RC - 253 - Sessão: 12/11/2014 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL em face da sentença do Juízo da 23ª Zona Eleitoral – Ijuí, que julgou improcedente a ação penal ajuizada pelo Ministério Público, absolvendo o denunciado da imputação que lhe fora feita pela prática de fato delituoso previsto no art. 326 do Código Eleitoral, injúria eleitoral, com fundamento no art. 386, inc. VII, do Código de Processo Penal.

Segundo a peça acusatória, durante a campanha eleitoral de 2012, o denunciado Erlon Beck teria injuriado o então candidato a vereador Enio dos Santos, ofendendo-lhe a dignidade e o decoro, com a colocação de uma foto acompanhada de frase em site da internet.

A denúncia descreve que foi postada, na rede social Facebook, fotografia de um bebê dotado de dentadura proeminente, fazendo alusão à compleição física e ao apelido do então candidato às eleições proporcionais Enio dos Santos, imputando-lhe conduta desonrosa ao afirmar que está mais sujo que pau de galinheiro e ainda fica olhando para cima!, consoante se evidencia no documento da fl. 29 dos autos, o qual subsidiou a peça acusatória.

O denunciado não aceitou as propostas de transação penal (fl. 29) e de suspensão condicional do processo (fl. 60).

Em sua defesa, admitiu ser o autor das postagens na rede social Facebook e argumentou que os dizeres haviam sido feitos com o intuito de crítica ao contexto político brasileiro, não tendo sido feitas diretamente ao candidato a vereador, apesar de o mesmo possuir a alcunha de “Dentinho”, conforme se verifica em folder de propaganda política juntado aos autos na folha 08 (fls. 37-56).

Encerrada a instrução penal, a sentença concluiu, em face do conjunto probatório, que a conduta do réu não teve o animus de injuriar a vítima, pois seu comentário na rede social teria sido feito de forma genérica (fls. 93-94.).

Inconformado, recorre o Ministério Público (fls. 97-100). Reitera que a materialidade e a autoria do delito restaram comprovadas. Argumenta a existência de injúria eleitoral, uma vez que o denunciado postou na internet, precisamente na Rede Social Facebook, foto de um bebê com dentadura proeminente, fazendo alusão à compleição física e ao apelido eleitoral utilizado pela vítima, naquela ocasião candidato ao cargo de vereador. Nas eleições de 2012, a vítima utilizava o nome de "Dentinho" para as urnas, conforme consta em seu registro na Justiça Eleitoral. Não bastasse, ao lado da referida fotografia – portanto, associada à imagem do candidato Enio dos Santos – o denunciado veiculou a seguinte afirmação: "está mais sujo que pau de galinheiro e ainda fica olhando para cima!"

Foram apresentadas contrarrazões (fls. 105-107), nas quais o réu reitera os argumentos trazidos na sua defesa, quais sejam, de que não havia ânimo de injuriar a vítima e que as críticas foram feitas a políticos em geral, e não à vítima.

Foram os autos ao Procurador Regional Eleitoral, que manifestou-se pelo provimento do recurso do Ministério Público (fls. 111-112v.).

É o relatório.

 

VOTO

Tempestividade

O recurso é tempestivo, eis que interposto dentro do prazo de dez dias da intimação da sentença, conforme dispõe o art. 362 do Código Eleitoral (fls. 84-85v.).

Mérito

A vítima, Ênio dos Santos, concorreu às eleições proporcionais em Ijuí, sendo candidato do Partido Democrático Trabalhista, com o número 12.800, pela Coligação Frente Trabalhista, utilizando nome para a urna de "Dentinho"; ao passo que o réu, Erlon Beck, pertence ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro e, apesar de não ter sido candidato no pleito, é conhecido na comunidade por sua intensa atividade política de militância de oposição ao partido da ora vítima. Por esse motivo, durante a campanha eleitoral de 2012, postou diversas publicações com cunho eleitoral.

A materialidade do crime está sobejamente comprovada nos autos. Quanto à autoria, deve-se dizer que em nenhum momento o acusado negou ter postado no Facebook a fotografia e os dizeres objeto da denúncia, limitando-se a afirmar a inexistência do dolo específico, pois afirma não ter tido a intenção de macular a imagem e o decoro do então candidato Ênio dos Santos.

Os fatos narrados na denúncia reportam-se à injúria eleitoral, conforme disposto no art. 326, caput, do Código Eleitoral:

Art. 326 – Injuriar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, ofendendo-lhe a dignidade e o decoro:

Pena – detenção até seis meses, ou pagamento de 30 a 60 dias-multa.

Restando incontroversas a materialidade e a autoria da mensagem postada na rede social Facebook, cumpre verificar a ocorrência, ou não, da injúria eleitoral.

Conforme a jurista Suzana de Camargo Gomes, o delito de injúria na propaganda eleitoral trata de ofensa à honra subjetiva da vítima, isto é, o sentimento que cada um possui no que concerne à própria honorabilidade e respeitabilidade. A vítima, neste caso, é ferida em seus brios, é atacada em sua honra sem que a ofensa consista na imputação de fato criminoso (calúnia) ou imoral (difamação). Nesse sentido, inclusive, foi decidido pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, quando, no Recurso Criminal 1629, o relator, Juiz Cauduro Padin, realçou:

Como se sabe na injúria não há fato específico, preciso, determinado, criminoso ou não, ao contrário da calúnia e da difamação.

Há na injúria opinião desfavorável sobre o ofendido; atribuição de qualidades negativas ou defeitos; uma avaliação, um juízo sobre alguém; a palavra insultosa, o epíteto, o impropério que leva ao desprezo, ao escárnio ou ludibrio.

Ora, a honra é atingida quando é atingida a própria ideia, o conceito de si mesmo, ou então pelo alcance ou comprometimento da consideração, do respeito e da reputação junto ao meio social, assim, respectivamente, a honra subjetiva e a honra objetiva.

(GOMES, Suzana de Camargo. Crimes Eleitorais. 4. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.)

Dito isso, prossigo na análise dos fatos.

Da análise da foto jocosa, na qual foi colocado um bebê com dentadura proeminente, fazendo alusão à compleição física e ao apelido eleitoral utilizado pela vítima, nas eleições de 2012, juntamente com a afirmação: está mais sujo que pau de galinheiro e ainda fica olhando para cima!, conclui-se que houve a ofensa à honra subjetiva da vítima.

A argumentação trazida pelo réu de que que as críticas foram feitas a políticos em geral, e não à vítima, não pode prosperar. A toda evidência, as postagens foram feitas para atingir o então candidato, o qual utilizava o nome de "Dentinho" para as urnas, conforme consta em seu registro na Justiça Eleitoral.

Ademais, a foto foi postada com a expressão está mais sujo que pau de galinheiro e ainda fica olhando para cima! Tal dizer lança uma grave suspeita acerca da conduta da vítima, com evidente ofensa à sua dignidade, honra e imagem.

Além disso, estando presente o elemento subjetivo do tipo, que é o dolo específico de injuriar, consubstanciado na vontade consciente e deliberada de ofender a dignidade e o decoro da vítima, resta caracterizado o delito. Ainda, a publicação da foto com os dizeres foi feita na seara eleitoral, com repercussão na propaganda eleitoral do pleito em que concorria Enio dos Santos.

Dessa forma, não restando dúvida acerca da ocorrência do delito de injúria eleitoral, previsto no art. 326 do Código Eleitoral, passo ao exame da dosimetria da pena.

Ao fazê-lo, analiso cada uma das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal Brasileiro para a fixação da pena-base.

Culpabilidade: o dolo revelado é o característico de tal espécie de delito, isto é, o de atingir a honra da vítima, utilizado pelo acusado em seu grau médio.

Antecedentes: presumivelmente abonados, ausentes anotações negativas.

Conduta social e personalidade do agente: não há elementos nos autos a ensejar avaliação segura, tanto quanto ao comportamento do agente perante a sociedade, quanto à respectiva personalidade, entendida essa como o conjunto de características pessoais do acusado. Elementos de difícil análise, que não prejudicarão o réu.

Motivos: relacionados à disputa eleitoral em que ambos eram adversários políticos. Entretanto, não há elementos nos autos que indiquem a necessidade de maior rigor na fixação da reprimenda.

Consequências: é evidente o abalo na reputação e imagem da vítima na campanha eleitoral que a manifestação do acusado causou, o que deve repercutir negativamente na pena.

Circunstâncias: as já descritas, ocorridas durante a refrega eleitoral.

Comportamento da vítima: a vítima não contribuiu para o episódio.

Presente esta moldura, restam as consequências do crime desfavoráveis ao sentenciado. A pena em abstrato do delito é de detenção de até seis meses, ou pagamento de 30 a 60 dias-multa.

Entendo ser suficiente, como reprimenda pelo delito, o pagamento de 45 dias-multa. E o valor do dia-multa, em face dos elementos constantes nos autos, deve ser fixado em 1/30 do salário-mínimo vigente, em favor do Fundo Penitenciário.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso do Ministério Público Eleitoral para condenar o réu no delito de injúria eleitoral, fixada a pena em 45 dias-multa, à razão de 1/30 do salário-mínimo, nos termos da fundamentação supra.

Após o trânsito em julgado desta decisão, proceda-se ao lançamento no rol dos culpados do nome do réu.