RC - 8272 - Sessão: 09/09/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral contra decisão do Juízo da 37ª Zona Eleitoral - Rio Grande, que rejeitou a denúncia formulada em desfavor de CARLA NOGUEIRA PETRUZZI, EDSON GOMES LOPES e SANDRA MARA DE OLIVEIRA (fls. 116-120v.).

O Ministério Público imputa aos denunciados a prática do crime previsto no artigo 350 do Código Eleitoral, e a CARLA, ainda, o delito contido no art. 353 c/c art. 350, caput, do mesmo diploma legislativo, em razão dos seguintes fatos descritos na peça acusatória (fls. 02-06):

1) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, a denunciada CARLA inseriu, em documento particular (recibo da fl. 141 do apenso I, vol. I, em nome de Sandra Mara Borges Cozza), declaração falsa, para fins eleitorais.

2) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, a denunciada CARLA inseriu, em documento particular (recibo da fl. 183 do apenso I, vol. I, em nome de Cláudia Silva do Amaral), declaração falsa, para fins eleitorais.

3) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, os denunciados EDSON e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, fizeram inserir, em documento particular (recibo da fl. 141 do apenso I, vol. I, em nome de Sandra Mara Borges Cozza), declaração falsa, para fins eleitorais.

4) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, os denunciados EDSON e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, fizeram inserir, em documento particular (recibo da fl. 183 do apenso I, vol. I, em nome de Cláudia Silva do Amaral), declaração falsa, para fins eleitorais.

[…]

5) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, as denunciadas CARLA e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, inseriram e fizeram inserir, em documento particular, declaração falsa, para fins eleitorais (recibo da fl. 206 do apenso I, vol. I, em nome de Marco Antônio Azambuja Peres).

6) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, as denunciadas CARLA e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, inseriram e fizeram inserir, em documento particular, declaração falsa, para fins eleitorais (recibo da fl. 207 do apenso I, vol. I, em nome de Maria Conceição dos Santos Rodrigues).

7) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, as denunciadas CARLA e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, inseriram e fizeram inserir, em documento particular, declaração falsa, para fins eleitorais (recibo da fl. 209 do apenso I, vol. I, em nome de Maria Luiza Amaral).

8) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, as denunciadas CARLA e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, inseriram e fizeram inserir, em documento particular, declaração falsa, para fins eleitorais (recibo da fl. 210 do apenso I, vol. I, em nome de Letícia Barbosa Cecere).

9) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, as denunciadas CARLA e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, inseriram e fizeram inserir, em documento particular, declaração falsa, para fins eleitorais (recibo da fl. 211 do apenso I, vol. I, em nome de Cláudia Maria Schmitt Oliveira).

10) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, as denunciadas CARLA e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, inseriram e fizeram inserir, em documento particular, declaração falsa, para fins eleitorais (recibo da fl. 212 do apenso I, vol. I, em nome de Pierry Camargo Amorim).

11) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, as denunciadas CARLA e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, inseriram e fizeram inserir, em documento particular, declaração falsa, para fins eleitorais (recibo da fl. 213 do apenso I, vol. I, em nome de Mayra Rocha).

12) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, as denunciadas CARLA e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, inseriram e fizeram inserir, em documento particular, declaração falsa, para fins eleitorais (recibo da fl. 214 do apenso I, vol. I, em nome de Maria Carmen da Conceição Barbosa).

13) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, as denunciadas CARLA e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, inseriram e fizeram inserir, em documento particular, declaração falsa, para fins eleitorais (recibo da fl. 215 do apenso I, vol. I, em nome de Claudete Maria Rocha).

14) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, as denunciadas CARLA e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, inseriram e fizeram inserir, em documento particular, declaração falsa, para fins eleitorais (recibo da fl. 216 do apenso I, vol. I, em nome de Ângelo Fonseca Barbosa).

15) No dia 05 de agosto de 2012, por volta das 12 horas, nas dependências da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), situada à Travessa Visconde de Itaboraí, s/nº, nesta Cidade, as denunciadas CARLA e SANDRA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, inseriram e fizeram inserir, em documento particular, declaração falsa, para fins eleitorais (recibo da fl. 218 do apenso I, vol. I, em nome de Samira Vieira Fernandes). [...]

[…]

16) No dia 06 de dezembro de 2012, em horário desconhecido, no Cartório da 37ª Zona Eleitoral desta Cidade, a denunciada CARLA fez uso de documentos falsificados, para fins eleitorais.

[…] Assim agindo, incorreram os denunciados CARLA NOGUEIRA PETRUZZI treze vezes (fatos 01, 02 e 05 a 15); EDSON GOMES LOPES duas vezes (fatos 03 e 04) e SANDRA MARA DE OLIVEIRA treze vezes (fatos 03, 04 e 05 a 15) nas sanções do art. 350, caput, da Lei nº 4.737/65, na forma dos arts. 29, caput, e 71, caput, do Código Penal; e a denunciada CARLA NOGUEIRA PETRUZZI (fato 16) nas sanções do artigo 353 c/c artigo 350, caput, ambos da Lei nº 4.737/65, motivo pelo qual o Ministério Público Eleitoral oferece a presente denúncia, requerendo que, recebida e autuada, sejam os denunciados citados para interrogatório e defesa que tiverem, ouvidas as pessoas abaixo arroladas, cumpridas as demais formalidades legais, até final julgamento e condenação.

A denúncia foi rejeitada, visto que os mesmos fatos foram amplamente debatidos por ocasião da improcedência da Representação Eleitoral n. 1-26.2013.6.21.0037 (fls. 88-101), proposta pelo órgão ministerial contra Alexandre Lindenmeyer e Eduardo Arthur Lawson, escolhidos Prefeito e Vice-prefeito de Rio Grande no último pleito, decisão confirmada neste Tribunal, por unanimidade (fls. 102-111).

Em suas razões recursais, o Ministério Público Eleitoral sustenta, em síntese, a independência entre as esferas cível-eleitoral e penal; que a prova produzida na ação eleitoral é limitada (em especial em relação ao número de testemunhas); que não teve oportunidade de produzir toda a prova necessária na ação penal; e que existem provas do cometimento dos delitos pelos acusados a embasar a persecução penal.

Com as contrarrazões (fls. 142-148), os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que emitiu parecer pelo provimento do recurso (fls. 154-160v.).

 

 

VOTO

1. Admissibilidade

O recurso é tempestivo. O Ministério Público Eleitoral foi intimado da sentença no dia 03.04.2014 (fl. 121); e o recurso, interposto em 07.04.2014 (fl. 122), dentro do prazo de dez dias previsto no art. 362 do Código Eleitoral.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

2. Mérito

Trata-se de recurso interposto contra sentença que rejeitou a denúncia.

O recebimento da peça acusatória, nos termos do artigo 41 do Código de Processo Penal, exige que esta esteja lastreada em um conjunto probatório idôneo o suficiente para dele se inferirem a comprovação da ocorrência do delito e indícios suficientes de sua autoria.

No voto proferido nos autos do Inquérito n. 2.829, caso semelhante ao dos autos, o Supremo Tribunal Federal assentou que o exame para recebimento da denúncia é meio também para que se resguardem os direitos fundamentais do indivíduo denunciado, que pode vir a ser injustamente submetido à tormentosa via crucis do processo penal.

Naquela ocasião, o Ministro Gilmar Mendes ensinou que surge nesse exame a complexa relação conflituosa entre o interesse público de efetiva persecução penal e os direitos e garantias fundamentais individuais, ponderando que, sendo a responsabilidade penal eminentemente subjetiva, e estando o indivíduo no centro das preocupações do processo penal, são necessários rigor e prudência por parte do Poder Judiciário no recebimento de denúncias, visto que imputações incabíveis, que dão ensejo à persecução criminal injusta, violam o princípio da dignidade da pessoa humana.

É inadmissível, por violar tal princípio, o uso do processo penal como substitutivo de uma pena que se revela tecnicamente inaplicável ou a preservação de ações penais ou de investigações criminais cuja inviabilidade já se divisa de plano.

Desse modo, muitas vezes a análise quanto à presença dos indícios de materialidade e de autoria delitiva pode levar o órgão julgador a se pronunciar, ainda que de forma preliminar e precária, sobre a própria existência e conformação dos fatos delituosos, bem como sobre a configuração e os modos de participação e de autoria. O pronunciamento antecipado do órgão julgador a respeito da materialidade e da autoria é, assim, inevitável em alguns casos; porém é resultado da atitude diligente e responsável desse órgão numa fase processual em que está em jogo a própria dignidade do indivíduo denunciado.

Assim restou ementado o referido julgado:

Inquérito. Direito Penal e Processo Penal. Denúncia por suposta prática do crime descrito no art. 350 do Código Eleitoral. 2. Candidato ao cargo de Deputado Federal. Omissão de receita e de informação de despesa por ocasião da prestação de contas à Justiça Eleitoral. 3. Omissão de receita. Irregularidade formal. Contas aprovadas pelo Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais. Ausência de justa causa. 4. Omissão de informação de despesa. Falta de comprovação mínima de materialidade e autoria. 5. Denúncia improcedente.

(Inq. 2829, Relator: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 21.02.2013, Acórdão Eletrônico DJe-190, Divulg. 26.09.2013, Public. 27.09.2013.)

Feitas estas breves considerações preliminares, passa-se à análise do recurso.

O delito descrito na denúncia vem contemplado no art. 350 do Código Eleitoral, assim redigido:

Art. 350. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais:

Pena - reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa, se o documento é público, e reclusão até três anos e pagamento de 3 a 10 dias-multa se o documento é particular.

Isso porque os denunciados teriam inserido, em documento particular (recibos), declaração falsa para fins eleitorais (integrar prestação de contas da campanha e obter o aval da Justiça Eleitoral no julgamento das contas).

A denunciada Carla também teria incorrido nas penas do art. 353 do Código Eleitoral, cuja redação é a seguinte:

Art. 353. Fazer uso de qualquer dos documentos falsificados ou alterados, a que se referem os artigos. 348 a 352:

Pena - a cominada à falsificação ou à alteração.

Segundo a peça inicial, Carla teria feito uso de documentos falsificados ao inseri-los, quando atuava como tesoureira da campanha, nos autos da prestação de contas (processo n. 520-35.2012.6.21.0037).

Os fatos examinados nestes autos também o foram na Representação n. 1-26.2013.6.21.0037 e, conforme já mencionado, na Prestação de Contas n. 520-35.2012.6.21.0037.

Na representação, a decisão transitada em julgado estampa que os fatos relacionados à confecção de recibos do evento, bem como de outras situações apontadas naquela ação, decorreram de desorganização e de descontrole por parte dos acusados. Vejamos:

[...] Do Almoço Realizado na AABB […] De fato, ainda que a prestação de contas do evento não tenha primado pela melhor técnica, apresentando irregularidades, tenho que tais falhas são meramente formais, decorrentes da desorganização e amadorismo dos militantes partidários que organizaram o evento. Ou seja, embora descumpridas as formalidades da legislação eleitoral, os elementos probatórios em nada indicam a ocorrência de fraude ou má-fé por parte dos organizadores da campanha e muito menos por parte dos representados, então candidatos, que não participaram nem se envolveram com a organização do evento, relegada aos partidos da Coligação. Assim, embora não se tenha chegado à contabilização do número exato de participantes do evento, é crível a quantidade e o número de ingressos declarados nos recibos eleitorais, bem como a dificuldade de informar os dados completos de todos os participantes e de todos aqueles que adquiriam ingressos apenas a título de colaboração, diante do grande número de ingressos comercializados e da grande adesão ao evento, realizado pelos próprios militantes do partido, consoante prova testemunhal uníssona, sem a contratação de empresa especializada na produção de eventos de tal porte. Registra-se, ainda, que a quantidade de pessoas declarada é compatível com o local, [...] Dos Recibos Eleitorais Relacionados ao Evento Alega o MPE a ocorrência de verdadeira fraude na confecção dos recibos eleitorais que integraram a prestação de contas apresentadas à Justiça Eleitoral.É incontroverso que foram contratados cerca de quarenta e cinco garçons para atender o almoço, percebendo cada um R$40,00 (quarenta reais) pelos serviços prestados, e que apenas doze assinaram recibos no valor de R$150,00 (cento e cinquenta reais), porque a maioria apresentou-se para trabalhar sem a posse de documento de identificação hábil para a confecção dos recibos eleitorais. No mesmo sentido é o depoimento das testemunhas.Ora, somando-se os valores registrados nos recibos e dividindo-se pelo número de garçons que atenderam ao evento, chega-se à média de R$40,00 (quarenta reais) per capita pelo serviço prestado, valor razoável e dentro da média de mercado para a prestação do serviço em análise. Não há, portanto, que se falar em fraude ou omissão, mas apenas em irregularidade formal, na medida que o valor total gasto com esse serviço aportou à prestação de contas e o pagamento foi realizado com verba oriunda da conta bancária da campanha.Quanto aos recibos eleitorais referentes à venda de ingressos, também incontroverso que em sua maioria foram emitidos em nome das pessoas encarregadas da venda, e durante a realização do evento, fato plenamente justificável, posto que na prática o comum é a distribuição de ingressos sem pagamento, cobrando-se os respectivos valores por ocasião do comparecimento ao evento. Com a devida vênia, não há que se presumir má-fé em tal prática, não tendo restado comprovado qualquer intuito fraudulento em tal sentido, mas sim, de forma clara, a desorganização e descontrole por parte dos organizadores, o que confirma a finalidade de mobilização do evento, e não de arrecadação. […] (fls. 88-111) (Grifei.)

A par disso, a prestação de contas do candidato foi, por unanimidade, aprovada com ressalvas.

Diante desse quadro fático, em que a suposta falsificação de documentos - e sua posterior utilização - foi tratada como falta de técnica, amadorismo, desordem e desorganização, não obstando, por conseguinte, a aprovação da própria prestação de contas, mostra-se incongruente e desarrazoado emprestar-lhe relevância criminal.

Conquanto inolvidável a separação de instâncias, no caso, é invencível a limitação imposta ao caráter subsidiário do direito penal.

O Supremo Tribunal Federal, ao analisar situação semelhante, em que o acusado teria falsificado documento para transferência de domicílio – que foi deferida administrativamente -, proferiu julgado reconhecendo a atipicidade da conduta, no seguinte sentido:

DENÚNCIA. CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA EM DOCUMENTO PÚBLICO. ALEGAÇÃO FALSA PARA JUSTIFICAR A TRANSFERÊNCIA DE DOMICÍLIO ELEITORAL (ART. 350 DO CÓDIGO ELEITORAL). 1. A transferência de domicílio eleitoral solicitada pelo denunciado foi deferida pelo TRE/BA, com base na presença de outros elementos comprobatórios do domicílio para fins eleitorais. 2. Presente a circunstância referida no item anterior, eventual incorreção em um dos documentos apresentados para instruir o pedido de transferência não acarreta lesão ao bem jurídico protegido pelo tipo penal: a fé pública no âmbito eleitoral. Nesses termos, é atípica a conduta descrita. 3. Denúncia rejeitada.

(Inq. 3147, Relator: Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 13.02.2014, Acórdão Eletrônico DJe-114, divulg. 12.06.2014, public. 13.06.2014.)

Também no caso ora examinado não se extrai do comportamento dos acusados qualquer lesão à fé pública eleitoral.

Apesar de o Ministério Público alegar que sua oportunidade de produção de provas na representação foi limitada pelas regras da própria ação eleitoral, os elementos constantes do inquérito policial possibilitam uma ampla análise dos fatos ocorridos no evento realizado para promoção da candidatura de Alexandre Duarte Lindenmeyer.

A sentença proferida na representação fez a adequada análise desses elementos, ponderando a quantidade de pessoas presentes no evento e os valores envolvidos, para concluir que os recibos de venda de ingressos representaram, de fato, o valor arrecadado, e os recibos dos garçons refletiram os valores dispendidos.

O amadorismo e a desorganização justificam, de certa maneira, os ‘ajustes’ efetuados pelos acusados na emissão de recibos identificados para que a contabilidade ‘fechasse’, não se verificando dolo ou má-fé.

A título de exemplo, nos depoimentos colhidos no inquérito, é possível divisar que alguns garçons assinaram o recibo em seu nome e em nome de outros que não portavam CPF na ocasião (declarações de Pierry Camargo Amorim – fl. 19, Claudete Maria Rocha – fl. 20 e Angelo Fonseca Barbosa – fl. 23); e que outros garçons não assinaram recibo algum (declarações de Alexya Afonso Rodrigues – fl. 31, e Natalya Soares Rodrigues – fl. 34).

Tais declarações foram suficientes para que a delegada que conduziu as investigações não constatasse a presença de indícios de prática de crime (fls. 82-84), subsidiando o juízo a quo na rejeição da denúncia (fls. 116-120).

Nesse contexto, mostram-se frágeis e insuficientes para sustentar a persecução penal os elementos de prova indicados pela acusação. É certo que a inicial não precisa ser instruída com prova absoluta da materialidade, mas deve conter um mínimo que demonstre ser ela viável.

Assim, por não se verificar a presença dos elementos do fato típico, mantenho a decisão desafiada, por todos os seus fundamentos.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso para o fim de manter a decisão recorrida.