PC - 143882 - Sessão: 05/02/2015 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se da prestação de contas apresentada por JULIANA BRIZOLA, candidata ao cargo de deputado estadual pelo Partido Democrático Trabalhista - PDT, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2014.

Após análise técnica das peças entregues pela candidata, a Secretaria de Controle Interno e Auditoria - SCI deste TRE emitiu Parecer Técnico Conclusivo pela desaprovação das contas, fls. 439-443.

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pela desaprovação das contas eleitorais (fls. 470-475).

Em 10 de dezembro de 2014, data na qual o processo constava em pauta de julgamento, veio aos autos a petição de fl. 478, com documentos. Foi deferida a retirada do processo da pauta de julgamento, e determinada nova análise pela SCI, conforme despacho de fl. 477.

A SCI emitiu Segunda Análise da Manifestação (fls. 485-486), na qual manteve a posição pela desaprovação das contas da candidata.

Na sequência, o Ministério Público Eleitoral, em novo parecer (fls. 489-489v.) ratificou a opinião antes exarada, igualmente pela desaprovação.

Em 14 de janeiro de 2015, a prestadora requereu juntada de documentos (fls. 491-495).

É o relatório.

 

 

 

 

VOTO

A candidata Juliana Brizola apresentou sua prestação de contas relativa à arrecadação e ao dispêndio de valores durante a campanha ao pleito de 2014.

A Secretaria de Controle Interno e Auditoria deste Tribunal emitiu Parecer Técnico Conclusivo pela desaprovação da contabilidade, em razão da permanência das irregularidades apontadas nos itens 1.2 e 1.5 do Relatório Preliminar para Expedição de Diligências, a saber:

a) item 1.2: constatou-se dívidas declaradas na prestação de contas decorrentes do não pagamento de despesas contraídas na campanha, no montante de R$ 318.945,45 (fls. 364 a 375) e, diante do exposto, foi solicitado a anuência expressa dos credores, conforme dispõe o art. 30, §2º, alínea “b” Resolução TSE n. 23.406/2014 […];

b) item 1.5: verificou-se a devolução de cheques pela conta bancária específica para a movimentação financeira da campanha eleitoral (fls. 145/150) no valor total de R$ 156.954,99, os quais não foram pagos nem aparecem registrados na Conciliação Bancária.

A candidata manifestou-se relativamente ao Parecer Técnico Conclusivo juntando documentos, de maneira que sobreveio análise de tal manifestação, de parte da SCI (fls. 464-467), entendendo (fl. 467):

Por fim, não foi comprovada a assunção da dívida de campanha pela direção partidária no valor de R$ 8.970,00, assim como a anuência da assunção de dívidas pelos fornecedores, no valor total de R$ 327.915,45.

Houve pedido de retirada da pauta de julgamento, já referido, sobrevindo a segunda Análise da Manifestação da SCI, fls. 485-486 (grifos no original):

Do exame da documentação acima referida, constata-se que os documentos apresentados sanaram a falha apontada no item “B” do Relatório de Análise da Manifestação.

Em relação ao item “A”, permanece a falha apontada referente à ausência da anuência expressa dos credores, no montante de R$ 318.945,45 (fls. 364 a 375), conforme dispõe o art. 30, § 2°, alínea “b” da Resolução TSE n. 23.406/2014 e o art. 299 da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

Conclusão

Do total da dívida de campanha no valor de R$ 318.945,45, a prestadora apresentou a decisão do órgão nacional de direção partidária do PDT autorizando a assunção da dívida de campanha por parte do diretório estadual do PDT e o cronograma de pagamento e quitação dos credores (fls. 414/418) o qual não ultrapassa o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo, entretanto permanece a não apresentação da anuência dos credores, em desconformidade ao art. 30, §2°, alínea “b” da Resolução TSE n. 23.406/2012. A dívida de campanha (R$ 318.945,45) representa 55,82% do total de despesas contraídas pela prestadora no valor de R$ 571.353,35 (fl. 244).

À análise da questão.

Da necessidade de anuência expressa dos credores no caso do partido assumir as dívidas de campanha.

O tema é claramente regulado pelo art. 30 da Resolução n. 23.406/2014, o qual vai grifado nos trechos que mais importam:

Art. 30. Os candidatos, partidos políticos e comitês financeiros poderão arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

§ 1º Após o prazo fixado no caput, é permitida a arrecadação de recursos exclusivamente para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até o dia da eleição, as quais deverão estar integralmente quitadas até o prazo para entrega da prestação de contas à Justiça Eleitoral.

§ 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas poderão ser assumidos pelo partido político (Lei n. 9.504/97, art. 29, § 3º e Código Civil, art. 299):

a) por decisão do seu órgão nacional de direção partidária, com apresentação de cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo; e

b) com anuência expressa dos credores.

§ 3º No caso do disposto no parágrafo anterior, o órgão partidário da respectiva circunscrição eleitoral passará a responder por todas as dívidas solidariamente com o candidato, hipótese em que a existência do débito não poderá ser considerada como causa para a rejeição das contas (Lei n. 9.504/97, art. 29, § 4º).

O comando decorre do disposto do art. 299 do Código Civil:

Art. 299. É facultado a terceiro assumir a obrigação do devedor, com o consentimento expresso do credor, ficando exonerado o devedor primitivo, salvo se aquele, ao tempo da assunção, era insolvente e o credor o ignorava.

Parágrafo único. Qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para que consinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu silêncio como recusa.

Por seu turno, a prestadora apresentou, fundamentalmente, a seguinte justificativa por não ter recolhido a anuência dos credores:

A anuência expressa dos credores não foi apresentada em função de tratar-se de assunção de dívida do Tipo Cumulativa. A anuência requerida cuida apenas do incremento do polo passivo, onde agora, o partido responde solidariamente pelo débito.

Em que pese a exigência contida na Resolução nº 23.406/2014 do TSE, tal requisito não guarda amparo Legal, há vista que a Lei nº 9.504/97 não faz menção a tal obrigação.

Como sabemos a resolução é um ato normativo secundário e estaria limitado apenas como regulamento, ou seja, disciplinar o teor da Lei nº 9.504/97, nesse sentido o próprio texto da lei estabelece:

Art. 105 Até o dia 5 de março do ano da eleição, o Tribunal Superior Eleitoral, atendendo o caráter regulamentar e sem restringir direitos ou estabelecer sanções distintas das previstas nesta Lei, poderá expedir todas as instruções necessárias para sua fiel execução, ouvidos, previamente, em audiência pública, os delegados ou representantes dos partidos políticos. (Grifo nosso.)

Dessa forma, o contido na própria Resolução, art. 30, § 4º, I, II e III, obriga o Partido Político, que assume solidariamente, a obrigação de cumprir com o “organograma”, à efetivamente quitar os débitos, sob pena de não ver suas próprias contas (do partido) aprovadas. E, da mesma forma, o devedor primitivo não é liberado do vínculo obrigacional, hipótese em que o consentimento dos credores torna-se desnecessário.

Nesse sentido, os requisitos eleitorais e o princípio moralizador que norteia a Prestação de Contas está cumprido, restando apenas a relação civil, credor e devedor, que permanece.

Razões que não procedem, por dois motivos principais.

O primeiro, porque existente o amparo legal que a defesa entende inexistente – o art. 299 do Código Civil. Tratando-se de dívida que deve se moldar pela legislação civil, nada mais indicado que a resolução do TSE, normativo regulamentar, esteja em sintonia com as normas legais de regência.

O segundo, porque, ao repassar as dívidas para o partido, a candidata se valeu do art. 30 da Resolução TSE n. 23.406/2014, exatamente o dispositivo que questiona.

Não é razoável, portanto, a quem quer que seja, obter de qualquer norma apenas o que lhe beneficia, sem arcar com os ônus que em contrapartida são trazidos. Utilizar o caput do art. 30 e, quanto ao § 2°, "b", sustentar que a norma é secundária - e por isso não foi cumprida - é, no mínimo, contraditório.

Ou seja, se a prestadora quer obter a vantagem de repasse da dívida, deveria também arcar com a responsabilidade de obter a anuência dos credores – até porque ambas as situações estão regradas no mesmo comando normativo.

Superada a questão, saliento apenas que, além da desobediência da regra em si, que prejudica o correto exame das contas da candidata, o considerável valor envolvido – R$ 318.945,45 (trezentos e dezoito mil novecentos e quarenta e cinco reais com quarenta e cinco centavos) -, bem como a admissão de que a conduta ocorreu por opção deliberada, tornam ainda mais reprovável a falha.

Nessa linha, a jurisprudência:

Recurso. Prestação de contas. Eleições 2008. Desaprovação no juízo originário. Dívida de campanha não quitada.

Alegação, pelos recorrentes, de existência de assunção de dívida pela agremiação partidária por eles integrada, com novação das obrigações que deram origem ao débito.

O artigo 21, § 1º, da Resolução TSE n. 22.715/2008 – editada para regulamentar a prestação de contas nas eleições de 2008 - estabelece que as dívidas de campanha devem estar quitadas até a data da entrega da prestação de contas, vedada a assunção de dívida por terceiros, inclusive por partido político.

No caso concreto, ainda que prevalecesse a tese – esgrimida pelos recorrentes - de que a resolução não poderia derrogar dispositivos do Código Civil, verifica-se a inocorrência de assunção de dívida conforme disciplinada no artigo 299 do diploma cível, ante a ausência de provas de ajuste com todos os credores.

A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral admite a novação com assunção liberatória de dívida de campanha por partido político, desde que a documentação comprobatória de tal dívida seja consistente – aludindo, nesse passo, à anuência expressa de todos os credores à avença e desde que tal assunção seja autorizada pelo órgão nacional de direção do partido, exigência esta do § 3º do artigo 29 da Lei 9.504/97, prova esta não feita pelos recorrentes.

Inexistência, nos autos, dos documentos necessários à formação da convicção acerca da solidez do negócio jurídico.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 503, Acórdão de 03.08.2010, Relator: Dr. ÍCARO CARVALHO DE BEM OSÓRIO, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 03.8.2010.) (Grifei.)

 

Conclusão

A falha apontada afeta a regularidade das contas de Juliana Brizola. A transferência de dívidas no valor de R$ 318.945,45 ao Partido Democrático Trabalhista não obedeceu o procedimento correto, pois deveria ocorrer com a anuência dos credores.

O valor total das despesas contraídas pela prestadora é de R$ 571.353,35, de maneira que R$ 318.945,45 representam 55,82% (cinquenta e cinco vírgula oitenta e dois por cento) do total.  Quantitativa e qualitativamente consideráveis, portanto.

Finalmente, consigno que a documentação recentemente juntada pela prestadora de contas, nas fls. 491-495 - comprovantes da quitação da 1ª parcela do cronograma de pagamento das dívidas de campanha da Eleição 2014, nos dizeres da petição -, não dizem respeito diretamente às circunstâncias que ensejam a presente desaprovação, não tendo, portanto, o condão de modificar a convicção já edificada.

Diante do exposto, VOTO pela desaprovação das contas de JULIANA BRIZOLA relativas às eleições gerais de 2014, com base no art. 30, III, da Lei n. 9.504/97.