RE - 4380 - Sessão: 19/03/2015 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO PROGRESSISTA – PP DE MANOEL VIANA contra sentença do Juízo da 79ª Zona Eleitoral de São Francisco de Assis, que desaprovou as contas da agremiação referentes ao exercício financeiro de 2011 e determinou a suspensão do recebimento das cotas do Fundo Partidário pelo prazo de doze meses.

A desaprovação ocorreu em face do recebimento de doações de fontes vedadas, as quais totalizaram R$ 1.174,00, soma oriunda da arrecadação de valores doados por servidores detentores de função de chefia ou direção, os quais se enquadram no conceito de autoridade pública, em afronta ao art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/1995.

Em razões recursais, o partido alega que não se trata de servidores comissionados, e sim do quadro efetivo, os quais recebem funções gratificadas sem exercer atividade de chefia ou direção (fls. 127-129).

Nesta instância, foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso, ante a verificação do recebimento, pela agremiação partidária, de doações provenientes de fontes vedadas, quais sejam, servidores públicos demissíveis ad nutum exercendo funções de chefia e direção (fls. 134-137v.).

É o relatório.
 

VOTO

Eminentes colegas:

O recurso é tempestivo. A sentença foi publicada no DEJERS do dia 09.7.13; e o recurso, interposto em 12.7.13, dentro do tríduo legal. Presentes os demais requisitos de admissibilidade, o apelo deve ser conhecido.

Trata-se de prestação de contas de partido político desaprovada no juízo de origem, em virtude do recebimento de doações de fonte vedada, em afronta ao art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/1995, in verbis:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[...]

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

Antes de adentrar no caso em apreciação, faz-se necessário esclarecer o que vem a ser “autoridade”, já que a lei não cuidou de conceituá-la.

Este Regional, ao apreciar a RE 100000525, da relatoria da Desa. Elaine Harzheim Macedo, assentou o conceito de “autoridade”, que deve abranger todo e qualquer servidor comissionado que desempenhe função de direção ou chefia, incluídos os admissíveis e demissíveis ad nutum:

Recurso. Prestação de contas de partido político. Doação de fonte vedada. Exercício financeiro de 2008. Doações de autoridades titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta, prática vedada pela Resolução TSE n. 22.585/2007 e pelo inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95. Desaprovação das contas pelo julgador originário. Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Razoável e proporcional a aplicação, de ofício, de 6 meses de suspensão das quotas do Fundo Partidário, a fim de colmatar lacuna da sentença do julgador monocrático. Provimento negado. (TRE-RS - RE: 100000525 RS, Relator: Desa. ELAINE HARZHEIM MACEDO, Data de Julgamento: 25.4.2013, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 78, Data 03.5.2013, Página 3.) (Grifei.)

O tema voltou a ser enfrentado por esta Casa, quando do julgamento do Recurso n. 34-80, de relatoria do Dr. Ingo Wolfgang, sessão de 26.8.2014, em que foram desaprovadas as contas de partido político, em razão do recebimento de doação advinda de cargos de coordenador, diretor de departamento e chefe de setores e unidades administrativas.

Eis a ementa daquele julgado:

Prestação de contas partidária. Diretório municipal. Art. 5º, inc. II, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro 2011.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum e na condição de autoridades. No caso, recebimento de quantia expressiva advinda de cargos de coordenador, diretor de departamento e chefe de setores e unidades administrativas. Manutenção das sanções de recolhimento de quantia idêntica ao valor doado ao Fundo Partidário e suspensão do recebimento das quotas pelo período de um ano.

Provimento negado.

Seguindo a mesma orientação, os seguintes feitos: RE 94-19, de Relatoria da Desa. Maria de Fátima Freitas Labarrère, sessão de 01.7.2014 e o RE 45-50, de Relatoria do Dr. Jorge Alberto Zugno, sessão de 19.11.2013.

A matéria novamente foi apreciada por ocasião do julgamento do Recurso n. 36-50, sessão de 23.9.2014. Destaco trecho do voto proferido pelo Des. Luiz Felipe Brasil Santos, vencedor e condutor do Acórdão:

É possível afirmar que o conceito atual de autoridade abrange os servidores ocupantes de cargos de direção e chefia (art. 37, V, da Constituição Federal), sendo excluídos os que desempenham função exclusiva de assessoramento. (Grifei.)

Ao discorrer acerca do tema “autoridade”, o Des. Luiz Felipe Brasil Santos reportou-se à Consulta n. 1.428 do TSE, sessão de 06.9.2007, de relatoria do Min. Antônio Cézar Peluso. Destaco trechos da aludida consulta, no ponto em que os Ministros buscam identificar o objetivo finalístico da norma (com grifos meus):

Min. Carlos Ayres Britto: Nós estamos dando interpretação dilatada. Estamos dizendo que a autoridade não é somente quem chefia órgão público, quem dirige entidade, o hierarca maior de um órgão ou entidade. Estamos indo além: a autoridade é também o ocupante de cargo em comissão que desempenha função de chefia e direção. Só estamos excluindo o assessoramento.
Dizer que o assessor é autoridade, uma vez que não dirige, não chefia ninguém, talvez seja demasia interpretativa. […]
Min. Cezar Peluso: A racionalidade da norma para mim é outra: desestimular a nomeação, para postos de autoridade, de pessoas que tenham tais ligações com partido político e que dele sejam contribuintes.
Min. Carlos Ayres Britto: Pode cumprir esse efeito inibidor.
Min. Cezar Peluso: Quem tem ligação tão íntima e profunda com o partido político, que é contribuinte do partido, pela proibição, evidentemente, não impede, mas, enfim, desestimula de certo modo.
[...]
Min. Carlos Ayres Britto: Está claro. A autoridade não pode contribuir. Quem é a autoridade? É evidente que o hierarca maior de um órgão ou entidade já não pode contribuir, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, e, além disso, os ocupantes de cargo em comissão.
Mas só incluímos no conceito de autoridade o ocupante de cargo em comissão na condição de assessor se também tiver função de direção e chefia, senão o assessor pode contribuir – mas apenas ele, dos ocupantes de cargo em comissão.
Min. Marco Aurélio (Presidente): Como ficamos, então?
Min. Carlos Ayres Britto: As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenhem função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.
[...]
Min. Marco Aurélio (Presidente): O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver doação por detentor de cargo de chefia e direção.

A meu sentir, o regramento tem por desiderato evitar que servidores cuja situação jurídica funcional seja de livre nomeação e exoneração, exercendo cargo de chefia, direção ou coordenação, venham a fazer doações – espécie de “dízimos” - aos partidos. Em outras palavras, busca-se evitar a transferência do dinheiro público - parcela do vencimento auferido pelo titular demissível ad nutum – para a agremiação partidária.

O Parecer Conclusivo (fls. 97-99) da unidade técnica deste Regional aponta 14 servidores ocupantes de cargos em comissão que realizaram doações ao Partido Progressista de Manoel Viana no ano de 2011. Alguns possuem chefia; outros, cargos de coordenação ou direção; há, ainda, servidores responsáveis por algum departamento do Executivo Municipal. Ou seja, todos cargos com poder decisório, e não meramente de assessoramento.

Assim, evidencia-se que o partido político recebeu doações de fontes vedadas, quais sejam, servidores ocupantes de cargos em comissão, exercendo função de direção e chefia, e que, portanto, enquadram-se no conceito de autoridade.

Nesse norte, julgado recente do TSE: Recurso Especial Eleitoral n. 4930 – Criciúma/SC, de relatoria do Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, sessão de 11.11.2014, cuja ementa segue abaixo transcrita:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DECISÕES. INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO. DOAÇÕES. OCUPANTES DE CARGO DE DIREÇÃO OU CHEFIA. AUTORIDADE. VEDAÇÃO. ART. 31, II, DA LEI Nº 9.096/95.

1. Para fins da vedação prevista no art. 31, II, da Lei nº 9.096/95, o conceito de autoridade pública deve abranger aqueles que, filiados ou não a partidos políticos, exerçam cargo de direção ou chefia na Administração Pública direta ou indireta, não sendo admissível, por outro lado, que a contribuição seja cobrada mediante desconto automático na folha de pagamento. Precedentes.

2. Constatado o recebimento de valores provenientes de fonte vedada, a agremiação deve proceder à devolução da quantia recebida aos cofres públicos, consoante previsto no art. 28 da Res.-TSE nº 21.841/2004.

Recurso especial desprovido.

A desaprovação das contas acarreta a suspensão da participação nas cotas do Fundo Partidário pelo período de um ano, à luz do art. 36, inc. II, da Lei 9.096/95. De igual modo, é devido o recolhimento dos valores recebidos indevidamente ao referido fundo, nos termos do art. 28, inc. II, da Resolução TSE n. 21.841/2004.

Por se tratar de quantia diminuta, e considerando precedente recente desta Casa (RE n. 36-50), estou reduzindo, de ofício, o período de suspensão do recebimento de novas quotas para 6 (seis) meses, em prol dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a decisão de primeiro grau; e, de ofício, readequando o prazo de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para o período de 6 (seis) meses, nos termos da fundamentação.

É como voto, Presidente.