MS - 138856 - Sessão: 09/10/2014 às 14:00

RELATÓRIO

De modo a evitar tautologia, reproduzo o relatório da fl. 18, de minha lavra:

Vistos, etc.

ADAVILSON DE CASTILHOS MAGAGNIN e GLASIENE CARDOSO VIEIRA impetram mandado de segurança em face do Juiz Eleitoral da 48ª Zona Eleitoral – São Francisco de Paula que determinou a apreensão do equipamento de som descrito no Boletim de Ocorrência das fls. 08-9, bem como o comparecimento do primeiro impetrante, motorista do veículo que transportava o aludido equipamento, em audiência no Juizado Especial Criminal, na qualidade de “autor”, aprazada para o dia 21.10.2014, com base nos art. 39, §§ 3º e 5º, da Lei n. 9.504/97 (fls. 02-5).

Informam que Adavilson realizava propaganda eleitoral para o candidato Mauro Pereira, do Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB. A apreensão foi levada a cabo em 04.9.2014.

Acostam documentos (auto de apreensão na fl. 11, auto de depósito de bens na fl. 12, notificação para audiência na fl. 13, entre outros).

Afirmam que a propaganda realizada não configura conduta criminosa, pois não foi realizada no dia da eleição, consoante o teor do artigo da Lei das Eleições supramencionado.

Aduzem presente o fumus boni iuris, consistente na ofensa ao devido processo legal e ao princípio da ampla defesa, como lhe seria assegurado no art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal.

Sustentam existente o periculum in mora, na medida em que Adavilson vem sendo tratado como criminoso e Glasiene, proprietária do equipamento, estaria sofrendo grave prejuízo em sua atividade comercial, dada a apreensão de seu material de trabalho.

Requerem a concessão de liminar, a fim de que seja suspensa a audiência marcada para o dia 21/10/2014 e devolvido o equipamento de som apreendido. Pede a concessão da segurança para tornar definitivas as medidas buscadas em caráter liminar.

Prossigo.

Deferi a liminar, reconhecendo presentes seus requisitos, para fins de suspender a audiência do dia 31.12.2014 e determinar a devolução do equipamento de som apreendido (fls. 18-20).

O magistrado informou que a Brigada Militar tem prestado apoio à fiscalização de eventuais descumprimentos ao art. 39, § 3º, da Lei n. 9.504/1997 por carros de som, resultando, por desconhecimento da legislação eleitoral, em enquadramentos equivocados como ocorreu no caso. Referiu que a utilização de veículos equipados com alto-falantes afronta o art. 42, III, do Decreto-Lei n. 3.688/1941 – perturbação do sossego. A audiência aprazada diria com esse crime comum, alheio a esta Especializada. Alegou que, a despeito do enquadramento em cidades pequenas, seria quase impossível não afrontar a lei eleitoral, dada a proximidade entre prédios públicos, escolas, hospitais e afins. Por essas razões, entende ausente direito líquido e certo a amparar a pretensão dos impetrantes (fls. 25-29).

Os autos foram com vista ao Ministério Público Eleitoral atuante perante esta Corte, o qual opinou pela concessão da ordem (fls. 31-32).

É o relatório.

 

VOTO

Cuida-se de mandado de segurança impetrado por ADAVILSON DE CASTILHOS MAGAGNIN e GLASIENE CARDOSO VIEIRA, visando à devolução de equipamento de som apreendido quando da realização de propaganda eleitoral e à suspensão da audiência aprazada para o dia 21.10.2014, pela suposta prática de crime eleitoral. Cumpre esclarecer que somente o equipamento de som restou apreendido, não havendo recolhimento do veículo em que instalado.

O juiz impetrado aludiu à aplicação do Decreto-Lei n. 3.688/1941, art. 42, III, que assim dispõe:

Art. 42. Perturbar alguém o trabalho ou sossego alheios:

[…]

III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;

Todavia, o dispositivo supracitado não serviu de fundamento ao Boletim de Ocorrência n. 04154258 (fls. 08-09), no qual apontado como capitulação delitiva o art. 39, §§ 3º e 5º da Lei n. 9.504/1997:

Art. 39

[...]

§ 3º O funcionamento de alto-falantes ou amplificadores de som, ressalvada a hipótese contemplada no parágrafo seguinte, somente é permitido entre as oito e as vinte e duas horas, sendo vedados a instalação e o uso daqueles equipamentos em distância inferior a duzentos metros: [...]

I - das sedes dos Poderes Executivo e Legislativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, das sedes dos Tribunais Judiciais, e dos quartéis e outros estabelecimentos militares;

II - dos hospitais e casas de saúde;

III - das escolas, bibliotecas públicas, igrejas e teatros, quando em funcionamento.

[...]

§ 5º Constituem crimes, no dia da eleição, puníveis com detenção, de seis meses a um ano, com a alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período, e multa no valor de cinco mil a quinze mil UFIR:

I - o uso de alto-falantes e amplificadores de som ou a promoção de comício ou carreata;

II - a arregimentação de eleitor ou a propaganda de boca de urna;

III - a divulgação de qualquer espécie de propaganda de partidos políticos ou de seus candidatos.

Sob o manto da legislação eleitoral foi autuado Adavilson, e sob esse manto devem ser examinados os fatos, pois incontroverso que o impetrante realizava propaganda eleitoral para o candidato Mauro Pereira, do Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB, quando teve seu equipamento de som apreendido. Assim é que o auto de apreensão (fl. 11) e o de depósito de bens foram lavrados pela chefe do cartório da 48ª Zona Eleitoral.

Em que pese o aludido decreto-lei efetivamente vedar o uso de alto-falantes, não prospera a alegação de que se tratou da coibição de contravenção penal comum, por se tratar da utilização de aparato de som para veiculação de propaganda eleitoral. Não obstante o esclarecimento do magistrado sobre a atuação da Brigada Militar no auxílio ao exercício do poder de polícia, tal deve se dar nos contornos da legislação eleitoral.

Nesse cenário, afastada a competência do Juizado Especial Criminal, a notificação da fl. 13 é irregular: notifico V. Sra. A comparecer no Fórum da Comarca de São Francisco de Paula, na sala da Secretaria do Juizado Especial Criminal, na qualidade de autor, no dia 21.10.2014, às 9h. (O Autor deverá estar acompanhado por Advogado, advertido de que na falta deste, ser-lhe-á designado um defensor público).

Quanto à tipicidade do fato, reproduzo os argumentos lançados na decisão monocrática:

Todavia, notório não se tratar de uso de alto-falantes e amplificadores de som no dia da eleição, a qual se dará, em relação ao pleito geral, somente em 5 de outubro do corrente, em flagrante excesso no enquadramento legal realizado pelo magistrado.

A propaganda divulgada por meio de veículo com equipamento de som pode e deve ser fiscalizada por meio do exercício do poder de polícia, o qual incumbe ao juiz eleitoral de piso nas eleições gerais. Contudo, a aludida apreensão se deu em 04.9.2014, data essa em que eventual irregularidade refoge à disciplina criminal do § 5º do art. 39 da Lei das Eleições, de sorte que entendo presente o requisito do fundamento relevante a autorizar a adoção da medida propugnada.

Não sou insensível ao argumento de que abusos ocorrem sob a garantia de publicidade às candidaturas, mormente em cidades pequenas em que há concentração de prédios próximos aos quais é vedada a propaganda sonora. Contudo, essa premissa, isoladamente, não sustenta o afastamento da aplicação da norma que permite a utilização de carro de som, a qual traz, inclusive, o devido balizamento. No ponto, agrego às minhas razões de decidir o parecer do procurador regional eleitoral, que bem abordou o tema (fl. 32):

[…]

Na hipótese, contudo, impossível determinar se os impetrantes de fato desrespeitaram os limites legais. O simples fato de a cidade ser pequena não é suficiente para ensejar, de imediato, ilegalidade e toda e qualquer propaganda eleitoral proveniente de alto-falantes, principalmente considerando que a distância de 200m é razoavelmente pequena.

Ainda, a ocorrência policial não discriminou o bem protegido do qual o carro estaria próximo, nem sequer a distância, se restringindo a imputar o artigo – erroneamente, volto a enfatizar.

Nesse contexto, não parece razoável simplesmente proibir o uso de equipamentos de som nas campanhas eleitorais em cidades pequenas, visando preservar a ordem social, eis que, em contrapartida, atentaria contra o direito dos eleitores de conhecerem os candidatos e o direito dos candidatos de realizarem campanha. Nessas circunstâncias, torna-se necessário flexibilizar os limites legais, a fim de preservar o pleito e, por conseguinte, a democracia.

Entendo, assim, que a conduta se encontra abrigada pela legislação eleitoral, havendo direito líquido e certo a ser amparado pela via do mandamus, cuja ordem tenho por conceder.

Diante do exposto, VOTO pela concessão da segurança, confirmando a liminar deferida, para cancelar a audiência do dia 21.10.2014 e determinar a devolução do equipamento de som apreendido.