MS - 136343 - Sessão: 03/10/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de mandado de segurança, com pedido liminar, impetrado pelo candidato a deputado federal RONALDO MIRO ZULKE contra ato de ANIBAL MOACIR DA SILVA, prefeito de São Leopoldo, e de LUIZ TREMARIN, secretário municipal de serviços públicos de São Leopoldo, em razão do recolhimento dos cavaletes de propaganda eleitoral do impetrante.

O pedido liminar foi deferido, determinando-se às autoridades coatoras a devolução dos cavaletes que ainda estivessem na posse da Prefeitura Municipal, bem como se abstivessem de promover novas retiradas até o julgamento do mérito da demanda (fls. 35-37).

Os impetrados prestaram informações comunicando o integral cumprimento do pedido liminar. No mérito, alegam que a decisão impugnada foi tomada com base na Lei Municipal n. 7.804, de 29.08.2012, que veda a colocação de propaganda eleitoral nas vias públicas do Município de São Leopoldo, e que a ação perdeu o objeto após cumprimento da decisão liminar, razão pela qual requereram a extinção do feito com fundamento no art. 267, VI, CPC (fls. 47-50).

O parecer da Procuradoria Regional Eleitoral é pela concessão da segurança e confirmação da liminar deferida (fls. 58-61).

É o sucinto relatório.

 

 

 

 

 

VOTO

De acordo com os autos, no dia 05 de setembro do corrente ano, por ordem do prefeito municipal e do secretário municipal de serviços públicos de São Leopoldo, o impetrante foi surpreendido com a retirada de cavaletes da sua campanha eleitoral, que foi determinada com base na Lei Municipal n. 7.804/12 de São Leopoldo, art. 1º, in verbis:

Art. 1 - É proibida a fixação de propaganda eleitoral na forma de "cavaletes", "bonecos", "balões", ou quaisquer outras espécies, nas calçadas, praças, canteiros, passarelas, viadutos e rotatórias ao longo de vias e logradouros públicos no âmbito do Município de São Leopoldo.

O pedido liminar foi concedido ao argumento de que a violação de postura municipal não pode servir de substrato para o cerceamento à propaganda, merecendo transcrever o seguinte excerto da decisão (fls. 36 e verso):

A questão posta cinge-se à zona de contato entre a competência material e administrativa dos Municípios - aos quais incumbe legislar sobre assuntos de interesse local e, em decorrência, fiscalizar o cumprimento de suas leis - e a competência exclusiva da União para legislar sobre Direito Eleitoral. É que a propaganda eleitoral é também hábil a gerar infrações aos Códigos de Postura Municipal, em especial por meio de poluição visual e auditiva.

No entanto, essa celeuma jurisprudencial e doutrinária acerca dos limites da legislação municipal e da atuação das autoridades municipais no controle da propaganda eleitoral resta superada pela edição da Lei n. 12.034/2009, que alterou a redação do art. 41, 1º, da Lei 9.504/97. (...)

É quanto basta para constatar, num juízo inicial, que os órgãos de fiscalização municipal não podem intervir no controle da propaganda eleitoral, quer porque não lhes seja atribuído poder de polícia para coibir irregularidades eleitorais, quer porque a violação de postura municipal não pode servir de substrato para o cerceamento à propaganda.

Vale dizer: o controle da atividade da propaganda eleitoral deveria ter sido feito por esta Justiça Especializada, a quem competiria, se fosse o caso, fazer cessar a suposta irregularidade, ainda que alicerçada em inobservância à Lei Municipal. Deparando com supostas transgressões na propaganda, cabe ao agente fiscalizador municipal noticiar o fato ao Juízo Eleitoral, a fim de que por este sejam tomadas as medidas necessárias para o exercício do poder de polícia eventualmente cabível.

Entendo que, nesse momento, o exercício dos direitos políticos fala mais alto e se sobrepõe aos interesses locais de ordem urbanística e estética. A celebração da democracia leva a sociedade, cuja vontade está expressa na lei federal, a aceitar - quiçá ao preço do que se possa qualificar como autêntica poluição visual - que a fixação de material de divulgação de pessoas e de partidos vá além do que ordinariamente se tem como aceitável em dada localidade, quando se trata de propaganda e publicidade em geral.

Conforme já referido, embora a existência de previsão na legislação municipal, a Constituição Federal, em seu art. 22, atribui à União a competência privativa para legislar sobre Direito Eleitoral. Além disso, o art. 41, § 1º, da Lei Federal n. 9.504/97 confere somente aos juízes eleitorais e juízes auxiliares o exercício do poder de polícia sobre a propaganda eleitoral, e o art. 37, § 6º, do mesmo diploma legal, permite a colocação de cavaletes ao longo das vias públicas. Confira-se:

Constituição Federal

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

Lei n. 9.504/97

Art. 41. A propaganda exercida nos termos da legislação eleitoral não poderá ser objeto de multa nem cerceada sob alegação do exercício do poder de polícia ou de violação de postura municipal, casos em que se deve proceder na forma prevista no art. 40.

§ 1º O poder de polícia sobre a propaganda eleitoral será exercido pelos juízes eleitorais e pelos juízes designados pelos Tribunais Regionais Eleitorais.

Art. 37. Omissis

§ 6º É permitida a colocação de cavaletes, bonecos, cartazes, mesas para distribuição de material de campanha e bandeiras ao longo das vias públicas, desde que móveis e que não dificultem o bom andamento do trânsito de pessoas e veículos.

Cumpre ressaltar que o Juiz Eleitoral da 51ª ZE de São Leopoldo, competente para o exercício do poder de polícia da propaganda de rua, por ocasião de uma consulta provocada pelo Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores, já havia se reunido com a Procuradoria Geral do Município para esclarecer sobre a inconstitucionalidade da Lei Municipal n. 7.804/2012, chegando a sugerir que fosse buscada a revogação da citada legislação (fls. 30-33).

Portanto, é inviável a intervenção do prefeito municipal no controle da propaganda eleitoral, seja porque não é detentor do poder de polícia para coibir irregularidades eleitorais, seja porque a violação de postura municipal não serve de substrato para o cerceamento da propaganda eleitoral, cabendo-lhe noticiar o fato ao juízo eleitoral, a fim de que por este sejam tomadas as providências eventualmente cabíveis.

A propósito, o Juízo Eleitoral da 51ª ZE ordenou a devolução dos cavaletes recolhidos antes mesmo do ingresso do mandamus, como se pode depreender dos documentos juntados pela defesa (fls. 55-56), onde consta a informação subscrita pelo fiscal municipal comunicando a devolução de 116 placas/cavaletes, às 14h do dia 05.09.2014, um dia antes da impetração da ação mandamental.

Ainda que o material de campanha tenha sido devolvido ao candidato em momento anterior à impetração, o writ não se exaure na devolução, mas também em ordenar à administração que se abstenha de promover novas apreensões com base na lei municipal. O impetrante busca, assim, proteger seu direito, ganhando a presente demanda contornos de mandado de segurança preventivo, como bem observado pelo procurador regional eleitoral, o que afasta a pretensão de extinção do feito por perda de objeto.

Por fim, indefiro o pedido de astreintes no caso de descumprimento da ordem ou de reincidência na remoção dos cavaletes, haja vista a previsão contida no art. 26 da Lei n. 12.016/2009, que equipara a crime de desobediência o descumprimento das decisões proferidas em mandados de segurança.

Art. 26. Constitui crime de desobediência, nos termos do art. 330 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940, o não cumprimento das decisões proferidas em mandado de segurança, sem prejuízo das sanções administrativas e da aplicação da Lei no 1.079, de 10 de abril de 1950, quando cabíveis.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela concessão da segurança, confirmando a liminar deferida.