RC - 3466 - Sessão: 17/07/2014 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso (fls. 470-478) interposto por JOSÉ ALMIR BOFF contra sentença (fls. 451-465) proferida pelo Juízo da 64ª Zona Eleitoral – sediada em Rodeio Bonito, que julgou procedente a ação penal, considerando-o como incurso nas sanções do art. 350 do Código Eleitoral e condenando-o à pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de reclusão (substituída por prestação de serviços à comunidade); de prestação pecuniária, no valor de três salários mínimos vigentes à época do fato delituoso, e pena de multa, à razão de um décimo do salário mínimo vigente à data do fato.

O fato praticado foi o seguinte:

Em data não precisada nos autos, mas após o dia 26 de junho de 2008, nas dependências da escola Estadual Joaquim José da Silva Xavier, no Município de Novo Tiradentes – RS, Hermínio Boff, José Almir Boff e Luiz Gilberto Gatti, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, inseriram ou fizeram inserir, em documento particular, declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais.

Na oportunidade, após realizadas as convenções partidárias para as eleições municipais de 2008, os denunciados Hermínio Boff e José Almir Boff reuniram-se novamente, alterando as deliberações da convenção do partido ao qual eram filiados (DEM), da qual haviam participado 08 pessoas (fls. 169-171), assinando nova ata com data retroativa e deliberação diversa da original (fls. 171-173).

O denunciado Luiz Gilberto Gatti concorreu para a prática do delito pois estava presente e redigiu a nova ata da convenção, estando plenamente ciente da existência da ata original, redigida logo acima da segunda (fls. 169-172), e ainda propôs o consenso entre os partidos para o denunciado Hermínio Boff, o que deu origem à produção da ata fraudulenta.

A ata em questão, referente ao partido Democratas, foi declarada nula pela Justiça Eleitoral, conforme cópia da decisão judicial às fls. 184-189.

A denúncia foi recebida em 21.03.2012. Na oportunidade, determinou-se a atualização dos antecedentes judiciais dos denunciados: José Almir Boff, Fátima Moro Peletti, Antônio Polet, Luís Mário Fontana, Luiz Carlos Michel, Claudir Cardoso Pereira, Gabriela Goretti Campagnoni, Cleonei Vieira Borges, Neri Vieira Borges, Hermínio Boff e Luiz Gilberto Gatti.

O Ministério Público Eleitoral ofereceu proposta de suspensão condicional do processo a todos os denunciados, à exceção do recorrente, que não atendia as condições para fruir do benefício (fl. 296).

Houve audiência preliminar em 9 de maio de 2012, ocasião na qual foram aceitas todas as propostas de suspensão condicional do processo, e José Almir Boff foi interrogado. Foi determinada a cisão do processo (fls. 319-320).

O réu apresentou defesa preliminar escrita (fls. 323-325).

Durante a instrução foram ouvidas 7 (sete) testemunhas da acusação e 2 (duas) de defesa (fls. 356-357 e 381-382).

As partes apresentaram alegações finais (fls. 385-386 e 388-391).

Sobreveio uma primeira sentença, com a condenação do recorrente (fls. 392-403).

Com o primeiro recurso, subiram os autos a esta Corte, a qual, após parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (fls. 417-421) declarou a nulidade parcial do processo (fls. 427-432), sendo determinada a renovação do interrogatório e das alegações finais. A nulidade, resumidamente, foi declarada, ao fundamento de que a realização do interrogatório do réu ao final do processo, conforme o art. 400 do Código de Processo Penal, se coaduna mais adequadamente com os princípios da ampla defesa e do contraditório do que o art. 359 do Código Eleitoral, que fixa a realização de tal interrogatório para logo após o recebimento da denúncia.

O réu foi interrogado novamente (fls. 443-445) e as partes apresentaram novas alegações finais (fls. 447-450).

Sobreveio sentença (fls. 451-465), a qual, a rigor, manteve a condenação originária.

No novo recurso (fls. 470-478), a defesa suscita preliminar de prescrição e aduz, em síntese, que o conjunto probatório é frágil e insuficiente para ensejar a condenação. Pede o provimento do recurso.

Houve contrarrazões (fls. 412-414) e, nesta instância, foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo desprovimento do recurso (fls. 417-421).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo, interposto no prazo de 10 dias da intimação, conforme o art. 362 do Código Eleitoral.

De início, indico que o recorrente aduz ter ocorrido prescrição, ao argumento de que a pena cominada, de 1 (um) ano e 9 (nove) meses, redundou em prazo prescricional de 4 (quatro) anos, na dicção do art. 109, V, do Código Penal. Indica que o fato ocorreu após o dia 26.06.2008, termo inicial para o cômputo do prazo, conforme o art. 111, I, do Código Penal. Pugna, no ponto, pela declaração de extinção da punibilidade.

Ocorre que, na marcha processual, houve eventos que interromperam a contagem do prazo prescricional. Vide, nessa linha, o recebimento da denúncia, em 21.03.2012 (art. 117, I, do Código Penal), conforme fl. 272, e a publicação de sentença condenatória, também considerada marco interruptivo da prescrição, conforme o comando do inc. IV, art. 117, do Código Penal.

Nítido: entre tais eventos, não correram 4 (quatro) anos, de forma que não ocorreu prescrição de qualquer ordem, mesmo que se tratasse da prescrição retroativa - vigente à época dos fatos e alterada pela Lei n. 12.234, de 5 de maio de 2010.

Relativamente ao mérito propriamente dito, o delito objeto da denúncia é descrito no art. 350 do CE:

Art. 350. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais:

Pena – reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa, se o documento é público, e reclusão até três anos e pagamento de 3 a 10 dias-multa, se o documento é particular.

Narra a peça inicial que o denunciado, após realizadas as convenções partidárias das eleições de 2008, teria alterado as deliberações da convenção do partido ao qual filiado, assinando uma segunda ata, com data retroativa e deliberação diversa da original.

No art. 350 do Código Eleitoral, o bem jurídico tutelado é a fé pública, em seu viés eleitoral, em nítida semelhança do crime de falsidade ideológica previsto no art. 299 do Código Penal. Trata-se de crime formal, cuja consumação ocorre com a ação omissiva ou comissiva, independentemente da ocorrência de prejuízo.

Veja-se a lição de Suzana de Camargo Gomes:

Trata-se do crime de falsidade ideológica transplantado para a órbita eleitoral, sendo que o bem jurídico tutelado, na espécie, é a veracidade do documento, não sua genuinidade ou autenticidade.

Assim, a falsidade de que cogita a norma penal não é de forma, mas de conteúdo. Não há que se falar em adulteração, rasura, inclusão ou retirada de letras ou algarismos do documento.

[...]

Inserir significa incluir, incorporar, expressar no documento declaração inverídica ou de conteúdo diverso daquele que deveria ser mencionado. Já fazer inserir pressupõe a ação de fazer gravar, inscrever, estampar, o que denota a existência de um autor intelectual e de um autor material do crime, este último somente podendo ser assim qualificado se tiver consciência da ilicitude do atuar. Caso contrário, será mero instrumento do agente, não havendo que se falar tenha ele cometido o delito. (GOMES, Suzana de Camargo. Crimes Eleitorais. 3. ed. São Paulo: RT, 2008, pp. 341-343)

E as teses sustentadas em sede recursal não são capazes de enfraquecer a prova acerca da materialidade e autoria. Daí que merece ser mantida a muito bem lançada sentença, que transcrevo com grifos meus, verbis:

A realização de novo interrogatório do réu, após a instrução processual, conforme determinou o egrégio Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, em nada alterou a situação fática e jurídica já reconhecida por ocasião da sentença prolatada às fls. 392-403, razão por que se impõe a condenação do acusado pelos mesmos fundamentos.

Na hipótese concreta, a MATERIALIDADE e a AUTORIA delitiva, inclusive o dolo do agente em cometer o delito, restaram sobejamente comprovadas pela ata nº 01/2008 (fls. 176-178), pela ata nº 02/2008 (fls. 178-179), as duas do Democratas de Novo Tiradentes – RS, e pela prova oral produzida.

Com efeito, da análise das atas nº 01/2008 e 02/2008, do Democratas de Novo Tiradentes – RS, algumas conclusões podem ser retiradas.

A primeira delas é que foi realizada uma primeira convenção partidária pelo Democratas, no dia 28.06.2008, com o nº 01/2008 (fls. 176-178), na qual ficou decido que o partido integraria a Coligação composta também pelo Partido dos Trabalhadores – PT, pelo Partido Progressista – PP e pelo Partido Popular Socialista – PPS. Ainda, na mesma ocasião ficou assentado que o candidato a Prefeito seria o sr. Claudir Cardoso Pereira, do Partido dos Trabalhadores – PT, e a Vice-Prefeito seria o sr. Luzi Carlos Benedette, do Partido Progressista – PP.

A segunda conclusão extraída é que, em tese, foi realizada uma segunda convenção partidária pelo Democratas, no mesmo dia 28.06.2008, agora com o n.º 02/2008 (fls. 176-180), na qual ficou decidido que o partido integraria a Coligação formada pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB, o qual apresentaria o candidato a Prefeito, sr. Edegar Peruzzo, e pelo Partido Progressista – PP, o qual apresentaria o candidato a Vice-Prefeito, sr. Luiz Carlos Benedette.

Portanto, basta analisar o teor das duas atas para se concluir que elas possuíram conteúdos distintos, o que começa a indicar que quem realizou a segunda (nº 02/2008) teve o intuito de que esta prevalecesse sobre a primeira (nº 01/2008). Não bastasse isso, o fato de nelas constar o mesmo dia de elaboração também conforma a inveracidade da segunda, pois não é crível que as duas deliberações tivessem ocorrido na mesma data.

Mas não são apenas esses elementos que confirmam a prática do crime de falsidade ideológica pelo sentenciado: note-se que a ata nº 01/2008 foi assinada por uma série de pessoas (pelo menos oito pessoas, conforme fl. 178), ao passo que a ata nº 02/2008 foi assinada apenas pelo Sr. José Almir Boff, ora sentenciado, e pelo Sr. Hermínio Boff, pai de José Almir e que também foi denunciado pelo mesmo crime eleitoral, só não estando sendo julgado porque se beneficiou com a suspensão condicional do processo.

Em outras palavras, a segunda ata foi assinada somente por quem teve interesse e concordou em participar da segunda deliberação, em substituição à primeira, numa vã tentativa de fazer com que a deliberação da primeira não fosse concretizada.

Aliás, sobre o ponto é interessante trecho da sentença prolatada em processo eleitoral que analisava o pedido de registro da Coligação, que bem sintetiza os acontecimentos. Naquela ocasião, o eminente Juiz Eleitoral, dr. Marco Aurélio Antunes dos Santos, disse (fl. 195v): “A convenção já tinha sido encerrada, quando a decisão do partido foi olimpicamente alterada por duas pessoas. Somente duas pessoas firmaram a nova ata, Hermínio Boff e José Almir Boff, respectivamente pai e filho (fls. 07-09), num verdadeiro conchavo familiar. Referidas pessoas comportaram-se como verdadeiros caciques, desrespeitando a decisão dos convencionais para atender seus interesses pessoais, o que não pode ser tolerado pela Justiça Eleitoral.”

Merece destaque, também, a demonstrar que a segunda ata teve apenas o intuito de fraudar a vontade deliberada na primeira, o fato de que, na ata nº 01/2008, o sr. Hermínio Boff havia passado a Presidência do partido para Francisco Rinaldi. No entanto, estranhamente, na ata nº 02/2008, Hermínio Boff aparece como Presidente, sem fazer qualquer alusão ao sr. Francisco Rinaldi.

Além da prova documental, acima analisada, a prova testemunhal corrobora a prática do delito de falsidade ideológica eleitoral pelo sentenciado, como se passa a analisar.

A testemunha Mauro Dalla Cort disse ser filiada ao Democratas no ano 2008. Participou da primeira convenção, mas não foi chamado a participar da segunda convenção. Lembrou que, na primeira convenção, ficou estabelecido que o PT indicaria o candidato a Prefeito e o PP, o candidato a Vice-Prefeito, com apoio do Democratas. Por ocasião da segunda convenção, houve mudança dos candidatos. Teve ciência da segunda convenção apenas depois que ela aconteceu, não tendo sido convidado para ela. Lembrou de ter sido convidado para a primeira convenção, mas não lembrou se foi convidado para ela pessoalmente. Soube, por boatos, que houve a segunda reunião porque o candidato a Prefeito havia desistido de concorrer. Afirmou que o sr. José Almir Boff não foi beneficiado com a segunda convenção. Acreditou ter sido ilícita a segunda convenção porque não foi para ela convidado (fl. 382).

A testemunha Francisco Rinaldi declarou ter participado da primeira convenção do Democratas em 2008, na qual ficou acertado que o sr. Hermínio Boff, como iria concorrer a vereador, passou a Presidência ao depoente, Sr. Francisco Rinaldi. Após, declarou que o “Cardosinho” não quis mais concorrer, razão por que “fizeram um bom senso”, falsificando uma ata. Não foi convidado e não estava presente na segunda convenção partidária. Ficou consignado na ata da primeira convenção que o depoente seria o Presidente do Democratas a partir de então. Houve uma inconformidade de algumas pessoas, pois a segunda ata estabeleceu um “bom senso”, o que não era a vontade delas. Recordou que, após a desistência de Cardoso, acertou com Hermínio Boff que fariam uma reunião em Novo Tiradentes – RS, no outro dia, às 09 horas. Na hora marcada, disse que Hermínio Boff não estava, tendo ele ido às 08 horas para conversar com Luiz Gilberto Gatti, ocasião em que foi realizada uma nova ata, tendo como Presidente do Democratas Hermínio Boff, em vez do depoente, Sr. Francisco Rinaldi. Disse que a segunda ata foi realizada por Luiz Gilberto Gatti, Hermínio Boff e José Almir Boff (fl. 382).

A testemunha Lídio Vicari referiu ser filiada ao PP e não ter participado de qualquer convenção do Democratas. Acreditou que os srs. José Almir Boff e Hermínio Boff não exerceram nenhum cargo no município de Novo Tiradentes – RS a partir de 2008. Não soube o motivo o motivo de ter havido a segunda convenção partidária do Democratas (fl. 382).

A testemunha Gilson Michel disse ser filiada ao PT. Participou de uma convenção partidária, não lembrando se participou da primeira ou segunda convenção. Não teve conhecimento se o Cardoso desistiu de concorrer. Não soube dizer se os srs. José Almir Boff e Hermínio Boff tiveram algum benefício ou exerceram algum cargo público em Novo Tiradentes – RS (fl. 382).

A testemunha Luiz Machado disse ter ficado sabendo que “Cardosinho” havia desistido de concorrer nas eleições. Sobre as convenções partidárias, nada soube explicar (fl. 357).

A testemunha Antônio Pereira nada soube explicar sobre o segundo fato. Ficou sabendo que Cardoso desistiu de concorrer. Nunca participou de convenção partidária do DEM (fl. 357).

A testemunha João de Oliveira nada soube a respeito do segundo fato. Ficou sabendo, por comentários, que Cardoso havia desistido de concorrer. Mencionou que as pessoas filiadas devem ser convidadas para as convenções partidárias (fl. 357).

As testemunhas Gilson Osvaldo Cruz e Almerinda de Oliveira nada souberam a respeito do fato (fl. 357).

Ao ser interrogado, José Almir Boff disse que, diante da desistência do sr. Claudir Cardoso em concorrer a Prefeito Municipal de Novo Tiradentes – RS, foi realizada uma segunda ata, com a melhor das atenções e com a finalidade de encontrar um outro candidato a Prefeito Municipal. Foi orientado pelo advogado Luiz Gilberto Gatti a realizar a segunda ata. A segunda ata foi realizada em torno de dois a três dias depois da primeira. Acreditou não ter feito nada de errado que alterasse a vontade da convenção. Justificou que a segunda ata foi mantida com a data da primeira, com a finalidade de observar os prazos eleitorais. Justificou, ainda, que, por uma falha, apenas o réu e seu pai, Hermínio Boff, assinaram a segunda ata, pois havia outras pessoas presentes na segunda convenção. Não soube explicar o motivo de o sr. Francisco Rinaldi, então Presidente do Democratas, não ter sido convocado para a segunda convenção. Confirmou ter havido a segunda convenção, a qual teve o objetivo de encontrar um outro candidato a Prefeito Municipal (fl. 445).

Como se viu de suas sínteses, os depoimentos de Lídio Vicari, Gilson Michel, Luiz Machado, Antônio Pereira, João de Oliveira, Gilson Osvaldo Cruz e Almerinda de Oliveira muito pouco ou quase nada demonstraram a respeito do segunda fato descrito na denúncia.

No entanto, os depoimentos de Mauro Dalla Cort e Francisco Rinaldi corroboram a prova documental, de modo a comprovar, de maneira contundente, a prática do delito pelo acusado, pois os dois depoentes foram unânimes em afirmar que, embora tenham participado da primeira convenção partidária e fossem filiados ao Democratas de Novo Tiradentes – RS, sem qualquer justificativa plausível não foram chamados para participar da segunda convenção, mais um indicativo da vontade deliberada de José Almir Boff e das demais pessoas que elaboraram a segunda ata em não seguir a vontade da maioria deliberada na primeira convenção partidária. Em especial, o depoimento do sr. Francisco Rinaldi (fl. 382) é elucidativo para a comprovação do crime, pois ele confirmou ter sido escolhido o Presidente do Democratas de Novo Tiradentes - RS quando da primeira convenção partidária, mas não ter sido convidado para participar da segunda, fato, aliás, que já é comprovado pela prova documental.

Além disso, o sr. Francisco Rinaldi declarou de forma minudente como se deu a elaboração da segunda ata partidária do Democratas: com a desistência de Claudir Cardoso Pereira em concorrer ao cargo de Prefeito, os srs. Luiz Gilberto Gatti, Hermínio Boff e José Almir Boff elaboraram uma segunda ata partidária, na qual ficou estabelecido que o Democratas participaria do consenso de partidos para as eleições municipais, o que não era a vontade da maioria das pessoas filiadas ao partido. Note-se que o sr. Francisco Rinaldi mencionou inclusive ter marcado às 09 horas de um dia para conversar com Hermínio Boff a respeito da nova convenção, mas não obteve êxito. Perceba-se, ainda, que o sr. Francisco Rinaldi chamou o consenso de “bom senso”, ao prestar seu depoimento.

Quanto às alegações do acusado, de que não tinha conhecimento do teor da ata, de que não pretendia prejudicar ninguém e de que a segunda convenção apenas pretendia resolver a questão envolvendo a desistência do candidato a Prefeito Claudir Cardoso Pereira, não prosperam e têm o único intuito de o livrar das consequências de sua conduta. Tanto o réu sabia do seu conteúdo que a assinou, na companhia de duas outras pessoas, srs. Luiz Gilberto Gatti e Hermínio Boff, e com a intenção de que o Democratas participasse do consenso de partidos políticos para as eleições municipais de 2008. Ademais, por hipótese, mesmo que se impusesse a realização de nova convenção, em face da desistência de um candidato, impunha-se-ia também a convocação de todos os filiados do Democratas para a nova deliberação, tal como aconteceu na primeira, a fim de que a vontade da maioria fosse respeitada.

Afora isso, o fato de a ata nº 02/2008 ter a mesma data da ata nº 01/2008 demonstra de maneira nítida que os srs. Luiz Gilberto Gatti, Hermínio Boff e José Almir Boff elaboraram-na às escondidas, para que a vontade dos demais filiados ao Democratas, já manifestada em legítima deliberação anterior, fosse alijada do processo democrático de Novo Tiradentes – RS.

Como se percebe de toda a prova analisada, documental e testemunhal, todos os elementos comprovam à saciedade a prática do crime de falsidade ideológica eleitoral por parte de José Almir Boff, pois ele, na companhia de duas outras pessoas, aproveitando a desistência de Claudir Cardoso Pereira em concorrer ao cargo de Prefeito Municipal, numa manobra ardilosa e de má-fé, resolveu realizar uma segunda convenção partidária do Democratas de Novo Tiradentes – RS (ata nº 02/2008), a fim de que somente a vontade sua e de seu pai, sr. Hermínio Boff, fosse consideradas, para que o Democratas participasse do consenso de partidos no Município, em detrimento, por consequência, da vontade dos demais filiados do partido e que já havia sido deliberada, conforme ata nº 01/2008.  (Grifei.)

Com efeito, a materialidade e a autoria restaram comprovadas diante do conteúdo da primeira e segunda atas de convenção partidária do DEM, ocorridas no mesmo dia, bem como pelos depoimentos colhidos.

Resta claro que José Almir Boff, juntamente com outros denunciados, com o intuito de alterar as deliberações constantes da convenção partidária do DEM (ata 01/2008), ocorrida em 26 de junho de 2008, redigiu nova ata da convenção (ata 02/2008), inserindo declarações falsas em documento particular, ao registrar que, no dia 28 de junho de 2008 ocorreu a convenção do partido sob a presidência de Hermínio Boff, com abertura de edital de convocação, publicado e afixado no átrio da Câmara Municipal de Vereadores, sendo decidido que o partido apoiaria o candidato a prefeito indicado pelo PMDB. Ou seja, o documento não retrata a verdade da deliberação do partido e foi assinado por pessoa que estava licenciada da presidência da agremiação.

A conduta do agente na realização de uma segunda convenção partidária a fim de que somente a sua vontade e de seu pai, Hermínio Boff, fossem consideradas, para que o Democratas participasse do consenso de partidos no município, em detrimento, por consequência, da vontade dos demais filiados do partido e que já havia sido deliberada, conforme ata nº 01/2008, demonstra a finalidade eleitoral.

O dolo específico restou caracterizado, à medida que a declaração inverídica, inserida na segunda ata, teve o desiderato de alterar a vontade do Partido Democratas de Novo Tiradentes, contaminando uma das fases do processo eleitoral, qual seja, as convenções partidárias.

Configurado, portanto, o elemento subjetivo do tipo ao qual se refere Suzana de Camargo Gomes (GOMES, Suzana de Camargo. Crimes eleitorais. 4.ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 280), que novamente reproduzo:

O elemento subjetivo do tipo é o dolo específico, expresso na vontade livremente dirigida à ação ou omissão prevista no art. 350 do Código Eleitoral, com o fim especial de afetar o processo eleitoral, em qualquer um de seus atos ou fases, seja no que concerne ao alistamento de eleitores ou registro de candidatos e filiados a partidos políticos, seja no que diz respeito à propaganda eleitoral, votação, apuração e diplomação dos eleitos.

Assim, configuradas a materialidade delitiva e a autoria, deve ser mantida a condenação do réu nas sanções do art. 350 do Código Eleitoral.

Por oportuno, reproduzo precedente desta Corte:

Recurso criminal. Falsidade ideológica eleitoral.

Comprovada a alteração dos fatos na ata da convenção partidária, não retratando a verdade da reunião. Conjunto probatório suficiente para caracterizar a materialidade e a autoria do delito previsto no art. 350 do Código Eleitoral. Provimento negado .

(TRE-RS, RECURSO CRIMINAL nº 32005, Acórdão de 31.10.2006, Relatora DESA. FEDERAL SILVIA MARIA GONÇALVES GORAIEB, Publicação: DJE - Diário de Justiça Estadual, Tomo 205, Data 07.11.2006, Página 51.) (Grifei.)

Deve, portanto, ser mantida a bem lançada sentença que condenou o réu pela prática do crime previsto no art. 350 do Código Eleitoral.

Ante o exposto, afastada a preliminar suscitada de ofício, VOTO pelo desprovimento do recurso.