REl - 0600970-56.2024.6.21.0085 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/04/2025 00:00 a 11/04/2025 23:59

VOTO

Inicialmente, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa em razão do não conhecimento das alegações finais apresentadas pela recorrente, pois não foi comprovada minimamente a alegação de que a magistrada teria concedido, em audiência, o prazo de 3 (três) dias para a manifestação.

O art. 22, inc. X, da Lei Complementar n. 64/90 é expresso no sentido do prazo de 2 (dois) dias para apresentação de alegações finais, e no termo de audiência a magistrada consigna a abertura do prazo para alegações finais.

O termo de audiência foi juntado aos autos no dia 04.11.2024, e o prazo de dois dias encerrou-se em 06.11.2024, às 23h59, sendo intempestiva a peça apresentada pela recorrente somente no dia 07.11.2024, quando já encerrado o prazo legal.

Assim, merece ser rejeitada a preliminar.

No mérito, a representação apresentada pela recorrente fundamenta-se na alegação de que os recorridos promoveram captação ilícita de sufrágio ao oferecerem um churrasco gratuito de grandes proporções a eleitores, nas vésperas do pleito, como forma de obter vantagem indevida na disputa eleitoral, o que caracterizaria a prática de captação e gastos ilícitos de recursos eleitorais disposta no art. 30-A da Lei n. 9.504/97, e a captação ilícita de sufrágio descrita no art. 41-A, também da Lei das Eleições:

Art. 30-A. Qualquer partido político ou coligação poderá representar à Justiça Eleitoral, no prazo de 15 (quinze) dias da diplomação, relatando fatos e indicando provas, e pedir a abertura de investigação judicial para apurar condutas em desacordo com as normas desta Lei, relativas à arrecadação e gastos de recursos. (Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009) (Vide Emenda Constitucional nº 107, de 2020)

 

§ 1° Na apuração de que trata este artigo, aplicar-se-á o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990, no que couber. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006)

 

§ 2° Comprovados captação ou gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais, será negado diploma ao candidato, ou cassado, se já houver sido outorgado. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006)

 

§ 3° O prazo de recurso contra decisões proferidas em representações propostas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

(…)

 

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela Lei nº 9.840, de 1999)

 

§ 1° Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

§ 2° As sanções previstas no caput aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fim de obter-lhe o voto. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

§ 3° A representação contra as condutas vedadas no caput poderá ser ajuizada até a data da diplomação. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

§ 4° O prazo de recurso contra decisões proferidas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

 

De acordo com a doutrina, o art. 41-A da Lei n. 9.504/97 “busca verificar se a vontade do eleitor foi viciada ou corrompida, protegendo a liberdade de voto”, enquanto o art. 30-A tem como bem jurídico tutelado “a higidez das normas relativas à arrecadação e gastos eleitorais e a transparência no financiamento das campanhas eleitorais” (Zilio, Rodrigo López. Direito Eleitoral. 10.ed.. São Paulo: Editora JusPodivm, 2024 p. 802 e 889).

A sentença recorrida julgou improcedente a representação, concluindo que não houve prova suficiente da responsabilidade dos recorridos na organização e custeio do evento.

A magistrada de primeiro grau considerou que as testemunhas ouvidas em juízo foram uníssonas ao afirmar que os custos do evento foram arcados pelos próprios participantes, inexistindo qualquer evidência concreta de que os candidatos tenham custeado ou promovido a distribuição de refeição como estratégia de compra de votos, conforme consta da decisão:

(…)

No mérito, verifico que não há provas nos autos com o condão de proporcionar certeza quanto ao cometimento de ilegalidade por parte dos representados, não tendo, assim, a Federação representante se desincumbido do ônus da prova de demonstrar as suas alegações.

Veja-se que nenhuma das fotos juntadas aos autos pela Federação Fé Brasil demonstra qualquer indício de compra de votos mas apenas registra que efetivamente existiu a concentração de pessoas antes do evento do comício com realização de churrasco. E, não há na legislação qualquer impedimento para a reunião de pessoas nas datas em questão nesse processo, inexistindo, nesses termos, demonstração de irregularidades ou ilegalidades.

Para uma eventual procedência de demanda seria preciso a prova inconteste de que os candidatos representados ou mesmo seu partido tivessem colaborado ou arcado com os custos do evento que continha alimentação e bebidas para consumo dos eleitores participantes.

Não há sequer indício nos autos de fornecimento de recursos financeiros dos candidatos á prefeitura de Três Forquilhas para o fornecimento de bebidas e comida.

Ademais, a prova oral produzida foi toda no sentido da realização de um evento particular envolvendo uma associação de moradores, negando que os representados, PROGRESSISTAS de Três Forquilhas, LORACI KLIPPEL MELO GERMANN e ROMULO BREHM HOFFMANN, tenham organizado, financiado ou participado de qualquer evento com fornecimento de bebidas ou alimentos.

O informante VOLNEI LIMA DE SOUZA - ID 125511506 - disse ser presidente da associação existente no Morro do Chapéu e que realizou concentração no dia 29.09.2024 antes da carreata do Progressistas com consumo de bebida apenas para os participantes do churrasco realizado. Afirmou que antes da concentração houve churrasco na casa de Nivaldo para 50 ou 60 pessoas. Asseverou que cada um pagava o que consumia de bebida alcoólica. Acresceu que o valor da carne foi rateado apenas entre os participantes do churrasco. Negou a presença no evento dos candidatos LORACI KLIPPEL MELO GERMANN ou ROMULO BREHM HOFFMANN. Perguntado pela advogada da parte autora, disse que vende bebida para manter a sede da associação, que normalmente recebe o pagamento em dinheiro, que vendeu bebida existente no estoque. Em resposta a indagação do Promotor Eleitoral, afirmou que a organização do churrasco foi feita por Neoli, que pediu para o o dono do sítio para vender a cerveja, disse que o churrasco não era para o partido.

No mesmo sentido, o informante NEOLI GASPAR FIRMINO - ID 125511505 - afirmou que participou dos comícios dos candidatos representados. Disse que pediu a área de Nivaldo para fazer churrasco em 29.09.2024. Asseverou que Nivaldo trouxe a carne e que os participantes do churrasco fizeram "vaquinha" para fazer churrasco. Afirmou que a cerveja foi comprada pelo Grupo do Veterano. Também negou a presença no evento dos candidatos LORACI KLIPPEL MELO GERMANN ou ROMULO BREHM HOFFMANN ou do recebimento de valores para realização do churrasco. Afirmou que recolheu a totalidade dos gastos e pagou a carne para Nei e o que sobrou deram em cerveja para quem estava lá. Perguntado pela advogada dos representantes, disse que chegou pelas 7h no local, que neste horário tinha pouca gente e mais pessoas chegaram perto do horário do almoço. Indicou que montou churrasqueira com Nei. Disse que o valor de pagamento do custo do evento foi em dinheiro e que o valor que sobrou foi distribuído cerveja do que sobrou. Em resposta a indagação do Promotor Eleitoral, afirmou que a combinação para realização do churrasco ocorreu com as pessoas do grupo do veterano que jogam futebol.

Também no mesmos sentido, o informante JOSÉ NIVALDO JUSTIN - ID 125511503 - disse que tem terra no Morro do Chapéu, com entrada entre Igreja e salão do Morro do Chapéu. Afirmou que foi pedido para usar o local da sua chácara em 29.09.2024 e que nesse dia foi realizado um churrasco no local, que vendeu a carne e que quem pagou o valor para ele foi Neoli. Asseverou que é proprietário de um mercado e tinha estoque de carne no local. Respondeu ao advogado que a bebida veio da sede da associação. Negou que os candidatos representados tenham participado do evento antes ou durante o churrasco. Disse que terminado o churrasco, bastante gente chegou para saída para o comício. Em resposta a advogada da federação representada disse que recebeu o valor da carne em dinheiro total de Neoli. Indicou que não sabe de onde veio o valor total, mas que Neoli entregou.

O informante GILVAN DA SILVA SPARREMBERGUER - ID 125511501 - disse que tem uma kombi que vende chopp e que vendeu o produto nos comícios. Indicou que quando chegou na propriedade de Nivaldo estava acontecendo um churrasco e que era uma concentração do Veteranos, agendado para 11h, que cada um pagava uma cota e que naquele momento não vendeu cerveja porque a associação já estava vendendo. Indicou que pelas 13h saíram para o comício. Afirmou que viu os candidatos LORACI KLIPPEL MELO GERMANN ou ROMULO BREHM HOFFMANN chegarem para dar início a carreata. Asseverou que pagou R$ 20,00 (vinte reais) para participar do churrasco em dinheiro para Neoli.

Uníssona a prova testemunhal da realização de evento privado com custas pelos participantes e ausente qualquer prova de atuação ilegal por parte dos representados, há que se julgar a representação especial improcedente.

Ante o exposto, nos termos dos artigos 373 e 487, inciso I, julgo IMPROCEDENTE a Representação Especial - RepEsp - ajuizada pela FEDERACAO BRASIL DA ESPERANCA (FE BRASIL) - PT, PV, PC do B - contra o PROGRESSISTAS de Três Forquilhas, LORACI KLIPPEL MELO GERMANN e ROMULO BREHM HOFFMANN.

(...)

 

Ocorre que o TSE firmou o entendimento de que o simples fornecimento de alimentos e bebidas em eventos de campanha, sem a finalidade de influência do voto, não se enquadra no conceito de captação ilícita de sufrágio (TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 47845, Acórdão, Relator(a) Min. João Otávio De Noronha, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo n. 95, Data 21.5.2015, P. 67). Esse posicionamento se justifica pela compreensão de que tais práticas, quando destituídas de propósito eleitoreiro, não chegam a viciar a autonomia e o discernimento do eleitor.

Do exame dos autos, tem-se que o evento em questão não foi promovido ou financiado pela campanha dos recorridos, mas sim custeado de forma espontânea pelos participantes, não havendo nos autos evidência de que o churrasco tenha sido um meio de obtenção de vantagem eleitoral indevida.

No recurso, foram invocados os depoimentos de Volnei Lima de Souza, Neoli Gaspar Firmino, José Nivaldo Justin e Gilvan da Silva Sparremberger, ouvidos como informantes, os quais teriam contradições ao afirmar que o churrasco foi um evento privado e independente.

Entretanto, Volnei Lima de Souza confirmou que cada participante pagava pelo consumo de bebida alcoólica, que os organizadores da associação de moradores existente no Morro do Chapéu venderam cerveja e que o churrasco ocorreu antes da concentração para o comício. Já Neoli Gaspar Firmino afirmou que solicita o espaço para realizar o churrasco e que o evento foi organizado pelo grupo do Veterano, com cobrança de uma taxa entre os participantes e orientação de que a cerveja fosse comprada separadamente.

José Nivaldo Justin declarou que a carne usada no churrasco foi comprada em seu mercado e que o pagamento foi feito em dinheiro por Neoli, e Gilvan da Silva Sparremberger referiu que comercializa bebida alcoólica, e que vendeu a bebida nos comícios, mas que, ao chegar ao local do churrasco, constatou que a Associação dos Veteranos já estava vendendo cerveja.

Não há a mínima prova do ilícito.

A demonstração da captação ilícita de sufrágio deve ser robusta e inconteste a evidenciar seus requisitos configuradores, a saber: a) prática de conduta do art. 41–A (doar, oferecer, prometer ou entregar a eleitor bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza); b) o fim específico de agir, consubstanciado na obtenção do voto do eleitor; c) a ocorrência do fato durante o período eleitoral; e d) participação, direta ou indireta, do candidato beneficiado ou a sua concordância ou conhecimento dos fatos que caracterizam o ilícito (TSE, AgR–RO–El n. 0000004–33.2020.6.00.0000/PI, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 09.5.2023). Cito precedente:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. REPRESENTAÇÃO POR CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. AUSÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS CARACTERIZADORES DA CONDUTA ILÍCITA. SÍNTESE DO CASO 1. O Tribunal a quo, por unanimidade, julgou improcedente a representação eleitoral com base no art. 41-A da Lei 9.504/97, em razão da fragilidade das provas testemunhais carreadas aos autos. 2. Interposto o recurso ordinário, foi mantida monocraticamente a decisão tomada na origem, pelo mesmo fundamento e a partir da compreensão que a condenação por captação ilícita de sufrágio demanda, em razão de sua gravidade, provas robustas e incontestes. ANÁLISE DO AGRAVO REGIMENTAL 3. Embora seja incontroversa a presença do candidato nos eventos religiosos, houve contradição das duas testemunhas diretas do ilícito acerca de circunstâncias essenciais, a exemplo de quais pessoas estavam presentes na conversa, da finalidade da avença, da suposta cobrança dos valores prometidos em campanha, do grau de envolvimento de uma das testemunhas na campanha do representado e das circunstâncias que motivaram uma das testemunhas a narrar os fatos em juízo. 4. "Embora seja possível a comprovação da captação ilícita de sufrágio mediante prova exclusivamente testemunhal, é necessário que essa prova seja consistente e demonstre, inequivocamente, a ocorrência de uma das condutas previstas no art. 41-A da Lei 9.504/97" (AgR-REspe 336-76, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 8.11.2016), o que não se observou na espécie. CONCLUSÃO Agravo regimental a que se nega provimento.

 

(TSE - RO: 06015869120186250000 ARACAJU - SE, Relator: Min. Sergio Silveira Banhos, Data de Julgamento: 07/05/2020, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 101, Data 25/05/2020)

 

Além disso, para este Tribunal: “O enquadramento da conduta tipificada no art. 41-A, se desenvolve mediante negociação dirigida a pessoa determinada, condicionada a uma vantagem, com o propósito de obter o voto” (TRE-RS - RE: n. 34579 RS, Relator: Dr. Luis Felipe Paim Fernandes, Data de Julgamento: 16.5.2013, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo n. 89, Data 20.5.2013, P. 6).

Isso porque o entendimento jurisprudencial é no sentido de que, “para a procedência da demanda, é necessária a demonstração irrefutável da conduta objetivamente considerada - compra ou negociação do voto com a entrega ou promessa da vantagem -, além da finalidade ou animus voltados à obtenção de votos” (TRE-RS - RREP: n. 879 RS, Relator: DRA. ANA BEATRIZ ISER, Data de Julgamento: 01.10.2009, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 183, Data 03.11.2009, P. 2).

De igual modo, não restou comprovada a captação e os gastos ilícitos de recursos eleitorais.

Portanto, entendo pela correção do raciocínio adotado na sentença. A prova dos autos e os depoimentos colhidos durante a instrução processual confirmam que: (i) O evento tratava-se de um churrasco organizado de forma privada entre moradores da comunidade, com pagamento de despesas pelos participantes, que contribuíram financeiramente para a aquisição da carne e das bebidas; (ii) os recorridos não participaram da organização do evento nem custearam qualquer despesa relacionada ao churrasco.

Não há prova concreta da suposta mercantilização de votos por meio dos benefícios concedidos. Não existe demonstração de que se tenha ofertado benefício para comprar votos de eleitores, circunstância que demandaria, igualmente, que os sujeitos passivos fosse identificados ou identificáveis para averiguar se votam no município e se estão com o título de eleitor válido.

O parecer da Procuradoria Regional Eleitoral também é no sentido de que não se demonstrou a existência de qualquer elemento probatório apto a confirmar que houve captação ilícita de sufrágio, concluindo pelo desprovimento do recurso.

A comprovação do ilícito deve ser inconteste a evidenciar seus requisitos configuradores do ilícito, mas não é essa a hipótese dos autos. A procedência da demanda a conjugação dos elementos subjetivos e objetivos que não se encontram presentes.

Destarte, entendo que a inexistência de provas concretas que vinculem os recorridos ao fornecimento do churrasco e da bebida retira qualquer possibilidade de presunção de ilicitude e, diante da fragilidade e da insuficiência do caderno probatório, concluo que a sentença deve ser mantida.

Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso.