RE - 34278 - Sessão: 15/07/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO – PSB DE VIAMÃO - e ANTÔNIO GERALDO DE SOUZA HENRIQUES FILHO contra sentença que julgou improcedente ação de investigação judicial eleitoral, proposta em face da COLIGAÇÃO MUDANÇA DE VERDADE, VALDIR BONATTO (prefeito de Viamão) e ANDRÉ NUNES PACHECO (vice-prefeito de Viamão), não reconhecendo o alegado abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação, visto que o conjunto probatório não se mostrou suficiente para concluir pela efetiva ocorrência das condutas impugnadas (fls. 347-349v.).

Os recorrentes requerem, preliminarmente, a desconstituição da sentença para que seja determinada a quebra de sigilo de dados telefônicos de uma série de pessoas, prova cuja produção foi indeferida pelo juiz de primeiro grau na audiência de instrução e na sentença. No mérito, asseveram que a decisão de primeiro grau é contrária à cronologia dos fatos, aos documentos juntados aos autos e aos testemunhos colhidos em juízo, restando claro o abuso do poder econômico por meio da prova carreada aos autos e pelo depoimento das testemunhas ouvidas em outro processo (AIME n. 1-18.2013.6.21.0072). Por essas razões, postulam a procedência da ação para que sejam cassados os diplomas e os direitos políticos dos representados, bem como lhes seja aplicada a multa do art. 36, § 3º, da Lei n. 9.504/97 (fls. 367-381).

Com as contrarrazões (fls. 390-393), os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 397-401v.).

É o relatório.

 

VOTO

1. Admissibilidade

O recurso é tempestivo. O procurador dos recorrentes foi intimado da sentença em 24/02/2014 (fl. 364), e o recurso interposto em 27/02/2014 (fl. 367), dentro, portanto, do tríduo legal.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

2. Preliminar de cerceamento de defesa

Os recorrentes pugnam pela desconstituição da sentença para que se determine a quebra de sigilo de dados e registros telefônicos das pessoas e números indicados na audiência de instrução, o que comprovaria que os representados e as gráficas (excluídas do polo passivo da demanda) agiram em conluio e de forma premeditada, incorrendo em uso indevido de meio de comunicação social e abudo de poder econômico.

No entender dos recorrentes, não ocorreu preclusão processual quanto ao pedido da prova em tela, na medida em que consta da inicial requerimento de produção de todos os meios probatórios admitidos em juízo. Além disso, foi feita, em audiência, a indicação dos nomes e dos números telefônicos abrangidos pela quebra, a qual é perfeitamente cabível em ações de natureza diversa da criminal.

Contudo, tenho que a sentença não merece reparos nesse ponto.

Refiro, de início, o argumento apresentado pelo magistrado de primeiro grau ainda na audiência de instrução, no sentido de que o pedido de quebra de sigilo de dados telefônicos não foi feito de forma específica pelos recorrentes quando da propositura da ação, que era o momento processual oportuno para especificarem as provas que pretendiam produzir e arrolarem testemunhas, sob pena de preclusão. O pedido feito na exordial é demasiadamente genérico e não supre a falha dos recorrentes no tocante à prova em questão.

Acrescento que faltou especificidade ao pedido quando formulado em audiência, pois os recorrentes não apontaram os fatos que pretendiam provar mediante a quebra do sigilo de dados telefônicos, tampouco esclareceram a existência de liame lógico entre os mesmos e a medida requerida.

A partir do Termo de Audiência (fls. 252-253), é possível perceber que os representantes requereram a prova após a oitiva da testemunha Júlio César Francisco da Silva, que teria presenciado um fato específico, ou seja, a entrega do material de campanha na manhã do dia 03.10.2012, às 7h30min, tendo sido o referido material retirado antes das 12h.

Contudo, o pedido foi feito relativamente a um período bem mais dilatado, isto é, desde o início do mês de setembro até o dia 04.10.2012, visando a abranger pessoas que não participam da presente demanda, sem justificativa plausível acerca do proveito probatório que surgiria com a produção da prova.

Dessa forma, ainda que a quebra de sigilo de dados e registros telefônicos não se confunda com a quebra de sigilo telefônico e, por essa razão, não se submeta à disciplinada na Lei n. 9.296/96, constitui medida que somente merece ser autorizada em hipóteses excepcionais, nas quais é absolutamente imprescindível para elucidar fatos e circunstâncias discutidas no processo.

O deferimento de qualquer medida restritiva ao direito fundamental à privacidade (art. 5°, inc. X, da CF), ao qual é correlata a inviolabilidade do sigilo de dados (art. 5°, inc. XII, da CF), não pode se dar com base em pedido genérico e desprovido de plausibilidade mínima, que a tutela constitucional exige por parte do Estado-Juiz.

Destarte, não restou caracterizada nulidade processual por cerceamento de defesa, uma vez que o julgador não está obrigado a deferir a produção de provas protelatórias ou desnecessárias à formação do seu convencimento, que nada acrescentam àquilo que já está suficientemente provado ou não guardam relação direta com os fatos objeto da demanda.

Com tais razões, afasto a preliminar.

3. Mérito

Segundo narrado na inicial, os demandados distribuíram, na manhã do dia 03.10.2012, panfletos impressos em papel-jornal, contendo pesquisa realizada pelo Instituto Methodus e publicada na capa da Edição Extra do Jornal Correio Rural daquele mesmo dia (Edição Extra n. 5.163), em que o candidato da coligação representada aparecia como favorito no pleito municipal de 2012.

O fato de os panfletos terem sido distribuídos na mesma data em que publicada a pesquisa pelo Jornal Correio Rural demonstra, de acordo com os representantes, a existência de conluio e favorecimento ilegal dos representados pelo mencionado jornal. Com o acesso antecipado à pesquisa, os representados puderam distribuir os panfletos antes mesmo da distribuição da edição extra do jornal, o que caracterizou manifesto uso indevido do meio de comunicação social e abuso de poder econômico durante o período eleitoral.

Entretanto, analisando os autos, verifico que a pesquisa foi contratada junto ao Instituto Methodus no final do mês de setembro de 2012, conforme a nota fiscal de serviços de fl. 96, tendo sido devidamente registrada perante este Tribunal em 27.09.2012 (fls. 113-114).

Em 02.10.2012, o Jornal Correio Rural contratou junto à Gráfica Editora Treze tiragem da sua edição extra, a qual foi concluída nesse mesmo dia, como comprova a nota de venda de produtos juntada na fl. 118. Na madrugada do dia 03.10.2012, o referido jornal iniciou a distribuição da sua edição extra no Município de Viamão e também publicou a capa dessa edição, em que estampada a pesquisa, no seu sítio na internet (fls. 119-120), respeitando, desse modo, o prazo de cinco dias, previsto no art. 12 da Resolução TSE n. 23.364/11.

A atuação do periódico foi, por conseguinte, regular e não denota tenha havido o aduzido conluio ou favorecimento dos demandados em detrimento dos demais candidatos que concorriam na eleição majoritária. Como observado no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, o que se percebe é que a pesquisa foi reproduzida nos panfletos após ter sido legitimamente divulgada pelo Jornal Correio Rural em rede social:

Destarte, tendo a pesquisa eleitoral atendido aos requisitos da legislação eleitoral, incumbia aos representados demonstrar o abuso do poder econômico e/ou indevido de meio de comunicação na divulgação da referida pesquisa, o que não ocorreu no caso dos autos. Ademais, como a pesquisa foi divulgada no site do jornal Correio Rural na noite anterior à publicação do jornal, e, frise-se, não foi produzida prova em sentido contrário, é natural a sua replicação pelos representados, candidatos apontados como favoritos (fl. 401).

Na fase de instrução do processo, a única testemunha ouvida, Júlio César Francisco da Silva (fls. 252-253), referiu que, na semana anterior ao dia da eleição, por volta das 7h30min, quando estava chegando em seu serviço no centro do Município de Viamão, havia recebido uma cópia do Jornal Correio Rural, contendo a pesquisa impressa em sua capa e material de propaganda nele encartado. Acrescentou que havia notado a distribuição do mesmo material em outros pontos da cidade, mas que a pesquisa não tinha sido divulgada em data anterior.

É importante mencionar que, além de não se extraírem do seu depoimento indícios de utilização irregular do meio de comunicação ou abuso de poder econômico, o depoente afirmou ser simpatizante de Antônio Geraldo de Souza Henriques Filho, representante que disputava a eleição majoritária com os representados e, por consequência, tinha evidente interesse na comprovação dos fatos objeto desta demanda.

Consigno, para finalizar, que o magistrado de primeiro grau, ao apreciar a prova colhida nos autos da AIME n. 1-18.2013.6.21.0072, cujo objeto também se relacionava com a pesquisa ora debatida, considerou-a insuficiente para o fim de comprovação da conduta atacada pelos representantes, nos seguintes termos:

De mais a mais, as testemunhas ouvidas nas duas ações não apresentam contundência suficiente para comprovar a tese dos representantes, de que o instituto de pesquisas e o jornal Correio Rural tenha agido em conluio com os representados Valdir Bonatto e André Pacheco, que tenham beneficiado estes de modo indevido ou, quiçá, que estes tenham abusado do poder econômico de modo a violar o equilíbrio que deve reger a disputa de um certame eleitoral (fl. 349).

À vista dessas considerações, concluo que o conjunto probatório dos autos não evidencia, de modo inequívoco, o uso indevido de meio de comunicação ou o abuso de poder econômico por parte dos representados, com o comprometimento da normalidade e da legitimidade do pleito, que são os bens jurídicos tutelados pelo art. 14, § 9º, da Constituição Federal, circunstância que impede o provimento do recurso.

Diante do exposto, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa e, no mérito, VOTO pelo desprovimento do recurso.