RE - 1526 - Sessão: 10/07/2014 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por JENIFER DA SILVA DA ROSA (fls. 10-13) contra decisão do Juízo da 85ª Zona Eleitoral de Torres, que indeferiu o pedido de transferência da sua inscrição eleitoral para o município de Dom Pedro de Alcântara durante período de revisão do eleitorado, por entender que não restou comprovado o alegado vínculo afetivo e social com o referido município (fls. 08-08v.)

A recorrente, em suas razões, busca a reforma da decisão, alegando possuir vínculo afetivo e social com o município, à medida que reside regularmente com a família de seu namorado, Zenon da Luz Webber, do que são prova a declaração da mãe desse, Rosana da Luz Webber e o comprovante de residência da mesma. Sustenta que o TSE, ao interpretar os arts. 42 e 55 do Código Eleitoral, tem ampliado o conceito de domicílio eleitoral, não o restringindo ao lugar de residência ou moradia do eleitor para permitir a transferência nos casos em que há vínculo político, afetivo, patrimonial e comunitário com o município (fls. 10-13).

A Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 19-20v.).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

VOTOS

Dr. Leonardo Tricot Saldanha:

O recurso é tempestivo. A recorrente foi intimada da decisão no dia 13.02.2014, quinta-feira (fl. 08v.), e interpôs o recurso no dia 17.02.2014, segunda-feira (fl. 09), dentro, portanto, do prazo de 3 dias previsto no art. 80 do Código Eleitoral.

No mérito, o recurso merece ser acolhido.

A juíza sentenciante indeferiu o requerimento de transferência eleitoral da recorrente, por entender ausente prova do seu vínculo afetivo e social com o município de Dom Pedro de Alcântara, em que, ademais, já realizados quatro procedimentos de revisão eleitoral, circunstância que exige a adoção de um conceito restritivo de domicílio eleitoral.

Os artigos 42, parágrafo único, e 55, inciso III, do Código Eleitoral, assim dispõem sobre o domicílio eleitoral:

Art. 42. O alistamento se faz mediante a qualificação e inscrição do eleitor.

Parágrafo único. Para o efeito da inscrição, é domicílio eleitoral o lugar de residência ou moradia do requerente, e, verificado ter o alistando mais de uma, considerar-se-á domicílio qualquer delas.
[...]
Art. 55. Em caso de mudança de domicílio, cabe ao eleitor requerer ao Juiz do novo domicílio sua transferência, juntando o título anterior.

§ 1° A transferência só será admitida satisfeitas as seguintes exigências:

[...]

III – residência mínima de 3 (três) meses no novo domicílio, atestada pela autoridade policial ou provada por outros meios convincentes.

É pacífico o entendimento de que o referido conceito não se confunde com o de domicílio civil. Aquele é mais amplo, abrangendo situações em que haja vínculo patrimonial, profissional ou comunitário com a cidade, conforme leciona José Jairo Gomes:

No Direito Eleitoral, o conceito de domicílio é mais flexível que no Direito Privado. Com efeito, o artigo 4º, parágrafo único, da Lei n. 6.996/82, dispõe que, para efeito de inscrição, domicílio eleitoral é o lugar de residência ou moradia do requerente, e, verificado ter o alistando mais de uma, considerar-se-á domicílio qualquer delas. É essa igualmente a definição constante do artigo 42, parágrafo único, do Código Eleitoral. Logo, o Direito Eleitoral considera domicílio da pessoa o lugar de residência, habitação ou moradia, ou seja, não é necessário haver animus de permanência definitiva, conforme visto. Tem sido admitido como domicílio eleitoral qualquer lugar em que o cidadão possua vínculo específico, o qual poderá ser familiar, econômico, social ou político.

(GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 4ª. ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 110-111.)

A jurisprudência do TSE consolidou-se no mesmo sentido, de modo a flexibilizar a norma inserta nos artigos supramencionados, admitindo como domicílio eleitoral o local onde o eleitor possua vínculos familiares, afetivos, ou econômicos, como se extrai das seguintes ementas:

DOMICÍLIO ELEITORAL - TRANSFERÊNCIA - RESIDÊNCIA - ANTECEDÊNCIA (CE, ART. 55) - VÍNCULOS PATRIMONIAIS E EMPRESARIAIS.

 Para o Código Eleitoral, domicílio é o lugar em que a pessoa mantém vínculos políticos, sociais e afetivos. A residência é a materialização desses atributos. Em tal circunstância, constatada a antiguidade desses vínculos, quebra-se a rigidez da exigência contida no art. 55, III.

(REspe n. 23.721/RJ, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 18.3.2005.)

 

DOMICÍLIO ELEITORAL - TRANSFERÊNCIA - RESIDÊNCIA - ANTECEDÊNCIA (CE, ART. 55) - VÍNCULOS PATRIMONIAIS E EMPRESARIAIS.

Para o Código Eleitoral, domicílio é o lugar em que a pessoa mantém vínculos políticos, sociais e econômicos. A residência é a materialização desses atributos. Em tal circunstância, constatada a antiguidade desses vínculos, quebra-se a rigidez da exigência contida no art. 55, III.

(Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 4.769, Acórdão n. 4.769 de 02.10.2004, Relator Min. Humberto Gomes de Barros, Publicação: DJ - Diário de Justiça, Volume 1, Data 17.12.2004, Página 316 RJTSE - Revista de Jurisprudência do TSE, Volume 15, Tomo 3, Página 263.)

 

RECURSO ESPECIAL. TRANSFERÊNCIA. DOMICÍLIO ELEITORAL. CARACTERIZADO. APELO PROVIDO.

Tendo o eleitor demonstrado seu vínculo com o município, defere-se o pedido de transferência.

(REsp n. 21.829, Acórdão n. 21.829 de 09.09.2004, Relator Min. Francisco Peçanha Martins, Publicação: DJ - Diário de Justiça, Volume 1, Data 01.10.2004, Página 150.)

No mesmo sentido, é a jurisprudência desta Corte, consoante ementado:

Recurso. Decisão que julgou improcedente impugnação de transferência de domicílio eleitoral. Alegada residência temporária no município em que o eleitor presta serviço. Flexibilidade do conceito de domicílio eleitoral, identificado como lugar onde o eleitor tem vínculos patrimoniais, profissionais ou sociais. Desprovimento.

(RE 46-81, Acórdão da sessão do dia 14.06.2012, Relator Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz.)

 

Recurso. Decisão que julgou improcedente pedido de cancelamento de transferência e alistamento dos 57 eleitores recorridos.
Aludidos eleitores integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, tendo instruído seus requerimentos de transferência com certidões de atendimento por agentes de saúde municipais.
Distinção entre os conceitos de domicílio eleitoral e domicílio civil. Amplitude maior daquele em relação a este, uma vez que abrange situações em que há vínculo profissional, patrimonial ou comunitário com o município, nos termos do art. 64 da Resolução TSE n. 20.132/98.
Condição especial dos recorridos como membros de movimento social desprovido de registros oficiais, chancelando o atendimento de saúde como única forma de evidenciar suas presenças na cidade para a qual requerem transferência eleitoral. Fragilidade, contudo, da referida prova - ante o caráter universal do atendimento médico -, que pode ser afastada pela comprovação da inexistência de ligação com a localidade. Provimento parcial, para cancelar o alistamento de 28 eleitores no tocante aos quais existem, nos autos, elementos que tornam duvidoso o vínculo por eles declarado com o município para o qual pretendem transferir-se.

(RE 262008. Sessão do dia 29.07.2008, Relator Des. Federal Vilson Darós.)

No presente caso, a recorrente alega residir com a família de seu namorado, Zanon da Luz Webber, há mais de 2 anos, tendo declarado, sob as penas da lei, o endereço da família do mesmo ao solicitar a transferência de seu domicílio eleitoral (fl. 03). Essa declaração foi confirmada pela própria mãe do seu namorado, Rosana da Luz Webber, cujo endereço está suficientemente demonstrado nos autos (fls. 06-07).

Assim, entendo que há prova suficiente do vínculo afetivo da recorrente com o município de Dom Pedro de Alcântara, motivo pelo qual tem direito de participar das decisões políticas da localidade, o que respalda a manutenção desta no cadastro eleitoral, na forma já realizada.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso, a fim de manter a inscrição da eleitora JENIFER SILVA DA ROSA no Município de Dom Pedro de Alcântara.