RE - 49908 - Sessão: 18/11/2014 às 14:00

RELATÓRIO

O Comitê Financeiro do Partido Social Democrático – PSD de Barra do Ribeiro protocolou, em 15.11.2012, a sua prestação de contas referente ao pleito daquele ano (fls. 02-26).

Emitido relatório preliminar, foi solicitado ao partido que informasse a conta bancária de campanha eleitoral, prestasse esclarecimento quanto à data correta de gestão da presidência do partido, bem como complementasse a documentação inicialmente acostada aos autos com recibos eleitorais e sanasse as divergências encontradas (fls. 27-29). Intimado, o interessado juntou documentos (fls. 36-63).

O Relatório Final de Exame concluiu pela persistência das falhas (fls. 64-65). Os autos foram com vista ao Ministério Público Eleitoral, o qual opinou pela desaprovação das contas (fl. 67-67v.). Sobreveio sentença, desaprovando as contas por entendê-las imprestáveis para o fim de permitir a fiscalização por parte da Justiça Eleitoral (fls. 69-70).

O Comitê Financeiro interpôs recurso, suscitando preliminar de cerceamento de defesa, por não lhe ter sido oportunizada vista dos autos para a manifestação acerca do Relatório Final de Exames, prevista em lei, e pleiteou a nulidade da decisão de piso (fls. 74-86). Acolhida a preliminar por esta Corte (fls. 120-122), os autos retornaram à Zona Eleitoral de origem para a concessão do prazo de lei, o qual, após a regular intimação do interessado mediante publicação no DEJERS (fl. 135), transcorreu in albis (fl. 136).

A parte foi a juízo requerer novo prazo para manifestação, arguindo a necessidade de intimação pessoal do responsável pelo Comitê Financeiro, em virtude de entender que o advogado constituído nos autos não teria poderes para receber a intimação, por se tratar de ato personalíssimo (fls. 138-142). O magistrado indeferiu o pedido (fl. 143).

Foram interpostos, sucessivamente, três agravos retidos reiterando a necessidade da intimação pessoal, os quais não foram recebidos por falta de previsão legal na seara eleitoral (fls. 152-154, 163-165 e 167-179).

Os autos foram em vista ao Ministério Público Eleitoral, o qual opinou pela desaprovação das contas (fls. 191-192).

A parte ingressou com o quarto agravo retido visando à obtenção de novo prazo. O magistrado da 151ª Zona Eleitoral entendeu manifesto o caráter meramente protelatório do manejo incessante de tais agravos e determinou o desentranhamento da última peça apresentada, bem como condenou os recorrentes ao pagamento de multa no valor de R$ 724,00 (setecentos e vinte e quatro reais) por litigância de má-fé (fls. 206-208).

Sobreveio sentença que desaprovou as contas, determinando a perda do direito ao recebimento das cotas do Fundo Partidário, pelo prazo de doze meses (fls. 213-214).

Inconformado, o Comitê Financeiro do PSD recorreu. Asseverou a existência de reformatio in pejus na decisão que o condenou à suspensão do repasse das cotas do Fundo Partidário e reiterou os termos dos agravos retidos, protestando pelo seu recebimento e arguindo ofensa ao devido processo legal, bem como ao princípio da ampla defesa e do contraditório. Aduziu não haver má-fé na reiterada interposição. No mérito, afirmou que as irregularidades constatadas não comprometem as contas (fls. 222-243).

Os autos foram com vista ao Ministério Público Eleitoral, o qual opinou pelo acolhimento apenas da preliminar de reformatio in pejus indireta e, no mérito, pelo não provimento do recurso (fls. 251-258v.).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

VOTO

Admissibilidade

O recorrente foi intimado da sentença em 05.05.2014 (fl. 216) e a peça recursal aportou em cartório na data de 07.05.2014 (fl. 222). Dentro, portanto, do prazo legal.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Do agravo retido e da litigância de má-fé

O recorrente interpôs, ao todo, cinco agravos retidos. Os quatro primeiros (fls. 152-154, 163-165, 167-79 e 196-200) não foram conhecidos por falta de previsão legal, sendo que quanto ao último deles o magistrado determinou o desentranhamento dos autos e condenou o recorrente às penas de litigância de má-fé, porquanto entendeu as sucessivas interposições como atos meramente protelatórios.

O comitê financeiro insistiu, interpondo o quinto agravo retido. No presente recurso, sobre este último, aduziu não ter conhecimento de que tenha sido julgado. Reiterou os seus termos na peça recursal e pleiteou o recebimento e conhecimento do referido agravo, requerendo a determinação da juntada da peça desentranhada e reconhecimento da ausência da litigância de má-fé, bem como o afastamento da multa aplicada, ou, sucessivamente, a redução do valor (fl. 224).

Com razão o magistrado de piso quando, ao receber o recurso, assim reiterou (fl. 244):

Conforme asseverado exaustivamente nos autos, nas decisões de fls. 157/158, 184/187 e 206/208, este Juízo entende que, s.m.j., não é cabível o manejo de agravo retido contra decisão interlocutória ou sem caráter definitivo no processo eleitoral, por ausência de previsão na legislação eleitoral. Com efeito, o Código Eleitoral prevê expressamente, no art. 279, a hipótese em que é cabível o agravo, qual seja, quando denegado recurso especial.

Dessa forma, na linha da firme jurisprudência do TRE/RS e TSE, eventuais inconformismos devem ser manifestados em recurso contra a decisão final do processo, inexistindo, assim, prejuízo à parte.

Efetivamente, é firme a jurisprudência quanto ao não cabimento do agravo retido contra decisão interlocutória na seara eleitoral. Vejam-se as decisões ilustrativas:

A jurisprudência, tanto do E. Tribunal Superior Eleitoral como desta Corte Regional, é pacífica no sentido do não cabimento de agravo contra decisão interlocutória proferida pelo juízo de primeira instância.

Trata-se, outrossim, de recurso cabível, apenas, nas hipóteses previstas pelo art. 279 do Código Eleitoral, que não contempla a hipótese ora em comento.Desta feita, faz-se imperioso o não conhecimento do agravo retido de fls.100/108, porquanto não satisfeito requisito intrínseco de admissibilidade.

(TRE/RJ RE N2 952-46.2012.6.19.0187 – Relator: Dr. FÁBIO UCHÔA MONTENEGRO – p. DJE-RJ em 06 de novembro de 2013.)

 

O agravo retido não possui abrigo no processo eleitoral, tendo em vista o princípio da concentração dos atos processuais, devendo as irresignações referentes à produção probatória ser manifestadas no recurso interposto após a sentença. Agravos retidos não conhecidos.

(TRE/RN RE 6843/2006 - Relator: Juiz Federal MANUEL MAIA - p. DJE 27.06.2007.)

A inesgotável insistência do recorrente em insurgir-se por via inúmeras vezes rechaçada pelo magistrado, sob o fundamento de ser incabível na seara eleitoral, bem enseja a interpretação do julgador de origem quanto ao intento protelatório das proposituras. Se a parte, por três vezes consecutivas, obteve pronunciamento judicial de que a via era inadequada, a quarta e a quinta interposições não podem gerar outro entendimento senão o adotado, pois mesmo a mera teimosia já teria cedido à conformidade, e a parte teria buscado outro caminho que não aquele de antemão sabidamente fechado.

Por todo o exposto, não recebo o agravo retido e mantenho a decisão referente à litigância de má-fé, nos exatos termos definidos pelo Juiz Eleitoral da 151ª Zona, na decisão de fls. 206-208.

O não conhecimento do agravo retido não obsta, contudo, que as razões desfiadas naquelas peças sejam analisadas, porquanto submetidas a apreço, pela via adequada, quando da reiteração dos termos na peça recursal ora sob apreciação. Assim, passo ao enfrentamento da celeuma estabelecida em virtude de intimação não pessoal do ora recorrente para saneamento das contas.

Da ofensa aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal

Alegou o recorrente que a intimação para a regularização das contas, porquanto não efetuada pessoalmente, afronta os princípios do contraditório e da ampla defesa, bem como fere o princípio do devido processo legal.

Sem razão o recorrente.

Com efeito, a intimação para a regularização das contas não foi realizada pessoalmente, mas mediante a nota de expediente n. 001/2014, publicada no Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral do Rio Grande do Sul – DEJERS, na data de 20.02.2014 (fl. 135). O prazo então concedido ao partido transcorreu in albis.

Entretanto, verifico que a parte, em 20.12.2012, acostou aos autos procuração na qual constituiu o Bel. Fábio Luis Correa dos Santos seu procurador, e, ainda que despiciendo, gizo, atribuiu-lhe os mais amplos poderes – dentre outros, os contidos na cláusula ad judicia et extra, assim como os poderes especiais para substabelecer, transigir, desistir, receber e dar quitação (fl. 83).

Ainda que a parte tenha deixado transcorrer in albis o prazo para sanar as irregularidades apontadas nas suas contas, tal situação não decorreu de qualquer ofensa ao princípio do contraditório ou da ampla defesa, tampouco de ferimento ao devido processo legal. Consoante visto acima, havia advogado constituído nos autos com anterioridade de 14 (quatorze) meses à data da publicação da nota de expediente contestada, razão pela qual a intimação, nos moldes como foi procedida, não encerra qualquer dos vícios apontados em preliminar, de modo que a afasto.

Da suspensão do feito

O recorrente pleiteou a suspensão do feito para julgamento conjunto com a prestação de contas n. 462-78, do prefeito eleito de Barra do Ribeiro, Luciano Guimarães Machado Boneberg. Fundamentou o pedido no fato de que houve confusão entre as contas do alcaide e da grei, afirmando que os equívocos, por serem os mesmos em um e outro processo, gerariam dependência e deveriam ser analisados concomitantemente (fl. 229).

Assim como o magistrado de origem e o Ministério Público Eleitoral, tenho que o pedido não deve ser acolhido.

As demonstrações necessárias devem ser feitas individualmente, de tal sorte que se possa visualizar em cada um dos feitos, de forma clara, os valores arrecadados e os gastos efetuados, a fim de que seja viabilizada a fiscalização dos recursos a que se destina a prestação das contas.

Se, para a adequada análise das contas do recorrente, for necessária a apreciação de contas diversas, isso só pode significar que a prestação em foco não foi elaborada em consonância com a exigência legal e peca quanto ao quesito essencial da transparência, o qual deve ser solvido dentro do próprio processo e não mediante expediente estranho aos autos.

Ademais, o recurso da prestação de contas do prefeito, cuja relatoria incumbiu ao Dr. Ingo Wolfgang Sarlet, já foi apreciado nesta Corte na data de 01.04.2014, razão pela qual o pleito perdeu o objeto.

Pelo exposto, rejeito o pedido.

Da reformatio in pejus indireta

O recorrente sustentou que a sentença combatida (flS. 213-215v.) contemplou reformatio in pejus indireta, tendo em vista que determinou a suspensão do recebimento das cotas do Fundo Partidário, agravando sua situação em relação ao anteriormente disposto na sentença anulada (fls. 69-70), a qual apenas desaprovou as suas contas, sem nada mais estipular.

Razão não lhe assiste.

O princípio da ne reformatio in pejus veda que decisão superveniente agrave a situação daquele que manejou o recurso, tendo por parâmetro o que foi anteriormente fixado na decisão recorrida. Há, assim, o pressuposto de uma situação consolidada que só admite alteração se for em benefício daquele que, inconformado, combateu a decisão.

Ocorre, nos autos, que inexiste relação de agravamento entre uma decisão e outra, porquanto a primeira sentença, por força da nulidade decretada por esta Corte, deixou de existir. Trata-se aqui não de duas decisões subsequentes,  a segunda agravando a primeira, mas de única sentença – como é só possível –, a segunda proferida, por determinação superior, para ocupar o lugar daquela declarada nula.

Nesse sentido, é a jurisprudência (grifos meus):

O acórdão recorrido determinou a nulidade de todos os atos processuais praticados durante a investigação judicial eleitoral em tela, a partir do momento em que/foi negada a produção de provas defesa do réu. sentença prolatada naquele processo. Não cabe falar, portanto, em possível reformatio in pejus, pois não haverá reforma de sentença alguma – o que ocorrerá será o proferimento de nova sentença, face à nulidade da primeira. Nesse sentido, é irretocável a manifestação exarada no acórdão que rejeitou os embargos de declaração.

(TSE – AgReg Respe n. 19854 – Relator: Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS – p. DJ de 29.08.2013.)

 

RECURSO – REPRESENTAÇÃO – PROPAGANDA – ELEITORAL EXTEMPORÂNEA – MENSAGENS DIVULGADAS EM MUROS DE PROPRIEDADES PRIVADAS COM MENÇÃO AO NOME DE CANDIDATO, AO ANO ELEITORAL E ÀS EXPRESSÕES ´AGORA É DIFERENTE, NESTE EU ACREDITO – CARACTERIZAÇÃO DE PROPAGANDA ELEITORAL EM PERÍODO VEDADO – ALEGAÇÃO DE NULIDADE DE SENTENÇA – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO NON REFORMATIO IN PEJUS – NÃO CONFIGURAÇÃO - SENTENÇA ANTERIOR QUE APLICOU O § 1º DO ART. 37 DA LEI 9.504/97, QUANDO SERIA O CASO DE APLICAÇÃO DO § 3º, DO ART. 36 DA MESMA LEI - SENTENÇA ANTERIOR ANULADA – NOVA SENTENÇA QUE APLICOU O DISPOSITIVO LEGAL CORRETO – POSSIBILIDADE – RECURSO A QUE SE NEGA, POR MAIORIA DE VOTOS.

(TSE – REspe – n. 25229 – Relator: Ministro EROS ROBERTO GRAU. p. DJ de 29.08.2008.)

Por conseguinte, como não há falar em contemplação da reformatio in pejus na sentença esgrimida, não subsiste razão para o acolhimento da preliminar arguida.

Destaco as preliminares.

Mérito

As irregularidades apontadas no relatório preliminar (fls. 27-29) foram apenas parcialmente esclarecidas pelo Comitê Financeiro (fls. 34-63).

Remanesceram as seguintes falhas apontadas no parecer conclusivo (fls. 64-65) e a respeito das quais sequer, intempestivamente, vieram aos autos documentos que as buscassem sanar:

1. as notas fiscais ns. 5876 e 5877 foram emitidas em nome dos candidatos aos cargos de prefeito e vice-prefeito (fls. 62-63), mas são referentes a despesas do comitê financeiro;

2. as notas fiscais ns. 5876 e 5877 também apresentam equívoco contábil, posto que foram lançadas como perfazendo o montante de R$ 2.400,00 (dois mil e quatrocentos reais), o qual é divergente do valor total correto, que seria de R$ 3.600,00 (três mil e seiscentos reais), restando a diferença de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais) sem declaração nas contas;

3. não foram gerados os documentos fiscais (notas fiscais) pertinentes às declarações de doação constantes das fls. 60-61, as quais correspondem ao exato valor da diferença de lançamento encontrado – R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais);

4. a diferença financeira acima apontada não transitou na conta corrente específica, visto que as doações foram efetuadas mediante a quitação de despesas diretamente pelos doadores.

Como é sabido, a prestação de contas dos partidos e candidatos em campanha eleitoral está submetida ao princípio da transparência, vale dizer, ao princípio da publicidade, de matiz constitucional. Na hipótese de haver dúvidas quanto à contabilização da movimentação financeira, bem como das receitas e despesas, a desaprovação pelo ferimento ao referido princípio é medida que se impõe. Entretanto, eventuais equívocos contábeis que não turvem a visão clara das contas podem ser relevados para o fim de ensejar não a desaprovação das contas, mas a aprovação com ressalvas.

Quanto ao apontado no item 1 – emissão das notas fiscais de ns. 5876 e 5877 em nome equivocado dos candidatos a prefeito e vice-prefeito, ao invés do nome do PSD de Barra do Ribeiro –, tenho que se trata de irregularidade que não compromete a transparência das contas, haja vista que os documentos em foco, a despeito do equívoco, foram desentranhados das contas dos candidatos (consoante informado pelo órgão técnico na fl. 65) e acostados a estes autos com a finalidade de compor o processo correto.

Das irregularidades apontadas nos itens 2 a 4, o que se extrai é que todas derivam de uma mesma situação fática, qual seja, dos pagamentos efetuados diretamente à empresa Silk Master Visual Ltda., pelos doadores Juliana da Silva Bauer Fontana e Silvana da Costa Abreu, a fim de saldar parte da despesa do partido com material de propaganda (duas placas em polionda), sem a emissão de notas fiscais aos doadores. Com isso, não houve o lançamento contábil adequado do valor total das placas, que é de R$ 3.600,00 (três mil e seiscentos reais), mas sim da parcela paga pela grei partidária, correspondente a R$ 2.400,00 (dois mil e quatrocentos reais), sem a consideração do valor doado – que somou R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais). Além disso, a quitação de parte do montante pelos doadores, porque diretamente efetuada, não transitou pela conta específica.

Todos os itens apontados constituem irregularidades. Entretanto, ainda que efetivamente presentes,  não chegam a comprometer as contas, porquanto dificultam mas não impedem a apuração da origem e do destino dos recursos financeiros, restando possível resgatar dos equívocos as operações efetuadas.

Dispositivo

Ante o exposto, afastadas as preliminares de mérito, VOTO pelo parcial provimento do recurso interposto, para aprovar com ressalvas as contas do Partido Social Democrático – PSD de Barra do Ribeiro relativas às eleições de 2012, nos termos do art. 51, inc. II, da Resolução TSE n. 23.376/2012, e mantenho a multa aplicada por litigância de má-fé, nos exatos termos da decisão de origem.