RE - 20462 - Sessão: 18/11/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pela COLIGAÇÃO AGORA É HORA, TODOS POR TAQUARI, EMANUEL HASSEN DE JESUS e ANDRÉ LUÍS BARCELLOS BRITO contra decisão do Juízo da 56ª Zona Eleitoral de Taquari que julgou parcialmente procedente a representação movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, condenando-os, individualmente, ao pagamento de multa no valor de R$ 4.000,00, observada a solidariedade entre a coligação e seus candidatos, em virtude de terem espalhado santinhos em vias públicas, nas proximidades de seções eleitorais do Município de Taquari, após as 22h do dia 06.10.2012, véspera das eleições, com fundamento nos arts. 6º, § 1º, 37, § 1º e 39, § 9º, todos da Lei n. 9.504/97 (fls. 50-52).

Os recorrentes suscitam, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva ad causam. No mérito, buscam a improcedência da representação, sustentando que inexiste prova da autoria da infração e da data em que distribuído o material de campanha, além de os registros fotográficos acostados aos autos não se encontrarem acompanhados das respectivas mídias digitais. Subsidiariamente, requerem a redução da multa para o mínimo legal cominado no § 1º do art. 37 da Lei n. 9.504/97 (fls. 59-65).

Com contrarrazões (fls. 75-77v.), os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 80-80v.).

É o relatório.

 

 

VOTOS

Dr. Hamilton Langaro Dipp:

Admissibilidade recursal

O mandado de intimação da coligação foi juntado aos autos em 02.07.2014, quarta-feira (fl. 52v.), e os mandados dos demais recorrentes, em 03.07.2014, quinta-feira (fl. 56v.).

No dia 04.07.2014, sexta-feira, foi feriado municipal em Taquari, conforme certificado na fl. 67 dos autos.

Logo, o recurso protocolizado no dia 07.07.2014, segunda-feira (fl. 59), é tempestivo, pois interposto no prazo de 24 horas estabelecido no art. 96, § 8º, da Lei n. 9.504/97, exceto relativamente à coligação, cujo prazo recursal se encerrou em 03.07.2014, quinta-feira.

Entretanto, como existe responsabilidade solidária entre a coligação e os seus candidatos no tocante à veiculação da propaganda irregular, imposta pelo art. 241 do Código Eleitoral, o recurso também aproveita à coligação recorrente por força do disposto no art. 509 do Código de Processo Civil, a seguir transcrito:

Art. 509. O recurso interposto por um dos litisconsortes a todos aproveita, salvo se distintos ou opostos os seus interesses.

Parágrafo único. Havendo solidariedade passiva, o recurso interposto por um devedor aproveitará aos outros, quando as defesas opostas ao credor lhes forem comuns.

Assim, conheço do recurso, estendendo seus efeitos à coligação.

Passo ao exame da matéria preliminar.

Preliminar de ilegitimidade passiva ad causam

Os recorrentes alegam ser partes passivas ilegítimas para a causa, sob o argumento de que nenhum dos santinhos apreendidos lhes pertence, sendo todos do candidato a vereador, Capiva.

Todavia, o primeiro panfleto acostado na fl. 06 contém, exclusivamente, propaganda da candidatura dos recorrentes aos cargos de prefeito e vice-prefeito, sendo que, nos outros três santinhos, juntados nas fls. 06-07, a propaganda da chapa majoritária aparece em conjunto com a do candidato Capiva.

Portanto, os santinhos apreendidos pertencem aos recorrentes, ainda que, em alguns deles, a propaganda da sua candidatura tenha sido compartilhada com a do candidato Capiva. Além disso, os panfletos foram encontrados nas vias públicas municipais, conforme os registros fotográficos acostados aos autos, notadamente os de fls. 11-12, em que podem ser vistos de forma clara e nítida.

Por essas razões, afasto a preliminar, visto que os candidatos recorrentes possuem legitimidade para integrar o polo passivo da demanda.

Mérito

No mérito, o Ministério Público Eleitoral propôs a presente representação em face dos recorrentes porque os mesmos espalharam material gráfico (santinhos/colinhas) em vias públicas, nas proximidades de seções eleitorais do Município de Taquari, após as 22h do dia 06.10.2012, véspera das eleições municipais.

A ação foi julgada procedente, com fundamento nos arts. 6º, § 1º, e 39, § 9º, da Lei n. 9.504/97, aplicando-se, aos recorrentes, a multa cominada no art. 37, § 1º, da mesma lei, em valor correspondente a R$ 4.000,00, devido ao descumprimento da medida liminar que lhes havia determinado a retirada da propaganda até as 23h do dia 07.10.2012, dia das eleições.

A decisão, contudo, merece ser parcialmente reformada.

Inicialmente, observo que o material apreendido (fls. 06-07) divulga a candidatura dos recorrentes ao pleito majoritário municipal, sendo, por consequência, de sua responsabilidade para fins eleitorais, inclusive da coligação, que é solidariamente responsável pela irregularidade da propaganda, nos termos do art. 241 do Código Eleitoral.

As fotografias que instruem a exordial (fls. 10-22), fruto de diligências da promotoria eleitoral, mostram as ruas cobertas de farto material de propaganda, dentre o qual os panfletos contendo publicidade dos recorrentes aos cargos de prefeito e vice-prefeito.

Além disso, as imagens contêm registros de data e hora, os quais confirmam que as vias públicas foram fotografadas no dia 07.10.2012, pelas partes da manhã e tarde, tornando desnecessária a instrução da inicial com os respectivos arquivos digitais.

A certidão e fotografias de fls. 38-46, trazidas aos autos pelo Ministério Público Eleitoral, evidenciam que, na manhã do dia 08.10.2014, havia panfletos dos recorrentes espalhados nas vias municipais próximas a seções eleitorais, constituindo prova suficiente do descumprimento do provimento liminar de fl. 23, em que ordenado o recolhimento do material até as 23h do dia das eleições.

Logo, as provas constantes dos autos comprovam a ofensa à norma do art. 39, § 9º, da Lei n. 9.504/97, a qual proíbe a distribuição de material gráfico após as 22h do dia que antecede o pleito:

Art. 39 [...]

§ 9o Até as vinte e duas horas do dia que antecede a eleição, serão permitidos distribuição de material gráfico, caminhada, carreata, passeata ou carro de som que transite pela cidade divulgando jingles ou mensagens de candidatos. (Grifei.)

Noto que, embora o art. 39, § 5º, inc. III, da Lei Eleitoral estabeleça ser crime a divulgação de qualquer espécie de propaganda de partidos políticos ou de seus candidatos (crime de boca de urna), essa conduta deve ser apurada em procedimento próprio, de natureza criminal, sendo inaplicável ao caso sob análise.

Já na esfera administrativa, esta Corte possui julgados divergentes a respeito da matéria, uns reconhecendo a adequação da multa do art. 37, § 1º, da Lei n. 9.504/97 (RE 606-49, Rel. Dr. Sílvio Ronaldo, julg. em 23.05.2013 e RE 608-19, Rel. Des. Marco Aurélio Heinz, julg. em 12.02.2014) e outros negando a incidência do dispositivo referido (RE 607-34, Rel. Desa. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère, julg. em 16.07.2013).

Refletindo sobre o caso, tenho que efetivamente não existe cominação legal de multa para a hipótese de descumprimento da normativa em tela.

Ainda que demonstrada a efetiva distribuição do material após as 22 horas do dia anterior ao pleito, é inviável a aplicação, por analogia, da multa prevista no art. 37, § 1º, da Lei das Eleições, uma vez que, em se tratando de norma restritiva de direito, deve ser interpretada restritivamente, como já reconhecido por esta Corte no seguinte precedente:

Recursos. Propaganda eleitoral irregular. Distribuição de "santinhos". Incidência do art. 39, § 9º, da Lei n. 9.504/1997. Eleições 2012. Procedência da representação no juízo originário. Aplicação de multa. Impossibilidade da concessão de efeito suspensivo aos recursos eleitorais, em face do art. 257, do Código Eleitoral. Pretensão afastada. Veiculação de propaganda por meio da distribuição de "santinhos" dos candidatos recorrentes, em vários locais de votação no dia da eleição. Evidente irregularidade. Demonstrada a autoria e a efetiva distribuição do material, após às 22 horas do dia que antecede à eleição. Inaplicabilidade de sanção pecuniária em razão da falta de previsão legal. Inviável, da mesma forma, o uso, por analogia, da multa prevista no art. 37, § 1º, da Lei das Eleições, pois norma restritiva de direito deve ser interpretada restritivamente. Não conhecimento do recurso de um dos candidatos, por intempestivo. Candidato, entretanto, beneficiado pelos efeitos do provimento dos demais apelos, com fulcro na regra prevista no art. 580 do Código de Processo Penal. Aplicação de ofício. Reforma da sentença para afastar a sanção pecuniária. Provimento dos demais apelos.

(TRE-RS - RE: 60734 RS, Relator: MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, Data de Julgamento: 16.07.2013, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 130, Data 18.07.2013, Página 3.) (Grifei.)

Assim, a “distribuição de material gráfico” após as 22h do dia anterior ao pleito, vedada pelo artigo 39, § 9º, da Lei n. 9.504/97, não se confunde com a realização de propaganda em bens públicos, conduta à qual é dirigida a multa prevista no art. 37, § 1º, da Lei n. 9.504/97. Vale dizer, não obstante a conduta de espalhar material de propaganda em áreas circunvizinhas a seções eleitorais após as 22h da véspera da eleição configure ilícito eleitoral e, por esse motivo, deva ser coibida pelo exercício do poder de polícia conferido aos juízes eleitorais, ela não pode ser sancionada por meio da aplicação da multa do art. 37, § 1º, devido à ausência de adequação típica.

Refiro, por oportuno, que o Tribunal Superior Eleitoral tem refutado a aplicação analógica da multa prevista no § 1º do art. 37 da Lei n. 9.504/97 à hipótese de veiculação de propaganda em bens particulares sem consentimento do proprietário, vedada no § 8º daquele mesmo dispositivo, para a qual a legislação eleitoral não comina sanção pecuniária, a exemplo do que ocorre com o § 9º do art. 39 dessa mesma lei, que silencia quanto ao sancionamento da infração nele descrita.

A título exemplificativo, cito o RESPE n. 12735 (decisão monocrática de 03.02.2014, relator Min. João Otávio de Noronha, DJE de 18.02.2014), o RESPE n. 714672 (decisão monocrática de 07.08.2012, relator Min. Arnaldo Versiani Leite Soares, DJE de 13.08.2012) e o RESPE n. 27.798 (relator Min. Felix Fischer, DJE de 07.08.2009).

Por essas razões, acolho parcialmente a pretensão recursal, para afastar a penalidade de multa imposta aos recorrentes em decorrência da violação ao art. 39, § 9º, da Lei n. 9.504/97, por inexistência de cominação legal específica.

Diante do exposto, afasto a preliminar de ilegitimidade passiva e, no mérito, VOTO pelo provimento parcial do recurso, para o fim de afastar a pena de multa imposta aos recorrentes na sentença, nos termos da fundamentação.