E.Dcl. - 183289 - Sessão: 20/01/2015 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de embargos de declaração, com pedido de efeitos modificativos (fls. 584-604), opostos por GERSON LUIS DE BORBA, candidato ao cargo de deputado estadual pelo PARTIDO PROGRESSISTA – PP, contra o acórdão que, por unanimidade, desaprovou sua prestação de contas referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2014.

Argumenta que o acórdão das fls. 578-582 incorreu em omissões e contradições,  postulando sejam sanadas, bem como concedidos efeitos infringentes, para que restem aprovadas com ressalvas as contas.

É o relatório.

 

VOTO

A irresignação é tempestiva, de forma que conheço dos embargos.

Mérito

O expediente serve para afastar obscuridade, dúvida ou contradição que emergem do acórdão, situando a matéria, no âmbito deste Tribunal, nos termos do artigo 275, I e II, do Código Eleitoral, in verbis:

Art. 275. São admissíveis embargos de declaração:

I - quando há no acórdão obscuridade, dúvida ou contradição;

II - quando for omitido ponto sobre que devia pronunciar-se o Tribunal.

De início, o embargante alega contradição na aplicação do art. 19, parágrafo único, da Resolução TSE n. 23.406/2014, o qual expressamente limita a utilização de recursos próprios dos candidatos a 50% do patrimônio informado à Receita Federal, na Declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física, referente ao exercício anterior ao pleito. Refere ter havido “tese” deste juízo baseada em “presunção”, sobre a qual a decisão teria sido construída.

Inexistiu presunção: o patrimônio declarado pelo próprio embargante para a Receita Federal – Ano/Calendário 2013 foi de R$ 31.360,81 (trinta e um mil trezentos e sessenta reais com oitenta e um centavos), fl. 420. Poderia dispor, para sua candidatura, de metade desse valor - R$ 15.680,41 (quinze mil seiscentos e oitenta reais com quarenta e um centavos).

Todavia, embargante informou à Justiça Eleitoral (fls. 431 e 433) a utilização de recursos próprios no valor de R$ 49.000,00 (quarenta e nove mil reais), equivalente a 156% (cento e cinquenta e seis por cento) do patrimônio declarado.

Também dispensada, portanto, qualquer tese, pois clara e cristalina a desobediência ao comando legal.

Os argumentos trazidos nos embargos não revelam contradição, senão apenas a intenção de rediscussão da matéria. Note-se que a alegação de erro material não foi minimamente comprovada.

Daí, trago à colação as razões da decisão atacada, fl. 579-579v:

A norma é objetiva e a desobediência é clara. O excesso se dá no valor de R$ 33.319,59 (trinta e três mil trezentos e dezenove reais com cinquenta e nove centavos) quantia considerável por si mesma, e equivalente a 5,87% (cinco vírgula oitenta e sete por cento) do total gasto na campanha – R$ 567.130,00 (quinhentos e sessenta e sete mil cento e trinta reais).

Não procedem as razões do candidato, expostas principalmente nas fls. 541 e 542, no sentido de que deviam ter sido levados em conta os valores declarados sob a rubrica “rendimentos tributáveis” pois lá declarados R$ 98.523,76 (noventa e oito mil quinhentos e vinte e três reais com setenta e seis centavos).

Ora, como exposto, a norma eleitoral visou sobretudo a alinhar a regulamentação com as disposições da legislação civil, a qual determina serem nulas as disposições de todos os bens sem reserva de parte, bem como aquelas que excederem a parte que o doador poderia dispor, no momento da liberalidade, em testamento.

E o legislador civil não fez tal escolha aleatoriamente pois, de fato, trata-se, o patrimônio, de referencial muito mais sedimentado do que seria qualquer outro. Os rendimentos de uma pessoa inegavelmente podem variar com mais facilidade do que seus rendimentos, até mesmo por uma questão de lógica. Por óbvio, todo e qualquer valor oriundo dos rendimentos tributáveis, ao final do exercício, deve ser declarado como patrimônio do contribuinte.

Ou seja, as eventuais “sobras” dos rendimentos tributáveis de GERSON estão, a rigor, integrando a rubrica “patrimônio”, e tanto isso corresponde à realidade que na declaração de imposto de renda do prestador consta, conforme fl. 420, os valores de R$ 1.592,47 (mil quinhentos e noventa e dois reais com quarenta e sete centavos) a título de aplicação em renda fixa, e R$ 68,34 (sessenta e oito reais com trinta e quatro centavos) como crédito em conta corrente.

Além disso, a resolução é clara e expressa ao vincular, para fins de disposição, ao patrimônio do doador.

Demonstrado, portanto, que o “espírito da norma de regência”, nos dizeres do próprio prestador, foi o de atrelar o limite de doação ao patrimônio do doador, exata e estritamente como feito pela legislação civil. Não se mostra razoável, assim, o alargamento conceitual pretendido pelo prestador, de forma que a irregularidade é de ser considerada como falha que compromete a regularidade das contas, como assentado pela Secretaria de Controle Interno e Auditoria deste Tribunal.

Sigo. Também as alegadas “omissões” trazidas pelo embargante são, na realidade, circunstâncias logicamente afastadas por razões expostas em sentido diametralmente contrário. Dito de outro modo: se as razões de julgamento se dão em um sentido, não é necessário, por óbvio, afastar expressamente raciocínios contrários.

Expostas as razões de decidir suficientes para a conclusão da decisão, é desnecessária a análise individualizada de todos os argumentos tecidos pelas partes, que ficam logicamente afastados.

Nesse sentido é a jurisprudência, conforme ementa que segue:

[…] No tocante à alegada ofensa ao art. 535, incisos I e II, do CPC, os recorrentes, a pretexto de alegar omissão no aresto recorrido, acabaram pleiteando a reforma da decisão, no que se refere à atribuição do onus probandi do estado de pobreza dos recorrentes.

Os embargos de declaração não servem para a reapreciação do mérito da demanda, já que o ordenamento pátrio destina-lhes fim específico: integração de decisum judicial em que tenha ocorrido uma das situações previstas no art. 535 do CPC. Não é necessário que o magistrado se oponha a cada um dos argumentos expendidos pelo recorrente, bastando que tenha solucionado de forma integral a querela, rejeitando logicamente as teses contrárias. Precedentes.[...] (STJ, REsp 1211838/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 02.12.2010, DJe 10.12.2010.)

Vale ressaltar, ainda neste ponto, que a jurisprudência trazida pelo embargante (RE n. 21.478, TRE do Maranhão) aqui não se presta como paradigma, por não tratar da mesma questão, até mesmo porque a decisão se deu sob a égide da Resolução TSE n. 23.376, relativa às eleições de 2012.

Sob outro aspecto, vale lembrar que a alegada marcha jurisprudencial, no sentido de tolerar irregularidades no montante de até 10% dos valores totais, foi logicamente afastada pelo argumento de que, no caso posto, o valor em si mesmo é relevante.

E o mesmo ocorre em relação à falta de identificação dos doadores originários, segunda irregularidade detectada. O embargante aduz que o valor de R$ 11.000,00 representaria 1,94% do total da campanha, olvidando que o valor em si mesmo é considerável, além da gravidade da conduta – distante da jurisprudência colacionada nos embargos, que trata de assunto diverso (valores não transitados em conta bancária de campanha).

Reproduzo, novamente, trecho da decisão atacada, especialmente no ponto que releva as consequências da não identificação dos doadores originários, grifos meus:

Ainda, saliento, conforme o art. 41 da Resolução TSE n. 23.406/2014, a cogência da utilização do SPCE - Sistema de Prestação de Contas Eleitorais, programa no qual devem constar as informações de arrecadação e gastos de campanha O argumento de que os doadores originários constarão na prestação de contas do partido político atribui, indireta e descabidamente, à Justiça Eleitoral a atividade de “escolher” os valores (e, portanto, as pessoas) que passarão a assumir a condição de doadores de campanha do candidato.

Ora, essa responsabilidade é, por óbvio, exclusiva do prestador, até mesmo porque, na ocasião, deve ser emitido o respectivo recibo.

Note-se ainda que, da forma como prestadas as contas, não foram possíveis duas análises fundamentais: a primeira, a atinente à existência (ou inexistência) das denominadas “fontes vedadas”, previstas no art. 5º da Resolução TSE n. 21.841/04 para os partidos políticos, aliás em rol mais estreito do que quando se está a tratar de arrecadação na campanha eleitoral - previstas no art. 28 da Resolução TSE n. 23.406/2014; e, a segunda, a aferição de valores repassados por pessoas na condição de “autoridade” - ocupantes de cargo em comissão com funções de direção ou chefia, as quais se enquadram no conceito de autoridade, situação considerada irregular tanto pelo Tribunal Superior Eleitoral quanto por esta Corte.

Irregularidade grave e insanável. Os doadores originários/pessoas físicas deveriam ter sido indicados na prestação de contas do candidato e registradas no SPCE. Ainda, na ocasião deveriam ter sido emitidos os respectivos recibos eleitorais. O valor de R$ 11.000,00 deve ser considerado recurso de origem não identificada, na forma do art. 29 da Resolução TSE n. 23.406/2014.

Daí, tenho que as razões trazidas pelo embargante evidenciam, a todo efeito, inconformismo com a decisão desfavorável, não cabendo, em sede de embargos, a pretensão de ver a decisão novamente analisada, conforme reiteradamente decidido por esta Corte:

Embargos de declaração. Pedido de atribuição de efeitos infringentes. Acórdão que negou provimento a recurso em prestação de contas. Alegada contradição, dúvida e obscuridade no decisum.

Inexistência de quaisquer dos vícios que permitam o manejo dos aclaratórios. Impossibilidade, pela via eleita, de rediscutir a matéria já decidida. Desacolhimento.

(PC 338, 17 de novembro de 2010, rel. Artur dos Santos e Almeida.)

Ademais, a inconformidade não merece acolhida quando utilizada para reexame do litígio, alterar a decisão, obter a análise sob determinado ângulo ou resposta a todos os argumentos elencados pelas partes, bem como se o objetivo é tão somente caracterizar o prequestionamento:

Ao julgador cabe apreciar a questão conforme o que ele entender relevante à lide. Não está o Tribunal obrigado a julgar a questão posta a seu exame nos termos pleiteados pelas partes, mas sim com o seu livre convencimento, consoante dispõe o art. 131 do CPC, utilizando-se dos fatos, provas, jurisprudência, aspectos pertinentes ao tema e da legislação que entender aplicável à espécie. - Os embargos declaratórios, mesmo quando manejados com o propósito de prequestionamento, são inadmissíveis se a decisão embargada não ostentar qualquer dos vícios que autorizariam a sua interposição. (STJ, REsp 521120/RS, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, Data do Julgamento 19.02.2008, Data da Publicação/Fonte DJe 05.03.2008.)

Assim, considerando que as falhas apontadas têm caráter objetivo, face a afronta direta à norma de regência, não há possibilidade de ver-se aplicado o princípio da proporcionalidade.

Em resumo, os pontos destacados pelo embargante buscam a reapreciação do caso, para que sejam concedidos os efeitos modificativos de aprovação das contas. A respeito, consigno não se admitir, em embargos de declaração, a mera revisão do que já foi julgado pelo Tribunal, não se podendo confundir o julgamento contrário aos interesses da parte com as hipóteses de omissão, obscuridade, dúvida ou contradição.

Desta forma, o manejo do presente recurso não encontra fundamento, impondo-se sua rejeição.

 

Ante o exposto, ausentes os vícios elencados no art. 275 do Código Eleitoral, VOTO pela REJEIÇÃO dos embargos de declaração, visto restar evidente o propósito de rediscusão do mérito da decisão.