RP - 136173 - Sessão: 29/10/2014 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de representação ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL contra TARSO FERNANDO HERZ GENRO, DILCE ABGAIL RODRIGUES PEREIRA e COLIGAÇÃO UNIDADE POPULAR PELO RIO GRANDE (PT/PTC/PCdoB/PROS/PPL/PTB/PR), na qual se imputa aos representados a realização de conduta vedada, especificamente a constante no art. 73, VI, b, da Lei n. 9.504/1997 – prática de propaganda institucional no período vedado.

Sustenta que o representado Tarso, candidato à reeleição ao cargo de governador do Estado, autorizou, no perfil social do Governo do Rio Grande do Sul junto ao Facebook, propaganda institucional de sua gestão, com números e estatísticas que são utilizados, pelo citado candidato, em debates e propagandas eleitorais. Indica que é mantido link para o site oficial do Governo do Estado do Rio Grande do Sul.

Formulou pedido de concessão de medida liminar, a fim de determinar a remoção, tanto do perfil do Governo do Estado do RS no Facebook, quanto das notícias impugnadas do sítio oficial do Governo do Estado na internet.

A liminar foi indeferida (fls. 136-137), e a Procuradoria Regional Eleitoral apresentou recurso (fls. 146-152), cuja análise foi postergada para a decisão que ora inicia, conforme despacho de fl. 178.

Os representados apresentam defesa (fls. 155-166). Sustentam não ter havido autorização ou veiculação de propaganda institucional, mas tão só a disseminação de matérias de cunho noticiário, publicadas no sítio do Governo do Rio Grande do Sul e replicadas no perfil oficial do Facebook do Estado. Indicam que não há de se confundir os conceitos de notícia e de publicidade, e defendem que, para haver publicidade institucional propriamente dita, há de ser demonstrado dispêndio de recursos públicos, o que não seria o caso. Aduzem que o candidato Tarso não autorizou, participou, anuiu ou tinha prévio conhecimento do conteúdo propagado. Requerem o recebimento da defesa e o acolhimento dos argumentos, para o julgamento de improcedência do pedido.

Encerrada a fase de instrução, vieram as alegações finais do Ministério Público (fls. 182-185) e dos representados (fls. 187-198).

Foi publicada, por equívoco de rito, decisão monocrática, a qual tornei sem efeito, conforme despacho, e requeri pauta para julgamento, submetendo a decisão ao Plenário deste Tribunal.

É o relatório.

 

VOTOS

Des. Federal Otávio Roberto Pamplona:

No mérito, o qual incluirá as razões expendidas pelo recurso do Ministério Público Eleitoral, a controvérsia diz respeito à prática de publicidade institucional em período vedado pelo governador e candidato à reeleição Tarso Genro, consistente na autorização, no perfil oficial do Governo do Rio Grande do Sul junto ao Facebook, para a veiculação de propaganda institucional, conforme as fotografias encartadas às fls. 15-25 e 30-78 dos autos.

A Lei n. 9.504/1997 possui capítulo específico sobre as condutas vedadas aos agentes públicos durante a campanha eleitoral, arts. 73 a 78, trazendo a inicial fato que se enquadraria no art. 73, inc. VI, “b”:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

VI - nos três meses que antecedem o pleito:

[...]

b) com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral; (Grifei.)

No caso da alínea “b” do inciso VI do art. 73 da Lei das Eleições, a regra proíbe publicidade institucional no período de 3 meses anteriores ao pleito, ressalvadas apenas as hipóteses de grave e urgente necessidade pública, devidamente reconhecidas pela Justiça Eleitoral.

O bem jurídico tutelado é a isonomia entre os concorrentes ao pleito. As hipóteses relativas às condutas vedadas são taxativas e de legalidade restrita, sendo que a conduta deve corresponder ao tipo definido previamente (Recurso Especial Eleitoral n. 24.795, rel. Luiz Carlos Madeira). Não há dúvida de que existe uma preocupação de evitar a ineficácia da norma que veda a publicidade institucional no período, coibindo conduta de quem se utiliza de propaganda institucional com vistas à campanha eleitoral.

Além disso, é certo que, em alguns casos, a realização de propaganda institucional da administração beneficia o titular do executivo que se candidata à reeleição.

No entanto, não se pode deixar de considerar a existência de propaganda institucional realizada de forma lícita pelo administrador público em momento anterior ao vedado, sem excessos ou mesmo desvirtuamento, sobretudo se considerada a autorização de reeleição pelo texto constitucional vigente.

Nesse contexto, deve-se analisar com prudência tais casos, de modo a aferir se houve o desvirtuamento das informações veiculadas.

No caso posto, entendo fundamentais duas circunstâncias. A primeira, a questão da prova da data de colocação das postagens no Facebook; a segunda, a do próprio conteúdo das postagens.

1. Das datas de postagem das notícias atacadas

Conforme a legislação, a vedação da prática de propaganda institucional ocorreu, no ano de 2014, a partir de 05 de julho, ou seja, três meses anteriores ao pleito, que ocorreu em 05 de outubro de 2014.

Daí, tenho por não esclarecido suficientemente, nos autos, o período em que postadas as fotos no perfil do Governo do Rio Grande do Sul junto ao Facebook. Não é possível afirmar que tenham sido veiculadas, pela primeira vez, após o dia 05 de julho.

Isso porque, muito embora a denúncia do cidadão (Sr. Miguel) tenha sido encaminhada ao Parquet em 31 de julho de 2014 (fl. 14), e a diligência do Ministério Público, após a denúncia, tenha ocorrido no dia 06 de agosto de 2014 (como declarado na margem dos printscreens) e, ambas, portanto, quando já corrente o período vedado, não resta claro desde quando constam as referidas imagens no perfil do Facebook, ou mesmo na própria página oficial do Governo do Estado gaúcho.

É certo que há datas constantes em alguns dos printscreens – 24 de julho de 2014, 25 de julho de 2014. Contudo, não é possível, a partir disso, concluir que se tratam, tais datas, dos dias em que realizadas as postagens, mormente se considerado que veiculam notícias notoriamente ocorrentes no primeiro semestre de 2014 – as enchentes no Estado do Rio Grande do Sul ou a safra recorde.

Daí, ressalvo que o Tribunal Superior Eleitoral tem admitido, por exemplo, a manutenção de placas de obras públicas colocadas anteriormente ao período vedado previsto na Lei das Eleições, desde que não contenham expressões que possam identificar autoridades, servidores ou administrações cujos dirigentes estejam em campanha eleitoral.

Por isso, colaciono as seguintes ementas de julgados (com grifos meus):

Propaganda institucional. Período vedado. Art. 73 da Lei n° 9.504/97. Placas em obras públicas. Permanência. Responsabilidade. Comprovação.

1. A permanência das placas em obras públicas, colocadas antes do período vedado por lei, somente é admissível desde que não constem expressões que possam identificar autoridades, servidores ou administrações cujos dirigentes estejam em campanha eleitoral (Precedente: Recurso na Representação n° 57/98). […] Recurso especial conhecido e provido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 19323, Acórdão n. 19323 de 24.05.2001, Relator: Min. FERNANDO NEVES DA SILVA, Publicação: DJ - Diário de Justiça, Volume 1, Data 10.08.2001, Página 70.)

 

Propaganda institucional em período vedado (Lei 9.504/97, art. 73, § 4°). Mensagens intermitentes, colocadas em relógios eletrônicos instalados em pontos de grande convergência de público.

[...]

2. A permanência de placas em obras públicas, antes do período vedado, é admissível, desde que delas não constem expressões que possam identificar autoridades, servidores ou administrações cujos dirigentes estejam em campanha eleitoral (Precedentes: Representação 57 e Recurso Especial 19.323). Recurso especial conhecido e provido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 19326, Acórdão n. 19326 de 16.08.2001, Relator: Min. JOSÉ PAULO SEPÚLVEDA PERTENCE, Publicação: DJ - Diário de Justiça, Volume 1, Data 05.10.2001, Página 140.)

A propósito, a lição de Olivar Coneglian (Propaganda eleitoral - de acordo com o Código Eleitoral e a Lei 9.504/1997. 6 ed., Curitiba: Juruá, 2004, pág. 83):

[…] a administração pública não precisa retirar placas permanentes de obras. Assim, se o município (em processo de eleição municipal) está construindo uma escola em cujo tapume se exibe uma placa com referência à mesma obra, essa placa não precisa ser retirada no período de vedação. Não se admite, porém, a colocação de uma placa nova nesse período, mesmo que a obra tenha sido iniciada nesse tempo.

E esta Corte já julgou processos análogos. Exemplificativamente, na sessão de 25 de junho de 2013, em processo da relatoria do Dr. Jorge Alberto Zugno, restou admitida a manutenção de placas de obras públicas colocadas em período anterior aos três meses que antecedem o pleito, desde que não constem expressões que possam identificar autoridades, servidores ou administrações cujos dirigentes estejam em campanha. Transcrevo a ementa do julgado:

Recurso. Suposta prática de publicidade institucional em período vedado. Eleições 2012.

Indeferimento da inicial, por carência de ação, no juízo originário.

É cediço que o Tribunal Superior Eleitoral tem admitido a manutenção de placas de obras públicas colocadas em período anterior aos três meses que antecedem o pleito, desde que não constem expressões que possam identificar autoridades, servidores ou administrações cujos dirigentes estejam em campanha eleitoral.

Não evidenciada a alegada publicidade institucional vedada pela legislação eleitoral, haja vista inexistir referência expressa ao prefeito, candidato à reeleição, tampouco indicação de candidatura. Nesse cenário, não é razoável exigir que a prefeitura retire as placas existentes de obras públicas em andamento.

Provimento negado.

(TRE/RS RE 751-78, Relator: Dr. JORGE ALBERTO  ZUGNO.) (Grifei.)

Assim, entendo que os precedentes citados se prestam ao caso posto, muito embora aqui se trate de veiculação de notícias na rede mundial de computadores, porque na espécie também não resta evidenciada a alegada publicidade institucional vedada, haja vista inexistir, nas imagens contidas no caderno probatório, referência expressa ao candidato da situação, tampouco indicação de candidatura eleitoral.

Adentra-se, então, ao segundo aspecto fundamental, qual seja, o do conteúdo das fotos e mensagens divulgadas no Facebook.

2. Do conteúdo veiculado

As fotos juntadas aos autos trazem, grosso modo, as seguintes notícias, todas constantes no perfil oficial do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, com link para o sítio oficial na internet:

RS é campeão em leitos hospitalares;

RS é o 4° melhor estado para negócios e investimentos;

Enchentes: União confirma repasse de R$ 14 milhões para municípios gaúchos;

Enchentes: DAER segue recuperando estradas atingidas pelas chuvas;

Taca-lhe milho na bicharada;

Fundo APL – empresas fortes e produtores mais fortalecidos;

Bibliotecas da região central são modernizadas;

Porto do Rio Grande bate recorde no 1° Semestre de 2014;

Desemprego cai na Região Metropolitana e é o menor do mês de junho nos últimos 14 anos;

União confirma transferência de R$ 14 milhões para municípios em situação de emergência;

RS, SC e PR passam MG em ranking nacional de competitividade;

Secretaria da Infraestrutura anuncia obras emergenciais na ERS 324;

RS vai receber 47 mil toneladas de sementes milho para atender municípios atingidos pelas chuvas.

Da análise de tais mensagens e imagens, nota-se que não há conteúdo eleitoral/eleitoreiro. Não é citado o nome de Tarso Genro ou, sequer, menciona-se o cargo de Governador do Estado do Rio Grande do Sul.

Ademais, verifica-se que a forte maioria das notícias trata de dados objetivos, números obtidos via notícias veiculadas na imprensa –, de maneira que não se trata de publicidade institucional. Algumas informações tratam, aliás, de notícias oriundas de outros entes federados: União, municípios, estados de Santa Catarina, Paraná e Minas Gerais.

Por outro lado, mesmo as indicações de obras, quando havidas, são relativas às enchentes notoriamente ocorridas no primeiro semestre de 2014, no Rio Grande do Sul, o que faz enquadrar na exceção legal da necessidade e utilidade pública da veiculação.

Finalmente, apenas a título exemplificativo, nota-se uma tendência jurisprudencial de análise, caso a caso, do conteúdo veiculado, exatamente como fator de ponderação a uma situação que não pode ser olvidada – a já citada possibilidade de reeleição dos candidatos. Não parece possível, nessa linha, imobilizar o noticiário estatal a ponto de prejudicar a informação dos cidadãos, desde que, claro, não haja desequilíbrio de forças na competição eleitoral, ou impedir o candidato da situação de ressalvar, em debates e propaganda eleitoral, dados e fatos que entenda abonadores da respectiva candidatura.

O candidato à reeleição, por óbvio, irá fazer relevo daquelas circunstâncias que entender favoráveis para que o eleitorado renove seu mandato, que podem coincidir com as notícias oficiais, dados e números.

O que é vedado, como já frisado, é a utilização da máquina publicitária estatal para a veiculação de publicidade institucional que desequilibre a competição eleitoral em favor do pretendente à reeleição, o que não ocorre no caso sob análise.

Nessa linha, colaciono ementa de julgado do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, verbis:

RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. CONDUTA VEDADA AO AGENTE PÚBLICO. ART. 73, I E VI, B, DA LEI Nº 9.504/97. UTILIZAÇÃO DO SÍTIO OFICIAL DO MUNICÍPIO E PÁGINA DO FACEBOOK PARA DIVULGAÇÃO DE PROPAGANDA INSTITUCIONAL EM PERÍODO VEDADO, VISANDO BENEFÍCIO DE CANDIDATURA. IMPROCEDÊNCIA. AFASTADA A PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DO DIREITO DE PRODUZIR PROVAS. MÉRITO. MERA PUBLICIDADE DE ATOS, PROGRAMAS, OBRAS E SERVIÇOS QUE NÃO CARACTERIZAM PROPAGANDA INSTITUCIONAL. DESPROVIMENTO.

(Processo: RE 83349-SP, Relatora: CLARISSA CAMPOS BERNARDO, Julgamento: 18.07.2013, Publicação: DJESP - Diário da Justiça Eletrônico do TRE-SP, Data 25.07.2013.)

Finalmente, não podem ser desconsideradas as Ordens de Serviço ns. 002/2014, 004/2014 e 005/2014, todas do Governo deste Estado, estabelecendo parâmetros para a conduta dos agentes políticos e servidores da Administração Direta e Indireta do Estado do Rio Grande do Sul, no que diz respeito a materiais de propaganda eleitoral e à publicidade dos órgãos e entidades da Administração Pública Estadual no período eleitoral de 2014. São documentos firmados pelo então governador do Estado e que fazem presumir, mediante a inexistência de prova em contrário, pela tomada de providências suficientes para a não ocorrência de autorização de propaganda institucional vedada.

Dessa forma, VOTO para julgar improcedente a representação.

 

Des. Luiz Felipe Brasil Santos:

Peço vista dos autos.

 

Dr. Hamilton Langaro Dipp:

Aguardo.

 

Dr. Luis Felipe Paim Fernandes:

Acompanho o relator.

 

Dr. Ingo Wolfgang Sarlet:

Aguardo a vista.

 

Leonardo Tricot Saldanha:

Aguardo a vista.