REl - 0600911-53.2024.6.21.0090 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/04/2025 00:00 a 11/04/2025 23:59

VOTO

O recurso é tempestivo. Ademais, encontram-se os demais pressupostos relativos à espécie, de modo que a irresignação merece conhecimento.

À análise.

O Juízo a quo julgou improcedente representação por suposta prática irregular de propaganda eleitoral em bem público, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL contra ANDRIENI DA SILVA GOULART, ao fundamento de que as fotografias anexadas aos autos demonstram uma quantidade insuficiente de material gráfico de campanha havendo indícios probatórios insatisfatórios que justifiquem a intervenção dessa Especializada.

No campo normativo, a propaganda eleitoral em bens de uso comum está disciplinada na Resolução TSE n. 23.610/19:

Art. 19. Nos bens cujo uso dependa de cessão ou permissão do poder público, ou que a ele pertençam, e nos bens de uso comum, inclusive postes de iluminação pública, sinalização de tráfego, viadutos, passarelas, pontes, paradas de ônibus e outros equipamentos urbanos, é vedada a veiculação de propaganda de qualquer natureza, inclusive pichação, inscrição a tinta e exposição de placas, estandartes, faixas, cavaletes, bonecos e assemelhados (Lei nº 9.504/1997, art. 37, caput) .

§ 1º Quem veicular propaganda em desacordo com o disposto no caput será notificado para, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, removê-la e restaurar o bem, sob pena de multa no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a R$ 8.000,00 (oito mil reais), a ser fixada na representação de que trata o art. 96 da Lei nº 9.504/1997 , após oportunidade de defesa (Lei nº 9.504/1997, art. 37, § 1º , e art. 40-B, parágrafo único) .

§ 2º Bens de uso comum, para fins eleitorais, são os assim definidos pelo Código Civil e também aqueles a que a população em geral tem acesso, tais como cinemas, clubes, lojas, centros comerciais, templos, ginásios, estádios, ainda que de propriedade privada (Lei nº 9.504/1997, art. 37, § 4º) .

(...)

§ 6º Nas dependências do Poder Legislativo, a veiculação de propaganda eleitoral ficará a critério da Mesa Diretora (Lei nº 9.504/1997, art. 37, § 3º) .

§ 7º O derrame ou a anuência com o derrame de material de propaganda no local de votação ou nas vias próximas, ainda que realizado na véspera da eleição, configura propaganda irregular, sujeitando-se a infratora ou o infrator à multa prevista no § 1º do art. 37 da Lei nº 9.504/1997 , sem prejuízo da apuração do crime previsto no inciso III do § 5º do art. 39 da Lei nº 9.504/1997 .

§ 8º A caracterização da responsabilidade da candidata ou do candidato na hipótese do § 7º deste artigo não depende de prévia notificação, bastando a existência de circunstâncias que revelem a impossibilidade de a pessoa beneficiária não ter tido conhecimento da propaganda.

§ 8º-A Na hipótese de derrame de material de propaganda no local de votação realizado na véspera ou no dia da eleição, a representação por propaganda eleitoral irregular poderá ser ajuizada até 48 (quarenta e oito) horas após a data do pleito. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021)

(…)

E o Ministério Público Eleitoral atuante perante a 090ª Zona Eleitoral recorre da decisão, sob o argumento de estar configurada a prática ilícita. Sustenta ausência de entendimento jurisprudencial e das balizas utilizadas pelo Juízo Eleitoral, a amparar o fundamento da sentença.

Adianto, sem razão.

No relativo à moldura fática, impõe-se contextualizar que o d. órgão ministerial elaborou petição instruída com Relatório Final Unificado, resultante da vistoria de 30 (trinta) locais de votação realizada por equipe coordenada pelo Promotor Eleitoral. O documento apresenta, para cada proximidade de local de votação, os candidatos dos quais se recolheu material de propaganda.

No caso concreto, julgo não haver provas suficientes em relação à recorrida ANDRIENI DA SILVA GOULART. O conjunto probante mostra-se frágil. Embora se possa identificar uma certa quantidade de impressos (aproximadamente 40), a prova não se encontra na via pública, praça, jardim etc (mas sim, ao que tudo indica, em cima de uma mesa).

E, das imagens de rua, não é possível identificar propaganda do candidato em tela:

 

Com efeito, este Tribunal tem entendido pela necessidade de pressupostos para a caracterização do derrame de santinhos, quais sejam, (i) imagens do local de votação ou seu entorno; (ii) identificação das partes representadas no material gráfico; (iii) expressiva quantidade de material gráfico a provocar o efeito visual de derramamento, e (iv) circunstâncias que permitam concluir pelo conhecimento dos envolvidos.

No caso, apenas o relatório da Promotoria indica que o material fora encontrado próximo aos locais de votação. Com o devido respeito à credibilidade irretocável que o Ministério Público merece como ente indispensável à ordem jurídica, a prova não foi submetida ao contraditório, é unilateral. 

Dessa forma, a afirmação carece de consolidação por outros elementos, conforme entendimento firme do Tribunal Superior Eleitoral, o qual explicita que a certidão do oficial da promotoria deve ser corroborada por outras provas (AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL n. 060047810, Acórdão, Relator (a) Min. Mauro Campbell Marques, Publicação: DJE de 09.9.2022).

Nessa linha, julgado recente deste Tribunal:

Direito eleitoral. Eleições 2024. Recurso. Representação. Improcedente. Propaganda eleitoral irregular. Derrame de santinhos no dia da eleição. Insuficiência probatória. Recurso desprovido.

I. CASO EM EXAME

1.1. Recurso contra sentença que julgou improcedente representação por propaganda irregular, decorrente do derrame de "santinhos" próximo a local de votação, no dia do pleito.

1.2. O recorrente alegou que os elementos apresentados nos autos são suficientes para demonstrar a irregularidade, requerendo a condenação nos termos do art. 37, § 1º, da Lei n. 9.504/97 e do art. 19, §§1º, 7º e 8º da Resolução TSE n. 23.610/19.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

2.1. A questão em discussão consiste em saber se o conjunto probatório apresentado é suficiente para caracterizar a prática de propaganda eleitoral irregular pelo derrame de santinhos próximo a local de votação.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. O art. 37 da Lei n. 9.504/97 e o art. 19 da Resolução TSE n. 23.610/19 vedam a prática de propaganda eleitoral em bens de uso comum, incluindo o derrame de santinhos, sujeitando os responsáveis à multa e apuração criminal, desde que devidamente comprovados os elementos caracterizadores da infração.

3.2. A caracterização do derrame de santinhos pressupõe a efetiva demonstração de ocorrência de premissas básicas, tais como: 1) imagens do local de votação ou seu entorno; 2) identificação das partes representadas no santinho/volante; 3) expressiva quantidade de material gráfico a provocar o efeito visual de derramamento ou espalhamento; e 4) circunstâncias que permitam concluir pelo conhecimento dos envolvidos.

3.3. Insuficiência de provas. Não demonstrado que o material de propaganda foi lançado no local de votação ou nas vias próximas (elemento territorial) no dia da eleição ou na véspera (elemento temporal). Não demonstrado que o local no qual os santinhos foram encontrados seria perto de uma seção eleitoral, em logradouro público. Fotos registradas distantes dos volantes, o que impossibilita a verificação de se tratar efetivamente de material de campanha do recorrido. Ademais, não restou demonstrada quantidade significativa do material, tampouco a presunção de conhecimento do beneficiário para, consequentemente, ensejar o arbitramento de multa. Manutenção da sentença.

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Recurso desprovido.

Tese de julgamento: "A caracterização de propaganda eleitoral irregular por derrame de santinhos exige demonstração de elementos objetivos que comprovem a prática, o local, a quantidade significativa e a identificação inequívoca do beneficiário e seu conhecimento do ato ilícito."

Dispositivos relevantes citados: Lei n. 9.504/97, art. 37, § 1º; Resolução TSE n. 23.610/19, art. 19, §§ 1º, 7º e 8º.

TRE-RS RECURSO ELEITORAL nº060094358, Acórdão, Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Publicação: DJE - DJE, 05/12/2024.

(Grifo meu.)

Ou seja, evidencia-se a presença de lastro jurisprudencial da decisão hostilizada, ao contrário do apontado nas razões recursais.

ANTE O EXPOSTO, VOTO por negar provimento ao recurso.