RE - 61104 - Sessão: 10/12/2014 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por SIMONE VARGAS LUNKES, candidata ao cargo de vereadora no Município de Santo Ângelo, contra sentença do Juízo da 45ª Zona Eleitoral que desaprovou as contas referentes às eleições municipais de 2012. A decisão pela desaprovação baseou-se na ausência do 'termo de cessão de veículo', na falta de apresentação de nota fiscal referente à receita estimada recebida do partido político e na divergência entre o patrimônio declarado no registro de candidatura e os recursos próprios aplicados na campanha (fls. 79-79v.).

A candidata recorreu, anexando 'termo de cessão de veículo' em conjunto com documentação comprovando ser  seu esposo o proprietário do automóvel. Em relação à divergência de valores do recibo eleitoral e da nota fiscal, informa que recebeu do partido político doação de material impresso (santinhos) no valor estimado de R$ 362,00 (trezentos e sessenta e dois reais), bem como apresentou a nota fiscal (fl. 68) emitida no valor total pago pela agremiação partidária. Ponderou ainda que a agremiação partidária também repassou para outros candidatos o mesmo material de campanha (por esse motivo, consta na sua prestação de contas somente o recebimento do valor proporcional por ela recebido). Quanto à utilização de recursos próprios, alega que os valores são oriundos de rescisão contratual. Requer a reforma da sentença recorrida, para que sejam aprovadas suas contas ou, alternativamente, sejam aprovadas com ressalvas (fls. 83-89).

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso e pela manutenção da desaprovação das contas, por entender que as irregularidades apontadas na sentença não foram devidamente sanadas pela candidata, o que comprometeria a transparência da prestação (fls. 101-103).

É o relatório.

 

VOTO

Eminentes colegas:

1. O recurso merece ser admitido por ser tempestivo.

 A decisão foi publicada no DEJERS em 17.7.2013 (fl. 80); e o recurso, interposto em 22.7.2013 (fl. 83), ou seja, dentro dos três dias previstos pelo art. 30, § 5º, da Lei n. 9.504/1997.

2. No mérito, com toda a vênia à posição e manifestação do ilustre representante do Ministério Público, tenho que procede a inconformidade recursal.

Verifico que, por ocasião da interposição do recurso, a candidata juntou documentos às fls. 90-94, cujo conhecimento admito, em função do disposto no art. 266, in fine, do Código Eleitoral e na linha da reiterada jurisprudência desta Corte.

A inconformidade recursal diz respeito à decisão que desaprovou as contas da candidata Simone Vargas Lunkes  referentes às eleições municipais de 2012, por apresentar as seguintes irregularidades:

a) ausência do 'termo de cessão de veículo;

b) falta de apresentação de nota fiscal referente à receita estimada recebida do partido político;

c) divergência entre o patrimônio declarado no registro de candidatura e os recursos próprios aplicados na campanha.

Em relação à primeira irregularidade apontada, as contas foram desaprovadas em razão de não ter sido apresentado, juntamente com o recibo (fl. 70) o 'termo de cessão de veículo' do carro FORD FOCUS, Placa JUZ 0468, relativo à utilização na campanha eleitoral. Contudo, a documentação juntada em grau recursal demonstra que o veículo utilizado pela candidata pertencia ao seu esposo. Diante disso, tenho que merece ser mitigado, com amparo nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, a exigência de formalização do termo de cessão do veículo, prevista no art. 22, inc. III, c/c o art. 41, inc. III, da Resolução TSE n. 23.376/2012, já que restou esclarecida a fonte de financiamento da campanha.

Nesse sentido, cito os seguintes julgados (com grifos meus):

Recurso. Prestação de contas. Eleições 2008. Desaprovação no juízo originário.

Suficiência dos documentos apresentados para identificação da origem e destino dos recursos arrecadados. Admissível o emprego de veículo pertencente a familiar na campanha eleitoral.

Não se verifica falha substancial quando o montante dos gastos irregulares é inferior a dez por cento do valor de recursos arrecadados. Razoabilidade.

Aprovação com ressalvas. Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n. 286, Acórdão de 12.7.2011, Relator: Dr. HAMILTON LANGARO DIPP, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 121, Data 14.7.2011, Página 03.)

 

Recurso. Prestação de contas. Eleições 2008. Desaprovação.

Emprego de automóvel de familiar na campanha eleitoral. Ausência de registro da despesa com cessão ou locação do veículo. Falha que não implica desaprovação da demonstração contábil.

Provimento parcial.

(Recurso - Prestação de Contas de Candidato n. 284, Acórdão de 27.7.2009, Relator: Des. LUIZ FELIPE SILVEIRA DIFINI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 124, Data 31.7.2009, Páginas 1 e 2.)

A outra irregularidade apontada consiste na ausência de nota fiscal relativa ao material impresso (santinhos) recebido como doação estimável em dinheiro e declarada no recibo n. 1230088536RS000002 (fl. 73).

Em relação à doação pelo partido político para candidatos, dispõe o art. 26 da Resolução TSE n. 23.376/2012:

Art. 26. As doações entre candidatos, comitês financeiros e partidos políticos deverão ser realizadas mediante recibo eleitoral e não estão sujeitas aos limites fixados nos incisos I e II do art. 25 desta resolução.

Destaca-se, ainda, que a candidata emitiu recibo eleitoral e juntou documentos que demostram a regularidade da doação. Dessa forma, no sentido de ser o recibo eleitoral documento hábil para comprovar a doação, colaciono jurisprudência (com grifos meus):

Recurso eleitoral. Eleições 2012. Prestação de contas de candidato em campanha eleitoral. Ausência de termos de doação referentes a recursos materiais recebidos do partido. Doação/cessão de veículos integrante do patrimônio do doador. Doações recebidas e não declaradas na primeira parcial das contas. Aprovação com ressalvas. Gastos acima do limite de despesa declarado pelo partido. Multa. Recurso parcialmente provido.

I - Nos repasses de material de campanha, efetuados pelo partido político ao candidato, exige-se tão somente o recibo eleitoral, dispensa-se o termo de doação. Inteligência do art. 26 da Resolução TSE n. 23.376/2012.

II - Veículos automotores cedidos ou doados à campanha eleitoral por pessoa jurídica devem ser enquadrados como bens permanentes que devem integrar o patrimônio da doadora e não como produto do seu próprio serviço (art. 23 da Resolução TSE n. 23.376/2012).

III - Consoante disposições do art. 30, inciso II e § 2º-A, da Lei n. 9.504/1997, os erros formais ou materiais irrelevantes no conjunto da prestação de contas, que não comprometam o resultado final da análise, não acarretam sua rejeição, impõe-se, por conseguinte, a aprovação com ressalvas.

IV - Gastos de campanha acima do limite declarado pela agremiação partidária não implica, necessariamente, na desaprovação das contas apresentadas. Contudo, impõe-se ao candidato infrator a penalidade de multa nos moldes previstos no art. 18, § 2º, da Lei n. 9.504, de 1997.

V - Recurso parcialmente provido.

(Recurso Eleitoral n. 56523, Acórdão n. 22/2013 de 31.1.2013, Relator: Dr. JOSÉ JORGE RIBEIRO DA LUZ, Publicação: DJE/TRE-RO - Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral, Tomo 26, Data 8.2.2013, Páginas 4-5.)

 

Recurso eleitoral. Prestação de contas de campanha eleitoral. Candidato. Doação entre candidatos. Ausência de nota fiscal. Valor de pequena monta. Razoabilidade e proporcionalidade. Aprovação com ressalvas.

I - Em relação às doações de bem estimável em dinheiro efetuadas pelo partido político ao candidato, exige-se tão somente o recibo eleitoral, dispensando-se o termo de doação, nos termos do art. 26 da Resolução TSE n. 23.376/2012, contudo, a origem das receitas estimáveis deve ser comprovada.

II - Nos termos do precedente no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 82-42 do C. TSE, se a doação recebida for de pequeno valor e não se averiguar a má-fé do candidato é possível a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

III - Recurso provido.

(Recurso Eleitoral n. 51412, Acórdão n. 59/2013 de 15.3.2013, Relatora: Dra. JUACY DOS SANTOS LOURA JÚNIOR, Publicação: DJE/TRE-RO - Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral, Tomo 53, Data 22.3.2013, Página 5.)

Importante ainda destacar que a doação de R$ 362,00 (trezentos e sessenta e dois reais) foi devidamente declarada na prestação de contas do Comitê Financeiro Municipal para Vereador, CNPJ n. 88.483.128/0001-02. Tal dado constata-se nas informações colhidas através de consulta no Sistema de Prestação de Contas referente às eleições 2012, disponibilizado na internet pelo Tribunal Superior Eleitoral – TSE. Dessa forma, entendo superada a incongruência apontada e considero que houve uma falha no preenchimento do recibo, a qual não caracteriza má-fé da candidata na apresentação da prestação de contas.

Relativamente à irregularidade remanescente, a utilização de recursos próprios do candidato que superam o montante inicialmente informado no registro de candidatura, da mesma forma, entendo  que deve ser superada. Com efeito, presente a falha, mas que, em sede recursal, veio esclarecida. Afirma a recorrente que os recursos são oriundos de verbas por término de contrato de trabalho e a justificativa apresentada efetivamente demonstrou a existência de valores que suportam o aporte de recursos próprios durante a campanha eleitoral.

Na hipótese, verifica-se que a candidata não declarou patrimônio próprio por ocasião do registro de candidatura, conforme consulta no sistema DivulgaCand2012,(http://divulgacand2012.tse.jus.br/divulgacand2012/abrirTelaPesquisaCandidatosPorUF.action?siglaUFSelecionada=RS), disponibilizado no site do TSE.

Contudo, constatou-se que, do total declarado na prestação contábil, foram empregados recursos próprios no valor de R$ 380,00 (trezentos e oitenta reais), conforme se pode apurar das informações do Demonstrativo dos Recursos Arrecadados (fl. 4), do Demonstrativo de Receitas e Despesas (fl. 6) e do Resumo Financeiro (fl. 26). Em contrapartida, percebe-se que, conforme extrato bancário (fl. 76), a regularidade da doação limita-se aos requisitos formais previstos no art. 22 da Resolução 23.376/2012, os quais, saliento, foram seguidos pela recorrente.

Assim, a questão atinente à prévia integração da quantia ao patrimônio da candidata resta prejudicada. Esse é, aliás, o viés adotado por este Tribunal em julgamentos recentes (com grifos meus):

Recurso. Prestação de contas de candidato. Eleições 2012.

Juntada de documentos e esclarecimentos em sede recursal. A aplicação de recursos próprios na campanha eleitoral, quando em espécie, não está sujeita às limitações impostas pelo art. 23 da Resolução TSE n. 23.376/12, referentes aos bens estimáveis em dinheiro. Comprovada a percepção de honorários advocatícios no decorrer da campanha e após o registro da candidatura. Persistência de falhas meramente formais, que permitem a aprovação com ressalvas dos registros contábeis. Provimento parcial.

(Prestação de Contas n. 26292, Acórdão de 10.6.2014, Relator: Dr. INGO WOLFGANG SARLET, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 104, Data 12.6.2014, Página 2.)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATO. ART. 18, INCISO I, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.376/2012. Recursos aplicados em campanha em valor superior ao declarado quando do registro de candidatura. Desaprovação no juízo originário. Os recursos próprios do candidato, em espécie, investidos na campanha eleitoral, não estão sujeitos às limitações impostas pelo art. 23 da citada resolução. Recursos provenientes de atividade econômica informal, durante o período eleitoral, não integrando o patrimônio da candidato quando do registro. Aprovação das contas. Provimento.

(Recurso Eleitoral n. 15089, Acórdão de 16.12.2013, Relator: Des. MARCO AURÉLIO HEINZ, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 235, Data 19.12.2013, Página 3.)

Convém reproduzir, inclusive, excerto da fundamentação do RE 150-89, que bem analisou a questão:

A Res. 23.376/2012, art. 18, especifica as espécies de recursos previstos para aportar os gastos de campanhas eleitorais, entre elas, no inciso I, os recursos do próprio candidato:

Art. 18. Os recursos destinados às campanhas eleitorais, respeitados os limites previstos nesta resolução, são os seguintes:

I – recursos próprios dos candidatos;

II – recursos e fundos próprios dos partidos políticos;

III – doações, em dinheiro ou estimáveis em dinheiro, de pessoas físicas ou de pessoas jurídicas;

IV – doações, por cartão de débito ou de crédito;

V – doações de outros candidatos, comitês financeiros ou partidos políticos;

VI – repasse de recursos provenientes do Fundo de Assistência Financeira aos Partidos Políticos – Fundo Partidário, de que trata o art. 38 da Lei nº 9.096/95;

VII – receita decorrente da comercialização de bens e/ou serviços e/ou da promoção de eventos, bem como da aplicação financeira dos recursos de campanha.

No cotejo dos demais incisos se depreende que esses recursos podem ser, ainda, doações estimáveis em dinheiro ou doações financeiras, estabelecendo a citada resolução, em seu artigo 22, a operação a legitimar uma e outra doação: por via bancária, se financeira; por doação ou cessão temporária, se estimáveis em dinheiro:

Art. 22. As doações, inclusive pela internet, feitas por pessoas físicas e jurídicas em favor de candidato, comitê financeiro e/ou partido político serão realizadas mediante:

I – cheques cruzados e nominais, transferência bancária, boleto de cobrança com registro, cartão de crédito ou cartão de débito;

II – depósitos em espécie, devidamente identificados com o CPF/CNPJ do doador;

III – doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro.

As doações que caracterizam bens estimáveis em dinheiro do próprio candidato estão atingidas por uma limitação expressa no artigo 23 da Res. 23.376/12 do TSE, que considera passíveis de doação apenas aqueles bens integrantes do patrimônio do candidato em período anterior ao pedido de registro da candidatura, e que constaram da declaração de bens que instruiu o pedido. Reproduzo o aludido dispositivo:

Art. 23. São considerados bens estimáveis em dinheiro fornecidos pelo próprio candidato apenas aqueles integrantes do seu patrimônio em período anterior ao pedido de registro da candidatura.

Como se extrai da própria redação do artigo, somente os bens estimáveis em dinheiro devem integrar o patrimônio do candidato no período anterior a sua candidatura. A doação em espécie não é alcançada pela norma em comento, por isso nada impede que a candidata utilize recursos próprios em espécie adquiridos no decorrer da campanha ou não declarados no registro de sua candidatura.

Ademais, todos os dados constantes da declaração de bens tornam-se públicos, sendo possível a qualquer pessoa acessá-los, porquanto não estão cobertos pelo sigilo – nem poderiam, uma vez que a medida tende a favorecer a transparência no exercício dos mandatos eletivos. Por outro lado, sabe-se que com os dados fiscais e bancários não é assim.

Isso posto, firmo entendimento no sentido de que os recursos próprios do candidato, quando em espécie, investidos em sua campanha, não se confundem com os bens estimáveis em dinheiro, não estando sujeito às limitações impostas pelo artigo 23. (Grifei.)

Por fim, e não menos importante, lembro os termos da Resolução TSE n. 23.376/2012, art. 49, de que erros formais e materiais corrigidos ou tidos como irrelevantes no conjunto da prestação de contas não ensejam a sua desaprovação e a aplicação de sanção. Diante disso, tenho que, as contas devem ser aprovadas com ressalvas, pois as falhas mostram-se superáveis após a análise sistêmica da contabilidade apresentada.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso interposto, para aprovar com ressalvas as contas de SIMONE VARGAS LUNKES relativas às eleições municipais de 2012, com base no art. 30, inc. I, da Lei n. 9.504/1997.