RC - 1905 - Sessão: 13/10/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por TADEU UBIRAJARA HOFFMANN (fls. 295-302) contra sentença proferida pelo Juízo da 127ª Zona Eleitoral de Giruá (fls. 265-270), que julgou procedente a denúncia, condenando-o pela prática do delito tipificado no art. 299, caput, do Código Penal (falsidade ideológica) em concurso material com o crime do art. 353 do Código Eleitoral (fazer uso de documento público falsificado ou alterado).

Em suas razões de recurso, a defesa busca a reforma parcial da sentença objetivando a fixação da pena-base no mínimo legal para ambos os delitos, tendo em vista que a culpabilidade do condenado é normal às espécies delitivas, e que a sua personalidade não pode ser considerada negativamente na análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, por ser desajustada e voltada à prática criminosa (fls. 295-302).

Com contrarrazões do Ministério Público de 1° Grau (fls. 306-309), os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo desprovimento do recurso (fls. 314-316v.).

A magistrada de primeiro grau remeteu, a esta Corte, a petição de recurso subscrita pelo réu, juntada nas fls. 318-323.

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. O réu e o defensor dativo nomeado foram intimados da sentença em 19.09.2013 (fls. 275 e 291); e a irresignação, apresentada em 27.09.2013 (fl. 295), dentro, portanto, do prazo de 10 dias contados da intimação, em conformidade com o art. 362 do Código Eleitoral.

Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, o recurso é de ser conhecido.

Destaco, por oportuno, que o conhecimento do recurso interposto pela defesa dativa atende ao anseio do réu de recorrer da sentença condenatória, manifestado na petição de fls. 319-323, restando superada eventual discussão acerca do cerceamento ao seu direito de defesa no âmbito desta ação penal.

 

Da Adequação Típica – Aplicação de Ofício do Instituto da Emendatio Libelli

Preliminarmente ao exame do mérito do apelo defensivo, analiso a adequação típica dos fatos, que se encontram narrados na denúncia nos seguintes termos:

1º FATO

No dia 15 de dezembro de 2004, em horário incerto, no Posto de Identificação de Giruá, nesta Cidade, o denunciado TADEU UBIRAJARA HOFFMANN fez inserir declaração falsa em documento público, com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante.

Na oportunidade, o denunciado TADEU UBIRAJARA HOFFMANN dirigiu-se ao Posto de Identificação para encaminhar a produção de documento de identidade, momento em que se identificou como José Luiz Hoffmann Sobrinho, seu irmão, apresentando a certidão de nascimento de José Luiz e inserindo suas impressões digitais no documento público de fl. 100.

Com base nos dados fornecidos pelo denunciado, foi expedida carteira de identidade (fl. 25).

Em 2005, o denunciado foi ouvido em investigação policial, momento em que se identificou como sendo José Luiz Hoffmann Sobrinho e apresentou o documento acima referido.

 

2º FATO

No dia 05 de janeiro de 2005, em horário não precisamente determinado, no Cartório da 127ª Zona Eleitoral de Giruá-RS, neste município, o denunciado TADEU UBIRAJARA HOFFMANN fez uso de documento público falsificado para fins eleitorais.

Na ocasião, portando o aludido documento de identidade descrito no 1º fato, o denunciado TADEU UBIRAJARA HOFFMANN procedeu o seu alistamento eleitoral, conforme documento de fl. 96, fazendo constar no título o nome de seu irmão José Luiz Hoffmann Sobrinho.

A condenação foi calcada, respectivamente, no art. 299, caput, do Código Penal (falsidade ideológica) e no art. 353 do Código Eleitoral (fazer uso de documento público falsificado ou alterado), abaixo transcritos:

Falsidade ideológica

Art. 299 Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, se o documento é particular.

 

Art. 353 Fazer uso de qualquer dos documentos falsificados ou alterados, a que se referem os artigos 348 a 352;

Pena - a cominada à falsificação ou à alteração.

A materialidade delitiva está suficientemente comprovada nos autos, por meio da carteira de identidade e do título eleitoral (fl. 29), do Requerimento de Alistamento Eleitoral e da Guia de Recolhimento de Multas Eleitorais (fls. 100-101).

Da mesma forma, a autoria restou inconteste durante a instrução processual, visto que o réu confessou ter utilizado a certidão de nascimento de seu irmão com o intuito de obter cédula de identidade falsa junto ao Posto de Identificação de Giruá e, posteriormente, ao requerer o título de eleitor perante o cartório eleitoral do mesmo município (fls. 196-198).

O primeiro fato foi adequadamente tipificado como o crime do art. 299, caput, do Código Penal, estando presente tanto o seu elemento típico normativo (declaração falsa) quanto o seu elemento subjetivo específico (alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante).

Contudo, ao analisar a descrição da segunda conduta delitiva em conjunto com os elementos constantes dos autos, observo que não restou provado o elemento subjetivo do tipo do art. 353 do Código Eleitoral, qual seja, o dolo específico de utilização do documento falso com finalidade eleitoral.

Em seu interrogatório, o réu afirmou o uso do documento de identificação falso ao requerer o título eleitoral, porque tinha a intenção de ocultar a sua identidade verdadeira para conseguir emprego, tendo em vista que se encontrava evadido da Colônia Penal Agrícola de Piraquara/PR desde 27.11.2003 (fl. 114).

Nesse sentido, colho a seguinte passagem do termo de degravação do depoimento do acusado (fls. 197-198), com grifos meus:

[...]

Juiz: Por que o senhor fez isso?

Interrogando: Porque eu não tinha documento na época, pra poder trabalhar.

Juiz: O senhor queria ocultar sua identidade verdadeira?

Interrogando: Eu mesmo tirei.

Juiz: Mas o senhor queria ocultar a sua identidade verdadeira. Seu nome, tudo. O senhor queria esconder isso?

Interrogando: Escondi porque eu tava fugitivo.

Juiz: Estava fugitivo. Daqui mesmo?

Interrogando: É. Da Colônia Penal Agrícola.

Juiz: Colônia Penal Agrícola de Piraquara?

Interrogando: É.

Juiz: Então o senhor utilizou e se alistou depois? Fez o alistamento eleitoral.

Interrogando: É. Eu fiz o título.

[…]

Vale dizer que inexiste prova irrefutável da finalidade eleitoral na conduta do réu, a exemplo de filiação a partido político ou participação em campanha eleitoral. Sequer há comprovação de que o acusado tenha utilizado o título de eleitor fraudulento para votar, pois o requereu em 05.01.2005 (fls. 100-101) e, segundo informado pelo Cartório Eleitoral de Giruá em 2008, apenas constava registro de justificativa eleitoral em seu cadastro (fl. 99), havendo, ademais, informação de que o réu reingressou no sistema prisional do Estado do Paraná em 05.05.2006 (fl. 162).

Como explica a doutrina trazida por Joel José Cândido acerca do delito do art. 353 do Código Eleitoral (Direito penal eleitoral e processo penal eleitoral. São Paulo: Edipro, 2006, pp. 428-429):

Como este crime remete aos documentos falsificados ou alterados a que se referem os arts. 348 a 352 do Código Eleitoral, deve o intérprete ter presente que o uso de documento falso, pelo agente, também tem que ser para fins eleitorais. Não havendo finalidade eleitoral no uso feito pelo agente, o crime poderá ser outro, mas não este do art. 353.

Nessa mesma linha, a jurisprudência (grifos meus):

RECURSO CRIMINAL. AÇÃO PENAL. ART. 353 C.C. ART. 348 DO CÓDIGO ELEITORAL. IMPROCEDÊNCIA, COM FUNDAMENTO NO ART. 386, III e VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO. AFASTADA. CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO. NECESSIDADE DA PRESENÇA DO DOLO ESPECÍFICO. AUSÊNCIA. NÃO CONFIGURADO O CRIME EM COMENTO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA POR APENAS UM FUNDAMENTO (ART. 386, VII, do CPP). RECURSO DESPROVIDO. COM DETERMINAÇÃO. 1- Recurso Criminal. Ação Penal. Conduta descrita na denúncia: os denunciados fizeram uso de documento público falso, qual seja, recibos eleitorais atestando a existência de doação eleitoral que jamais se concretizou. Falsidade das assinaturas comprovada por meio de perícia. Ação Penal julgada improcedente. Não comprovação de que o recorrido tenha produzido as assinaturas. 2- Preliminar em contrarrazões de prescrição. Não ocorrência. Afastada. 3- Crime de uso de documento falso - art. 353, do Código Eleitoral. Não comprovação da ciência dos agentes acerca da falsidade das assinaturas nos documentos contestados. Indícios de que a doação se realizou. Necessidade da presença do dolo específico para a caracterização do crime. Ausência. Não configurado o crime em comento. 4- Aplicação do art. 249, § 2º, do Código de Processo Civil ao processo penal, por analogia, para estender os efeitos da sentença a quo a réu que, embora denunciado, deixou de constar no corpo do r. decisum, evidenciando mero erro material. 5- Absolvição mantida, apenas pelo fundamento de ausência de provas (art. 386 , inciso VII, do CPP). Recurso desprovido. (Processo: RECC 639-SP Relatora: CLARISSA CAMPOS BERNARDO, Julgamento: 22.05.2014 Publicação: DJESP - Diário da Justiça Eletrônico do TRE-SP, Data: 29.05.2014.)

Por conseguinte, inexistente o elemento subjetivo específico, inviável a caracterização do tipo previsto no art. 353 do Código Eleitoral.

Em verdade, na narrativa da segunda conduta delituosa, estão delineados todos os elementos constitutivos do crime de inscrição fraudulenta, previsto no art. 289 do Código Eleitoral:

Art. 289 Inscrever-se fraudulentamente eleitor.

Pena - reclusão até cinco anos e pagamento de cinco a 15 dias-multa.

A inscrição fraudulenta constitui crime formal que se consuma com a simples apresentação do pretenso eleitor perante a Justiça Eleitoral para integrar, mediante fraude, o Cadastro Nacional de Eleitores, independentemente do deferimento do seu pedido.

O elemento típico subjetivo é o dolo genérico, bastando [...] a vontade livre e consciente de inscrever-se mediante o emprego de meios astuciosos e fraudulentos (GOMES, Suzana de Camargo. in Crimes eleitorais. 4 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, pp. 96-97).

Exatamente o dolo esclarecido pela doutrina ficou demonstrado no trecho do seu depoimento acima transcrito. O acusado, de forma deliberada e consciente, obteve título de eleitor ideologicamente falso, documento corriqueiramente exigido para fins de contratação empregatícia, por ele almejada à época.

Por essas razões, aplico, de ofício, o instituto da emendatio libelli, previsto no art. 383 do Código de Processo Penal, para dar nova classificação jurídica ao segundo fato, subsumindo-o à figura típica do art. 289 do Código Eleitoral.

Noto que, no presente caso, a modificação da classificação jurídica do fato não macula o exercício de ampla defesa pelo réu que, durante a fase de instrução, defendeu-se do fato e das circunstâncias apontadas pelo órgão do Ministério Público Eleitoral. Ademais, por força do princípio do ne reformatio in pejus, a aplicação do instituto da emendatio libelli deve observar o limite da pena imposta na sentença, haja vista que a acusação não recorreu da sentença.

 

Do Concurso de Crimes

Os ilícitos previstos nos arts. 299, caput, do Código Penal e 289 do Código Eleitoral foram praticados pelo réu em momentos distintos e com finalidades próprias de obtenção de cada um dos documentos com conteúdo falso, voltados ao ocultamento de sua real identidade para evadir-se da polícia.

O réu, ao falsificar a cédula de identidade, certamente não tinha, como único fim, a execução do crime de inscrição eleitoral fraudulenta, na medida em que sequer exerceu o seu direito de voto, como anteriormente referido. Equivale a dizer que a potencialidade lesiva do crime de falsidade ideológica não se esgotou na configuração das elementares do delito de inscrição fraudulenta de eleitor, o que obsta a aplicação do princípio da consunção à hipótese dos autos.

As infrações são autônomas, o que é reforçado pela diversidade existente entre os bens jurídicos tutelados pelas normas jurídicas em comento: o art. 299, caput, do Código Penal tutela a fé pública, ao passo que a norma do art. 289 do Código Eleitoral é voltada à proteção da higidez do Cadastro Nacional de Eleitores.

Nesse sentido, cito o seguinte precedente do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais:

RECURSO CRIMINAL ELEITORAL. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO (ART. 297 DO CÓDIGO PENAL), INSCRIÇÃO ELEITORAL FRAUDULENTA (ART. 289 DO CÓDIGO ELEITORAL) E FALSIDADE IDEOLÓGICA (ART. 299 DO CÓDIGO PENAL, ESTE, CRIME CONTINUADO), EM CONCURSO MATERIAL. CERTIDÃO DE NASCIMENTO FALSA EMITIDA EM NOME DE OUTREM. OBTENÇÃO DE INSCRIÇÃO ELEITORAL. AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE DEMONSTRADA. INAPLICÁVEIS, À ESPÉCIE, OS PRINCÍPIOS DA CONSUNÇÃO E DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPROVIMENTO. [...] Se o réu, conscientemente, assinou documento, fazendo-se passar por terceira pessoa, com o fim de obter inscrição eleitoral com tal nome, é responsável por inscrição eleitoral fraudulenta, fato definido como crime pelo Código Eleitoral (art. 289). O dolo do crime da inscrição eleitoral fraudulenta é genérico, bastando a vontade de inscrever-se fraudulentamente. Se os delitos previstos nos arts. 297 e 299 do Código Penal foram praticados em momentos distintos, com finalidade própria, configurando-se condutas autônomas, não devem ser absorvidos pelo crime do art. 289 do Código Eleitoral, em face do princípio da consunção, mormente quando, para cada conduta, o réu tinha uma finalidade específica de obter êxito na obtenção de documento com conteúdo falso e, sendo assim, cada delito configurou-se de forma autônoma, não havendo que se falar em meio para a obtenção de um resultado único. De efeito, não há como se aplicar o princípio da consunção se não há um delito maior a abranger os menores, os quais devem figurar como fase preparatória, preliminares ou complementos desse delito principal que os absorve. O princípio da insignificância deve ser aplicado no caso concreto diante da constatação da mínima ofensividade da conduta do agente; da inexpressividade da lesão jurídica provocada; da inexistência de periculosidade social da ação e do reduzido grau de reprovabilidade da conduta. Não ficando demonstrados tais pressupostos, não há que se falar em tal postulado, mormente em se tratando de Direito Penal Eleitoral. Não vislumbrando como acatar a versão dos fatos apresentada pelo recorrente e existindo nos autos prova segura da prática dos diversos delitos em questão, sendo inegável a atuação consciente do recorrente na obtenção dos documentos fraudados, notadamente porque diante das diversas evidências, não há versão crível ou prova que as infirme, mantém-se a sentença condenatória, com o improvimento do recurso.

(TRE-MS - RC: 373266-MS, Relator: ARY RAGHIANT NETO, Data de Julgamento: 09.04.2012, Data de Publicação: DJE - Diário da Justiça Eleitoral, Tomo 562, Data: 17.04.2012, Páginas 05-06) (Grifei.)

Configurado, dessa maneira, o concurso material de crimes, nos termos do art. 69, caput, do Código Penal.

Passo ao exame da dosimetria das penas.

 

 

Da Dosimetria das Penas

Em seu recurso, a defesa postula a redução das penas impostas ao réu para o mínimo legal relativamente a ambos os crimes, pretensão que merece ser parcialmente acolhida, pelas razões a seguir expostas.

 

Crime do art. 299, caput, do Código Penal

Ao analisar as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, a juíza de primeiro grau fixou a pena-base em 3 anos de reclusão, valorando negativamente os antecedentes, a personalidade e a conduta social do réu, bem como as circunstâncias em que cometido o delito, concluindo que, dessas diretrizes, exsurge uma culpabilidade acentuada.

A existência de antecedentes é incontroversa nos autos, pois o réu possui condenações criminais com trânsito em julgado contra si, segundo certificado nas fls. 80-82 e 246, com o que se está diante de circunstância judicial que lhe é desfavorável.

Contudo, quanto à personalidade, é impossível afirmar, com segurança, o seu desajuste, uma vez que os autos não contêm uma avaliação do perfil psicológico do acusado. Esse vetor judicial não pode, por consequência, interferir negativamente no arbitramento da pena-base.

A conduta social do acusado também constitui circunstância negativa. Porém, não pela indicação genérica de se voltar à prática delitiva, o que se confundiria com os próprios antecedentes criminais, mas pelo fato de o réu encontrar-se foragido da Justiça do Estado do Paraná na data dos fatos (fl. 114).

Os motivos, as circunstâncias e as consequências do crime são fatores neutros. Ao contrário do asseverado na sentença, o fato de o réu não residir em Giruá e deslocar-se para esse município para o cometimento dos crimes deve ser compreendido como integrante da sua condição de foragido, já tomada em seu desfavor na análise da sua conduta social.

O comportamento da vítima é, igualmente, vetor neutro, que não interfere na graduação da pena-base.

Como somente os antecedentes e a conduta social do acusado remanescem negativos, a culpabilidade, entendida como um juízo de reprovabilidade social da conduta, não se mostra acentuada, mas, sim, normal à espécie delitiva.

A pena cominada em abstrato ao delito de falsidade ideológica, se o documento é público, é de 01 (um) a 05 (cinco) anos de reclusão e multa. Partindo da valoração das circunstâncias judiciais, entendo que a pena-base não deve se afastar demasiadamente do mínimo legal. Fixo-a, portanto, em 01 (ano) e 06 (seis) meses de reclusão.

Como há registro de mais de uma condenação criminal anterior com trânsito em julgado contra o réu (fls. 80-82 e 246), o mesmo pode ser considerado reincidente (art. 61, inc. I, do Código Penal), razão pela qual aumento a pena-base em 3 (três) meses de reclusão. Em decorrência da atenuante da confissão espontânea (art. 65, inc. III, 'd', do Código Penal), diminuo a pena em 03 (três) meses de reclusão, fixando-a provisoriamente em 01 (ano) e 06 (seis) meses de reclusão.

Na ausência de circunstâncias majorantes e minorantes, a pena provisória fica convertida em definitiva, no patamar de 01 (ano) e 06 (seis) meses de reclusão.

A pena de multa foi adequadamente fixada no mínimo legal, isto é, 10 (dez) dias-multa, à razão de 1/30 do valor do salário-mínimo vigente ao tempo dos fatos, em conformidade com o art. 49, § 1º, do Código Penal, devendo ser integralmente mantida, tendo em vista a interposição de recurso somente pela defesa.

Redimensiono, assim, a pena privativa de liberdade para 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão, mantendo a pena de multa em 10 dias-multa, à razão de 1/30 do valor do salário-mínimo vigente ao tempo dos fatos.

O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade será o semi-aberto, por conta das variáveis do art. 33, § 2º, do Código Penal, restando inviabilizada a sua substituição por restritivas de direitos, em virtude de o réu ser reincidente em crime doloso (art. 44, inc. II, do Código Penal).

 

Crime do art. 289 do Código Eleitoral

A pena abstratamente cominada ao crime do art. 289 do Código Penal é de 01 (um) a 05 (cinco) anos de reclusão e pagamento de 05 (cinco) a 15 (quinze) dias-multa, por aplicação da regra do art. 284 do mesmo código.

Quanto a esse delito, o réu registra antecedentes (fls. 80-82), e a sua conduta social também merece ser valorada negativamente, devido à evasão do sistema prisional do Estado do Paraná. A personalidade, os motivos, as circunstâncias e as consequências do crime, bem como o comportamento da vítima, em nada destoam da normalidade típica, não interferindo de maneira negativa no arbitramento da pena-base.

Considerando as circunstâncias judicias em seu conjunto, fixo a pena-base em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão.

Reconheço, a incidência da agravante da reincidência (art. 61, inc. I, do Código Penal) e da atenuante da confissão espontânea, ambas no quantitativo de 03 (três) meses de reclusão. Com isso, a pena provisória fica arbitrada em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão.

Inexistem majorantes e minorantes que incidem na hipótese, de sorte que a pena fica definitivamente fixada em 01 (ano) e 06 (seis) meses de reclusão.

Fixo a pena de multa no mínimo legal, isto é, 05 (cinco) dias-multa, à razão de 1/30 do valor do salário-mínimo vigente ao tempo dos fatos, com base no art. 49, § 1º, do Código Penal, por entender esse montante adequado e suficiente à prevenção e repreensão do crime.

A pena para o delito do art. 289 do Código Eleitoral fica, então, arbitrada em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão e 05 (cinco) dias-multa, à razão de 1/30 do valor do salário-mínimo vigente ao tempo dos fatos.

O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade também deverá ser o semi-aberto (art. 33, § 2º, do Código Penal), a qual não pode ser substituída por penas restritivas de direitos, devido ao réu ser reincidente em crime doloso (art. 44, inc. II, do Código Penal).

 

Da Soma das Penas

Como os delitos foram cometidos em concurso material, as penas devem ser somadas (art. 69, caput, do Código Penal), totalizando 03 (três) anos de reclusão e 15 dias-multa, à razão de 1/30 do valor do salário-mínimo vigente ao tempo dos fatos.

 

Da Prescrição da Pretensão Punitiva

Em face da readequação típica do segundo delito e da redução das penas impostas ao réu, as quais, em havendo concurso de crimes, devem ser consideradas isoladamente para fins de extinção da punibilidade (art. 119 do Código Penal), reconheço a prescrição da pretensão punitiva estatal em relação a ambas as infrações penais.

O art. 110 do Código Penal foi alterado pela Lei n. 12.234/2010, a qual extinguiu a prescrição da pretensão punitiva chamada pré-processual, calculada entre a data do recebimento da denúncia e a data do fato, tomando-se por base a pena aplicada na sentença condenatória, ou seja, a pena concretamente havida.

A alteração legislativa que suprimiu prescrição da pretensão punitiva pré-processual prejudica o réu e, por esse motivo, não pode ser aplicada à hipótese dos autos, em vista da garantia constitucional da irretroatividade da lei penal mais gravosa (art. 5º, inc. XL, da Constituição Federal).

Como os fatos pretensamente delituosos são anteriores à Lei n. 12.234, que data do ano de 2010, deve ser, na espécie, aplicada a antiga redação art. 110 do Código Penal, aquela vigente à época dos fatos delituosos:

Art. 110. A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 1º - A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 2º - A prescrição, de que trata o parágrafo anterior, pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou da queixa. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

As penas aplicadas para cada um dos crimes foi de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. Consequentemente, a prescrição verifica-se em 4 anos (art. 109, inc. V, do Código Penal), prazo que não sofre o acréscimo de 1/3 (um terço) relativo à reincidência (art. 110, caput, do Código Penal), por ser inaplicável à prescrição da pretensão punitiva (Súmula n. 220 do STJ).

Como entre a data dos fatos delituosos (15.12.2004 e 05.01.2005 – fls. 02-03) e o recebimento da denúncia (19.06.2012 – fl. 167) transcorreu lapso temporal superior a 7 anos, impõe-se declarar extinta a punibilidade do réu, em razão da prescrição retroativa da pretensão punitiva estatal, com fundamento no art. 107, inc. IV, c/c os arts. 109, inc. V, 110, § § 1º e 2º, e 119, todos do Código Penal.

As penas de multa, igualmente, devem ser extintas, pois prescrevem no mesmo prazo estabelecido para a prescrição da pena privativa de liberdade quando aplicadas cumulativamente, de acordo com o art. 114, inc. II, do Código Penal.

Diante do exposto:

a) dou provimento parcial ao recurso defensivo para reduzir a pena privativa de liberdade imposta ao réu pelo crime do art. 299, caput, do Código Penal a 1(um) ano e 6 (seis) meses de reclusão, mantendo a pena de multa em 10 (dez) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos;

b) aplicar, de ofício, o instituto da emendatio libelli, readequando a tipificação do segundo fato para o crime do art. 289 do Código Eleitoral, aplicando as penas de 1(um) ano e 6 (seis) meses de reclusão e multa de 5 (cinco) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente ao tempo dos fatos; e

c) reconhecer extinta a punibilidade do réu relativamente a ambos os crimes, em virtude da prescrição retroativa, com fundamento nos arts. 107, inc. IV, 109, inc. V, 110, § § 1º e 2º, 114, inc. II, e 119, todos do Código Penal.