REl - 0600372-59.2024.6.21.0067 - Voto Relator(a) - Sessão: 14/04/2025 00:00 a 15/04/2025 23:59

VOTO

Primeiramente, é de se consignar que o recurso interposto nestes autos é tempestivo, todavia, ainda que tempestivo, verifica-se a perda superveniente do objeto recursal, o que obsta seu conhecimento.

A controvérsia estabelecida nos autos diz respeito ao suporto uso de recursos gerados por inteligência artificial em propaganda publicada pelo recorrido JONAS CALVI, em seus perfis nas redes sociais Facebook e Instagram, no qual aparece uma imagem como cenário de fundo sem, no entanto, especificar o uso de inteligência artificial. Estas são as imagens contestadas:

Interface gráfica do usuário, SiteO conteúdo gerado por IA pode estar incorreto.

O Juízo a quo julgou improcedente a representação com o seguinte fundamento:

"na hipótese, não há demonstração de que, na confecção da propaganda, foi utilizada a tecnologia de I.A., em vez de mero recurso de marketing de uso costumeiro em campanhas, que não encontra vedação legal.

Ademais, como bem observou o Ministério Público, não há divulgação de fato falso ou que crie no eleitor um estado mental de expectativa sobre algo irreal.

Além disso, cabe registrar que os candidatos Paulo Costi e Enoir Cardoso também usaram de recurso parecido em publicação realizada na rede social Instagram, com paisagem ao fundo e inserções na frente, publicadas em 23, 24 e 28 de agosto de 2024 e em 07 de setembro de 2024, sem o indicativo do recurso utilizado, que se assemelha, em muito, à publicidade objeto da representação.

Desta feita, não constada incidência de vedação legal na propaganda impugnada, a improcedência da representação é medida que se impõe."

Acerca do uso de recursos de inteligência artificial na propaganda eleitoral, dispõe o art. 9º-B da Resolução TSE n. 23.610/19:

Art. 9º-B. A utilização na propaganda eleitoral, em qualquer modalidade, de conteúdo sintético multimídia gerado por meio de inteligência artificial para criar, substituir, omitir, mesclar ou alterar a velocidade ou sobrepor imagens ou sons impõe ao responsável pela propaganda o dever de informar, de modo explícito, destacado e acessível que o conteúdo foi fabricado ou manipulado e a tecnologia utilizada.

§ 1º As informações mencionadas no caput deste artigo devem ser feitas em formato compatível com o tipo de veiculação e serem apresentadas:

I - no início das peças ou da comunicação feitas por áudio;

II - por rótulo (marca d'água) e na audiodescrição, nas peças que consistam em imagens estáticas;

III - na forma dos incisos I e II desse parágrafo, nas peças ou comunicações feitas por vídeo ou áudio e vídeo;

IV - em cada página ou face de material impresso em que utilizado o conteúdo produzido por inteligência artificial.

§ 2º O disposto no caput e no § 1º deste artigo não se aplica:

I - aos ajustes destinados a melhorar a qualidade de imagem ou de som;

II - à produção de elementos gráficos de identidade visual, vinhetas e logomarcas;

III - a recursos de marketing de uso costumeiro em campanhas, como a montagem de imagens em que pessoas candidatas e apoiadoras aparentam figurar em registro fotográfico único utilizado na confecção de material impresso e digital de propaganda.

§ 3º O uso de chatbots, avatares e conteúdos sintéticos como artifício para intermediar a comunicação de campanha com pessoas naturais submete-se ao disposto no caput deste artigo, vedada qualquer simulação de interlocução com a pessoa candidata ou outra pessoa real.

§ 4º O descumprimento das regras previstas no caput e no § 3º deste artigo impõe a imediata remoção do conteúdo ou indisponibilidade do serviço de comunicação, por iniciativa do provedor de aplicação ou determinação judicial, sem prejuízo de apuração nos termos do § 2º do art. 9º-C desta Resolução.

Art. 9º-C (...)

§ 2º O descumprimento do previsto no caput e no § 1º deste artigo configura abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação social, acarretando a cassação do registro ou do mandato, e impõe apuração das responsabilidades nos termos do § 1º do art. 323 do Código Eleitoral, sem prejuízo de aplicação de outras medidas cabíveis quanto à irregularidade da propaganda e à ilicitude do conteúdo.

Na situação posta nos autos, verifico que o objeto da demanda - a revisão da sentença para reconhecer a irregularidade da propaganda veiculada em desconformidade com o previsto no § 1º do art. 9-B - não tem mais relevância, pois a única sanção imposta pela legislação para o caso é a remoção do conteúdo em desacordo com a normativa vigente.

Portanto, não mais persiste a razão de ser da presente ação, tendo em vista a ausência de previsão legal para imposição de multa eleitoral.

Conforme expressamente disposto no § 4º do art. 9º-B da Resolução TSE n. 23.610/19, a única sanção aplicável ao caso seria a determinação para remoção do conteúdo irregular, o que não se mostra mais necessário. Em verdade, somente lei em sentido estrito tem aptidão de autorizar aplicação de multa para o caso de propaganda eleitoral irregular.

Nesse sentido, caso a propaganda esteja em desacordo com o art. 9º-B, a legislação autoriza o exercício do poder de polícia para retirada do conteúdo porque sua forma é irregular.

Por fim, acrescento ainda que, no caso dos autos, a sentença de improcedência está acertada. Conforme se vê, e em linha com a conclusão do parecer ofertado pela Procuradoria Regional Eleitoral, não há claramente o uso de técnica de manipulação de mídia na propaganda impugnada, mas tão somente uma montagem rústica, com sobreposição de imagem, o que se enquadraria perfeitamente na permissão prevista na utilização de recursos de marketing de uso costumeiro em campanhas, prevista no inc. III, do parágrafo 2º do citado art. 9-B da Resolução TSE n. 23.610/19.

Ante o exposto, VOTO por NÃO CONHECER do recurso interposto, ante a perda superveniente do objeto, julgando extinto o feito, sem resolução de mérito, na forma dos arts. 485, inc. VI, e 932, inc. III, do Código de Processo Civil.