RE - 2772 - Sessão: 05/03/2015 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO – PTB de SANTA ROSA contra sentença (fls. 86-88) que desaprovou suas contas referentes ao exercício financeiro de 2013.

Em razões recursais (fls. 90-91), o recorrente postula a aprovação das contas, entendendo não haver ilicitude nas doações realizadas, pois o art. 5º, § 1º, da Resolução TSE n. 21.841/04 não veda a contribuição de agentes políticos e servidores públicos filiados a partidos políticos. Outrossim, aduz que somente secretários municipais devem ser considerados autoridades, entendendo descaracterizada a ilicitude das contribuições alcançadas pelos detentores dos demais cargos (Diretor do Departamento de Desenvolvimento Econômico e Assessor de Gabinete do Prefeito).

Nesta instância, foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso, visto ter verificado o recebimento de doações pela agremiação partidária provenientes de autoridades e servidores públicos demissíveis ad nutum que exercem funções de chefia ou direção, o que configura fonte vedada (fls. 93-94).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. O partido foi intimado da sentença em 22.9.2014, segunda-feira, e o recurso interposto em 25.9.2014, quinta-feira, dentro do prazo previsto pelo artigo 258 do Código Eleitoral.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

Trata-se de prestação de contas de partido político, desaprovada em virtude do recebimento de doação de fonte vedada, em desacordo com o disposto no art. 31, II, da Lei n. 9.096/1995:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[...]

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

É assente, neste Tribunal, o entendimento de que o conceito de autoridade do dispositivo citado abrange todo e qualquer servidor comissionado que desempenhe função de direção ou chefia, incluídos os demissíveis ad nutum, conforme se verifica pela ementa transcrita:

Recurso. Prestação de contas de partido político. Doação de fonte vedada. Exercício financeiro de 2008. Doações de autoridades titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta, prática vedada pela Resolução TSE n. 22.585/2007 e pelo inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95. Desaprovação das contas pelo julgador originário. Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Razoável e proporcional a aplicação, de ofício, de 6 meses de suspensão das quotas do Fundo Partidário, a fim de colmatar lacuna da sentença do julgador monocrático.Provimento negado.

(TRE-RS - RE: 100000525 RS, Relatora: Desa. ELAINE HARZHEIM MACEDO, Data de Julgamento: 25.4.2013, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 78, Data 03.5.2013, Página 3.) (Grifei.)

Ressalto que o TSE, até a edição da Res. 22.585/2007, havia firmado entendimento no sentido de ser possível a contribuição de filiados ocupantes de cargos exoneráveis ad nutum, o que pode ser constatado com a ementa do julgamento da Pet. n. 310 (Resolução TSE n. 20.844, de 14.08.2001), de relatoria do Ministro Nelson Jobim:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO DOS TRABALHADORES – PT. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 1996. Contribuição de filiados ocupantes de cargos exoneráveis ad nutum. Inexistência de violação ao art. 31, II, da Lei n° 9.096/95. Contas aprovadas.

(Petição n. 310, Resolução n. 20844 de 14.8.2001, Relator: Min. NELSON AZEVEDO JOBIM, Publicação: DJ - Diário de Justiça, volume 1, data 09.11.2001, página 154, RJTSE - Revista de Jurisprudência do TSE, volume 13, tomo 1, página 302.)

Entretanto, desde o advento da Resolução TSE n. 22.585/07, o tema não comporta mais questionamentos. Por oportuno, reproduzo ementa da Consulta que deu origem à Resolução:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(Consulta n. 1428, Resolução n. 22585 de 06.9.2007, Relator: Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado: Min. ANTONIO CESAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172.) (Grifei.)

Os fundamentos exarados para a mudança de interpretação deram-se nos seguintes termos:

Estamos dando interpretação dilatada. Estamos dizendo que autoridade não é somente quem chefia órgão público, quem dirige entidade, o hierarca maior de um órgão ou entidade. Estamos indo além: a autoridade é também o ocupante de cargo em comissão que desempenha função de chefia e direção.

[…]

Está claro. A autoridade não pode contribuir. Que é a autoridade? É evidente que o hierarca maior de um órgão ou entidade já não pode contribuir, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, e, além disso, os ocupantes de cargo em comissão.

[…]

As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenham função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.

[…]

Para mim, autoridade em sentido amplo: todo aquele que possa, por exemplo, em mandado de segurança, comparecer nessa qualidade, para mim é autoridade […].

O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção. (Grifei.)

Como se verifica, transmudou-se de uma compreensão que privilegiava a proteção do partido político contra a influência do Poder Público, para uma interpretação que ressalta a relevância dos princípios democráticos da moralidade, dignidade do servidor e preservação contra abuso de autoridade e do poder econômico.

A previsão de fontes vedadas tem por finalidade impedir a influência econômica de entidades que tenham alguma vinculação com órgãos públicos e, também, evitar possíveis manipulações da máquina pública em benefício de determinadas campanhas, conforme a lição de Carlos Velloso e Walber Agra (AGRA, Walber de Moura. VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Elementos de Direito Eleitoral. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, fl. 317):

Tentou a lei eleitoral, ao excluir esses órgãos ou entidades, preservar o pleito eleitoral de sua influência, que, pelo vulto dos interesses que personificam, podem desequilibrar a campanha em favor daqueles aquinhoados com sua preferência. Outrossim, busca-se impedir que entidades públicas, de caráter público ou que possuam vínculos estreitos com órgãos governamentais, possam exercer suas funções com desvio de finalidade para sustentar as preferências partidárias escolhidas.

Portanto, o conceito de autoridade abrange os servidores ocupantes de cargos de direção e chefia (art. 37, V, da Constituição Federal), sendo excluídos os que desempenham exclusivamente a função de assessor.

Daí, merece reforma a sentença no ponto em que entendeu, como valores oriundos de fonte vedada, as doações efetuadas por José dos Santos, no valor total de R$ 553,00 (quinhentos e cinquenta e três reais, fl. 86), eis que ocupante do cargo de Assessor de Gabinete, o qual não restou comprovado tenha as características que o fariam incidir na irregularidade.

De outro modo, inequívoco que os ocupantes dos cargos de direção e chefia elencados no parecer conclusivo do exame das contas (fls. 70-71, Luis Fernando Rabuske (Secretário Municipal) e Rafael Furtado Jarczewski (Diretor de Departamento) encontram-se inseridos no conceito de “autoridade” preconizado pelo TSE, restando vedada a doação de valores a partido político.

Quanto à pena de suspensão do repasse de cotas do Fundo Partidário, fixada pelo prazo de doze meses na sentença, o art. 36, II, da Lei n. 9.096/95 prevê que, no caso de recebimento de recursos de fontes vedadas fica suspensa a participação no Fundo Partidário por um ano. O dispositivo conta, igualmente, no art. 28, II, da Resolução TSE n. 21.841/04:

Art. 28. Constatada a inobservância às normas estabelecidas na Lei n. 9.096/95, nesta Resolução e nas normas estatutárias, ficará sujeito o partido às seguintes sanções ( Lei n. 9.096/95, art. 36):
[...]
II – no caso de recebimento de recursos de fontes vedadas, previstas no art. 5º desta Resolução, com a ressalva do parágrafo único, fica suspensa, com perda, das cotas, a participação do partido no Fundo Partidário por um ano, sujeitando-se, ainda, ao recolhimento dos recursos recebidos indevidamente ao Fundo Partidário; (Grifei.)

Todavia, e na esteira de julgados desta Corte (v.g. RE n. 146-15, de relatoria do Dr. Leonardo Tricot Saldanha, julgado em 15 de janeiro de 2015, unânime) penso que a penalização se afiguraria demasiado rigorosa. Ainda que alguns doadores, como acima indicado, sejam proibidos de realizar doações, tenho que a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de doze meses não pode integrar uma equação que busque o devido sopesamento e indique a reprimenda adequada ao caso posto. Indico que o Tribunal Superior Eleitoral possui precedentes nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO. DOAÇÃO DE FONTE VEDADA. ART. 31, II, DA LEI 9.096/95. SUSPENSÃO DE COTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ART. 36, II, DA LEI 9.504/97. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INCIDÊNCIA.
1. Na espécie, o TRE/SC, com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, concluiu que o recebimento de recursos no valor de R$ 940,00 oriundos de fonte vedada de que trata o art. 31, II, da Lei 9.096/95 - doação realizada por servidor público ocupante de cargo público exonerável ad nutum - comporta a adequação da pena de suspensão de cotas do Fundo Partidário de 1 (um) ano para 6 (seis) meses.
2. De acordo com a jurisprudência do TSE, a irregularidade prevista no art. 36, II, da Lei 9.096/95 -consistente no recebimento de doação, por partido político, proveniente de fonte vedada - admite a incidência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade na dosimetria da sanção.
3. Agravo regimental não provido
(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 4879, Acórdão de 29.8.2013, Relator: Min. JOSÉ DE CASTRO MEIRA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 180, Data 19.9.2013, Página 71.)
 
Prestação de contas. Campanha eleitoral. Candidato a deputado. Fonte vedada.
1. Este Tribunal, no julgamento do AgR-AI nº 9580-39/MG, rel. Min. Arnaldo Versiani, DJE de 25.9.2012, reafirmou, por maioria, seu entendimento no sentido de que "empresa produtora independente de energia elétrica, mediante contrato de concessão de uso de bem público, não se enquadra na vedação do inciso III do art. 24 da Lei nº 9.504/97". Precedentes: AgR-REspe nº 134-38/MG, relª. Minª. Nancy Andrighi, DJE de 21.10.2011; AgR-REspe nº 10107-88/MG, rel. Min. Arnaldo Versiani, de 9.10.2012. Ressalva do relator.
2. Ainda que se entenda que a doação seja oriunda de fonte vedada, a jurisprudência desta Corte Superior tem assentado que, se o montante do recurso arrecadado não se afigura expressivo diante do total da prestação de contas, deve ser mantida a aprovação das contas, com ressalvas, por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
Agravo regimental a que se nega provimento.
(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 963587, Acórdão de 30.4.2013, Relator: Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 18.6.2013, Página 68-69.)

Na hipótese, o período de suspensão pode ser mitigado, comportando redução na suspensão do repasse de novas cotas do Fundo Partidário de 12 meses para 2 meses.

Portanto, entendo por dar provimento parcial ao recurso, para:

- excluir R$ 553,00, doados por José dos Santos da quantia determinada em sentença para recolhimento à conta do Fundo Partidário, de R$ 3.863,00, resultando no valor de R$ 3.310,00 (três mil trezentos e dez reais) a ser recolhido ao Fundo Partidário;

- reduzir a pena de suspensão do repasse de cotas do Fundo Partidário, de 12 (doze) meses para 2 (dois) meses.

Ante todo o exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso, para retirar R$ 553,00 doados por José dos Santos da quantia considerada oriunda de fonte vedada, e para reduzir o prazo de suspensão do repasse de cotas do Fundo Partidário de 12 meses para 02 meses, mantida a desaprovação das contas do PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO – PTB DE SANTA ROSA.