RE - 4525 - Sessão: 01/10/2014 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por SINARA PAULA CALZZA ZAMBIASI contra decisão do Juízo da 161ª Zona Eleitoral – Caxias do Sul, que rejeitou exceção de pré-executividade, mantendo o redirecionamento de execução fiscal contra a agravante, na condição de sócia-gerente da empresa Credence Corretora de Seguros Ltda. ME, originalmente executada.

Em suas razões, a recorrente alega ser parte passiva ilegítima para a execução fiscal, tendo em vista jamais ter exercido a gerência administrativa da referida sociedade empresária, particularidade que impede seja a ação contra ela redirecionada, com fundamento no Enunciado da Súmula n. 435 do Superior Tribunal de Justiça. Sustenta, ainda, a impossibilidade do redirecionamento fundado no art. 135, inc. III, do Código Tributário Nacional, visto que as multas eleitorais não têm natureza tributária (fls. 02-22).

Em contrarrazões, a União defende, em síntese, que os documentos de fls. 36 e 74-75 comprovam que a agravante era sócia-gerente ao tempo da dissolução irregular da empresa, o que permite o redirecionamento da execução fiscal contra a mesma, em conformidade com o Enunciado da Súmula n. 435 do Superior Tribunal de Justiça e o art. 1016 do Código Civil (fls. 102-103).

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso, por entender inviável dilação probatória em sede de exceção de pré-executividade para apurar eventual ilegitimidade passiva da recorrente, e por considerar possível o redirecionamento da execução fiscal contra a pessoa do sócio-gerente em caso de dívida não tributária (fls. 105-109).

É o relatório.

VOTO

1. Admissibilidade

Preliminarmente, destaco ser cabível a interposição de agravo de instrumento na hipótese dos autos, uma vez que, por força do art. 367, inc. IV, do Código Eleitoral, as ações executivas para a cobrança de dívida eleitoral se sujeitam às normas previstas na Lei n. 6.830/1980 e no Código de Processo Civil, aplicado subsidiariamente, em conformidade com o art. 1º daquela lei (TSE - AgR-REspe: 772959 RJ, relator: Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, data de julgamento: 05.11.2013, data de publicação: DJE, tomo 229, data 02.12.2013, página 36).

Ademais, o recurso é tempestivo. A decisão que rejeitou a exceção de pré-executividade foi publicada no DEJERS n. 66, de 14.04.2014 (fl. 93v), e o recurso interposto em 23.04.2014 (fl. 02), dentro do prazo de 10 dias previsto no art. 522, caput, do Código de Processo Civil.

Portanto, conheço o recurso.

2. Mérito

A execução fiscal originária tem por objeto multa eleitoral aplicada à empresa Credence Corretora de Seguros Ltda. ME, por causa de doação acima do limite legal, prevista no art. 81, § 1º, da Lei n. 9.504/1997, realizada durante as eleições de 2012 (fl. 25).

Devido ao fechamento da empresa, certificado por oficial de justiça (fl. 27v), a União requereu o redirecionamento do feito contra a agravante, na qualidade de sua sócia-gerente, com base no Enunciado da Súmula n. 435 do Superior Tribunal de Justiça e no art. 135, inc. III, do Código Tributário Nacional (fls. 32-33).

Contra a decisão que deferiu esse pedido (fl. 44), a recorrente opôs exceção de pré-executividade (fls. 48-60), a qual foi rejeitada pelo juízo de primeiro grau (fls. 86-93), ensejando a interposição do presente agravo de instrumento. Por meio desse recurso, a agravante busca o reconhecimento da sua ilegitimidade para integrar o polo passivo da ação executiva, sob o fundamento de serem inaplicáveis o enunciado da referida súmula e o Código Tributário Nacional à execução fiscal de origem.

O recurso, entretanto, não merece provimento.

A agravante alega que a execução fiscal não pode ser redirecionada contra a recorrente com respaldo no art. 135, inc. III, do Código Tributário Nacional, em razão de as multas eleitorais constituírem dívida ativa de natureza não tributária, segundo disposto no art. 367, incs. III e IV, do Código Eleitoral, assertiva que se coaduna com a orientação do Tribunal Superior Eleitoral, ilustrada no seguinte precedente:

Execução fiscal. Redirecionamento contra presidente de partido. Multa eleitoral. Natureza não tributária. 1. Conforme a jurisprudência do TSE, a multa eleitoral constitui dívida ativa de natureza não tributária. Precedentes: AgR-REspe nº 203-47, rel. Min. Dias Toffoli, PSESS em 23.10.2012; AgR-REspe nº 183-54, de minha relatoria, DJE de 17.4.2013. 2. O art. 135, III, do Código Tributário Nacional é inaplicável às execuções de dividas decorrentes de multa que não possua natureza tributária, o que obsta a inclusão do dirigente na condição de responsável no polo passivo da demanda executiva. Precedentes do STJ: AgRg no Ag nº 1.208.897, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE de 22.2.2011; REsp nº 1.038.922, relª. Minª. Eliana Calmon, DJE de 4.11.2008. Agravo regimental a que se nega provimento.

(TSE - ARESPE: 26242 AC, relator: Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, data de julgamento: 12.11.2013, data de publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, tomo 23, data 03.02.2014, página 296.) (Grifei.)

Todavia, o redirecionamento da ação executiva permanece viável com base no art. 4º, § 2º, da Lei n. 6.830/1980 c/c o art. 50 do Código Civil. O primeiro dispositivo legal determina a aplicação das normas relativas à responsabilidade previstas na legislação tributária, civil e comercial à dívida ativa da Fazenda Pública, atraindo a incidência do art. 50 do Código Civil, que autoriza a desconsideração da personalidade jurídica para alcançar o patrimônio dos sócios-gerentes responsáveis pelas condutas ilegais, sempre que se caracterizar excesso de mandato, desvio de finalidade ou confusão patrimonial.

Nesse sentido, a cópia da 1ª Alteração do Contrato Social da empresa Credence Corretora de Seguros Ltda. ME demonstra que a agravante ingressou na sociedade, na condição de sócia-gerente, em 21.02.2008 (fls. 74-75). Esse fato pode ser igualmente verificado no espelho da consulta do nome da agravante e da empresa junto ao Sistema Nacional de Registro de Empresas Mercantis/SINREM (fls. 34-37).

Não bastasse isso, a multa foi imposta à empresa executada em acórdão publicado no dia 11.12.2012 (fl. 25), com trânsito em julgado em 14.12.2012 (informação obtida junto ao Sistema de Andamento de Documentos e Processos deste Tribunal/SADP), época em que a recorrente já desempenhava a gerência da sociedade, sendo, assim, responsável pela prática da doação ilegal.

Eventual discussão sobre os poderes de gestão que a agravante efetivamente exercia, em virtude da sua designação contratual como administradora técnica, requer produção de prova, a qual é vedada no âmbito da exceção de pré-executividade. Essa via de defesa é destinada ao enfrentamento de matérias de ordem pública que prescindem de dilação probatória, consoante diretriz jurisprudencial consolidada no Enunciado da Súmula n. 393 do Superior Tribunal de Justiça:

Súmula 393 - A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória.

Além disso, segundo a certidão de fl. 27v, emitida em 24.07.2013, o oficial de justiça deixou de cumprir o mandado de citação, penhora e avaliação expedido nos autos da execução fiscal, porque a empresa não mais funcionava no local de suas atividades, noticiando a desocupação do andar do prédio por ela utilizado e a existência de obras no local.

Essa circunstância constitui indício substancial do encerramento irregular da empresa, que embasa o redirecionamento do pleito executivo à agravante, de acordo com entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL - EXECUÇÃO FISCAL - REDIRECIONAMENTO - DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE CERTIFICADA POR OFICIAL DE JUSTIÇA - CABIMENTO. 1. A certidão do oficial de justiça que atesta o encerramento das atividades da empresa no endereço fiscal é indício de dissolução irregular apto a ensejar o redirecionamento da execução fiscal. Precedentes. 2. A não localização da empresa no endereço fornecido como domicílio fiscal gera presunção iuris tantum de dissolução irregular. Possível, assim, a responsabilização do sócio-gerente, a quem caberá o ônus de provar não ter agido com dolo, culpa, fraude ou excesso de poder. 3. Recurso especial não provido.

(STJ - REsp: 1344414 SC 2012/0194798-4, relator: Ministra ELIANA CALMON, data de julgamento: 13.08.2013, T2 - SEGUNDA TURMA, data de publicação: DJE 20.08.2013.) (Grifei.)

Acrescento que o espelho de consulta do nome da sociedade empresária junto ao SINREM (fls. 36-37) não contém informação acerca de seu encerramento, bem como o seu CNPJ continua em situação ativa (fl. 84). Esses dados revelam que a pessoa jurídica encerrou suas atividades sem comunicar a Junta Comercial e a Secretaria da Receita Federal, desatendendo aos requisitos exigidos nos arts. 51, § 1º, 1.150 e 1.151 do Código Civil.

Como a agravante compunha o quadro societário ao tempo do fechamento irregular da empresa, e essa circunstância implica a responsabilidade subsidiária dos sócios, torna-se admissível o redirecionamento da execução fiscal contra a mesma, em conformidade com o Enunciado da Súmula n. 435 do Superior Tribunal de Justiça, abaixo transcrito:

Súmula 435 - Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.

Ressalto que a dissolução irregular da sociedade acarreta a inversão do ônus probatório, passando a incumbir à agravante a prova de eventual inocorrência de dolo, culpa, fraude ou excesso de poder de sua parte relativamente à doação ilícita, na sede própria dos embargos à execução, descabida na via da exceção de pré-executividade, como anteriormente dito.

O encerramento irregular da empresa sem a devida comunicação ao órgão competente faz presumir o abuso da personificação jurídica, na medida em que o esvaziamento do patrimônio societário impede a satisfação dos credores em favor dos sócios ou de terceiros, consubstanciando a figura do desvio de finalidade ou da confusão patrimonial dependendo das especificidades do caso concreto.

Desse modo, correta a decisão agravada que rejeitou a exceção de pré-executividade, mantendo o comando decisório de redirecionamento da execução fiscal em desfasvor da recorrente.

Diante do exposto, VOTO no sentido de negar provimento ao recurso.