RP - 6953 - Sessão: 03/06/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pela Procuradoria Regional Eleitoral (fls. 206-212) contra sentença (fls. 198-202) que julgou improcedente representação por propaganda eleitoral extemporânea contra RONALDO MIRO ZULKE e PARTIDO DOS TRABALHADORES – PT do Rio Grande do Sul – em razão da distribuição de material impresso intitulado “Rodovia do Parque – BR 448 – para melhorar a vida dos gaúchos”, em 24 de março de 2014, entre o acesso da Av. Júlio de Castilhos para a Av. Presidente Castelo Branco e a Rua da Conceição, no centro desta Capital, o qual teria sido confeccionado pelo demandado, que ocupa cargo de Deputado Federal.

O recorrente alega que o material constitui propaganda eleitoral antecipada, visto que possui slogan, faz menção a candidatos à eleição majoritária, traz a identificação do partido, foto do representado junto à Presidente Dilma e a sua logomarca de campanha a deputado, tudo como forma de quebrar a paridade de forças com os demais concorrentes ao pleito que se aproxima, não se caracterizando mera divulgação de ato parlamentar, motivo pelo qual requer a imediata proibição da distribuição do material e aplicação das sanções cabíveis, nos termos do art. 36, § 3°, da Lei n. 9.504/97 (fls. 206-212).

Em contrarrazões, os recorridos pugnam pelo desprovimento do recurso (fls. 218-239 e 241-245).

É o breve relatório.

 

 

 

 

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do prazo de 24 horas previsto no art. 96, § 8º, da Lei n. 9.504/97.

Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, deve ser conhecido.

Mérito

Ao decidir monocraticamente o feito, assim me manifestei (fls. 198-202):

[...] A propaganda eleitoral somente é permitida a partir do dia 5 de julho do ano da eleição, conforme art. 36 da Lei nº 9.504/1997, combinado com art. 2º da Resolução TSE n. 23.404/2014, que dispõe sobre a propaganda e as condutas ilícitas em campanha eleitoral para o pleito que se aproxima.

No dizer de José Jairo Gomes (Direito Eleitoral. 6ª edição, São Paulo, Editora Atlas, 2011, pág. 320), “Denomina-se propaganda eleitoral a elaborada por partidos políticos e candidatos com a finalidade de captar votos do eleitorado para investidura em cargo público-eletivo. Caracteriza-se por levar ao conhecimento público, ainda que de maneira disfarçada ou dissimulada, candidatura ou os motivos que induzam à conclusão de que o beneficiário é o mais apto para o cargo em disputa. Nessa linha, constitui propaganda eleitoral aquela adrede preparada para influir na vontade do eleitor, em que a mensagem é orientada à conquista de votos.”

No entanto, não é toda a publicidade exteriorizada em período anterior ao legalmente permitido que caracterizaria a propaganda extemporânea.

O art. 36-A da Lei n. 9.504/97, repetido no art. 3º referida Resolução, estabelece os casos em que não será considerada propaganda eleitoral antecipada, nos seguintes termos:

I - a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, desde que não haja pedido de votos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;

II - a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, planos de governos ou alianças partidárias visando às eleições;

III - a realização de prévias partidárias e sua divulgação pelos instrumentos de comunicação intrapartidária; ou

IV - a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos, desde que não se mencione a possível candidatura, ou se faça pedido de votos ou de apoio eleitoral. (grifei)

Conforme o magistério de Rodrigo López Zílio (Direito Eleitoral. 3ª edição, Porto Alegre, Editora Verbo Jurídico, 2012, pág. 288), “A jurisprudência tem traçado distinção entre a promoção pessoal e a propaganda eleitoral extemporânea; aquela é permitida, ao passo que esta é vedada. Conforme o TSE, 'a mera divulgação do nome e do trabalho desenvolvido, sem referência a eleições, candidaturas e votos, não caracteriza propaganda eleitoral antecipada.' (AgRg no AI nº5.275 – Rel. Min. Luiz Carlos Madeira – j. 01.02.2005).

Ainda conforme o mencionado Autor, “A diferença entre promoção pessoal e propaganda eleitoral torna-se ainda mais nebulosa quando se trata das prestações das contas de candidatos já em exercício de mandato, quando há divulgação de mensagens alusivas a datas especiais, comemorativas e eventos públicos e, ainda, nas hipóteses envolvendo adesivos em veículos automotores.

A veiculação e distribuição de boletins informativos de parlamentares e candidatos à reeleição, no mais das vezes, coloca o julgador na situação limite entre o que é lícito – porque configura prerrogativa do mandato exercido – e o que é vedado pela legislação eleitoral – porque caracteriza violação ao princípio da igualdade de oportunidades entre os candidatos, na medida em que configura a antecipação da propaganda.”

As dificuldades desafiadoras apontadas na lição transcrita se amoldam ao caso posto sob análise, mas adianto que não impedem seja afastada a incidência de propaganda eleitoral realizada a destempo.

De modo a estabelecer critérios que tornem menos árdua a tarefa de distinguir a propaganda eleitoral da mera promoção pessoal, busca-se na jurisprudência as diretrizes mencionadas para enquadrar a situação enfrentada.

A paradigmática decisão contida no Recurso Especial Eleitoral nº 16.183 (Rel. Min. José Eduardo Alckmin), dispõe que “Propaganda eleitoral contendo mensagem de boas festas. Conduta que não se tipifica como ilícita. O mero ato de promoção pessoal não se confunde com propaganda eleitoral. Entende-se como ato de propaganda eleitoral aquele que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, mesmo que apenas postulada, a ação política que se pretende desenvolver ou razões que induzam a concluir que o beneficiário é o mais apto ao exercício da função pública. Sem tais características, poderá haver mera promoção pessoal – apta, em determinadas circunstâncias, a configurar abuso de poder econômico – mas não propaganda eleitoral. Recurso não conhecido.”

A par dessas orientações, deve-se analisar, além do texto da publicidade, os demais fatores que a compõe, como as imagens, o meio utilizado, número, o alcance da divulgação, circunstâncias que podem auxiliar na caracterização.

2.3. O informativo (fls. 11-12) é composto de duas folhas, com 21 cm por 18,5 cm, dobrável ao meio, na cor predominante azul escuro, com textos em fundo branco e, também, em fundo azul, além de dizeres de maior destaque.

O panfleto traz fotos da rodovia, com destaque para a sua obra de arte mais chamativa, a ponte sobre um dos braços do rio Jacuí, próxima da Arena do Grêmio e da Freeway. Além delas, também traz fotos do representado com outros políticos e, principalmente, junto à Presidente Dilma e do Governador Tarso Genro, de igual modo filiados ao PT.

Examinado o impresso, verificam-se dois pequenos indicativos de possível logomarca do representado, escrito Zulke, em branco e em preto, com a referência à sua condição de Deputado Federal, expondo a estrela vermelha que carateriza sua sigla partidária.

Na parte central, em duas páginas, um mapa da região sobre uma foto de satélite, contemplando as estradas que interligam os municípios e o indicativo das melhorias da BR 116.

Observo, por primeiro, que o texto retrata uma visão retrospectiva dos acontecimentos, um relato das etapas que levaram à concretização da BR 448 – Rodovia do Parque, inclusive com dados informativos, como extensão, municípios abrangidos pela malha rodoviária da região, custo da obra etc., a par das melhorias que a estrada proporciona à comunidade. O texto fala de uma conquista para a comunidade abrangida pelas obras de infraestrutura, não de algo a ser buscado, que ainda necessitasse ser feito e, desse modo, sem poder prescindir da intervenção do representado.

Verifico, com isso, que inexiste a proposição de possíveis ações a serem empreendidas em um mandato futuro, a promessa de que o parlamentar merece continuar em seu cargo para que as obras se desenvolvam.

A referendar o entendimento explicitado, recorro novamente à lição de Zilio (ob. cit., fl. 290), quando refere que A divulgação de atos parlamentares deve, necessariamente, ser retrospectiva – e não prospectiva. Dito de outro modo, divulgam-se atos já praticados no curso do mandato parlamentar, e não possível ação de mandato futuro.

Noto, ainda, ao inverso do contido na inicial, que o panfleto faz referência à ação empreendida pelo demandado, mesmo que não seja de modo extremamente claro, mas guarda consonância com sua atuação parlamentar, como notório representante da região, quando afirma que a construção da via é resultado de muita luta ao lado da sociedade gaúcha, que se mobilizou e se juntou a nós (ou seja, ao Deputado Federal Zulke) no Comitê de Acompanhamento das Obras de Infraestrutura Viária da Região Metropolitana de Porto Alegre.

Por oportuno, consigno que os anexos que integram a defesa do representado atestam, mediante registros jornalísticos de periódicos da região metropolitana de Porto Alegre, que remontam a 2005, a participação efetiva do Deputado Zulke durante a tramitação das diversas fases que compreenderam a realização da obra, inclusive sua atuação no Comitê antes mencionado.

Confrontado o conteúdo do impresso contendo a prestação das realizações do parlamentar durante o mandato que desempenha, não se pode inferir que possua força para inculcar no eleitor referência antecipada à campanha para 2014, podendo influir no desiderato do eleitor, nem mesmo de forma subliminar.

As fotos estão vinculadas ao trabalho desenvolvido, sendo demasiado pressupor que o autor do informativo deva se “esconder” justamente quando está expondo as realizações de sua atividade junto à comunidade que representa. Não há menção ao número que teria concorrido no pleito passado. Não há menção às eleições deste ano. Não há menção ao ano de 2014. Não há, portanto, mesmo de forma dissimulada, a sugestão de o representado se mostrar como o mais apto ao exercício da função pública.

Por outro lado, não é possível aferir a quantidade de pessoas alcançadas pela mensagem contida no panfleto impugnado, havendo tão somente o exemplar que a inicial junta, podendo-se verificar que sua distribuição no local indicado desta Capital, conforme as fotos das fls. 13-18, está adstrita a um único divulgador, que está vestido de bermudas e camiseta vermelha.

Não bastassem essas considerações, chama a atenção a antecedência com que foi divulgado o panfleto, em março deste ano, em oportunidade muito anterior ao pleito que ocorre no mês de outubro vindouro.

Não se desconhece que a lei não delimita uma marco a partir do qual possa se caracterizar a publicidade como antecipada, nem que o TSE entende ser de somenos “a distância temporal entre o ato impugnado e a data das eleições ou das convenções partidárias de escolha dos candidatos.”. No entanto, não se pode desconsiderar que a época de veiculação do impresso arrefece o impacto que poderia causar na quantidade indeterminada de eleitores abrangidos, visto que eventual publicidade perde o vigor e embaça na mente do destinatário o possível propósito eleitoral diante da distância no tempo entre um marco e outro. Note-se que não há referência de a divulgação ter se prolongado além daquele dia mencionado na inicial.

Assim, não vislumbro no referido boletim informativo as características necessárias, mesmo que subliminares, para caracterizá-lo como propaganda eleitoral extemporânea.

Desta forma, necessário concluir que o material de divulgação guarda compromisso com o escopo principal de esclarecer os destinatários sobre a atuação do parlamentar, especialmente focando seus feitos durante o transcurso do mandato para o qual foi eleito.

A jurisprudência deste Tribunal, em situações semelhantes, também é nesse sentido:

Recursos. Decisão que julgou parcialmente procedente representação por propaganda eleitoral extemporânea. Imposição de multa à primeira recorrente.

Inexistência de menção a candidatura, slogan de campanha, número da candidata ou partido político nos calendários impugnados. Boletim informativo adstrito a veicular a atividade parlamentar da representada, sem referências a eventual proposta política ou a pretensão de pleito futuro. Publicidade que não se caracteriza como eleitoral. Provimento ao apelo da primeira recorrente e desprovimento dos recursos remanescentes.

(Processo Rp 58, Rel. Dr. Ícaro Carvalho de Bem Osório, de 27/10/2009).

 

Recurso. Distribuição de folders com prestação de contas do exercício do mandato parlamentar, contendo críticas aos poderes executivos - estadual e municipal -, além de enumerar compromissos e conquistas políticas.

Afastada prefacial de ilegitimidade passiva da agremiação partidária. Responsabilidade solidária do partido pelos atos de propaganda de seus filiados (art. 241 do Código Eleitoral).

A mera divulgação do nome e do trabalho desenvolvido pela parlamentar, sem menção às eleições, candidaturas ou votos, não caracteriza propaganda eleitoral antecipada. Admissão de críticas a agentes políticos desde que alcancem apenas o desempenho do cargo e sejam de interesse público. Ausência de elementos caracterizadores de publicidade subliminar.

Inocorrência de ofensa ao art. 36 da Lei das Eleições.

Provimento.

(Processo Rp 33, Relator Dr. Jorge Alberto Zugno, de 1º/07/2010.)

 

Por fim, chamo a atenção para o fato de que o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul está atento às ações de políticos que desbordem do regramento permitido para divulgação de suas realizações, na estrita conformidade com o permissivo legal, pois eventual descumprimento receberá a oportuna sanção prevista na Lei das Eleições.

Diante do exposto, afastada a preliminar suscitada, julgo improcedente a representação proposta por propaganda eleitoral extemporânea.

O recurso interposto reitera os argumentos expostos pelo representante na peça inaugural, não trazendo inovações que possam alterar a convicção já firmada.

Volto a registrar que o conteúdo do impresso impugnado contém realizações do parlamentar, as quais puderam ser corroboradas por registros que integram os anexos da defesa – periódicos da região metropolitana de Porto Alegre, que remontam à 2005, nos quais constata-se a participação efetiva do Deputado Zulke durante a tramitação das diversas fases que compreenderam a realização da obra, inclusive sua atuação no Comitê de Acompanhamento das Obras de Infraestrutura Viária da Região Metropolitana de Porto Alegre.

Ademais, não há qualquer menção a candidatura futura, não se podendo inferir que o impresso possua força para inculcar no eleitor referência antecipada à campanha para as eleições de 2014, ou que possa influir em sua vontade, ainda que de forma subliminar.

Por fim, destaco que não há menção ao número com o qual o parlamentar teria concorrido no pleito passado, não há menção às eleições deste ano, nem ao ano de 2014. Inexiste, portanto, ainda que de forma dissimulada, a sugestão de o representado se mostrar como o mais apto ao exercício da função pública.

Em suma, o impresso impugnado veicula informações sobre a atividade do parlamentar, não possuindo as características necessárias, mesmo que subliminares, para caracterizá-lo como propaganda eleitoral extemporânea.

Por oportuno, cumpre ressaltar, conforme já advertido na decisão monocrática, que o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul está atento às ações de políticos que desbordem do regramento permitido para divulgação de suas realizações, na estrita conformidade com o permissivo legal, pois eventual descumprimento receberá a oportuna sanção prevista na Lei das Eleições.

Em face do exposto, VOTO por negar provimento ao recurso.

 

Voto Divergente:

Dr. Luis Felipe Paim Fernandes:

A meu sentir o deputado circulou nesse processo com uma desenvoltura entre o permitido e o proibido. Há uma evidente propaganda eleitoral visando às próximas eleições. A meu sentir há uma propaganda subliminar, com planfeto apresentando nome do candidato, aproveitando obra do governo do Rio Grand do Sul para destacar uma futura candidatura ao próximo pleito. Entendo como propaganda extemporânea e estou divergindo do voto, dando provimento ao recurso do Procurador Regional Eleitoral, fixando multa no valor de R$ 10.000,00.