RE - 15791 - Sessão: 01/07/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recursos eleitorais interpostos pela COLIGAÇÃO RENOVA CARLOS BARBOSA e FERNANDO XAVIER DA SILVA, candidato à reeleição como prefeito de Carlos Barbosa, contra sentença que julgou parcialmente procedente representação por conduta vedada ajuizada pela primeira recorrente em face da COLIGAÇÃO JUNTOS POR CARLOS BARBOSA, RODRIGO STRADIOTI, candidato a vice-prefeito, e FERNANDO XAVIER DA SILVA, para o fim de condenar Fernando ao pagamento de multa no valor de R$ 5.000,00 por infringência ao art. 73, VI, “b”, da Lei n. 9.504/97, por realização de propaganda institucional em período vedado mediante adesivos afixados nas lixeiras e parquímetros da cidade de Carlos Barbosa contendo o slogan: O governo que faz mais e melhor. Administração 2009-2012.

O processo subiu a esta Corte em grau recursal, obtendo julgamento de anulação diante da ausência de formação de litisconsórcio entre o candidato a prefeito e o candidato a vice-prefeito, Evandro Zibetti (fls. 154-156v.).

Nas razões de reforma, a Coligação Renova Carlos Barbosa combate os fundamentos da sentença no ponto em que o julgador entendeu que a condenação estaria restrita à autoridade responsável pela colocação dos adesivos impugnados, o prefeito reeleito. Requer o provimento para que seja majorada a multa e condenados todos os representados, com a declaração da inelegibilidade e cassação dos diplomas (fls. 219-223).

O recorrente Fernando Xavier da Silva sustenta que a afixação de adesivos nas lixeiras e parquímetros da cidade, contendo o slogan - O governo que faz mais e melhor – Administração Municipal 2009-2012 – não viola os arts. 37, § 1º, da CF e 73, VI, “b”, da Lei das Eleições e que, tão logo foi notificado acerca da liminar que determinava a retirada da publicidade, cumpriu a decisão. Requer a reforma da decisão com o julgamento pela improcedência (fls. 224-230).

Contrarrazões apresentadas pelas partes às fls. 233-240.

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo parcial provimento do recurso da coligação representante para acolher o pedido de cominação de multa ao vice-prefeito, Evandro Zibetti, e pelo desprovimento do recurso de Fernando Xavier (fls. 245-251).

É o relatório.

 

VOTOS

Dr. Leonardo Tricot Saldanha:

Os recursos são tempestivos. Os recorrentes foram intimados da sentença em 14.03.2013 (quinta-feira), e ambos recursos interpostos em 18.03.2013 (segunda-feira), vale dizer, dentro do tríduo legal.

O ato imputado aos representados refere-se à prática da conduta vedada prevista no art. 73, VI, “b”, da Lei n. 9.504/97, abaixo reproduzido:

Art. 73 - São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

VI - nos três meses que antecedem o pleito:

[...]

b) com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral; (Grifei.)

A inicial da representação sustenta a ocorrência de publicidade institucional em período vedado e a prática de propaganda eleitoral antecipada, pois as fotografias acostadas às fls. 11-13 demonstram que, durante o período em que é vedada a publicidade institucional, a prefeitura de Carlos Barbosa manteve afixados os adesivos que haviam sido colocados “há longa data” nos parquímetros e lixeiras da cidade, onde constava, além das informações sobre o uso e as taxas, no parquímetro, e as informações sobre a separação do lixo orgânico e do reciclável, nos coletores de lixo, o brasão municipal e o slogan Prefeitura Municipal de Carlos Barbosa - O governo que faz mais e melhor. Administração Municipal 2009-2012.

Adianto que, analisados os autos, não se verifica a realização de publicidade institucional, merecendo reforma a decisão para o fim de ser julgada improcedente a representação.

O c. TSE, em reiterados julgados, já se manifestou no sentido de que em obras públicas é vedada a manutenção de placas contendo expressões que possam identificar autoridades, servidores ou administrações cujos cargos estejam em disputa na campanha eleitoral, ainda que colocadas anteriormente ao período três meses que antecedem o pleito:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 73, VI, B, DA LEI Nº 9.504/97. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. MANUTENÇÃO. PERÍODO VEDADO. RECONHECIMENTO. TEMPESTIVIDADE.

- Configura propaganda institucional vedada a manutenção de placas de obras públicas colocadas anteriormente ao período previsto no art. 73, VI, b, da Lei das Eleições, quando delas constar expressões que possam identificar autoridades, servidores ou administrações cujos cargos estejam em disputa na campanha eleitoral. Precedentes.

- Embargos declaratórios acolhidos somente para reconhecer a tempestividade dos embargos anteriormente opostos.

(TSE, Embargos de Declaração em Embargos de Declaração em Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 10783, Acórdão de 15.04.2010, Relator Min. Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Data 18.05.2010, Página 29 .)

Além disso, a jurisprudência sobre a matéria é pacífica sobre o cometimento da conduta vedada mesmo quando a autorização para a publicidade institucional é anterior ao período proibitivo, dado que, em muitos casos, as administrações públicas valiam-se da autorização ocorrida em momento anterior à vedação para realizar ostensiva propaganda institucional com evidente intenção eleitoral de captação de votos.

A par destes entendimentos, no sentido de que a manutenção de placas em obras públicas contendo expressões que possam identificar administrações cujos cargos estejam na disputa caracteriza a conduta vedada prevista no art. 73, VI, “b”, da Lei das Eleições, e de que, ainda que a autorização para a propaganda seja anterior, sua manutenção configura a infração eleitoral, tenho que a análise deste caso concreto não pode se afastar da intenção do legislador ao tipificar a infração, nem tão pouco do casuísmo que levou o TSE a alargar a expressão “autorizar publicidade institucional”.

A finalidade do artigo 73 e seguintes da Lei das Eleições, no que tipificam as condutas vedadas, é impedir o abuso do poder político e de autoridade, para se preservar o equilíbrio e a igualdade entre o candidato da situação e os demais concorrentes ao pleito. Daí necessário que a conduta beneficie candidatura em detrimento de outra.

As condutas vedadas buscam impedir o indevido emprego da máquina pública por candidatos à reeleição, evitando que sejam praticados atos com o fim deliberado de causar benefício ou prejuízo indevido aos participantes do processo eletivo (ZILIO, Rodrigos López. Direito Eleitoral, 3ª ed., Porto Alegre: Ed. Verbo Jurídico, 2012, p. 502-504).

Logo, para que haja a caracterização da transgressão da regra, a ação deve ter sido dirigida com o propósito de beneficiar candidatura, causando prejuízo aos demais concorrentes, com a quebra da isonomia entre os candidatos.

É evidente que um painel publicitário, a exemplo de um outdoor, instalado em frente a uma obra pública que permanece em execução durante o período de campanha eleitoral, e veicula o slogan de candidato à reeleição, traz manifesto proveito à candidatura da situação, pois expressamente vincula a candidatura a uma benfeitoria pública, uma realização para o eleitorado. Esta hipótese é, sem sombra de dúvidas, caso de propaganda institucional pelo evidente proveito que obtém o candidato que está em exercício frente aos demais.

Também há casos em que slogans, cores e símbolos característicos de uma administração são veiculados nos bens públicos de forma maciça justamente às vésperas do período proibitivo, no mais das vezes, com a intenção de que permaneçam sendo vistos pelos eleitores durante todo o processo eleitoral, exsurgindo daí o entendimento de que a manutenção da publicidade também caracteriza o ilícito. Confira-se:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. CONDUTA VEDADA. PROPAGANDA INSTITUCIONAL. PERÍODO. PROIBIÇÃO. LEI Nº 9.504/97, ART. 73, VI, b. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. (SÚMULAS Nos 7/STJ e 279/STF). FUNDAMENTOS NÃO INFIRMADOS. DESPROVIMENTO.

1. No caso vertente, o Tribunal de origem constatou a ocorrência de publicidade institucional realizada no período vedado, por meio da divulgação do símbolo e slogan da administração municipal em cortinas de escolas públicas, uniformes estudantis e placa de projeto social, o que atrai a incidência das sanções previstas no § 4º do art. 73 da Lei nº 9.504/97, quais sejam, suspensão do ato e multa.

2. Não há como reformar o acórdão sem reexaminar o acervo fático-probatório dos autos, providência inviável em sede de recurso especial.

3. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 164508, Acórdão de 15.02.2011, Rel. Min. Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Data 06.04.2011, Página 50.)

O ponto é justamente este: uma publicidade institucional legítima e regular, veiculada dentro dos ditames da lei, a partir dos três meses que antecedem o pleito passa a caracterizar conduta vedada, devendo ser suprimida a fim de preservar a isonomia entre os candidatos.

Dadas as peculiaridades do caso concreto, tenho que os adesivos com informações de utilidade pública colocados “há longa data” nos parquímetros e lixeiras da cidade, embora contendo o slogan da atual administração, não configuram abuso de poder capaz de determinar a condenação.

Primeiro, porque o candidato à reeleição Fernando Xavier da Silva, a exemplo do que ocorre com a propaganda antecipada, prontamente cumpriu a decisão liminar prolatada quando do ajuizamento da ação, que determinou a retirada do slogan dos adesivos, afixando um adesivo cinza sobre os dizeres O governo que faz mais e melhor. Administração Municipal 2009-2012 (fl. 50).

Segundo, porque as ordens de serviço expedidas pelo prefeito logo no início do ano eleitoral relativas ao controle da publicidade institucional dão conta da intenção de cumprimento da legislação, restando evidenciada a falta de intenção de realizar propaganda eleitoral no período vedado, de modo que a peculiaridade do caso concreto não pode ser tratada como o de típica publicidade institucional veiculada em meios de comunicação, nos quais o gestor age com consciente propósito de divulgar feitos da Administração especificamente durante o período vedado.

Terceiro, e mais importante, porque entendo que a simples manutenção de slogan da administração no adesivo com as informações sobre o parquímetro e com a indicação de lixo seco ou orgânico não caracteriza, por si só, propaganda eleitoral, tampouco desvirtua a propaganda institucional do município, pois embora identificador da atual gestão, sequer há notícia nos autos de utilização de tais expressões na campanha para a reeleição.

Aliás, tenho dificuldade em visualizar benefício caracterizador de abuso e de quebra de igualdade num slogan escrito ao lado das instruções de um parquímetro ou das informações sobre a lixeira, dado que não parece estar presente a promoção pessoal do agente público, situação que iria de encontro ao art. 37, § 1º, da Constituição Federal.

Pela singeleza com que a questão se apresenta, não vejo como enquadrar a hipótese em conduta vedada caracterizadora de abuso de poder. Além disso, não restou demonstrado que a propaganda ilegal foi capaz de macular a regularidade e a legitimidade do pleito eleitoral ou mesmo, tenha desequilibrado a disputa.

A possibilidade de reeleição é inegavelmente uma vantagem desleal aos demais candidatos ao pleito, porém tem previsão constitucional.

A análise é extremamente casuística, daí porque é necessário frisar que o entendimento aqui exposado não é genérico e tem fundamento nas peculiaridades do caso concreto, a fim de não gerar precedente que sirva de azo ao abuso. Embora a pesquisa jurisprudencial tenha retornado casos em que houve condenação, é preciso levar em consideração a intenção legislativa, a forma de publicação do slogan e o momento em que foi veiculado. Como as diretivas jurídicas estão predominantemente cunhadas na terminologia cotidiana, o contexto e a situação são os auxiliares fundamentais para a interpretação judicial (Ross, Alf. Direito e Justiça. São Paulo: Edipro, 2000, p. 147).

No caso em exame, tenho que a questão foge do abuso principalmente porque a própria inicial afirma que o slogan estava nos adesivos há longa data, situação também analisada no seguinte precedente:

RECURSO ELEITORAL - REPRESENTAÇÃO - CONDUTA VEDADA - ART. 73, VI, B, DA LEI Nº 9.504/97 - PUBLICIDADE INSTITUCIONAL - CANDIDATOS - PREFEITO E VICE-PREFEITO - DISTRIBUIÇÃO DE JORNAIS - AUSÊNCIA DE PAGAMENTO COM RECURSOS PÚBLICOS - PROPAGANDA ELEITORAL REGULAR - SLOGAN DA ADMINISTRAÇÃO EM IMÓVES E VEÍCULOS PÚBLICOS MUNICIPAIS - INSCRIÇÃO ANTIGA - NÃO-CONFIGURAÇÃO - RECURSO IMPROVIDO.

Propaganda eleitoral impressa confeccionada de acordo com a lei e devidamente lançada na prestação de contas não se confunde com a publicidade institucional vedada pelo art. 73, VI, "b", da Lei das Eleições.

A jurisprudência do colendo Tribunal Superior Eleitoral está consolidada no sentido de que é exigido, para a caracterização da publicidade institucional, que seja ela paga com recursos públicos. Nesse sentido: Acórdão nº 24.795, rel. Min. Luiz Carlos Madeira e Acórdãos nos 20.972 e 19.665, rel. Min. Fernando Neves.

A inscrição do slogan da Prefeitura Municipal em imóveis e veículos antes dos três meses anteriores ao pleito não viola o art. 73, VI, "b", da Lei 9.504/97.

(TRE-MT, Representação n. 1311, Acórdão n. 18783 de 28.04.2010, Relator César Augusto Bearsi, Publicação: DEJE - Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral, Tomo 634, Data 03.05.2010, Página 1-3.) (Grifei.)

Concordo com o entendimento do Ministério Público junto à origem (fl. 118), no sentido de que o slogan não induz o leitor (e eleitor), por si só, a vinculá-lo com a pessoa do candidato à reeleição Fernando Xavier da Silva e seu candidato a vice. E nem se verifica autopromoção dos candidatos através do slogan utilizado. Nesse sentido, a doutrina:

Publicidade institucional é, portanto, aquela propaganda veiculada na imprensa escrita (incluindo Diário Oficial com destaque jornalístico), rádio ou televisão, usada por candidatos à reeleição ou candidatos agentes públicos, que se valem de órgãos oficiais para se autopromover (quebra do princípio da impessoalidade dos atos administrativos), facilitar a publicação de seus ideais (quebra do princípio da moralidade administrativa) ou cobrir os custos com o dinheiro público (quebra do princípio da legalidade administrativa – ato de improbidade – lesão ao erário), sob a aparência de publicidade legalizada de atos, programas, obras, serviços e campanhas.

(Cerqueira, Thales Tácito e Cerqueira, Camila A. Direito Eleitoral Esquematizado. 2ª Edição, revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2012, p.578.)

A conduta vedada destina-se a coibir que os agentes públicos se beneficiem da administração pública em prol de uma candidatura. Daí que a melhor interpretação é aquela no sentido de que o uso da máquina pública ocorra de forma evidente e intencional, causando desequilíbrio entre os participantes ao pleito.

Não é o caso dos autos, merecendo a ação ser julgada improcedente.

Pelo exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso da COLIGAÇÃO RENOVA CARLOS BARBOSA e pelo provimento do recurso de FERNANDO XAVIER DA SILVA para o fim de reformar a sentença e julgar improcedente a representação.

 

Des. Luiz Felipe Brasil Santos:

Acompanho o relator.

 

Desa. Maria de Fátima Freitas Labarrère:

Considero que estampar a frase O governo que faz mais e melhor. Administração 2009-2012 em todos os parquímetros e lixeiras da cidade em período proibido configura, sim, a conduta vedada pela lei. O eminente relator, ao expor os motivos pelos quais não teria considerado os fatos como conduta vedada, apontou a não utilização do slogan durante a campanha do candidato e a retirada imediata da propaganda impugnada. No entanto, entendo que o slogan foi retirado tardiamente, ficando exposto durante o período vedado. E, de acordo com informações constantes dos autos, esse slogan era usado na publicação de jornal informativo, que dizia Carlos Barbosa Mais e Melhor, e também teria sido usado em todas as máquinas e veículos da municipalidade com o brasão do Município de Carlos Barbosa e o slogan O Governo que faz Mais e Melhor. Então, trata-se de uma propaganda vista por todos, pois exposta em locais de amplo acesso.

Nesse sentido, estou negando provimento aos recursos, com a vênia do eminente relator.

 

Dr. Ingo Wolfgang Sarlet:

Tive acesso ao voto escrito, pude ver as fotografias, e percebi que o slogan não figurava isoladamente em alguns parquímetros, como eu pensava, mas sim de forma espalhada em todas as lixeiras e parquímetros, de modo que o impacto dessa exposição disseminada pela cidade é bem maior do que um outdoor, até porque as pessoas têm acesso direto e imediato à propaganda. Desse modo, acompanho o voto da eminente Desa. Maria de Fátima.

 

Dr. Hamilton Langaro Dipp:

Impressionado com os argumentos, tanto da Desa. Maria de Fárima, como do Dr. Ingo, acompanho a divergência.

 

Dr. Luis Felipe Paim Fernandes:

Acompanho a divergência.