RP - 177134 - Sessão: 03/10/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de representação com pedido de direito de resposta ajuizada por TARSO FERNANDO HERZ GENRO e UNIDADE POPULAR PELO RIO GRANDE contra a COLIGAÇÃO ESPERANÇA QUE UNE O RIO GRANDE, ANA AMÉLIA DE LEMOS e JORGE ANTÔNIO DORNELLES CARPES, em razão de alegadas ofensas que teriam sido proferidas contra os representantes no horário eleitoral gratuito de rádio do dia 29.9.2014, às 12h.

Argumentam que os representados agrediram a honra e a imagem do Partido dos Trabalhadores e, de forma indireta, a do candidato Tarso Genro. Pedem a concessão do direito de resposta.

Notificados, os representados apresentaram defesa (fls. 25-34), suscitando a inépcia da inicial, porque veio desacompanhada das mídias e cópia da sua degravação. No mérito, argumentam que não proferiram qualquer ofensa ao candidato Tarso. Mencionam que a referência à destruição de reputação é fato notório, divulgado na imprensa, havendo inclusive um livro a respeito do tema. Argumentam que são feitas apenas criticas contundentes aos adversários, tendo por base fatos de conhecimento público. Requerem a improcedência da representação.

Foram encaminhadas cópias dos autos à Procuradoria Regional Eleitoral.

O procurador regional eleitoral ofertou parecer oral no sentido da procedência da representação.

É o relatório.

VOTOS

Desa. Liselena Schifino Robles Ribeiro:

Preliminarmente, cumpre anotar que a representação com pedido de direito de resposta está sendo trazida diretamente a Plenário, com fundamento no que dispõe o artigo 17, § 5º, da Resolução 23.398/2013, segundo o qual “o Relator, sempre que entender pertinente, poderá levar o feito diretamente ao Plenário, para julgamento, independentemente de decisão prévia, facultando aos procuradores das partes oportunidade de sustentação oral”.

Tendo em vista a proximidade do pleito e a inviabilidade de o caso ser apreciado em plenário antes do dia das eleições, caso fosse seguido o rito ordinariamente previsto na resolução acima citada, fica evidenciada a pertinência de trazer o feito diretamente ao Pleno desta Corte.

Ainda em matéria preliminar, os representados suscitam a inépcia da inicial, pois foram notificados sem cópia da mídia e da degravação do programa. Não prospera a irresignação. A notificação para resposta é feita mediante envio de fax, conforme estabelece a própria Resolução n. 23.398/2013, meio incompatível com o envio de mídias de áudio. Ademais, a mídia esteve à disposição da parte em Secretaria.

Diga-se, ainda, que a degravação foi feita no próprio corpo da petição inicial, de forma que os representados tiveram amplo conhecimento da propaganda impugnada, circunstância evidenciada pela sua defesa, a qual rebateu todos os argumentos tecidos na inicial, não sofrendo qualquer prejuízo.

No mérito, resta incontroverso que os representados, no horário eleitoral gratuito de rádio do dia 29.09.2014, no bloco das 12h. levaram ao ar propaganda com o seguinte conteúdo - nos dizeres dos representantes, ofensivos à sua honra e imagem.

Conheço muito bem a Ana Amélia e tenho orgulho de ser seu vice. E também conheço o jeito do PT de destruir reputações. Hoje é com Ana Amélia, depois pode ser comigo, com você, alguém da sua família ou até a sua empresa. Estão acostumados a fazer isso. Com eles não há limites. Tentam acabar com os bons políticos. Vão eliminando pouco a pouco aqueles que têm a coragem de fiscalizá-los e enfrentá-los. Ou seja, afastam os bons e ficam os maus. Essa é a velha prática dos nossos adversários, rasteira, covarde e manipuladora. Esse é o tipo e o jeito do fazer política de quem quer governar nosso Estado por mais quatro anos. Chega de PT. Só a Ana Amélia pode vencer Tarso e tira o PT do governo. Pense bem nisso. No dia 05 de outubro, vamos votar numa pessoa séria, trabalhadora, decente, vamos votar na Ana Amélia. É a reta final da campanha. É a esperança que nos move até a vitória.

Adiante, em outra passagem, a propaganda refere que “não é a intriga e o uso criminoso da rede social que vai me intimidar ou que vai mudar a disposição dos gaúchos e das gaúchas em votar nesta candidata”

Inicialmente, deve ser afastada a alegação de que houve ofensa à pessoa do governador Tarso Genro. A propaganda, nos trechos destacados como ofensivos pelos próprios representantes, não faz qualquer menção ao nome do candidato ao governo, referindo-se apenas ao Partido dos Trabalhadores e à forma com que se comporta na campanha. A conclusão de que as ofensas atingem também a pessoa do governador somente é possível a partir de ilações feitas pelos representantes, não sendo identificadas na propaganda impugnada.

Assim, a propaganda, ao criticar o comportamento de seus adversários na campanha refere-se exclusivamente ao Partido dos Trabalhadores, fazendo apenas uma pequena alusão ao candidato Tarso, para dizer que o PT continuará no poder se seu candidato foi reeleito. O candidato ao cargo de vice governador afirma conhecer “o jeito do PT de destruir reputações. Hoje é com Ana Amélia, depois pode ser comigo, com você, alguém da sua família ou até sua empresa. Estão acostumados a fazer isso”. Na sequência, afirma ainda que “com eles não há limites, tentam acabar com os bons políticos, vão eliminando pouco a pouco aqueles que têm a coragem de fiscalizá-los e enfrentá-los. Ou seja, afastam os bons e ficam os maus”. “Essa é a velha prática dos nossos adversários: rasteira, covarde e manipuladora”.

É pacífico o entendimento de que, em meio à campanha política, os confrontos de ideias pela escolha de um programa ou de um determinado governante assumem feições acirradas e, por vezes, ofensivas. Nesse sentido, cite-se a doutrina de José Jairo Gomes:

Dada a natureza de suas atividades, o código moral seguido pelo político certamente não se identifica com o da pessoa comum em sua faina diuturna. Tanto é que os direitos à privacidade, ao segredo e à intimidade sofrem acentuada redução em sua tela protetiva. Afirmações e apreciações desairosas, que, na vida privada, poderiam ofender a esse matiz quando empregadas no debate político-eleitoral. Assim, não são de estranhar assertivas apimentadas, críticas contundentes, denúncias constrangedoras, cobranças e questionamentos agudos. Tudo isso insere-se na dialética democrática (Direito Eleitoral, 8ª ed., 2012, p. 412.)

A doutrina é seguida pela jurisprudência, como se extrai da seguinte ementa:

I - Expressão que, no trato comum, constitui injúria perde substância quando se leva em conta o ambiente da campanha política, em que ao candidato incumbe potencializar, em seu proveito, as mazelas do adversário.

II - Mesmo que se considere montagem a exibição de imagens, não há nela aquele potencial degradante ou ridicularizante que a tornaria ilícita.

(TSE, REPRESENTAÇÃO nº 496, Acórdão nº 496 de 25.09.2002, Relator(a) Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 25.09.2002 RJTSE - Revista de Jurisprudência do TSE, Volume 14, Tomo 4, Página 40.)

Na hipótese, não se pode negar que os termos empregados na propaganda foram bastante contundentes, no mais das vezes dirigido à agremiação, e fazendo alusão a um suposto histórico de ofensas à reputação de adversários políticos divulgados na imprensa, embora não pontue a que fatos especificamente se refere. Nada obstante, as afirmações feitas na propaganda devem ser interpretadas de acordo com o contexto público e notório da campanha política travada no Estado, especialmente entre os dois candidatos.

Os representantes têm usado em sua propaganda eleitoral fatos a respeito da candidata representada, seguidos de indagações a respeito de sua boa-fé ou lisura de seu comportamento. Esta Corte, em diferentes situações, negou direito de resposta à representada, mas reconhecendo que a propaganda eleitoral dos representantes empregara também termos ácidos e contundentes, os quais se encontravam, entretanto, dentro dos limites do debate político.

As assertivas de que o Partido dos Trabalhadores “destrói reputações”, “afastam os bons e ficam os maus”, “velha prática dos nossos adversários: rasteira, covarde e manipuladora” devem ser apreciadas dentro desse contexto, em que a propaganda eleitoral dos representantes indagava a respeito da postura adequada da candidata representada. Com isso, não se vê uma ofensa gratuita aos seus adversários – o que poderia levar a caracterizar de forma mais evidente ofensas à imagem da agremiação –, mas uma resposta ácida e contundente à postura adotada pelos representantes durante a campanha eleitoral.

A jurisprudência tem admitido o emprego de termos distorcidos ou de mau gosto na propaganda eleitoral, como se verifica pelas seguintes passagens, extraídas de decisões judiciais: o desabamento que atingiu a Favela Nova República foi criminoso e assassino ou a tragédia poderia ter sido evitada se a administração do PT fosse competente não ensejam direito de resposta (Res./TSE 15.811, Rel. Min. Vilas Boas, DJ 5.2.90); As assertivas do tipo o PT administra com raiva, com ódio, procurando antes criar agitação do que resolver os problemas dos sem-terra ou com esse objetivo político ideológico não ensejam direito de resposta (Res./TSE n2 14.472, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 25.8.94); Chamar alguém de desleal no calor de uma disputa eleitoral não revela qualquer atitude que justifique direito de resposta […]. No que diz respeito às palavras que imediatamente seguem esta declaração (nessa campanha ele utilizou pequenos partidos para agredir, para infamar, para difamar) também não verifico um fundamento hábil para sustentar o presente direito de resposta (TRE/PR, Direito de Resposta 1041, Rel. Dr. Marcelo Malucelli, julg. em 22.10.2002); eles sabiam se humilhar muito bem em inglês na frente dos poderosos. ou gostavam de vender sem o menor pudor o patrimônio público. (TSE, Rp 342, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, DJ 03.12.2002).

Ainda há outra circunstância que desautoriza o direito de resposta. A propaganda eleitoral gratuita no rádio e televisão encerrou-se na data de ontem, 02.10.2014, e eventual concessão da medida pleiteada deverá ser transmitida dentro das 48 horas anteriores ao pleito, como faculta o art. 58, § 4º, da Lei n. 9.504/97. Com o deferimento do direito, os representantes ocupariam espaço exclusivo, em rede, nas rádios do Estado, obtendo, com isso, uma expressiva exposição perante o eleitorado, sabendo-se que o período imediatamente anterior à eleição é o mais sensível para o convencimento de grande parte dos eleitores e que a mera concessão de direito de resposta já causa um significativo impacto no público.

Tendo em vista esses elementos, tenho que o tom agressivo e pejorativo empregado na propaganda impugnada, considerando o contexto da eleição, não se mostra de extrema gravidade, a ponto de justificar que os representantes ocupem, com exclusividade, tempo nas rádios para responder às afirmações tecidas pelos representados. Deve-se ter presente que o tempo da resposta é devolvido, não imposto como pena; é restitutio in integrum e não poena (TRE/SC, REC nº 1304, Relator Márcio Vicari, Data 24.10.2008); assim, entendo que eventual concessão de direito de reposta não teria o efeito de simplesmente devolver o tempo para resposta, mas conferir verdadeira vantagem aos representantes, frente, não só aos representados, mas aos demais candidatos em disputa.

Essa mesma preocupação já sensibilizou esta Corte, no julgamento do Processo classe 17, n. 42006, de relatoria do Dr. Almir Porto da Rocha Filho, o qual entendeu desarrazoado conferir direito de resposta pelo prazo de 1 minuto, tempo mínimo para a divulgação da resposta, em razão de uma pequena ofensa. Transcrevo a ementa do julgado:

Recurso. Representação. Horário eleitoral gratuito de televisão. Afirmações ofensivas ao Partido dos Trabalhadores, associando-o ao termo “bandidagem”.

Preliminar rejeitada.

Alegações increpadas de ofensivas contidas dentro do espírito de crítica, não configurando calúnia, difamação, injúria ou inverdade patente.

Aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Provimento. (julg. em 19.9.2006)

Infelizmente, ao que parece, os candidatos estão esquecendo seus projetos de governo e suas ideologias para questionar unicamente a postura de seus adversários políticos. Este Tribunal, com acerto, tem assegurado a liberdade dos candidatos na elaboração de sua campanha e na escolha dos temas a serem trazidos para o debate eleitoral. Esta postura, entretanto, poderá ser revista no decorrer do segundo turno das eleições se os candidatos não souberem fazer uso dessa liberdade em prol da construção de ideias e projetos políticos.

Com estas considerações, VOTO pela improcedência da representação.

 

Dr. Hamilton Langaro Dipp:

Acompanho.

 

Dr. Luis Felipe Paim Fernandes:

Com a relatora.

 

Dr. Ingo Wolfgang Sarlet:

Faço uma retificação. Na verdade o art. 58 não fala em fatos, fala em conceito ou afirmação injuriosa ou inverídica. Concordo com a preocupação externada da tribuna com o nível da campanha que está desbordando para um nível preocupante das manifestações.

 Acompanho o voto da relatora para manter a  isonomia entre as condições do embate entre os candidatos.

 

Des. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère:

Acompanho a relatora.

 

Dr. Leonardo Tricot Saldanha:

Acompanho a relatora.