REC - 136258 - Sessão: 24/09/2014 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por TARSO FERNANDO HERZ GENRO, COLIGAÇÃO UNIDADE POPULAR PELO RIO GRANDE (PT / PTC / PCDOB / PROS / PPL / PTB / PR) e DILCE ABGAIL RODRIGUES PEREIRA (fls. 47-57) contra decisão monocrática (fls. 37-44) que julgou procedente a representação por propaganda eleitoral irregular no horário eleitoral gratuito ajuizada pela COLIGAÇÃO ESPERANÇA QUE UNE O RIO GRANDE (PP / PRB / PSDB / SD).

Narrou a inicial (fls. 02-10) que, no dia 04.09.2014, às 19h32min, nas inserções do horário gratuito de televisão, na propaganda do 3º bloco, bem como no mesmo dia, no horário das 11h07min, na propaganda do 1º bloco, e no dia 05 de setembro, igualmente às 11h07min, na propaganda do 1º bloco, os representados veicularam inserção em que o candidato a governador invadiu, nas duas primeiras oportunidades, o horário destinado à eleição para deputado federal e, na última inserção, o horário destinado à eleição para deputado estadual.

Sustentou a ocorrência de violação ao disposto no art. 53-A da Lei n. 9.504/97, uma vez que a propaganda foi focada na figura do atual governador. Referiu que aparece somente o candidato ao governo, Tarso Genro, com seu nome e sua logomarca de campanha ao fundo, sendo nítido o conteúdo de propaganda para a eleição majoritária.

Requereu a concessão de liminar para que os demandados não mais reproduzam as inserções hostilizadas e, no mérito, a procedência da representação, declarando-se a ilegalidade da invasão de horário com a consequente perda do tempo equivalente às três inserções no horário destinado à propaganda majoritária de governador, em todas as emissoras referidas. Juntou mídias e degravações das propagandas impugnadas (fls. 02-10).

O pedido liminar foi indeferido (fls. 16-17). Notificados, os representados apresentaram defesa, requerendo a improcedência da representação (fls. 25-32).

Da decisão monocrática de procedência recorrem os representados, ao argumento de que a propaganda está de acordo com o § 1º do art. 53-A da Lei n. 9.504/97. Afirmam que as locuções contidas na propaganda se restringem a considerações pertinentes à esfera de interesse da eleição para o Poder Legislativo federal e estadual, não havendo desvirtuamento da propaganda eleitoral. Argumentam que não houve qualquer menção a sua candidatura, nem apoio ou pedido de voto ao pleito majoritário (fls. 47-57).

Para evitar situações de surpresa do ponto de vista jurisprudencial, determinei que a decisão de procedência ficasse com sua eficácia sujeita a não interposição de eventual recurso, o qual, acaso existente, deveria ser recebido, excepcionalmente, com os efeitos suspensivo e devolutivo.

Com as contrarrazões (fls. 62-66), os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo desprovimento do recurso (fls. 68-70).

É o relatório.

 

VOTOS

Des. Federal  Otávio Roberto Pamplona:

Admissibilidade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do prazo de 24 horas previsto no art. 96, § 8º, da Lei n. 9.504/97.

Mérito

A presente demanda visa à apuração de violação ao disposto no artigo 53-A da Lei n. 9.504/97 (regulamentado pelo artigo 43 da Resolução n. 23.404/14 do TSE), que assim dispõe:

Art. 53-A - É vedado aos partidos políticos e às coligações incluir no horário destinado aos candidatos às eleições proporcionais propaganda das candidaturas a eleições majoritárias, ou vice-versa, ressalvada a utilização, durante a exibição do programa, de legendas com referência aos candidatos majoritários, ou, ao fundo, de cartazes ou fotografias desses candidatos.

§ 1º É facultada a inserção de depoimento de candidatos a eleições proporcionais no horário da propaganda das candidaturas majoritárias e vice-versa, registrados sob o mesmo partido ou coligação, desde que o depoimento consista exclusivamente em pedido de voto ao candidato que cedeu o tempo.

§ 2º Fica vedada a utilização da propaganda de candidaturas proporcionais como propaganda de candidaturas majoritárias e vice-versa.

§ 3º O partido político ou a coligação que não observar a regra contida neste artigo perderá, em seu horário de propaganda gratuita, tempo equivalente no horário reservado à propaganda da eleição disputada pelo candidato beneficiado.

(Incluído pelo art. 4º da Lei n. 12.034, de 2009.) (Grifei.)

O dispositivo está incluído no título “Da Propaganda Eleitoral no Rádio e na Televisão” e aplica-se tanto ao horário gratuito de divulgação em rede quanto em inserções.

De acordo com a representante, o candidato Tarso Genro invadiu o horário destinado à propaganda das eleições proporcionais nas inserções da propaganda eleitoral veiculada nas emissoras RBS TV, Band, SBT e Pampa, porque a publicidade seria totalmente focada na imagem do candidato ao governo, com divulgação de seu nome de urna, Tarso Genro, e com conteúdo de propaganda para a sua reeleição, inclusive utilização do slogan da candidatura majoritária: “Compartilhe crescimento, compartilhe igualdade”.

Assevera a existência de desvirtuamento, considerando que poucos segundos das inserções foram efetivamente utilizados para a eleição proporcional, situação que viola a isonomia de oportunidade entre os candidatos, visto que o representado aparece muito mais vezes do que todos os demais concorrentes, veiculando sua imagem no horário das inserções para governador, para deputado estadual e para deputado federal.

Adianto que assiste razão à coligação representante.

Veja-se que o caput do art. 53-A veda a inclusão dos candidatos à eleição majoritária na propaganda dos candidatos proporcionais. Esta é a regra geral. O texto do § 1º do mesmo artigo refere ser facultado o depoimento do candidato ao cargo majoritário, "desde que o depoimento consista exclusivamente em pedido de voto ao candidato que cedeu o tempo".

Em primeiro lugar, destaco que todo o tempo da inserção veiculada é ocupado pelo candidato TARSO GENRO, em afronta ao que dispõe o § 1º, o qual explicita que essa participação deve ser bastante limitada e objetiva. Nesse sentido, é a lição de Rodrigo Lopez Zílio:

O regramento exige que o depoimento seja conciso e objetivo, tendo a duração necessária para veicular pedido de voto, sem digressões de caráter subjetivo ou pessoal.

Não há simples depoimento, há verdadeira propaganda à eleição majoritária.

Por este motivo, entendo que houve, além da infringência ao § 1º do já citado art. 53-A, a afronta ao § 2º do dispositivo, que veda a utilização do espaço da candidatura proporcional para a feitura de propaganda do candidato majoritário (e vice-versa).

A aparição do candidato majoritário, que deveria ocorrer como uma exceção, com um depoimento limitado a um pedido de votos, tornou-se regra, em claro descumprimento à legislação eleitoral. Nesse sentido, há um desvio de finalidade da norma.

Também teve esse entendimento o TRE do Paraná, em caso em todo semelhante ao presente. Cito trecho da decisão contida na RP 2858-86:

Tem razão a Coligação representante. Sendo, em princípio, possível que o candidato na eleição majoritária preste depoimento em favor dos candidatos de sua coligação na eleição proporcional (art. 53-A, § 1º da Lei 9.504/97), essa participação deve ser bastante limitada e objetiva, já que, nos termos da lei exige-se que o "depoimento consista exclusivamente em pedido de voto ao candidato que cedeu o tempo".

Ademais, ao contrário do que faz crer a defesa, a fala de TARSO GENRO não é em prol dos candidatos proporcionais, pois apenas nos segundos finais há um pedido de voto para aqueles concorrentes ao pleito. No restante de sua manifestação, o candidato usou todo o tempo para tecer comentários sobre o Estado, fazendo referência ao seu trabalho como atual governador, bem como a sua possível reeleição.

Cumpre transcrever o conteúdo das duas publicidades aqui tratadas, conforme degravações da fl. 09:

Inserções de Propaganda para Deputados Federais

Tarso Genro: O Rio Grande é hoje um dos três Estados brasileiros mais atraentes para investimentos. E é também um dos que mais recebeu recursos federais nos últimos anos. Ainda há muito a conquistar e, para atrair mais investimentos e compartilhar os avanços sociais com todos os gaúchos, vote nos candidatos do PT para deputado Federal. Compartilhe crescimento, compartilhe igualdade, vote nos deputados federais do PT.

Inserções de Propaganda para Deputados Estaduais

Tarso Genro: Hoje o Rio Grande encontrou o seu caminho. É o estado que mais cresce no Brasil. Muito já foi feito, mas ainda há muito o que fazer. Para avançar com mais igualdade e compartilhar mais crescimento, vote nos candidatos do PT a deputado estadual. Compartilhe crescimento, compartilhe igualdade. Vote nos deputados estaduais do Partido dos Trabalhadores – PT.

Nesse sentido, evidentes são os trechos de sua fala: Hoje o Rio Grande encontrou seu caminho. É o Estado que mais cresce no Brasil. Muito já foi feito [passado] mas ainda há muito o que fazer [futuro]. Nesses dizeres há uma nítida campanha de sua candidatura.

Em nenhum momento aparece algum candidato à eleição proporcional. Somente ao final das inserções houve menção aos votos nos candidatos a deputados estaduais ou federais do PT, quando todo o restante do conteúdo faz referência ao governo do Estado. Assim, considerando a propaganda como um todo, entendo que há um pedido implícito de votos para a candidatura de TARSO GENRO, à medida que sua forte exposição, somada ao conteúdo de sua fala, extrapola os limites legais.

Ora, a simples exposição da imagem e fala do candidato estabelecem inequívoco favorecimento, pois, ainda que não tenha havido pedido expresso de voto, há uma vantagem em relação àqueles candidatos que ocuparam o espaço da propaganda de forma adequada, visto que, em princípio, é vedada a simbiose entre as propagandas aos cargos majoritários e proporcionais.

Nesse sentido, cito precedentes do TRE de Santa Catarina e do TRE do Ceará, os quais julgaram casos análogos ao presente:

ELEIÇÕES 2014 - REPRESENTAÇÃO - PROPAGANDA ELEITORAL NO HORÁRIO ELEITORAL GRATUITO - INSERÇÕES - OCUPAÇÃO DE ESPAÇOS DESTINADOS AOS CANDIDATOS A DEPUTADO FEDERAL E ESTADUAL PELA PROPAGANDA DO CANDIDATO A GOVERNADOR DO ESTADO - ART. 53-A DA LEI N. 9.504/1997 - INTERVENÇÃO QUE NÃO SE LIMITA AO EXCLUSIVO PEDIDO DE VOTOS PARA OS DETENTORES DAS INSERÇÕES - INVASÃO CONFIGURADA - REDUÇÃO DA SANÇÃO - LIMITAÇÃO DA PERDA DA PROPAGANDA AO TEMPO EFETIVAMENTE INVADIDO, EXCLUINDO-SE O TEMPO GASTO COM O PEDIDO DE VOTOS PARA OS CANDIDATOS A DEPUTADO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. A apresentação da propaganda eleitoral dos candidatos ao pleito proporcional pelo candidato ao pleito majoritário, expondo sua opinião sobre temas de interesse geral, que, muito embora possam depender da edição de leis para serem implementados, também estão na esfera de influência do Chefe do Executivo, configura a invasão de espaço destinado à candidatura diversa. Também configura a invasão a apresentação de fotografia do candidato ao pleito majoritário, ocupando metade da tela e quase no mesmo plano de apresentador, enquanto são enumeradas as qualidades desejáveis de um político ou destacadas conquistas do Estado relacionadas a atos do Executivo, que era chefiado pelo candidato que aparece na fotografia, para, somente ao final, pedir votos, genericamente, para os candidatos a deputado. A invasão do espaço destinado aos candidatos ao pleito proporcional por candidato que disputa a eleição majoritária enseja a aplicação da sanção prevista no § 3º do art. 53-A da Lei n. 9.504/1997, que não pode ser afastada apenas com base na alegada boa-fé dos infratores, que, no caso concreto, sequer foi demonstrada. O plano de mídia determina o número de inserções a serem transmitidas pelas emissoras, cabendo aos partidos políticos informarem quais as propagandas que serão transmitidas em cada bloco de audiência por dia de propaganda, sendo o normal transmissão das mesmas mídias nos mesmos blocos de audiência em todas as emissoras. Não se pode exigir do representante que comprove que todas as emissoras transmitiram as mesmas inserções nas datas e blocos de audiência, pois a prova é quase impossível de ser feita, cabendo aplicar-se, no caso, a teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, que consiste em retirar o peso da carga da prova de quem se encontra em evidente debilidade de suportá-lo. No caso concreto, se os representados alegam que não transmitiram as mesmas inserções em todas as emissoras, cabe a eles comprovar. De acordo com precedentes deste Tribunal, deve ser excluído, da sanção aplicada, o tempo de propaganda efetivamente utilizado pelo candidato da majoritária em benefício dos candidatos que lhe cederam o tempo.

(TRE-SC - RREP: 84654 SC , Relator: HÉLIO DO VALLE PEREIRA, Data de Julgamento: 09.09.2014, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Volume 18h01min, Data 09.09.2014.)

 

REPRESENTAÇÃO ELEITORAL. PROPAGANDA ELEITORAL GRATUITA. INSERÇÃO. TELEVISÃO. ELEIÇÃO PROPORCIONAL. INÉPCIA DA INICIAL. REJEIÇÃO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. REJEIÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. CONFIGURAÇÃO. APRESENTAÇÃO DE AÇÃO DE PROGRAMA DE GOVERNO. CANDIDATO MAJORITÁRIO. PEDIDO GENÉRICO DE VOTOS. INVASÃO. CONFIGURADA. PROCEDÊNCIA. 1. A inépcia da inicial é afastada quando o feito encontra-se instruído com a juntada da mídia e respectiva degravação, mediante as quais é possível aferir as circunstâncias da propaganda; 2. Não há de que se falar em litigância de má-fé quando é legítimo a parte autoral demandar o Judiciário mediante representações com objetos distintos; 3. Configura-se ilegitimidade passiva em relação à parte representada quando os efeitos da decisão não alcançará a sua esfera jurídica.; 4. Configura-se invasão de horário reservado à propaganda eleitoral gratuita quando o candidato majoritário utiliza o tempo de propaganda em inserção destinado à candidatura proporcional, para expor ação de sua plataforma de governo, mesmo que haja pedido genérico de votos para as candidaturas proporcionais. 5. Procedência da Representação.

(TRE-CE - 42: 201140 CE , Relator: ANTONIO SALES DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 11.09.2014, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 11.09.2014.)

No âmbito do TSE, também encontramos precedente no mesmo sentido.

Cito o Rp 115374, relator Ministro Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, o qual determinou, dia 02 de setembro do corrente, que o Partido dos Trabalhadores de Alagoas (PT-AL) deixasse de veicular conteúdo de propaganda eleitoral em bloco, no rádio, de candidatos ao cargo de deputado estadual. Conforme noticiado no site do TSE, o Ministro diz, ainda, que a Lei das Eleições (Lei n. 9.504/1997) proíbe o uso do horário reservado aos candidatos às eleições proporcionais para veicular propaganda de candidatos aos cargos majoritários. Na propaganda, a coligação de Aécio Neves afirma que a fala do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva “destinou-se essencialmente a promover a postulação à Presidência da República, fazendo alusão apenas residual e genérica aos candidatos do partido". De acordo com o ministro relator, houve, de fato, veiculação de pedido de votos para a candidata Dilma Rousseff e o vice na chapa Michel Temer, em desacordo com o que dispõe o artigo 53-A da Lei das Eleições.

E no Rp 109304 o Ministro Admar Gonzaga determinou, em decisão liminar, que o Partido dos Trabalhadores (PT) do Estado do Maranhão suspendesse a utilização do horário destinado à propaganda dos candidatos a deputado estadual para a divulgação ou pedido de votos para o pleito presidencial. Isso porque, após assistir ao programa televisivo contestado, entendeu restar evidente a veiculação de pedido de votos para presidente e vice e o descumprimento da norma que trata sobre o tema. “A propaganda, portanto, veiculou mensagem que implica a desnaturação da finalidade prevista pelo legislador, que apartou as publicidades em dias e horários distintos e ainda definiu ressalvas para as referências sobre candidaturas a outros cargos”, relatou o ministro.

Há, na propaganda impugnada, uma supremacia das eleições do executivo sobre as eleições do legislativo, com evidente ruptura do princípio da igualdade dos possíveis contendores do pleito vindouro. E, na perspectiva de um razoável equilíbrio no processo democrático, que já pende fortemente em benefício daqueles que dispõem do poder almejado, entendo que deve ser coibida tal conduta.

Como consequência, cumpre aplicar as sanções legais previstas na Lei Eleitoral.

Diante do exposto, nego provimento ao recurso e determino a perda do horário de propaganda gratuita do candidato da majoritária, nos termos do art. 53-A, § 3º, da Lei n. 9.504/97, conforme discriminado a seguir:

- 1 inserção de 30 segundos no 3º bloco, no dia 27 de setembro;

- 2 inserções de 30 segundos no 1º bloco, sendo uma no dia 26 e outra no dia 27 de setembro.

Notifiquem-se as emissoras RBS TV, Band, SBT e Pampa para que cumpram a determinação.