RE - 2268 - Sessão: 01/07/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por SANDRA MARIA ZIMMERMANN MARTINI contra decisão do Juízo da 112ª Zona Eleitoral, que julgou procedente a representação por doação acima do limite estabelecido no artigo 23, I, § 1º, da Lei n. 9.504/97, ajuizada em seu desfavor pelo Ministério Público Eleitoral, condenando a representada ao pagamento de multa no valor de R$ 11.460,00.

Em suas razões recursais (fls. 108-114), a recorrente alega a decadência da ação, pois somente foi notificada no dia 26 de agosto de 2013. Argumenta ter doado valores estimáveis em dinheiro, consistentes no empréstimo de um veículo e cedência de serviço de assessoria jurídica, propugnando que tais doações estão sujeitas ao limite previsto no artigo 23, § 7º, da Lei n. 9.504/97. Requer que seja julgada improcedente a representação.

Com as contrarrazões, nesta instância, os autos foram encaminhados com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, a qual se manifestou pelo desprovimento do recurso (fls. 128-123).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. O recorrente foi intimado da decisão em 14 de março de 2014 (fl. 107), sexta-feira, e interpôs o recurso no dia 19 do mesmo mês, quarta-feira, dentro do prazo de 3 dias previsto no art. 81, § 4º, da Lei n. 9.504/97.

No mérito, a recorrente alega ter havido a decadência da ação.

Estabelece o artigo 21, parágrafo único, da Resolução 23.376/2011, que as representações por doação acima do limite legal devem ser propostas 180 dias após a diplomação dos eleitos:

Art. 21. [...]

Parágrafo único. As representações de que trata o caput deste artigo poderão ser ajuizadas até a data da diplomação, exceto as do art. 30-A e dos arts. 23 e 81 da Lei nº 9.504/97, que poderão ser propostas, respectivamente, no prazo de 15 dias e no de 180 dias a partir da diplomação.

No caso, as doações foram feitas no pleito realizado no Município de Independência, cuja diplomação ocorreu em 18 de dezembro de 2012. Como a ação foi proposta no dia 04 de junho de 2013, evidente que não houve o transcurso do prazo estabelecido.

Seguindo na análise do mérito, a representada, Sandra Maria Zimmermann Martini, realizou doações, no pleito de 2012, que totalizaram o montante de R$ 4.500,00 (fls. 34-35). Como a doadora auferiu no ano de 2011 o total de R$ 22.080,00 (fl. 57), teria extrapolado 10% dos seus rendimentos, afrontando, assim, o artigo 23, § 1º, I, da Lei n. 9.504/97:

Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei.

§ 1º As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas:
I - No caso de pessoa física, a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior à eleição.

Nada obstante, verifica-se que as doações efetuadas foram estimáveis em dinheiro, e não em espécie, como se extrai dos documentos das folhas 34 e 35, consistentes no empréstimo de um veículo e de serviços de assessoria jurídica, de acordo com o que informa a defesa.

A respeito desta espécie de doação, existe regra específica no ordenamento, prevista no artigo 23, § 7º, da Lei n. 9.504/97:

Art. 23. [...]

§ 7º O limite previsto no inciso I do § 1º não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador, desde que o valor da doação não ultrapasse R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).

O magistrado sentenciante julgou procedente a representação sob os  seguintes fundamentos: a) os serviços doados não podem ser inseridos no limite do aludido § 7º, que apenas se refere a “bens móveis ou imóveis”; e b) a representada não comprovou a efetiva propriedade do veículo alegadamente doado.

Relativamente à doação de serviços, o egrégio Tribunal Superior Eleitoral admite que tal cessão está incluída no limite previsto no artigo 23, §7º, da Lei n. 9.504/97:

Representação. Doação acima do limite legal.

1. A doação de serviços estimáveis está incluída na ressalva prevista no art. 23, § 7º, da Lei nº 9.504/97, que diz respeito aos bens móveis ou imóveis de propriedade do doador, pois constitui atividade com valor econômico que, em razão de sua prestação obriga, em tese, o beneficiário à necessária contraprestação.

2. A doação de serviços para campanha eleitoral envolve, para efeito de análise financeira das campanhas, a renúncia ao direito pessoal de caráter patrimonial, ou seja, o direito de crédito que faria jus o doador, o qual, na hipótese prevista no inciso III, do art. 83 do Código Civil Brasileiro, deve ser considerado como bem móvel.

3. A doação de prestação de serviços de divulgação de panfletos não ultrapassou o limite de R$ 50.000,00 previsto no § 7º do art. 23 da Lei das Eleições, ainda que somado ao valor atinente à cessão do veículo de propriedade do recorrente.

Recurso especial a que se dá provimento, para julgar improcedente a representação.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 1.787, Acórdão de 01.10.2013, Relator Min. Henrique Neves da Silva, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 198, Data 15.10.2013, Página 31.)

No tocante à ausência de prova da efetiva propriedade do veículo doado, entendo que, pelas circunstâncias do caso, esse ônus não deve recair sobre a representada.

Desde o início da representação já se tinha a notícia de que foram realizadas doações estimáveis em dinheiro, e não em espécie (fls. 34-35). Nessa linha, a representada não alegou qualquer fato modificativo da situação trazida aos autos pelo representante, ao contrário, somente reafirmou a doação estimável em dinheiro, indo além, esclarecendo em que consistiam tais doações.

Diga-se, ademais, que não existem indícios ou sequer notícias de fraude nas doações realizadas, ou na prestação de contas dos candidatos e partidos beneficiados.

Veja-se que os documentos relativos à natureza e valor das doações foram admitidos para reconhecer o excesso legal, mas negados quanto à validade e regularidade de tais cessões, sem qualquer evidência da ilegalidade desses atos. O artigo 373, parágrafo único, e 380, ambos do CPC, estabelecem que os documentos utilizados como prova devem ser admitidos como válidos em seu conjunto:

Art. 373 [...]

Parágrafo único. O documento particular, admitido expressa ou tacitamente, é indivisível, sendo defeso à parte, que pretende utilizar-se dele, aceitar os fatos que lhe são favoráveis e recusar os que são contrários ao seu interesse, salvo se provar que estes se não verificaram.

 

Art. 380. A escrituração contábil é indivisível: se dos fatos que resultam dos lançamentos, uns são favoráveis ao interesse de seu autor e outros lhe são contrários, ambos serão considerados em conjunto como unidade.

Assim, tratando-se de doação estimável em dinheiro de pessoa física, está inserida no limite previsto no artigo 23, § 7º, da Lei n. 9.504/97, cabendo ao representante demonstrar a irregularidade de tal doação, especialmente quando a sua natureza não é alegada como fato modificativo das circunstâncias já trazidas com a inicial da ação.

Assim, deve ser julgada improcedente a representação, diante da obediência ao limite estabelecido no artigo 23, § 7º, da Lei n. 9.504/97 e da absoluta ausência de indícios de irregularidade de tais doações.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso, a fim de julgar improcedente a representação.