RP - 174536 - Sessão: 03/10/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de representação com pedido de direito de resposta ajuizada por JOSÉ FRANCISCO SANCHOTENE FELICE, candidato ao cargo de deputado estadual, e por ELISABETE BRETTAS FELICE, candidata a deputada federal, em face de EDITORA CIDADE & CULTURA LTDA, em razão de matéria jornalística publicada na edição do dia 27.9.214 no Jornal Cidade, com distribuição em Uruguaiana, que visa causar danos à imagem dos autores, sugerindo que o seu patrimônio foi amealhado de forma ilícita e/ou escusa.

A representação foi também dirigida contra FERNANDO ALVES, que teria veiculado propaganda eleitoral negativa dos candidatos José Francisco Sanchotene Felice e Elisabete Brettas Felice, em seu perfil de rede social, restando extinto o feito sem resolução do mérito, por impossibilidade jurídica do pedido em relação a este representado, com base no art. 267, VI, do Código de Processo Civil. Além disso, o pedido liminar foi indeferido, determinando-se a notificação da representada (fls. 32 e verso).

A EDITORA CIDADE & CULTURA LTDA apresentou defesa, alegando que as informações veiculadas no jornal são legítimas e que foram divulgadas com o sentido de informar a comunidade de Uruguaiana, local onde circula o jornal, sem intenção de difamar ou injuriar os representados, nem tampouco divulgar afirmações falsas. Alegam que a reportagem revela apenas o patrimônio que os representados declararam à Justiça Eleitoral, não havendo ofensa pessoal. Sustenta que a matéria trata de questões que envolvem interesse público dos cidadãos de Uruguaiana e invoca a liberdade de imprensa, de informação e de manifestação do pensamento (fls. 39-51).

Foram remetidas cópias do feito à Procuradoria Regional Eleitoral, para exarar parecer (fl. 67).

É o relatório.

VOTOS

Desa. Liselena Schifino Robles Ribeiro:

Preliminarmente, cumpre anotar que a representação com pedido de direito de resposta está sendo trazida diretamente a Plenário com fundamento no que dispõe o artigo 17, § 5º, da Resolução n. 23.398/2013, segundo o qual o Relator, sempre que entender pertinente, poderá levar o feito diretamente ao Plenário, para julgamento, independentemente de decisão prévia, facultando aos procuradores das partes oportunidade de sustentação oral.

A proximidade do pleito e a inviabilidade de apreciação de eventual recurso antes do dia das eleições evidenciam a pertinência de trazer o feito diretamente ao Pleno desta Corte.

A representação é tempestiva, pois foi ajuizada no prazo de 72h previsto para o ajuizamento de direito de resposta em relação à propaganda em jornal, nos termos do art. 17, I, “a” da Resolução TSE n. 23.398/13.

No mérito, a partir de notícia veiculada na rede social Facebook relativa ao patrimônio declarado pelos candidatos ao pleito, o Jornal Cidade, que possui distribuição no Município de Uruguaiana, divulgou, na edição de 27 de setembro de 2014, a seguinte manchete de capa: FELICE$, O$ MILIONÁRIO$ CANDIDATO$.

Na página 4 do jornal a matéria é trazida sob o título Fortuna dos Felice causa espanto em Uruguaiana, com a divulgação de uma fotografia dos representados José Francisco Felice e Elisabete Felice, conforme cópias às fls. 19 e 22 dos autos.

A reportagem tem extenso conteúdo e menciona que o valor de patrimônio declarado pelos candidatos ao TSE caiu como uma bomba na comunidade uruguaianense, com a notícia de que temos um dos candidatos mais ricos das atuais eleições, revelação do nome do felizardo sócio do Clube do Milhão da Política Gaúcha: José Francisco Sanchotene Felice. Segue a matéria fazendo referências de que há políticos que empobrecem após o exercício de cargos públicos, os que receberam herança de família como afirma Paulo Maluf (PP), e um terceiro caso, o do político cujo marketing pessoal criou tantas lendas a respeito de sua decantada origem humilde que, embora milionário, no imaginário popular, ele pertence, no máximo, à classe média – aquela categoria social onde se encontram os chamados remediados.

É afirmado que: daí o espanto geral com o patrimônio de José Francisco Felice, que seria mais do que os outros 10 candidatos locais juntos, pois o casal Felice tem mais de quatro milhões de reais. A matéria faz referência à baixa avaliação dada aos bens, e que, em programa radiofônico, o representante forjou sua mitologia pessoal afirmando, dentre outras questões que, na infância, de tão pobre, 'não podia comprar um picolé'. Acrescenta: sabe-se que não foi com o casamento que se tornou um milionário, pois em 2010 o candidato teria falado que, quando criança, Elisabete não tinha dinheiro para comprar uma bicicleta. Além disso, a reportagem faz referência a outros fatos, que criaram a imagem de um político de classe média desapegado de bens materiais.

Ao final, o periódico diz: quando voltar a ocupar os microfones de rádio, o ex-prefeito terá duas alternativas: ou confessa que herdou uma fortuna, ou explica o segredo do seu sucesso financeiro.

Os representantes sustentam que a intenção do periódico é clara: equipará-los a delinquentes, marginais, ladrões do dinheiro público, portanto, não merecedores de voto no pleito que se aproxima, e que pretende incutir no eleitor a dúvida de que não possuíam tal patrimônio quando Felice assumiu a Prefeitura de Uruguaiana em 2005. Asseveram que o seu patrimônio é o mesmo que vem sendo declarado ao TSE desde 2005.

Esse é o cenário posto nos autos, cumprindo lembrar que a publicação da imagem dos representantes, tanto na capa quanto na folha 4 do jornal, ilustra a reportagem jornalística.

Diga-se que os pressupostos para a concessão do direito de resposta, no âmbito eleitoral, são diversos dos requisitos necessários para a caracterização de responsabilidade civil por dano moral. No Direito Eleitoral, o instituto está previsto no art. 58 da Lei das Eleições, que dispõe:

Art. 58 - A partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.

Enquanto no Direito Civil avalia-se o dano moral eventualmente sofrido, a seara eleitoral preocupa-se com a candidatura daquele que se alega ofendido, e a necessidade de dar-se uma resposta ao fato noticiado.

No caso dos autos, evidencia-se que a representada, através do jornal que publica, à guisa do exercício do direito de informação, tem se utilizado do periódico para dirigir diversos ataques ao representante Sanchotene Felice, conduta que certamente reflete na imagem do candidato.

Nesta Corte, recentemente foi julgado improcedente pedido de direito de resposta movido por José Francisco Sanchotene Felice em face de publicação de matéria no jornal representado, nos autos da Rp 1504-62, de relatoria da Dra. Lusmary Fátima Turelly da Silva (decisão monocrática de 27.9.2014). Embora no plano eleitoral não tenha sido verificado o direito à resposta, esta nova representação evidencia a possibilidade de a representada estar levando a efeito conduta abusiva. Na contraposição da liberdade de manifestação com o direito de informação e o direito à imagem e privacidade, este último pode ser merecedor, sim, de proteção, uma vez verificado excesso passível de punição.

A liberdade de imprensa não traz em si um direito absoluto que se exime da apreciação judicial.

No entanto, nesta hipótese concreta, lida e relida a matéria jornalística que fala sobre o patrimônio declarado pelos representantes à Justiça Eleitoral questionando o seu sucesso financeiro, não se pode depreender qualquer caráter difamatório, injurioso, calunioso ou sabidamente inverídico às pessoas dos representantes. Sequer há ofensa de monta que possa amparar a divulgação do discurso de resposta pretendido.

O texto da resposta, juntado à fl. 08, se dirige a explicar que Sanchotene Felice tem o mesmo patrimônio que detinha antes de assumir a Prefeitura de Uruguaiana no ano de 2005 e que o patrimônio que adquiriram ao longo de suas vidas é limpo, lícito e oriundo de muito trabalho, inclusive de herança familiar. Veja-se que a própria resposta que acompanha o pedido bem demonstra que as sugestões aos eleitores contidas na matéria sequer foram definidas e respondidas de forma pontual.

Ressalto que considero, no mínimo, de mau gosto, o título da manchete de capa: FELICE$, O$ MILIONÁRIO$ CANDIDATO$, que usa o cifrão no lugar da letra “s” para dar um tom pejorativo à chamada. Divulgada sob a imagem dos representantes, em foto destacada na capa, o título tem a clara intenção de atacar os candidatos.

Uma imprensa que se diz livre e séria deve informar sem macular ou infamar, com o que corre o risco de perder o crédito. O comum é que o próprio meio de comunicação, mesmo antes da publicação da matéria jornalística, ouça a pessoa de que tratará e ofereça oportunidade de se manifestar sobre aquilo que será publicado. Isso é o que se espera de uma imprensa que se diz livre, séria e comprometida com a verdade sobre os fatos legítimos que divulga na intenção de informar a comunidade de Uruguaiana.

Porém, na esfera eleitoral, não se verificam os requisitos necessários para a concessão do direito de resposta.

Com essas considerações, VOTO pela improcedência da representação.

 

Dr. Hamilton Langaro Dipp:

Voto com a relatora.

 

Dr. Luis Felipe Paim Fernandes:

Divirjo da eminente relatora.

A demandada vem fazendo sucessivas manifestações contra os candidatos e nesses casos não haverá segundo turno. Já havia sido proposta representação que foi julgada pela Dra. Lusmary negando direito de resposta aos representantes.

A matéria é bastante ofensiva,  já pelo título em que os "s" são representados por cifrões. Em cidade da fronteira aos candidatos é atribuído terem fortuna que não conseguem explicar.

Entendo que a forma como está colocada a matéria há difamação e injúria contra os candidatos, desbordando da da crítica.

Voto por deferir o direito de resposta.

 

Dr. Ingo Wolfgang Sarlet:

Acompanho a relatora.

 

Des. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère:

Com a vênia da relatora acompanho a divergência.

Os representante solicitam o direito de resposta para apenas dizer que possuem  o mesmo patrimônio que detinham antes de assumir a prefeitura.

Voto por deferir o direito de resposta.

 

Dr. Leonardo Tricot Saldanha:

Acompanho a relatora. Ainda está dentro do espaço da liberdade de imprensa.