RE - 23032 - Sessão: 08/09/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por ZENY DOS SANTOS OLIVEIRA e FRANCISCO ELIFALETE XAVIER contra a sentença que julgou improcedente a ação de investigação judicial eleitoral proposta em face de JORGE SANDI MADRUGA e GILMAR CARTERI, considerando não demonstrada a prática das condutas descritas nos artigos 41-A e 73, inciso IV, da Lei n. 9.504/97.

Em suas razões recursais, suscitam a preliminar de nulidade do processo por cerceamento de ação, argumentando que foi vedada a dilação da prova oral com a limitação do número de testemunhas e indeferimento da oitiva de Antônia da Silva. No mérito, alegam que restaram comprovadas as práticas das condutas imputadas aos recorridos: a) realização de jantares abertos durante período vedado, b) a utilização de obras federais em material associativo de campanha, c) a compra de votos mediante doação de animais, d) a compra de votos mediante a distribuição de combustível, e) a realização de intensa propaganda eleitoral articulada mediante mensagem de voz em período vedado e f) solicitação de votos mediante atendimentos médicos em estabelecimento público de saúde remunerado pelo sistema único de saúde. Requerem a decretação da nulidade do processo ou a reabertura da instrução com a oitiva de testemunhas e complementação de documentação ou a reforma da decisão com o julgamento de procedência da ação (fls. 355-367).

Nas contrarrazões os recorridos suscitam a preliminar de carência da ação, pois a demanda foi ajuizada após o pleito e os candidatos representados não foram eleitos, inexistindo registro ou diploma a ser cassado, merecendo ser extinto o feito. No mérito, requerem o desprovimento do recurso (fls. 372-382).

A Procuradoria Regional Eleitoral manifesta-se pelo desprovimento do recurso (fls. 83-85v.).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e merece conhecimento.

Passo ao exame das preliminares e adianto que não prosperam.

Não há cerceamento ao direito de ação dos recorrentes em razão da restrição do número de testemunhas ao limite legal e negativa de intimação de testemunhas para comparecimento em audiência, porquanto o TSE tem firme entendimento de que a limitação do número de testemunhas - 6 (seis) testemunhas para cada parte, independentemente da quantidade de fatos e do número de recorrentes ou de recorridos - se mostra adequada à harmonização do princípio da celeridade processual com o princípio do devido processo legal (Agravo Regimental em Recurso Contra Expedição de Diploma n. 671, Acórdão de 27.11.2007, Relator Min. Carlos Augusto Ayres de Freitas Britto, Publicação: DJ - Diário de justiça, Volume 1, Data 11.12.2007, Página 140).

Além disso, o art. 22, V, da LC n. 64/90 dispõe que as testemunhas devem comparecer à audiência, "independentemente de intimação". Para o TSE Não há cerceio de defesa se o juiz - mesmo após determinar que a parte indique os endereços de suas testemunhas - deixa consumar as respectivas intimações, advertindo para a necessidade de comparecimento espontâneo. (Recurso Especial Eleitoral n. 35932, Decisão Monocrática de 14.04.2010, Relator Min. Aldir Guimarães Passarinho Junior, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Data 23.04.2010, Págs. 106-111.)

Ressalto que cabe à parte que arrolou a verificação prévia acerca do comparecimento ou não das testemunhas, ou mesmo promover esforços para que a prova seja produzida, não sendo cabível o pedido de renovação da audiência de instrução sem a demonstração de justo motivo para o comparecimento das testemunhas.

A questão do cerceamento foi bem analisada pelo juízo a quo em sede de embargos declaratórios (fl. 350-350v.), tendo a magistrada consignado, quanto ao pedido de nova data para a inquirição da testemunha Antônia Silva, que foi realizada diligência pelo Cartório Eleitoral e lavrado o Auto da fl. 231, não restando confirmada a alegação de que a testemunha não havia comparecido à audiência de instrução por ter sido ameaçada.

Ademais, o juiz é o destinatário das provas e o condutor da instrução, cabendo-lhe indeferir as diligências e oitivas que entender desnecessárias ao deslinde dos fatos ou protelatórias.

Assim, rejeito a prefacial.

Também merece desacolhida a preliminar de carência de ação, porque os recorridos não foram eleitos na eleição de 2012, porquanto, além das sanções de cassação do registro do diploma ou de candidatura, eventual procedência da ação poderia cominar a declaração da inelegibilidade ou até mesmo a condenação ao pagamento das multas previstas nos arts. 41-A ou 73 da Lei das Eleições.

Com estes fundamentos, afasto a matéria preliminar.

No mérito, os recorrentes sustentam que os fatos alegados possuem carga probante e segura para gerar o juízo de condenação.

Passo ao exame.

Jantares com distribuição de alimentação para eleitores e simpatizantes durante o período eleitoral.

Primeiramente, diga-se que não constitui conduta ilegal a realização de jantares para apoio a candidaturas, prática que, inclusive, é muito adotada pelos participantes do pleito para arrecadar recursos na campanha e reunir correligionários.

Além disso, eventual irregularidade na arrecadação ou nos gastos realizados por candidatos deve ser apurada através da representação prevista no artigo 30-A da Lei das Eleições, relativa à captação e gastos ilícitos de campanha.

Dito isso, tenho que não restou comprovada captação ilícita de sufrágio ou prática de condutas vedadas nos jantares em questão.

A fotografia da fl. 100 mostra um local em que várias pessoas estão fazendo refeições, aí incluindo os representados, mas nada há que represente qualquer ilicitude na imagem. Sequer aparece qualquer propaganda eleitoral na foto e o local está decorado com bandeirinhas de São João. Pela luz que vem da janela, bem se vê que não se trata de um jantar, mas sim de um almoço.

A prova testemunhal tampouco corrobora a alegada ilicitude eleitoral pois, conforme bem referido na sentença, a testemunha dos representantes, Waldecir Silveira de Lemos (CD à fl. 227), apenas afirmou ter sido convidado para cantar em um jantar em que os representados estavam, e a testemunha Rogério Henrique da Silva Colares (CD à fl. 250) somente declarou ter promovido um jantar em que foi servido um sopão, no mês de agosto de 2012, que se tratava de um evento aberto para o qual foram convidadas várias pessoas além dos representados.

Ainda que os representados tenham feito o uso da palavra nos aludidos eventos, não há ilicitude capaz de gerar a condenação.

Divulgação de obras federais no material de campanha dos recorridos.

Os recorrentes alegam que os recorridos se locupletaram indevidamente ao utilizar na sua campanha eleitoral propaganda de programas e obras realizadas pelo governo federal, conforme documentos das fls. 97, 98 e 202.

No entanto, conforme bem refere a sentença recorrida, não é vedada a associação de conquistas de correligionários do partido na campanha eleitoral de um candidato. Não prospera a tese recursal de que “programas custeados pelo poder público não podem ser alvo de locupletamento político-eleitoral”, pois não há previsão legal de ilicitude para este fato.

Consoante bem refere a sentença, o art. 73, inciso VI, da Lei das Eleições apenas proíbe, nos três meses que antecedem o pleito, a autorização de publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos, situação que não ocorreu na espécie, pois não se trata de propaganda institucional, mas sim de propaganda eleitoral.

Portanto, nada há de ilegalidade neste fato, não se conformando a hipótese na configuração de abuso de poder ou conduta vedada.

Prática de captação ilícita de sufrágio mediante doação de animais a eleitores com atividade agropecuária na zona rural de São José do Norte em troca de voto e de apoio político.

Os recorrentes sustentam que o fato estaria comprovado pela escuta ambiental da conversa realizada entre José de Lemos Porto, conhecido como “Zé Cabrito”, e José Antônio Furtado (degravação à fl. 113 e CD à fl. 118) e pelas testemunhas Paolo Saraiva (CD à fl. 227) e Laureci Abreu Amorim (CD à fl. 250).

Destaco que a gravação de áudio não confirma a entrega de um “tourinho em troca de voto”. Conforme consta na degravação da fl. 113, Zé Cabrito disse gostar de Luis Carlos Pereira, o Caio, “ele é bom pra mim, me dá tudo”. Ao ser indagado sobre ter recebido o touro em troca de voto, não confirmou o fato, limitando-se a dizer que recebeu um “terneiro”, sem indicar a motivação eleitoreira.

Com igual sorte, a prova testemunhal não comprova o alegado.

A testemunha Paolo Saraiva Garcia (CD à fl. 227), afirmou que teve conhecimento da doação de bebidas e comida em troca de voto, porém, de forma vaga e sem maiores detalhes, apenas dizendo tratar-se de boatos. O mesmo em relação à doação de combustíveis. Quanto à doação de animais, disse que, no dia 15.11.12, encontrou com o Sr. Zé Cabrito na barbearia do Sr. Lauro, que lhe contou ter recebido um terneiro, no valor de R$ 1.500,00, para votar no recorrido Jorge Sandi Madruga.

Como o Sr. José Cabrito não foi ouvido e a testemunha Paolo apenas ouviu falar do fato, sem presenciar a oferta, tenho que o depoimento não se presta para comprovar a alegação.

A testemunha Laureci Abreu Amorim (CD à fl. 250), proprietário da barbearia referida por Paolo, disse que ouviu José Cabrito dizer que pediu a Caio um tourinho em troca do seu voto. Afirmou que Zé Cabrito disse ter pedido o terneiro, e não que havia recebido o animal. Laureci contou que Zé Cabrito e Caio são amigos, e que depois dos fatos Zé Cabrito disse que havia falado de brincadeira e que não era verdade. Aliás, ambas as testemunhas afirmaram que Zé Cabrito é uma pessoa muito brincalhona.

Portanto, o fato não está comprovado nos autos.

Quanto à distribuição de combustíveis em troca de votos, tenho que a própria alegação recursal reconhece que a prova é fraca e apenas indiciária, uma vez que as testemunhas apenas tangenciaram o assunto sem nada a acrescentar que conduzisse a um juízo de convicção, já se mostrando suficiente para afastar a acusação. O mesmo ocorre com a acusação de uso de recursos públicos da saúde para engendrar a atividade político-eleitoral nos atendimentos do recorrido Gilmar Carteri, consoante se extrai das razões recursais (fl. 366):

Os pedidos expressos de apoio e votos não restaram suficientemente comprovados, embora a prova documental tenha demonstrado, de maneira inquestionável que o segundo Representado continuou intensificando suas atividades médicas no hospital público local, único aberto 24h, atendendo mais do que nunca e distribuindo receituários para dispensação de medicação controlada a pacientes que a utiliza, sobretudo de forma contínua; fls. 139-140. Certo que não precisava, diante da ausência de vedação, deixar suas atividades no hospital, mas não podia lá fazer campanha eleitoral com dinheiro público, “opinião” das fls. 137-138, de data desconhecida, sobretudo ostensiva como realizou, impingindo até dependência psicológica aos pacientes. (Grifos do original.)

Destaco que os documentos citados pelos recorrentes tratam de parecer informando a ausência de necessidade de desincompatibilização de candidato que exerce a função de médico em hospital público e ofício informando a quantidade de plantões anuais do recorrido Gilmar, que de nada servem para provar a alegada ilicitude.

Em relação à alegação de veiculação de propaganda extemporânea, destaco que há procedimento próprio previsto na Lei n. 9.504/97 relativo às representações eleitorais por propaganda irregular, destinado a apurar este tipo de impropriedade, que não é analisada em sede de investigação judicial eleitoral, cujo rito está previsto no art. 22 da LC n. 64/90 e é específico para a apuração de uso indevido, desvio ou abuso de poder e, ainda, utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social.

Nessas circunstâncias, conforme os próprios recorrentes reconhecem, tem-se que o caderno probatório e as razões recursais não trazem elementos suficientes para alterar a convicção do julgado, não havendo se falar em renovação da instrução diante do juízo de improcedência da ação.

Ante o exposto, afasto a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso.