$ 2.045,00 (fls. 52-58.).

O Procurador Regional Eleitoral retificou oralmente o parecer, modificando o valor de transferência ao Tesouro Nacional para R$ 2.000,00.

É o relatório.
 

VOTO

REJANE MATTOS TEIXEIRA apresentou sua prestação de contas relativas ao pleito de 2014.

A arrecadação informada foi de R$ 2.000,00, e os gastos importaram no valor de R$ 2.045,00 (fl. 14).

O órgão técnico deste Regional apontou várias inconsistências não sanadas, as quais passo à análise individual:

1) Arrecadação de recursos sem a emissão de recibo eleitoral:

a) No item 1 do Parecer Conclusivo (fls. 31/35), que apontou a existência de recursos arrecadados sem a correspondente emissão de recibo eleitoral, em desacordo com o art. 10 da Resolução TSE nº 23.406/2014:

Recursos arrecadados sem emissão de recibo eleitoral:

Data: 12/09/14

CNPJ/CPF: 20.562.055/0001-00

Nome: Claudia Barbosa Alves

Valor (R$): 2.000,00

A prestadora manifesta-se (fl.41), no seguinte sentido:

Quanto a emissão de recibo eleitoral , esta devidamente comprovado a fls. 03 e 05 – extrato de prestação de contas;

Os citados documentos são os extratos da prestação de contas, 1ª parcial (fl. 03) e 2ª parcial (fl. 05), ambos zerados, não ofertando quaisquer informações.

(Grifei.)

De notar que o valor de R$ 2.000,00 representa toda a arrecadação de campanha. Portanto, a ausência do recibo eleitoral correlato é inconsistência grave, que inviabiliza aferir, com segurança, a real fonte de financiamento de campanha.

2) Despesas com combustível sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos ou publicidade com carro de som.

A prestadora se manifestou à fl. 41, dizendo que não é proprietária de veículo e usou o carro de sua mãe como contribuição para a campanha. Entretanto, ainda que não tenha realizado pagamento pela utilização do carro, necessário fazer o lançamento da doação na forma de recursos estimados, com a emissão do respectivo recibo eleitoral e a apresentação do documento fiscal emitido em nome do doador, ou termo de doação por ele firmado, o que ausente no caso em tela.

3) Divergências e inconsistências entre os dados dos fornecedores lançados na prestação de contas e as informações constantes na base de dados da Receita Federal.

Data: 15/09/2014

CPF/CNPJ: 010.318.637-13

Fornecedor - Prestação de Contas: José Renato C. De Oliveira

Fornecedor – Receita Federal: não localizado

Valor (R$):100,00

 

Data: 08/09/2014

CPF/CNPJ: 061.126.183-78

Fornecedor - Prestação de Contas: Bruno da Rosa Carvalho

Fornecedor – Receita Federal: não localizado

Valor (R$): 150,00

 

Data: 07/08/2014

CPF/CNPJ: 070.524.197-56

Fornecedor - Prestação de Contas: Anselmo Amaro Carvalho

Fornecedor – Receita Federal: não localizado

Valor (R$): 150,00

 

Data: 17/09/2014

CPF/CNPJ: 184.688.520-30

Fornecedor - Prestação de Contas: Pedro dos Santos

Fornecedor – Receita Federal: não localizado

Valor (R$): 120,00

 

Data: 20/09/2014

CPF/CNPJ: 500.662.526-20

Fornecedor - Prestação de Contas: Rogério Teixeira

Fornecedor – Receita Federal: não localizado

Valor (R$): 150,00

 

Data: 20/09/2014

CPF/CNPJ: 908.634.763-10

Fornecedor - Prestação de Contas: Anselmo Borba Carvalho

Fornecedor – Receita Federal: não localizado

Valor (R$): 120,00

 

Data: 15/09/2014

CPF/CNPJ: 11.526.949/0001-46

Fornecedor - Prestação de Contas: Gráfica Kairos

Fornecedor – Receita Federal: Baixada

Valor (R$): 250,00

A prestadora alegou que não tinha como aferir a veracidade dos dados pessoais de seus fornecedores (panfleteiros) e que a gráfica lhe forneceu uma nota fiscal (fls. 41-42). Em que pese sua argumentação, o documento da fl. 18 não é considerado Nota Fiscal. E as incongruências identificadas impedem o atesto de transparência e confiabilidade das contas.

4) Pagamentos em espécie, no montante de R$ 2.045,00, sem a constituição do Fundo de Caixa, em afronta ao art. 31, §§ 5º e 6º, da Resolução TSE. 23.406/2014 (fl. 47).

O limite global de 2% para a constituição do Fundo de Caixa, assim como o limite individual de R$ 400,00 para pagamento, em espécie, de despesas de pequeno porte, têm por desiderato o controle efetivo da contabilidade, oportunizando mais segurança à identificação dos fornecedores e das despesas realizadas e, por consequência, conferindo maior confiabilidade às contas.

O extrato da fl. 14 registra despesa de R$ 2.045,00, o que significa dizer que a totalidade da despesa de campanha foi paga em espécie. De notar que 2% dos gastos representam R$ 40,90, valor autorizado como Fundo de Caixa. Assim, ultrapassados R$ 2.004,10 os pagamentos em espécie, caso tal Fundo tivesse sido constituído.

5) Pagamento de despesa sem que o valor tivesse transitado na conta de campanha.

O total de débitos verificados no extrato bancário é de R$ 2.000,00. Todavia, o total de despesas declaradas na prestação de contas é de R$ 2.045,00. Essa diferença de R$ 45,00 sinaliza que houve pagamento de despesa que não transitou pela conta de campanha.

6) Inconsistência na identificação de doador originário, no valor de R$ 2.000,00, porquanto informada a Direção Estadual do PSB.

Data: 12/09/14

Valor (R$): 2.000,00

CPF/CNPJ do Doador Direto: 20.562.055/0001-00

Nome do Doador Direto: Claudia Barbosa Alves

CPF/CNPJ do Doador Originário: 91.698.118/0001-90

Nome do Doador Originário: Partido Socialista Brasileiro

Recibo Eleitoral: Não informado

Os doadores originários devem ser discriminados nos recibos eleitorais emitidos pelo candidato, não se prestando à identificação de origem do recurso o partido político. Isso porque há limites para a doação de recursos provenientes de pessoas físicas (dez por cento) e de pessoas jurídicas (dois por cento) para as campanhas eleitorais, à luz do art. 25 da Resolução TSE n. 23.406/14.

Também importa mencionar que o art. 28 da Resolução TSE n. 23.406/2014 elenca as fontes vedadas de arrecadação na campanha eleitoral.

Portanto, quando o prestador deixa de identificar a real origem do recurso na prestação de contas, acaba por impedir a fiscalização quanto à legitimidade da fonte doadora, bem como se foi (ou não) ultrapassado o limite legal de doação. Aliás, esse foi o entendimento desta Corte quando do julgamento da Prestação de Contas n. 1698-62, de relatoria da Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja, na sessão de 03.12.2014.

Ademais, a ausência de informações da real fonte doadora inviabiliza a transparência das informações repassadas à própria sociedade, conforme determinam os arts. 43 e 74 da Resolução TSE n. 23406/14.

De notar que a importância de R$ 2.000,00 representa a totalidade de recursos arrecadados.

Cumpre tecer algumas considerações sobre a Lei 13.165/2015, publicada em 29 de setembro de 2015:

O art. 2º da Lei 13.165/2015 acrescentou o § 12º ao art. 28 da Lei 9.504/97, com o seguinte teor:

§ 12.  Os valores transferidos pelos partidos políticos oriundos de doações serão registrados na prestação de contas dos candidatos como transferência dos partidos e, na prestação de contas dos partidos, como transferência aos candidatos, sem individualização dos doadores.

Percebe-se, portanto, que regulada a matéria de forma a dispensar a individualização dos doadores.

Como a regra, evidentemente, é mais benéfica, poder-se-ia cogitar da aplicação retroativa da lei.

Entretanto, sendo a irretroatividade a regra e a retroatividade exceção, tenho que para assim proceder, mister que a própria lei contivesse norma transitória expressa com esse escopo.

Ademais, o TSE tem-se mostrado refratário à aplicação retroativa, como se demonstra com o seguinte precedente:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CAPTAÇAO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. PRAZO RECURSAL. 24 HORAS. FUNDAMENTO NAO IMPUGNADO. SÚMULA 182. NAO PROVIMENTO.

1. Na espécie, o juízo de inadmissibilidade do recurso especial considerou que o prazo recursal de 3 dias, tal como previsto no art. 258 do CE, somente teria aplicação caso a AIJE houvesse sido proposta com base na captação ilícita de sufrágio cumulada com abuso de poder, circunstância que, todavia, não se refere à hipótese dos autos.

2. A v. decisão regional, além de se revelar em consonância com a jurisprudência do e. TSE, não foi objeto de insurgência específica nas razões do agravo de instrumento, limitando-se o agravante a repetir os argumentos do recurso especial obstado. Incidência da Súmula nº 182/STJ: "É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada".

3. O e. STJ, interpretando o art. 1.211 do CPC, já decidiu que a interposição do recurso é sempre regida pela lei em vigor na data de publicação do decisum impugnado. (AgRg no REsp 663.864/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 26.9.2005)

4. Na espécie, considerando que a sentença condenatória foi publicada em 18.11.2008, data em que ainda vigorava a lei anterior, descabe sustentar aplicação retroativa da lei nova, que somente ingressou no ordenamento jurídico com a promulgação da Lei nº 12.034, de 29.9.2009.

5. Agravo regimental não provido.

(AgR-AI 11402/SP, Rel. Min. Felix Fischer, DJe de 11.3.2010.) (Grifei.)

A respeito da temática específica – identificação dos doadores originários - em decisão recentíssima, proferida na sessão de julgamento de 09.10.2015, publicada no DJE de 16.10.2015 (p. 89-92), portanto já na vigência da Lei 13.165/2015, da lavra do Min. Herman Benjamin, o TSE reafirmou a plena eficácia dos dispositivos da Res. 23.406/2014 do TSE.

Transcrevo, por oportuno, o que constou na mencionada decisão acerca da identificação dos doadores, que reproduz excertos do Respe 2481-87/GO, de relatoria do Ministro Henrique Neves, julgado na na sessão de 08.9.2015:

Demonstrar contabilmente a entrada de receitas, por óbvio, significa identificar a fonte da receita que ingressou na contabilidade da campanha ou do partido político.
Sem essa identificação, repita-se, seria impossível a verificação do respeito aos dispositivos expressos na legislação eleitoral e na Constituição da República que vetam que os partidos políticos e as campanhas eleitorais sejam subsidiados e financiados por determinadas pessoas ou entidades.

[...]
Aliás, a necessidade de identificação de recursos doados também é necessária em razão das disposições da Lei da Transparência (Lei nº 12.527, de 2011, arts. 2º e 8º) e das previstas na Lei nº 9.613, de 1998, que dispõe "sobre os crimes de lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta Lei; cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, e dá outras providências" .
A importância do tema também se verifica pela constatação de que eventual transgressão às regras que regulam a captação de recursos para as campanhas eleitorais é capaz de ensejar a cassação do registro ou do diploma dos candidatos eleitos, a teor do que dispõe o art. 30-A da Lei das Eleições.
A utilização de recursos provenientes de fontes não identificadas, por sua vez, além de terminantemente proibida, é punível na forma do art. 36 da Lei nº 9.096, de 1995, que estabelece a suspensão do recebimento das quotas do Fundo Partidário até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral.
[...]
A regra do art. 29 da Res.-TSE nº 23.406, ao contrário do considerado pelo acórdão regional e pelo parecer da d. Procuradoria-Geral Eleitoral, não constitui, em si, a aplicação de uma sanção.
Ao contrário, o dispositivo permite - independentemente da caracterização da infração - que a interminável pesquisa sobre a origem do recurso por parte da Justiça Eleitoral e dos próprios candidatos e partidos políticos possa ser substituída pela devolução dos respectivos recursos aos cofres públicos, evitando-se, assim, longos períodos de suspensão da distribuição das quotas do Fundo Partidário.
Nesse aspecto, não há falar em extrapolação da função normativa secundária deste Tribunal ao editar a Res.-TSE nº 23.406 ou em violação ao art. 105 da Lei nº 9.504/97.

[...]
Nessa linha, reconhecer que os candidatos e partidos políticos somente podem utilizar recursos financeiros cuja origem esteja devidamente identificada e não podem usar aqueles provenientes de fontes vedadas, e, ao mesmo tempo, permitir que tais recursos - não identificados - permaneçam à disposição dos candidatos ou dos partidos políticos revelaria, no mínimo, um gigante contrassenso, em manifesto desrespeito ao ordenamento jurídico vigente, retirando por completo da decisão judicial qualquer efeito prático no que tange à impossibilidade de utilização de tais recursos.
[...]
Desse modo, o dispositivo indicado - reiterado e aperfeiçoado há várias eleições - não contém obrigação que não derive diretamente da Constituição da República, das leis eleitorais e da prestação jurisdicional por parte da Justiça Eleitoral, por isso está em plena consonância com a atividade de organização e fiscalização do financiamento dos pleitos eleitorais.

Por fim, esta Corte, nos autos do RE 31-80.2015.6.21.0008, de relatoria do Des. Paulo Roberto Lessa Franz, julgado em 08 de outubro de 2015, já se manifestou acerca da não retroatividade das novas regras estabelecidas pela Lei 13.165/2015, consoante ementa que reproduzo:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Arts. 4º, caput e 14, inc. II, “n”, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014.

A abertura de conta bancária é obrigatória, independentemente de ter havido movimentação financeira no período. Falha de natureza grave que impede a apresentação de extratos bancários correlatos, os quais são imprescindíveis para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos financeiros, bem como para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira. Irregularidade insuperável, a comprometer, modo substancial, a fiscalização exercida pela Justiça Eleitoral.

As alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/2015, que deram nova redação ao art. 37 da Lei n. 9.096/95, suprimindo a sanção de suspensão de novas contas do Fundo Partidário, não têm aplicação retroativa aos fatos ocorridos antes da sua vigência.

Redimensionamento, de ofício, do quantum de suspensão das cotas, em homenagem aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Provimento negado. (grifei)

Assim é que as novas regras trazidas pela Lei 13.165/2015 apenas terão efeito prospectivo, imediato e geral, não alcançando os efeitos já consolidados sob a vigência de lei anterior, apenas tendo eficácia para os atos praticados a partir da sua vigência.

Concluo, portanto, que a permanência de várias irregularidades enseja a reprovação das contas e a transferência de R$ 2.045,00 ao Tesouro Nacional, em face das falhas apontadas nos itens 5 (R$ 45,00) e 6 (R$ 2.000,00).

Diante do exposto, na esteira do parecer ministerial, VOTO pela desaprovação das contas de REJANE MATTOS TEIXEIRA e determino o recolhimento de R$ 2.045,00 (dois mil e quarenta e cinco reais) ao Tesouro Nacional, no prazo de até 05 dias após o trânsito em julgado da decisão, na forma do art. 54, III, combinado com o art. 29, ambos da Resolução TSE n. 23.406/2014.

Anote-se esta determinação, de modo que o valor seja transferido ao Tesouro Nacional uma única vez, evitando-se a repetição de recolhimento pelos mesmos fatos, ainda que em outros autos.