RE - 3734 - Sessão: 29/10/2014 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por INDÚSTRIA GRÁFICA LIBARDI LTDA. M.E., CESAR ELIAS LIBARDI e FLAVIO EDUARDO LIBARDI contra a decisão que julgou procedente a representação por doação acima do limite estabelecido no art. 81, § 1º, da Lei n. 9.504/1997, condenando a empresa representada à pena de multa no valor de R$ 52.731,60 (cinquenta e dois mil, setecentos e trinta e um reais e sessenta centavos) e à proibição de contratar e participar de licitações públicas pelo prazo de cinco anos, declarando-se, ainda, a inelegibilidade dos administradores, nos termos do art. 1º, I, ‘p’, da Lei Complementar n. 64/1990.

Em suas razões recursais (fls. 78-96), os recorrentes negam que tenham realizado qualquer doação para a campanha eleitoral de 2012. Explicam que ocorreu a compra de bens, ou seja, o partido político vendeu papel recebido em doação no valor de R$ 14.400,00 (quatorze mil e quatrocentos reais). Defendem que foi uma transação comercial sem objetivo de lucro, que o partido não arrecadou recursos, somente transformou um bem material (papel) em dinheiro, cujos valores já estavam contabilizados na campanha eleitoral. Requerem o provimento do recurso com o julgamento pela improcedência da representação ou, alternativamente, a redução da multa para valor de R$ 10.546,32 (dez mil, quinhentos e quarenta e seis reais e trinta e dois centavos), equivalente ao excesso doado.

Com as contrarrazões (fls. 99-101), nesta instância, os autos foram encaminhados ao Ministério Público Eleitoral, que se manifestou pelo parcial provimento do recurso no sentido de afastar a declaração de inelegibilidade dos administradores da empresa (fls. 106-112).

É o breve relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo. Os recorrentes foram intimados da decisão em 05 de novembro de 2013 (fl. 77v.) e interpuseram o recurso no dia 08 do mesmo mês, 3 dias após o início da contagem do prazo recursal, previsto no art. 81, § 4º, da Lei n. 9.504/97.

No mérito, o cerne da controvérsia judicial consiste em saber se os representados realizaram doação para campanha eleitoral no valor de R$ R$ 14.400,00 (quatorze mil e quatrocentos reais), incompatível com o total de rendimentos da empresa no ano de 2011, a qual obteve faturamento bruto de R$ 192.648,00 (cento e noventa e dois mil, seiscentos e quarenta e oito reais).

O magistrado de primeiro grau concluiu que a comercialização do papel caracterizou-se como doação acima do limite realizada por pessoa jurídica, com fundamento nos § § 2º e 3º do art. 81 da Lei n. 9.504/97.

No entanto, não vislumbro a realização de doação para campanha eleitoral na operação realizada entre os recorrentes e o Partido Progressista.

Na defesa, a empresa alega que não realizou qualquer doação para campanha eleitoral, argumentando que houve compra e venda com o partido político.

A compra e venda constitui-se em um negócio jurídico que tem como objeto a transferência de um bem ao comprador após pagamento do preço estabelecido, conforme definição do art. 481 do atual Código Civil:

Art. 481. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro.

Da leitura do dispositivo legal precitado, é possível verificar a existência dos três elementos essenciais ao contrato de compra e venda: a coisa, o preço e o consentimento.

Sobre o contrato de compra e venda, cito os sempre pertinentes ensinamentos de Sílvio de Salvo Venosa (Direito Civil: contratos em espécie. 12 ed. São Paulo: Atlas, 2012. Coleção Direito Civil, v. 3, pág. 7):

A compra e venda caracteriza-se, portanto, entre nós, como contrato consensual, que se completa pelo mero consentimento, com efeitos exclusivamente obrigacionais, tornando-se perfeita e acabada mediante o simples acordo de vontades sobre a coisa e o preço, nos termos do art. 482 (res, pretius, consensus).

Examinando os autos, verifico que o recibo eleitoral apresentado pela defesa (fl. 45), realmente indica que sua emissão teve como causa a venda de papel doado pela empresa Celulose Riograndense ao partido político durante a campanha eleitoral de 2012. Ou seja, a efetiva doadora do papel foi a empresa Celulose Riograndense, e não a recorrente Indústria Gráfica Libardi Ltda. M.E.

Como se observa no Demonstrativo dos Recursos Arrecadados (fls. 49-50), foram registradas como doação estimada o recebimento do papel e como doação por comercialização de bens a venda do papel para a empresa recorrente, isto é, o mesmo bem foi declarado duas vezes na prestação de contas como recurso arrecadado para a campanha eleitoral.

Dessa forma, tenho que restou comprovada a realização de um contrato de compra e venda, no qual a empresa recorrente, compradora, entregou o valor mediante o recebimento do objeto vendido pelo partido político, consistente em papel que lhe havia sido doado por terceiro.

O recibo eleitoral não foi o meio adequado para a efetivação do negócio jurídico de compra e venda e gerou a ideia de que houve doação para campanha eleitoral. Porém, tenho que não restou comprovada a existência de doação, mas sim de venda.

O limite para financiamento de campanhas por parte da iniciativa privada, estabelecido pela legislação eleitoral, visa à contenção do abuso do poder econômico, garantir a lisura do processo eleitoral e, também, coibir qualquer prática que desequilibre a disputa entre os candidatos.

Na espécie, não restou malferido o texto legal, merecendo ser provido o recurso para o fim de ser julgada improcedente a representação, com a exclusão das condenações impostas na sentença.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso e julgo improcedente a representação.